Silver escrita por Isabelle


Capítulo 8
Capítulo 7 - Charlie


Notas iniciais do capítulo

"Sussurrei algo no seu ouvido
Foi uma coisa pervertida para dizer
Mas eu disse isso de qualquer maneira
Te fiz sorrir e olhar para longe"
— Cigarettes After Sex



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Nenhum canal na TV parecia me satisfazer, muito menos alguma série. Tentei assistir Downton Abbey, mas nem a série estava me satisfazendo, parecia que havia algo se remoendo em mim agora que eu havia devolvido todas as coisas para André. Ele fazia muita falta. Mais do que eu esperava que ele fizesse. Ter as coisas dele jogadas pelo apartamento parecia uma forma de dizer que em breve ele estaria de volta, já que ele havia deixado sua caneca do Senhor dos Anéis no meu armário, já que a gente ainda tinha que terminar a nova temporada de Game of Thrones e já que sua escova de dentes ainda estava em cima da minha pia. Tudo isso indicava que a qualquer momento eu poderia ver ele passaria por aquela porta e me pediria desculpas, mas essa não era a realidade. A realidade era que ele tinha parado de gostar de mim antes que eu me desse conta disso, e de uma pessoa que tinha me dito que me amava tantas vezes, isso pareceu surreal.

Tinha sido ruim o bastante saber que eles estava me traindo, uma parte de mim parecia achar que tudo era uma grande invenção, e que o universo estava pregando uma peça em mim, porém, no momento em que vi Dani aparecer na porta da republica usando a camiseta que eu sempre usava quando dormia em sua casa tudo desabou. Uma grande parte de mim desabou, mas eu me mantive forte. Ninguém sabia o que realmente havia acontecido. Eu conseguia sentir minhas veias pegando fogo na hora que entrei no carro e acredito que até mesmo assustei Wade um pouco com a correria, mas ela era toda para me fazer chegar logo em casa, pois no momento em que eu entrei no meu apartamento, meu coração simplesmente explodiu e manchou todo o apartamento de vermelho.

Meu corpo todo fora jogado para o chão onde eu trouxe minhas pernas para perto do meu corpo e permaneci. Tampei minha boca para evitar os soluços, e fiquei ali. As lágrimas desciam pesadas enquanto minha garganta doía por conta dos soluços abafados. Me arrastei lentamente até o banheiro onde visualizei meus olhos vermelhos. Olhei a pulseira no meu pulso e a tirei, encarando as letras que já estavam sumindo. Tinha sido presente de André de um ano de namoro. Uma das coisas que eu não consegui devolver para ele. Deixei ela em cima da pia, e me arrastei para o meu quarto onde eu deitei e deixei as lágrimas caírem no travesseiro.

As memórias vinham como um turbilhão, elas não me deixavam ficar deitada na cama quieta, a única coisa que eu fazia naquele instante era encarar o teto, enquanto sentia um aperto mortal tomar conta do meu peito e se espalhar.

Tudo tinha começado em uma viagem de formatura três anos antes. Minha turma tinha decidido ir para a praia, e como Gabi havia resolvido que queria ir, pois nunca havia ido a praia, eu decidi que iria para acompanhá-la. Não sabia que sofrimento tinha vindo na bagagem daquela viagem, pois André havia decidido viajar com seus amigos na mesma época. Morávamos 500 km um do outro no mesmo estado, mas, mesmo assim, havíamos nos conhecido em uma praia totalmente distantes de ambas as casas.

O prédio que iriamos ficar seria hospedado por 40 alunos divididos em 10 pessoas em quatro apartamentos. Obviamente era uma divisão horrenda, contudo, no fim, tudo dera certo e conseguimos organizar um jeito perfeito para todos ficarem confortável quando fossemos dormir.

