Rony tinha acabado de voltar da fisioterapia, estava bem melhor com os tratamentos. Gina se encarregava de levá-lo e buscá-lo, o que ele considerava algo bom, já que ela era a única que não o tratava como um bebê. Mesmo estando recuperado, seu pai e principalmente sua mãe o tratavam como se ele tivesse um ano de idade.

Assim que chegou ele deitou-se no sofá e passou a usar seu telefone celular enquanto Gina estava na cozinha, empenhada em preparar algo para os dois comerem. Enquanto ele lia seu feed em uma rede social, ele recebeu uma mensagem de Harry.

“Tá a fim de andar de patins hoje?” dizia a mensagem de Harry, que deixou-o encabulado.

“Eu não sei andar de patins, e você sabe disso!” ele respondeu.

“E é exatamente por isso que você tem uma professora, não é mesmo?” o pensamento que passou por sua cabeça era tão inacreditável que ele não se conteve e teve que perguntar ao amigo.

“Está falando sério?”

“Sim, estou. Ela te espera às duas e meia, acho que você já sabe onde encontrá-la.”

Não precisou que Harry dissesse mais nada, ele já estava se levantando e pegando a chave do carro, porém lembrou-se de Gina e foi até a cozinha avisá-la.

— Ginny? — disse assim que entrou na cozinha.

— O que é agora, Ron? — ela perguntou impaciente como sempre.

— Nossa, que grosseria... Eu estou de saída, ok?

— E vai pra onde eu posso saber?

— Tem uma pessoa querendo me ver.

— Que pessoa?

— Uma pessoa que eu quero muito ver também.

— Que pessoa que... Ah! — ela disse entendendo a situação — Vá logo antes que a mamãe chegue!

— Obrigado! — ele trocou um sorriso cúmplice com a irmã.

— Rony, espere! Tome cuidado ao dirigir, ok? E... Boa sorte! Estou torcendo por você!

— Valeu, mana! — ele voltou e deu um rápido abraço em Gina e finalmente saiu.

(...)

Hermione já estava se arrependendo de ter aceitado a proposta de Harry. Ela estava sentada em um dos bancos do parque em que ela e Rony tinham andado de patins juntos, esperando-o.

O primeiro local que veio a sua mente quando Harry pediu que ela escolhesse um lugar para que os dois pudessem se encontrar fora aquele, e agora estava lá a sua espera.

Não estava nem um pouco a vontade. Estava com medo e não sabia o que iria dizer ou fazer quando ele chegasse se é que ele viria. Uma parte dentro de si gostaria muito que ele não viesse, mas a outra estava desesperadamente ansiosa para vê-lo.  

Quando o avistou se aproximando, seu coração parou. Ele parecia desconfiado e feliz ao mesmo tempo, também parecia absurdamente melhor do que da última vez que o viu no leito do hospital. Quando ele já estava bastante próximo ela se levantou, e ele parou a sua frente observando-a. Ela tentou gaguejar alguma coisa, mas foi ele que se pronunciou primeiro:

— Harry disse que queria me ver. Imagino que não esteja mais me odiando tanto.

— Eu não odeio você.

— Prove.

— Nós temos que conversar. — ela disse ignorando o pedido dele.

— Ótimo. Sou todo ouvidos! — ele sentou-se no banco e ela o imitou.

— Ok, mas primeiro... Você está bem? Como estão indo os tratamentos?

— Acho que saberia se tivesse ido me ver.

— Ron, por favor...

— Por favor o quê, Hermione? Por que não foi me ver? Por que sumiu? O que é que eu fiz com você?

— Uma coisa de cada vez... — ela pediu suspirando e passou a fitar o nada — Ron, muita coisa aconteceu nesse tempo em que estávamos separados.

— Imagino, afinal já faz três meses desde o acidente.

— Não! Não só desde o acidente! Antes disso... Muita coisa aconteceu, incluindo a gravidez falsa da Lilá e o ataque ao meu primo. Eu sabia que você estava esquisito desde aquele dia, e é ai que eu te pergunto: Por que não me contou nada? Não confiava em mim?

— Não contar nada sobre o quê?

— Sobre você e a Lilá. Por que não me contou? Você sabe que eu sempre confiei em você em relação a ela, e mesmo assim não me contou.

