Avatar: A Lenda de Kyoshi escrita por Lucas Hansen


Capítulo 7
VI - A Imprudência de Myoshi




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― Bicudo! ― Myoshi gritava debilmente. ― Bicudo, cadê você? 

― Silêncio aí em cima! ― Uma voz grossa abaixo soou. ― Quer avisar para todo o exército de Chin onde a Resistência se encontra? 

Myoshi não deu atenção para o desrespeitoso Handu. Em um salto, deixou o pilar de rocha que a irmã elevou e pousou na grama da fazenda com um estrondo raivoso. 

― Bicudo! Apareça, por favor! 

Mas nada de seu melhor amigo aparecer. A voz de sua irmã também berrou debaixo do poço. 

― Myoshi, volte logo! Podemos procurar o Bicudo depois! Venha ver a nossa mãe. 

Myoshi queria ver Sukishi. Mas sua mãe estava alimentada e em segurança, e mesmo que deixasse a base dessa Resistência por alguns minutos, ela continuaria ali. 

Porém Bicudo estava perdido. Tudo poderia ter ocorrido a ele: Se tornar a presa de um alce-leão-dente-de-sabre, afogar em uma areia movediça ou até mesmo ser capturado para o uso do exército de Chin. 

― Eu já venho! ― Clamou para a irmã dentro do poço. ― Mantenha nossa mãe segura. Vou procurar o Bicudo. 

― Espera! ― Sua irmã anunciou na mesma hora. E quando se virava para respondê-la bruscamente para ficar, sua cabeça apareceu no poço e ela pulou ao seu lado. ― Ficamos separadas por muito tempo. Não vou permitir que isso aconteça de novo. Procuramos o Bicudo juntas. 

Kyoshi sorriu, e Myoshi retribuiu o seu sorriso, agradecida. 

― Agora, onde você deixou ele? 

― Ali. ― Apontou para o norte, perto das árvores onde fez o buraco para invadir a base da Resistência. Iniciou sua caminhada até o local, acompanhada pela irmã. ― Disse para ele me esperar ali. 

― Estamos muito perto do território do Chin Myoshi. Foi muita burrice você deixá-lo sozinho. 

― Espera, eu sou a burra agora? Pensei que a burra era você. Aliás, não sabia o que me esperava lá embaixo, nos túneis... Se fosse uma base do Chin, Bicudo teria ficado mais seguro aqui em cima. 

― Bom, não vai adiantar ficarmos paradas. ― Kyoshi afirmou com convicção. ― Irei para nordeste, e você para noroeste. Voltamos daqui uma hora, antes do sol se pôr. ― Antes que Myoshi pudesse dizer algo, Kyoshi continuou. ― Com ou sem o Bicudo. Sua segurança é mais importante do que a dele. 

― Como pode dizer isso? 

― Digo apenas o que sinto. Vá logo, e lembre-se. Uma hora. 

E Kyoshi começou a caminhar para sua direita. Enraivecida com a nova atitude da irmã, que era um pouco mais do que uma criança quando partiu da fazenda anos atrás, Myoshi também começou sua caminhada. 

Apesar de procurar por Bicudo, não era nele que Myoshi pensava, mas sim em seu pai, Xudok. 

Não conseguia deixar de lembrar a última conversa que tiveram, e revivia ela em sua mente constantemente. Seu pai justificara a razão pela qual forçou-a a treinar a dobra de terra, e tudo que Myoshi fizera em sua despedida fora desprezá-lo. 

"Não quero deixar a minha família, apenas você." 

Umas das últimas palavras ditas ao pai ecoavam em sua cabeça, e não podia deixar de se arrepender de tê-las dito. Sobrevivera em sua viagem apenas pelos ensinamentos de seu pai, e nem pôde agradecê-lo propriamente. Não pôde mostrar-lhe a gratidão, apenas o desprezo. 

Com um remorso enorme, Myoshi continuou sua busca cada vez menos esperançosa. 

O sol já iniciava sua descida e estava prestes a ir dormir, deixando a lua acordar. Sua vontade de dar meia volta e se reunir com sua irmã entrou em conflito com sua vontade de encontrar Bicudo e alimentá-lo. 

Não passava uma noite com ela durante anos. Sentia saudades de sua inocência, seu riso e até mesmo de sua habilidade sobrenatural com a dobra de terra. 

Mas passara todas as noites dos últimos anos com Bicudo. Jamais perdoaria a si mesma se o deixasse escapar por entre seus dedos. Jamais se perdoaria caso ele se tornasse um cavalo-avestruz de carga para Chin. Jamais se perdoaria caso ele morresse. 

Percebeu enfim que não tinha escolha. 

Seguiu durante o crepúsculo o caminho para o noroeste, com os pensamentos ainda lhe queimando a cabeça. Porém, sua mente freou com um sinal: Penas, que Myoshi reconheceu ser de Bicudo, jaziam pelas gramíneas, já que vento algum soprava para levá-las para longe. 

Um grau de felicidade e excitação passou por seu corpo, e sentiu-o palpitar e tremer junto com o coração conforme avançava. 

A lua já iluminava a terra quando avistou cerca de sete soldados com dois cavalos-avestruz, provavelmente rumando para a nova aldeia conquistada por Chin, perto de sua antiga fazenda. 

Sabia que, a pé, os soldados demorariam dias para retornar com seus achados, por isso, precisava se aproveitar dessa situação. 

Furtivamente, Myoshi avançou, flanqueando-os pelos arbustos que a escondiam. Bicudo pareceu notá-la, pois relinchou e virou a cabeça em sua direção. Um dos soldados se virou, curioso, para ver o que animal avistara, provavelmente temendo um predador. Mas ao não ver ou escutar nada, continuou a caminhar lentamente com seus companheiros. 