Na manhã seguinte, nosso primeiro dia na praia, estávamos todos empolgados. Gabi parecia que não poderia ficar mais feliz, e quando ela viu o mar bem em frente ao seus olhos um arrepio percorreu todo seu corpo. Eu nunca havia visto tanta felicidade no rosto de uma pessoa por apenas olhar o mar. Sorri tanto por estar vendo aquela cena, tanto pelo cheiro do mar me rodeando e me envolvendo. Gabi nem ao menos me esperou, ela simplesmente jogou suas roupas num canto e saiu em disparada para o mar. A única coisa que eu pude fazer fora dar risada da cena e fazer o mesmo.

Passamos a maior parte do dia na praia, e depois quando nos reunimos de volta no apartamento todos estavam falando sobre um luau que haveria aquela noite. Aquilo me fez rir, pois eu realmente não queria ir, eu estava totalmente desgastada pela praia aquele dia. Ainda mais para acompanhar o ritmo de Gabi que parecia que tinha ingerido pó de guarana na veia de tão animada que estava. Contudo, a mesma estava numa fase de tentar novas coisas, e ir no luau fazia parte desse “tentar novas coisas” e aparentemente entrar em todas aquelas roubadas com ela faziam parte de um contrato de amizade que eu nem ao menos tinha conhecimento de ter assinado, então eu tive que ir.

Gabi me vestiu em uma saia longa cheia de frutas, com um cropped branco. Tentei explicar para ela que as pessoas se vestiriam normal, e não como em um filme ou seriado onde as pessoas vão em luaus no Havaí. Não estávamos nem aos pés do Havaí, mas, mesmo assim, ela não me deu ouvidos. Continuou me cercando com maquiagens, e delineados com a tinta neon que marcavam meu rosto me deixando bem mais animada do que eu realmente estava.

— Tudo bem, pode não ser como no Havaí, mas você continua linda — ela disse, e nós duas nos olhamos. — Esse cabelo realmente combina com você, não é, Silver?

Eu sorri para ela de lado e concordei. Eu gostava de como Silver soava, sabia que a tradução era somente a palavra prata, mas eu gostava, bastante. O instinto de pintar havia sido de repente. Um dia eu estava morena, com os cabelos tão escuros quanto o céu a noite, e no outro estava tão prateado quanto o cabelo da Daenerys de Game of Thrones. É claro que eu não havia achado que aquela cor havia ficado bem para mim, como ficava para ela, contudo, com o tempo e ajuda de Gabi, eu pude encontrar a cor perfeita que eu queria.

Gabi me lembrava muito a Dani, contudo a tonalidade da sua pele era um pouco mais clara, e seu cabelo naquela época estava curto na altura do ombro, e também o simples detalhe que ela nunca faria uma coisas daquela comigo. Os olhos eram cor de amêndoa, e o cropped preto com a saia meia vermelha fazia com que eles se destacassem. Ela tinha sido minha melhor amiga desde a quarta série quando nos conhecemos por causa de um exercício de matemática. Ela tinha me ajudado a encontrar minha vocação, no ano que eu tirei somente para trabalhar, já que eu não sabia o que queria, e eu gostava de pensar que eu a havia ajudado, contudo, não tinha certeza.

Saímos e encontramos com várias pessoas. Havia música alta, gente tumultuada, e bebida. Gabi nem ao menos parecia aquela menina tímida que era na nossa cidade. Ela estava extremamente mais leve e solta. Conseguia conversar normalmente com os garotos que chegavam nela, e até mesmo me deixou alguns instantes para ir ficar com um deles.

Camila que era minha outra amiga, não tão próxima, estava conversando com esse outro garoto. Ele era alto e tinha um rosto bem definido. Os olhos eram meio acinzentados e as maçãs do rosto pareciam ter sido implantadas ali de tão bem desenhadas que eram. Por mais que ele estivesse conversando com Camila, seu olhar passava por mim de um jeito que me fazia ruborizar. Ele traçava a linha do meu corpo, enquanto eu tentava me distrair pedindo vários drinques para beber. Queria que Gabi voltasse logo, mas depois de ter saído com um cara como o que ela tinha saído, duvido muito que ela voltaria rápido.