— Ah... Pensei que seria melhor ignorar aquilo tudo, Hermione. Eu não sabia o que tinha acontecido e preferia não saber, pois não significava nada pra mim! E pensei que se não significasse nada pra mim, também não significaria pra você. E mesmo assim, em certo momento eu te contei! Mesmo que depois da coisa ter ficado feia, eu contei. Mas foi você que não quis me ouvir, não me deu atenção.

— Você não percebeu nada mesmo? Nada diferente em mim ou no meu jeito? Ou estava tão conturbado que nem notou? — ela virou o rosto para fitá-lo por poucos segundos, mas logo voltou a encarar o nada.

— Como assim?

— Naquela noite, pouco tempo antes de você chegar eu recebi uma visita um tanto indesejada... Victor apareceu no meu apartamento e me ameaçou. Disse que tudo o que havia acontecido com Cedrico era culpa dele, e que se eu não fizesse o que ele mandasse, outras pessoas correriam riscos. Ele disse que iria atrás dos meus pais, dos meus amigos e de você. E eu não pude desobedecê-lo... — agora lágrimas rolavam pelo rosto da garota, preocupando Rony.

— O que quer dizer com isso?

— Ele queria voltar comigo. Disse que me faria amá-lo e perdoá-lo. Disse que tinha errado e queria se redimir, mas se eu não aceitasse por bem ele faria por mal. Me deu dois dias para assumir um relacionamento com ele. Então você chegou, completamente desesperado e soltou mais uma bomba em cima de mim! Eu cheguei a cogitar a ideia de contar tudo pra você e resolvermos tudo aquilo juntos... Mas acho que o medo me cegou e eu tentei me convencer de que você tinha me traído.

— Hermione...

— Eu não aceitei aquilo pra mim... No fundo eu sabia que você não faria uma coisa dessas comigo! Mas eu não podia colocar a vida de mais ninguém em risco. Não depois dele quase ter matado Cedrico.

— Está dizendo que você não estava com Victor por que queria? Ele estava te ameaçando, Hermione? — ela assentiu e fechou os olhos, tentando manter-se calma como Harry a aconselhara.

— E então você apareceu na festa do Tiago de mãos dadas com a Lilá, e aquilo destruiu meu coração. Todas as esperanças que ainda me restavam de que você não tinha me traído se foram naquela hora...

— Você precisa saber que não fui que a levei até lá, ela me seguiu! E eu só segurei as mãos dela porque fiquei com ciúmes de você quando te vi com aquele idiota!

— Eu sei, eu sei... Mas na hora eu não sabia e fiquei muito mal por isso.

— Hermione... Victor te violentou? Forçou você a...?

— Não! Não! Isso nunca! — apressou-se a dizer — Se ele tivesse tentado, talvez eu não teria aguentado por tanto tempo... Victor é um completo imbecil, achava que me faria amá-lo de verdade. Ele é louco, completamente louco.

— Você já o denunciou? Queixou-se na polícia?

— Harry já cuidou de tudo isso pra mim.

— Harry? Harry Potter? Meu amigo?

— Sim. Harry tem sido um anjo pra mim. Ele tem me ajudado muito! Tanto judicialmente quanto psicologicamente. Victor está preso agora, graça a eles. Se eu não tivesse desabafado com Harry, eu nem sei o que faria.

— Por que contou tudo a ele?

— Não sei se sabe, mas eu fui te visitar quase todos os dias no hospital quando ainda estava em coma. Numa tarde eu tinha acabado de descobrir uma coisa... Uma coisa que me fez sentir que eu devia estar com você naquele momento e com mais ninguém... Então eu fui te visitar, mas eu não podia ficar muito tempo porque sempre te visitava no horário do meu almoço. Então quando eu saí do quarto ela estava lá...

— Ela quem?

— Lilá. Com uma barriga falsa, enganando sua família. Eu pensei que todos já sabiam sobre ela, mais tarde Harry me contou que você dois estavam a investigando sobre o que ela fez contigo. Mas aparentemente só você e eu sabíamos que ela não estava grávida. Acredito que tenha ido me contar tudo logo que soube a verdade, não é? Antes de falar com Harry.

— Foi. Eu sabia de que devia contar tudo a ele primeiro, mas eu não aguentava mais. Queria você de volta, Hermione.