Eles bebiam, Myoshi percebeu. Provavelmente uma cerveja-vinho, ou algo mais forte. Derrubá-los seria moleza. 

― Venha logo animal estúpido! ― Um dos soldados puxava a rédea do Bicudo, enquanto outro sacou um chicote e lhe açoitou. 

Uma fúria governou seu ser por um instante, e Myoshi se revelou chutando três rochas em direção dos soldados. Dois deles foram pegos de surpresa, e logo foram nocauteados. Outro, escapou por pouco. 

― A Resistência! ― Um deles afirmou. 

― E desde quando a Resistência age sozinha? ― Outro questionou. 

― E quem se importa? Mate-a! 

E quatro dos soldados tentaram cumprir essas ordens. Dois deles brandido espadas, um deles o arco, e o último uma lança. O que os comandava segurou os dois cavalos-avestruz com seus pés descalços. 

Myoshi já estava acostumada a lidar com não-dobradores. Com certa facilidade, manteve uma postura firme e socou o ar, lançando rochas pesadas contra um dos homens. Ele as repeliu com as espadas. 

Uma flecha ou outro voava em sua direção, e Myoshi encontrou dificuldade em dançar para escapar das mesmas; não desejava uma dessas atravessando sua perna como anos atrás. 

Com rapidez, prendeu o arqueiro dentro de uma rocha, impossibilitando-o de atirar, e até mesmo de respirar. Escapou do golpe com o aço e chutou o estômago de um deles, e logo se virou para chutar uma rocha para o lanceiro, que tombou ao ser atingido. 

O espadachim mais habilidoso voou em sua direção, e Myoshi esquivou-se com um impulso da terra, passando por cima do homem, em direção aos cavalos-avestruz. 

Uma pequena parte de si queria negociar com o tal comandante, implorar por Bicudo e pedir para ir embora. Mas sabia que não era momento para isso, e muito menos adiantaria. Com um movimento veloz e firme, chutou três pedras em direção do homem. 

Ele desviou, porém não Bicudo. Uma das rochas o atingiu em cheio, e ele guinchou de dor. 

― BICUDO! 

O comandante contra-atacou. Um rocha atingiu seu estômago, e outra, sua cabeça. 

Sem ar, mal conseguindo respirar, e com a visão embaçada, Myoshi perdeu todas as esperanças. "Logo te encontrarei, meu pai." Ela pensou. "Logo te encontrarei e poderei de agradecer por tudo que fez por nossa família. Agradecer por salvar minha mãe e minha irmã. E a mim." 

Incapaz de se mover, Myoshi esperou o golpe fatal. Mas ele nunca veio. Um estrondo atingiu seus ouvidos, como um terremoto, e vários dos soldados que começavam a levantar eram atingidos novamente por rochas que Myoshi não dobrara. 

Olhando para trás, avistou Kyoshi. Imponente, rígida e amedrontadora: Seu olhar de antigamente havia sumido completamente, e a garota que um dia existira, não existia mais. 

Notando que não seria páreo para Kyoshi, o comandante montou no cavalo-avestruz saudável e galopou berrando: 

― Eu voltarei! Voltarei com terra! Voltarei com sangue! Voltarei com Chin! ― E sua voz se desfez na distância, enquanto ele abandonava seus subordinados. 

― Obrigada... ― Myoshi dizia enquanto se levantava, mas ela não lhe deu atenção, e muito menos um olhar. 

― Pegue o Bicudo. Eu vou imobilizar todos esses soldados e levá-los para a base. Podem ter informações valiosas para nos dar. 

Aproximou-se de Bicudo. Ele mal conseguia colocar uma de suas pernas no solo, e ele a dobrava constantemente com o contato. Claramente sangue gotejava. 

― Me desculpe... ― Ela disse para o animal, que lhe fez uma expressão de censura. Mas quem lhe respondeu fora Kyoshi. 

― Não quero suas desculpas. Eu disse para voltar depois de uma hora, não disse? ― Ela rugiu inconformada e furioso. Não era nada com a irmã que conhecia. ― Pelo menos você encontrou o Bicudo. 

Myoshi tentou levá-lo pelas rédeas, mas ele não conseguia se mover. 

― Vamos... Você consegue, eu sei que sim. 

Kyoshi virou para ela com um ar de dó. 

― Pra que serve um cavalo-avestruz que não consegue cavalgar? ― Perguntou com rispidez. 

― Você está dizendo o que eu estou pensando que você está dizendo? 

― Olha, ele está sofrendo. Você realmente quer que o Bicudo sofra? 

― Eu quero que o Bicudo viva! 

― Bom, isso vai ser bem difícil com a perna quebrada. Ele vai morrer, Myoshi. Mais cedo ou mais tarde. A escolha é sua se ele vai sofrer ou não. 

Não queria ouvir isso. Seu maior companheiro jamais morreria. Myoshi jamais permitiria. 

Myoshi dobrou uma rocha circular ao redor de Bicudo e o elevou no ar. Primeiramente, ele pareceu desesperado para retornar ao solo. Mas logo se acalmou e permaneceu quieto, facilitando a dobra de Myoshi. 

― Você é quem sabe. ― Kyoshi disse. ― Depois não diga que eu não lhe avisei. ― Sua irmã ergueu os seis soldados cobertos e presos com rocha pelo corpo inteiro, com exceção da cabeça, com extrema facilidade. 

Passado alguns minutos de silêncio sob o luar, Myoshi perguntou: 

― Eles vão voltar? 

― Ah, sim. Voltarão com sangue. Voltarão com Chin. ― E riu, debochando-os.


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