— Olá. — O garoto se aproximou de mim, deixando Camila conversando com outra garota.

A música que estava tocando trocou de repente para Cigarettes After Sex que era uma das minhas bandas favoritas, aquilo realmente pareceu um bom sinal na época para mim.

— Olá. — Eu respondi, e cantarolei um pedaço da música que estava tocando.

— Cigarrettes After Sex? — Ele perguntou, olhando para uma das caixas de som.

— Oh, meu Deus, conhece essa banda? — Perguntei empolgada, não era muitas as pessoas que a conhecia.

— Uma das minhas bandas favoritas. — Ele cantarolou o outro pedaço da música.

Eu abri um sorriso para ele. Não havia como não sorrir. A conversa já tinha começado de um jeito ótimo, sem passada de mão, ou alguém tentando abusar de ninguém. Ele apenas tinha chegado conversando normalmente sobre música, claramente eu não conseguia ver o buraco em que aquela situação me levaria. Eu apenas conseguia pensar em quão lindos seus olhos eram.

— Você é realmente muito bonita. — Suas bochechas ficaram vermelhas ao me falar isso. — Me desculpe, eu sou péssimo conversando com garotas. — Ele deu uma risada sem graça.

— Sem problemas, eu também sou um saco falando com garotos. — Abri um sorriso fraco. — Tem sorte de eu não ter te assustado e feito ir embora, é uma das coisas que eu faço.

— Assusta os garotos como? — ele trocou um olhar preocupado.

— A maioria das vezes eles querem me cantar menosprezando outras garotas. Isso meio que me faz simplesmente sair andando e fingir que não conheço.— Dei de ombros.

— Realmente a coisa está complicada ultimamente. — Os olhos dele dançaram por mim, novamente, me fazendo corar. — Meu nome é André. — Sorriu, meio tímido, e ele realmente era. — E me desculpe por ser péssimo em pedir para poder te beijar.

— Eu sou a Charlote. — Disse, meio sem graça. — E tudo bem, eu acho. — Dei uma risada.

E bem assim, minha vida tinha se tornado totalmente diferente. Mentira. Ela não tinha se tornado totalmente diferente, claro que ela continuava na mesma, mas desde um longo tempo, eu nunca tinha tido uma pessoa que inflamasse meu coração da forma que André fazia. Obvio que eu já havia tido casinhos no ensino médio, mas nada como André. Eu cheguei a acreditar que ele seria o amor da minha vida. Eu realmente cai de cara no chão.

Nós nos beijamos aquela noite, numa parte mais distante da praia, onde o mar quebrava suas ondas e fazia o vento nos soprar. Ele tocou violão para mim antes, improvisou uma música curta com meu nome, e ficou me encarando parecendo bobo. Fiquei meio sem graça com aquele gesto já que não estava acostumada com as pessoas me encarando de uma forma tão liberal. De uma forma que realmente pareciam me desejar.

— O que? — Perguntei para que ele desviasse o olhar, mas ele não o fez.

— O seu cabelo, ele é realmente muito bonito. — Ele sorriu. — Queria testar uma cor assim, mas não acho que ficaria tão bom. — Ele brincou e eu ri.

— Na verdade, é bem recente, e está sendo muito difícil cuidar desse cabelo. — Disse nervosa. Ele estava tão próximo de mim. Conseguia sentir sua respiração encontrando meu rosto. — Eu estou quase desistindo e pintando novamente de preto, por que acho mais fácil, e é uma cor tão mais sabe? E eu acho que estou falando demais e muito rápido, é que eu faço isso quando estou nervosa, com você aqui tão perto e… — E ele me beijou.