— Quando a vi lá fora enganando a todos eu me senti completamente enojada. — ela recomeçou ignorando o que Rony havia dito — Sua família na situação em que estava e ela se aproveitando para enganá-los. Eu não me contive e acabei acertando uma bofetada na cara dela! Seus pais não gostaram muito, mas a Gina acreditou em mim e desmascarou aquela loira aguada. Não me orgulho do que aconteceu depois, mas foi bom ver sua mãe e sua irmã batendo nela.

— Ginny me contou.

— É, ela estava furiosa. — ela soltou um barulho parecido com um riso — Então o Harry chegou e acabou com a briga, as duas estavam tão nervosas que o seu pai não conseguiu pará-las sozinho. E ele ficou assustado quando soube do porquê de toda aquela confusão, e ficou mais assustado ainda quando a Gina disse a ele o que eu sabia. Então ele pediu pra conversar comigo sozinho. Sem ninguém.

— E assim você contou tudo a ele?

— Sim. Eu tive que contar para outras pessoas também, a pedido do próprio Harry. Ele precisava de testemunhas sabe?

— Quem foram as testemunhas?

— Cedrico, o garoto que estava com ele quando foi atacado e o Draco.

— Draco?

— Sim. Acho que se lembra do dia do acidente, não se lembra? Você saiu, ficamos só Victor e eu no apartamento.

— O que ele fez com você?

— Não importa...

— É claro que importa! — ele disse segurando o rosto dela, obrigando-a a olhá-lo — Gina disse que tinha aparecido uma cicatriz no seu rosto. Deixe-me ver? O que ele fez?

— Não tem mais cicatriz, já sumiu. — disse o afastando — Ele ficou um pouco bravo, nada demais. Como eu havia dito: não importa.

— Não importa? — ele estava incrédulo — Não acredito que aquele canalha tenha encostado um dedo em você.

— Ele não fez muita coisa... Draco chegou e me tirou de lá. E também deu uma lição no Victor. Desde aquele dia ele ficou desaparecido, eu pensei que finalmente estaria em paz até o dia de toda a briga com a Lilá. Naquele dia eu recebi ligações, era ele com o número desconhecido me ameaçando de novo. E eu sabia que não podia mais continuar aquilo, eu não estava mais sozinha... Então contei tudo ao Harry.

— Graças a Deus! Hermione, você não tinha que ter guardado tudo pra você. Mesmo com a confusão da gravidez da Lilá, eu poderia ter te ajudado e te protegido.

— Eu sei, me arrependo de não ter contado nada a ninguém antes. Mas Harry me ajudou muito, e ele concordava com a ideia de que eu devia ir embora. Me manter segura... Manter a mim e a...

— Você e a...? — ele incentivou-a, já que ela parecia não conseguir mais falar. Então ela finalmente o encarou, olhando-o nos olhos.

— Você se lembra de tudo, não lembra? Daquela noite antes do acidente... Você foi até o meu apartamento, eu estava comendo brigadeiro.

— Eu me lembro. Você estava tão linda! Linda e nervosa, parecia até uma ironia que uma garota numa camisola cor-de-rosa estava tão irada comigo.

— Eu te chamei de mentiroso, traidor e hipócrita.

— E eu... — ele começara a falar, mas ela o interrompera com a voz chorosa.

— E você disse que me amava. E por isso nunca mentiria pra mim! Disse que ia me proteger, me dar carinho e me dar o valor que eu merecia. Disse que eu devia acreditar em você porque me amava.

— E ainda amo. Será que é a única que ainda não percebeu? — ele perguntou levantando o olhar dela.

— Naquela noite nós não protegemos, Ron. Estávamos tão empolgados que acabamos por nos esquecer da proteção. — ela secou as próprias lágrimas.

— O que quer dizer isso?

— Quero dizer que eu engravidei. A partir daquela noite nós teríamos um filho, Ron.

A notícia pegara Rony de surpresa. Ele sentiu todo o ar de seus pulmões sumirem, e até ficou um pouco tonto. Hermione estava grávida! Grávida de um filho dele!

— Hermione...

— Não se alegre. — ela o interrompeu — Eu o perdi, perdi a criança. Harry acredita que foi por causa do excesso de estresse que eu tenho passado...

— Harry sabia disso também? Sabia que estava grávida de um filho meu?

