A Diferentona escrita por Glauber Oliveira


Capítulo 6
Gates Motel


Notas iniciais do capítulo

Olá, diferentões e diferentonas! Mil desculpas pela imensa demora para postar um capítulo novo (antes tarde do que nunca, né?). É que aconteceu tanta coisa nos últimos meses: provas e trabalhos da faculdade, bloqueio criativo, a famosa bad... mas eu nunca desisti desta história por causa de vocês e porque é um grande prazer escrevê-la. Enfim... é isso. Espero que gostem deste "especial de Halloween" e desculpe se houver algum erro na escrita. Boa leitura!



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 Apressadamente, subo as escadas de dois em dois degraus e, já no andar de cima, disparo em direção ao meu quarto. Fecho a porta e vasculho o armário em busca do meu cofrinho rosa em forma de porco. Venho colocando dinheiro nele desde os doze anos, quando decidi que meu sonho de princesa era contratar um stripper no meu aniversário de dezoito. Na época eu não sabia o que um stripper fazia, mas minha avó dizia que ele era como um palhaço que animava festas, só que apenas para adultos.

 Encontro o bendito porquinho e o levanto com os dois braços acima de minha cabeça enquanto um coral de vozes angelicais canta ao fundo e uma luz sobrenatural ilumina o objeto.

— Meu precioso. – Seguro o cofrinho contra o peito. – Me desculpe por isso, Rosinha. Laquisha e Bart me devem um stripper.

 Então largo o cofrinho e, em câmera lenta, o assisto se espatifar no chão. CRASH! Há pedacinhos dele por todo o piso, porém não há sequer uma moeda! Cadê o meu dinheiro?!

 Saio do quarto, enfurecida, e desço as escadas com passos pesados e barulhentos.

— O que foi, querida? – vovó indaga.

— Todo o dinheiro que estava no meu porquinho sumiu!

— Ah, fomos nós que pegamos emprestado – vovô responde calmamente, como se não fosse nada demais.

— O quê?! – exclamo. – Poderiam ao menos ter me avisado!

— Tá bom, nós roubamos – ele confessa. – Mas um dia a gente devolve. Ou não.

— Mas por que vocês pegaram?!

— Nós íamos dar uma festa e estávamos lisos – explica ela. – Precisávamos comprar farinha. E não era a de trigo.

— Eu não acredito que vocês torraram tudo o que eu tinha com cocaína!

— Quem você acha que somos? – pergunta meu avô. – Dois viciados? Não gastamos tudo com cocaína. Compramos maconha também.

— E álcool – minha avó acrescenta.

— Será que eu preciso explicar que é errado roubar?

— Será que eu preciso explicar as regras para morar conosco? – ela diz.

— Vocês têm regras? – questiono.

— Agora temos. Regra número A: esteja atenta a todo instante porque vamos te roubar. Viu? Acabei de pegar o sutiã que você está usando e você nem percebeu! – vovó ergue a peça íntima, balançando na minha frente.

— Mas esse sutiã não é meu – digo.

 Ela olha por baixo da blusa através da gola.

— Ah, então é meu. Droga, não acredito que eu me roubei! Isso me faz lembrar a regra letra 2: não confie em ninguém. Nem em você mesma. Agora, vá lá em cima trancar a porta do seu quarto antes que gente roube seu colchão e você tenha que dormir naquela caçamba ali fora.

— Você dois são péssimas pessoas.

— Obrigado, querida – eles agradecem em uníssono.

— Como vou comprar os presentes para o Bart e a Laquisha?

— É muito simples. – Vovó se levanta do sofá e segura meu rosto delicadamente com as duas mãos. – Vai trabalhar, vagabunda! Essa casa é pequena demais pra ter três desocupados.

* * *

 Sigo o conselho de meus avós de procurar um trabalho. Pela internet, busco por vagas de emprego na cidade. A primeira da lista é a de atendente num lugar chamado Gates Motel. Decido que amanhã irei lá.

 No dia seguinte, após o colégio, pego emprestado o carro dos meus avós e dirijo até o motel. No banco do passageiro está meu currículo que escrevi a mão, usando uma caneta vermelha com cheirinho de morango pra impressionar o dono ou dona do estabelecimento. Colei até uns adesivos do Smilingüido, mostrando que sou de Deus.

 Chegando ao local, estaciono o automóvel perto de um letreiro de neon. Desço segurando o currículo e caminho em direção à entrada da recepção. Olho pelo vidro da porta fechada. Parece não haver ninguém. Mesmo assim, dou três batidinhas e digo:

— Olá?

 Silêncio.