O sabor salgado da sua boca preencheu a minha, meu corpo fora puxado para o dele com tanta avidez que eu senti medo, um frio na boca do estômago que me tomou totalmente, mas eu não queria pensar nisso, só queria prender minhas mãos em seu cabelo e beijá-lo, lentamente, firmemente, como se fosse a última coisa que eu faria em toda a minha vida. Ele parecia me desejar como eu fazia com ele, e eu me senti tão extasiada por isso. Era tão fácil conversar com André, não era necessário muita coisa, a não ser tem uma boca e uma voz. A conversa simplesmente fluía com ele.

Após isso nos encontramos todos os dias na praia. Nós demos caminhadas longas e rimos. Ele me pagou um suco e me levou no karaokê. Nós jogamos boliche e fomos ao cinema. Eu nunca pensei que pudesse me apegar a alguém tão rápido como eu me apaguei a André, e aquilo por mais lindo que fosse, não era nada lega, pois chegaria a hora em que eu iria para um canto, e ele iria para outro. Tentamos evitar isso, e fingir que a despedida não nos cercava, mas ela estava ali, correndo atrás da gente enquanto tentávamos fugir, mas ela nos alcançou.

Um dia antes de ir embora, nós fomos em uma festinha que havia. André passou a mão pela minha cintura, e me conduziu até um lugar onde ele tentou me ensinar a dançar. Algo totalmente falho pois meus pés não pareciam saber o que fazer. Contudo, no fim, ele passou a mão contra as minhas cinturas, e eu levantei os braços no seu pescoço, encarando aqueles olhos tão claros. Ele parecia querer dizer alguma coisa, mas não conseguia. Seus lábios ficavam abrindo e fechando a cada momento, e eu apenas não queria pressiona-lo. Deitei minha cabeça em seu peito, e deixei que a música rodasse a nossa volta, enquanto sentia o coração dele bater tão rápido quanto o meu. Gabi tinha dito que tinha medo disso. Medo que eu acabasse me apaixonando e no dia da despedida eu me desfizesse. 

— Charlie. — Ele desceu até meu ouvido, sussurrando para que só eu ouvisse. — Acho que me apaixonei por você. — Eu engoli seco. — As coisas que eu penso em fazer com você, envolvem tanto coisas fofas tanto quanto coisas... Me desculpe. — Riu, sem graça. — Eu estou nervoso. — Ele passou uma das mãos no meu cabelo. — Não quero ir embora amanhã, e não quero que você vá embora. Não vá embora. — Sua respiração encontrava a curva do meu pescoço.

— Não quero ir embora. — Disse baixinho, e ele suspirou. 

— Me desculpe por me apaixonar por você em apenas tão poucos dias, Charlie. — Ele ousou dizer, e eu tive medo de responder, então apenas o beijei. O beijo da despedida. 

O último dia, fora o mais difícil. André fora até a porta do ônibus para dizer tchau, ele tinha aquele olhar magoado no rosto, e segurou minha mão até o último momento. Me despedir dele parecia uma tortura, e no momento em que entrei no ônibus Gabi me abraçou com toda força, e disse que eu deveria ser forte, que ela estava ali por mim. Então fora isso. Tinha passado horas naquele ônibus pensando nele, e em como seria difícil esquecê-lo. Pois era isso que eu deveria fazer agora, esquecer o menino estranho com quem eu havia passado seis dias. Tínhamos combinado que seria só aquilo, e que não podíamos nos apegar, mas no momento em que eu cheguei em casa, as notificações de suas mensagens estavam em meu celular. Eu não poderia ter ficado mais feliz, o que eu não sabia, era que no momento em que eu achava que estávamos apaixonados, ele estava ficando com outra menina. Eu realmente tinha sido muito ingênua.

Movi meu corpo lentamente para o sofá trazendo comigo uma coberta e um travesseiro, e fiquei ali, mudando os canais, tentando achar alguma coisa que preencheria o vazio de André. Mal sabia eu, que a pessoa que faria isso, morava bem em frente ao meu apartamento.




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