— Sabia. Foi por isso que contei tudo a ele, eu precisava proteger essa criança! E foi ele que me obrigou a vir aqui conversar com você.

— Obrigou? Como assim obrigou?

— Eu não ia contar nada a você, Ron. Apenas iria embora e tentaria deixar tudo isso pra trás. Mas ele me convenceu de que era um direito seu saber de tudo.

— Você estava pensando em ir embora sem me dizer nada? Como teria coragem de fazer isso comigo, Hermione? — agora Rony sentia um misto de raiva e tristeza — Depois da noite que passamos juntos, o acidente... Você estava grávida de um filho meu! Um filho meu! Tem noção do que ia fazer? Tem noção de tudo que aconteceu entre nós? Como... Como pode simplesmente querer ir embora?

— Não só quero como vou! Minha chefa pediu para ficar até a formatura, depois eu vou embora.

— Você não pode ir embora!

— É o melhor pra nós dois, Ron.

— O que te faz pensar isso?

— Tudo o que aconteceu entre nós até hoje deu errado! Tudo! Desde o dia em que nos conhecemos! O próprio universo arranja uma maneira de nos separar, e eu não quero imaginar em nada pior do que já nos aconteceu. O melhor a fazer é ir embora! — ela dissera se levantando e ele a acompanhou.

— Como tem coragem de dizer que tudo entre nós deu errado? Realmente pensa uma coisa dessas? Tudo deu errado, Hermione? Tudo? Eu te dei dez meses para que não se apaixonasse por mim. Eu sempre disse que iria ganhar, e mesmo assim você entrou no acordo. Você até tentou, Hermione. Mas antes dos dez meses você já estava apaixonada por mim e eu te amei desde a primeira vez que te vi.

“No dia em que nos conhecemos eu fui dormir pensando em você, sabia? Tinha me arrependido de não ter pegado seu telefone, fui obrigado a ir com Neville pra um encontro as cegas contra a minha vontade, só pra conseguir contato com você! Me empenhei em não desistir de você até o último segundo, até finalmente você responder uma mensagem minha.

“O dia em que me respondeu foi um dos meus dias mais felizes, porque eu finalmente percebi que valia a pena eu lutar por aquilo que eu queria. E eu sempre quis você, Mione! Eu esperei dois longos meses pra te ver de novo, enfrentei toda a burocracia do hospital pra comemorar o seu aniversário com você. Você tinha me dito que nunca tinha recebido uma festa surpresa, eu fui o primeiro a preparar uma pra você.

“Eu nunca iria me dispor a tentar agradar uma mulher por dez longos mesmo enquanto corria o risco de ser rejeitado por ela no final. Nunca. Mas por você eu fiz isso... E se isso não é amor eu não sei o que é!

“Agora, diz pra mim, Hermione. Me diz como o amor entre duas pessoas pode ser completamente errado? Depois de tudo o que aconteceu com a gente eu estou aqui por você e você está aqui por mim. O que tem de errado nisso?”

— Não quero que ninguém se machuque por mim. Ninguém mais!

— E se eu preferir me machucar ao invés de ficar longe de você? Nada me machucaria mais que isso! — ele aproximou-se dela, repousou suas mãos na cintura fina de Hermione e colou sua testa na dela.

— Não é você que decide isso, Ron. — então os dois fecharam os olhos, um respirando o cheiro do perfume do outro.

— Hermione...

— Seja feliz, Ron...

Assim que ela sussurrara aquelas palavras ele sentiu-a se distanciar dele, e assim que abriu os olhos ele a observou correr para longe. Tentar alcançá-la seria inútil, ele mal voltara a andar, correr seria uma idiotice.

Sentiu as lágrimas banhando-lhe os olhos e ele sentou-se novamente no banco. Passou as mãos pelos cabelos e respirou fundo tentando acalmar-se.

Ele passou meses tentando fazê-la falar com ele, meses tentando vê-la, meses tentando formar uma amizade com ela, meses para conseguir beijá-la, meses para conquistá-la. E depois de tudo que tinha acabado de ouvir, ele sentiu-se ainda mais determinado: Se depois de todo esse tempo ele tinha se mantido firme, não seria agora que desistiria. Ele já tinha conquistado o coração de Hermione, apenas a lembraria disso.