 Lá no alto, vejo uma casa antiga numa colina bem próxima daqui. Talvez seja onde o dono do motel more. Resolvo ir lá, no entanto, escuto um barulho e me viro. Avisto um rapaz por volta dos vinte e poucos anos puxando com dificuldade um saco preto de lixo de trás da recepção. Assim que ele me avista, larga o saco e ossos de uma mão pendem para fora. Ele acena para mim e sorri, se aproximando. Tento manter a calma e retribuo com um sorriso forçado. A vontade de sair correndo é imensa, mas minhas pernas estão paralisadas por conta do medo. E mesmo que eu tentasse fugir, provavelmente esse louco me alcançaria. Talvez ele não tenha notado o que eu vi.

— Olá! – o rapaz diz de forma simpática e natural. – Desculpe, eu só estava jogando o lixo fora. Você deve ser a prostituta que o hóspede do quarto três contratou. Ele pediu para avisar que foi almoçar no centro da cidade e que logo mais está de volta.

— Ah, não. Eu não sou uma prostituta. Na verdade – decido mentir –, eu estava meio perdida. Achei que este era o lugar certo, mas percebi que não. Só que agora eu já me encontrei. De qualquer forma, obrigada. Eu já vou indo.

— Isso na sua mão é um currículo? – ele pergunta.

— É – respondo. – Boa visão a sua. – Rio de nervoso.

— Então você está no lugar certo. Estamos precisando de um atendente.

— Ah, que ótimo. Bem, aqui está meu currículo – falo, entregando a folha com as mãos trêmulas.

 O rapaz chega mais perto, pega o papel, dá uma olhada e suspira. Ele ergue as sobrancelhas.

— Uau! Cheirinho de morango. Estou impressionado. Por que não aproveita e já faz a entrevista?

— S-sério? – gaguejo.

— Sério.

 Tento arrumar alguma desculpa.

— É que eu preciso raspar meu bigode, depilar a virilha e...

— Tudo bem, não vai demorar.

 Ou seja, vai ser uma morte rápida. Tomara que seja indolor. Como será que ele vai me matar? Espera, eu não posso aceitar esse destino! Se bem que eu falei tanto que queria estar morta que Deus deve ter me ouvido. Desculpa, Deus. Era apenas força de expressão. Bom, agora não tem como voltar atrás.

— Já que insiste... – digo.

— Ótimo. Vamos ao meu escritório. Fica atrás da recepção.

 Concordo, balançando a cabeça.

— Mas antes, posso ir ao banheiro? – pergunto.

— Claro. Você pode usar o do quarto um, aquele do lado do meu escritório.

 Acompanho o jovem até o motel. Ele busca a chave do quarto um na recepção e abre a porta do dormitório.

— Fique a vontade – ele diz. – Vou ficar aqui fora e cuidar do lixo enquanto isso.

— Tudo bem. – Finjo um sorriso.

 Assim que o dono do motel some de vista, disparo para o banheiro e tranco a porta. Pego o celular do bolso da calça e ligo para meus avós. Não demora muito e alguém atende.

— Alô?— ouço a voz de minha avó.

— Oi, vovó – falo, sussurrando. – Sou eu, Emily.

Ah, pensei que fosse alguém importante. O que foi, querida?

Escute. Eu estou no Gates Motel.

Mentira! Não acredito que minha netinha finalmente vai transar! Você me ligou porque quer umas dicas, né? Olha, não precisa ficar nervosa. Relaxe. Eu diria para você esfregar os peitos na cara dele até sufocá-lo, mas como você é reta como uma tábua, eu sugiro que sente na cara dele.

— O quê?! Não! Eu não vou transar! Estou aqui por causa da vaga de atendente. Só que quando cheguei, o dono do motel estava carregando um saco de ossos! E neste momento, estou trancada num banheiro, surtando por conta disso!

Emily, não há motivo para ficar com medo. É só um monte de ossos. Você ficaria com medo da Taylor Swift?

— Não são os ossos! É o cara! E se eu for a próxima a parar naquele saco?

Eu diria que foi um prazer ter te conhecido, mas nem isso eu posso te dizer.

— Me ajude! Foi você quem me meteu nessa, dizendo para eu ir trabalhar.

Você ainda me escuta? Nem eu mesma me escuto. Aliás, o que eu acebei de falar?

— Esquece. Tchau, vovó.

— Tchau, querida. Que Deus te elimine.

 Encerro a ligação.

 Preciso sair daqui, penso. Observo ao redor o cubículo em que me encontro e miro numa pequena janela que dá para os fundos do motel. Subo na privada com a tampa abaixada, em seguida, na caixa de descarga. Abro a janela e tomo impulso. Metade do meu corpo já está do lado de fora quando me dou conta de que estou entalada. Droga! Eu não devia comer tanto cookie no Starbucks. Já sei o que fazer!

— SOCORRO! – grito desesperadamente. – Alguém me ajude!

  Escuto passos de alguém se aproximando. É o dono do motel.

— Ninguém me ajude! Estou ótima! Podem voltar ao que estavam fazendo!

— Meu Deus, o que aconteceu? – ele pergunta, observando a situação, perplexo.

— Nada. Eu apenas quis tomar um ar fresco.

— E por que não saiu pela porta?

— Porque ela emperrou.

— Ah, isso acontece com frequência. Preciso mandar trocar. Mas não se preocupe, eu vou te ajudar.

 Agora eu estou preocupada de verdade.

Imagino que ele vá sacar uma faca de algum lugar e cortar minha garganta. Não tenho para onde ir. É o momento perfeito para cometer um assassinato. No entanto, ele realmente me ajuda. Depois de muitos esforços de ambas as partes, consigo me desprender.

— Obrigada – digo por fim, ofegante. – Pensei que eu fosse morrer ali.

— Imagina. Tudo certo para a entrevista?

  Droga! Me esqueci deste detalhe.

— Claro! – minto.

 Damos a volta no motel e entramos na cabine da recepção. Passamos pelo balcão de atendimento e chegamos ao pequeno escritório. Deve ser aqui onde ele mata suas vítimas. Assim ninguém vê nada. Por isso ele não me matou lá fora.

— Sente-se – o rapaz diz, gesticulando para uma poltrona. Sento-me nela. Meus músculos estão totalmente enrijecidos. Os bicos dos meus peitos só faltam perfurarem o sutiã e a blusinha de tão duros, e não é de tesão. – Engraçado. Quase ninguém vem atrás desta vaga.

— Por que será, né?

— Pronta para a entrevista? – ele pergunta. “Entrevista”. Sei. De qualquer forma, assinto. – Perfeito. A propósito, me chamo Norman. Norman Gates. Você é a...? – ele procura por meu nome no currículo.

— Emily – respondo de imediato.

— Nome de prostituta – Norman comenta.

— O quê?

— Desculpe, pensei alto demais. Mas é verdade.

— Não é, não! Esquece. Vamos terminar logo com isso.

 Norman se senta em uma poltrona de frente para minha e pergunta:

— Tem alguma experiência no mercado de trabalho?

 O quê? Ele realmente está fazendo uma entrevista?

— Não – respondo.

— Qual o seu objetivo aqui?

— Ficar viva. Quer dizer, ganhar dinheiro.

— Filme favorito?

— Cinderela Baiana.

— Uma cor?

— Azul-piscina-pública.

— Se você fosse um animal, você seria...?

— Um panda porque ele só vive com bambu na boca.

— Um sonho?

— De doce de leite.

— Um medo?

— Cair de moto e me ralar.

 Após alguns minutos em silêncio, aparentando estar pensativo, Norman solta:

— Está contratada.

— Uhul! – levanto animada e faço minha dancinha da vitória. Se ele é um psicopata, que se dane, contanto que me pague... – Obrigada! Quando começo?

— Amanhã.

— Maravilha!

* * *

 Saindo da recepção/escritório, dou de cara com uma bela mulher em pé, parada diante da porta do quarto três.

— Com licença – falo, me aproximando –, você é a moça que o homem deste quarto contratou?

— Sim – ela responde, simpática.

— Ele saiu para almoçar, mas daqui a pouco está de volta.

— Obrigada pela informação. Você trabalha aqui?

— Trabalho, sim – digo.

— Prazer – a mulher estende a mão e me cumprimenta. – Eu sou a Emily, e você?

— Belo nome! – abro um sorriso falso. O desgraçado do Norman está certo. – Me chamo Emma – minto. – Eu gostaria de conversar mais, mas já deu meu horário e...

— Ah, sem problema.

— Mas boa sorte com o cara do quarto três.

— Obrigada. Até mais, Emma.

— Até!

 Caminho sentido ao carro dos meus avós para ir embora, porém algo me chama a atenção. O saco que Norman carregava, jazia no topo de uma lata de lixo, perto da escadaria que dava para a casa na colina. Minha curiosidade me consome. Vou lá. Então, desembrulho o saco e encontro os ossos de uma mão. Ossos falsos de um esqueleto de plástico. O saco está recheado de enfeites velhos de Halloween. Eu me enganei. Norman não é um maníaco. Eu é que tenho sérios problemas causados pelos meus avós. Que vergonha que eu passei.

 Chuto a lata de lixo, que tomba e faz o saco de enfeites de Halloween derramar tudo o que possuía dentro. No entanto, havia outro saco de lixo no fundo da lata. Ele se desamarra e dali uma cabeça decapitada de verdade de um homem sai rolando pelo chão. Grito e saio correndo. A única coisa que se passa pela minha mente é: será que aquela cabeça era do cara do quarto três? Fica aí o questionamento.


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Notas finais do capítulo

Se gostaram, por favor, comentem. O dedo de vocês não vai cair, eu prometo. Além disso, é muito importante para mim, pois, de certa forma, me incentiva a continuar escrevendo. E se tudo der certo, nos vemos muito me breve. Até mais!



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