Silver escrita por Isabelle


Capítulo 4
Capítulo 3 – Charlie


Notas iniciais do capítulo

Seu coração é grande demais para o seu corpo,
é por isso que não cabe aí dentro.
Você está derramando onde todos possam ver
— Melanie Martinez



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Abri a porta do provador e Dani me olhou com um olhar encantado. É claro que ela tinha feito o mesmo olhar para todos os outros seis vestidos que eu havia provado anteriormente, mesmo que eu soubesse que todos eles estavam completamente estranhos em mim. Por algum motivo que eu não compreendia, Dani achava que a melhor maneira de lidar com um termino de namoro era elogiar sua amiga de qualquer maneira, mesmo que os vestidos que ela esteja provando sejam desproporcionais para seu corpo.

Sorri para ela agradecida, e voltei para dentro para experimentar o último vestido que faltava. Era o mais sem graça de todos. Não tinha muito brilho, nem muitos strass colado por todo ele. Era apenas um vestido preto tomara que caia que se abria em um cós mais larguinho na cintura. Não era o vestido mais lindo de todos, mas com certeza era o vestido que iria comigo para casa e até mesmo para aquela festa ridícula.

— Esse ficou maravilhoso. — Dani disse, mas dessa vez ela não estava prestando muita atenção. Seus olhos estavam mais focados no celular. — Me desculpe, mas podemos ir andando, não gostei de nenhum desses.

Olhei para ela que tinha descartado vários vestidos que haviam ficado completamente maravilhosos nela. Dani não era o tipo de pessoa em que uma roupa não da certo. Era o tipo de menina extremamente bonita, que sabe que é bonita, e que você não precisa dizer isso para ela se pretende chamar sua atenção, porque é uma coisa que ela já tem consciência. Seus olhos eram de uma cor meio amêndoa com bochechas rosadas em uma pele negra que dava inveja em qualquer um. Os cabelos eram cacheados e caiam num percurso cachinho de uva até seus ombros. Os lábios eram simplesmente carnudos, e mesmo com um batom rose que ela estava usando era destacado facilmente e ela tinha um piercing, que mesmo eu não gostando, achava que era totalmente perfeito para ela.

— Como assim não vai levar nenhum? — Perguntei pegando as peças que haviam no provador.

— Não ficaram muito bons em mim. — Deu de ombros como se fosse totalmente normal. — Sabe um vestido verde que você tem? Eu estava pensando se você não emprestaria ele para eu ir para a festa.

— Claro.

Não pensava em Dani como quem usaria um vestido verde como aquele. Tinha sido um presente do meu aniversário de 18 anos para uma festinha que eu tinha tido. Ele era verde musgo com umas pedras espalhados, não era tão bonito como um vestido vermelho mula manca que ela havia provado.

Dani quis transitar no shopping comigo a tarde toda por entre lojas que eu devia ter entrado uma ou duas vezes desde que havia me mudado. André e eu não eramos pessoas que iam no shopping para ficar andando em lojas. O máximo que fazíamos era passar pelas vitrines e comentar sobre alguma peça de roupa ou outra, e após isso ir direto para o cinema ou para a praça de alimentação. Contudo, com Dani era totalmente o contrário, no momento em que passávamos na frente de uma loja, ela nos empurrava para dentro dela, observava as roupas, me fazia provar algumas, mas no final não comprava nada e me empurrava para outra. Ficamos fazendo isso a tarde toda, até que a hora da festa fosse se aproximando, e nós duas tivéssemos que ir para nossas respectivas casas.

— Você sente falta dele? — Perguntou sem olhar para mim.

Eu estava focada olhando a pista e a ultima coisa que eu esperava era uma pergunta como aquela. Para ser sincera, queria que as pessoas não falassem comigo sobre André, a única coisa que eu queria é que tudo o que tinha acontecido nos últimos dois anos tivesse sido apenas um sonho, e que na verdade nada realmente tivesse existido.

— Sim. — Respondi rapidamente locomovendo o carro por entre uma avenida que estava movimentada.

— Mas, tipo muito? — Agora eu sentia o olhar dela no meu rosto.

— Eu não sei. — Suspirei profundamente. — Sabe quando você está acostumada com uma pessoa todos os dias, e vocês tem uma sintonia ótima, vocês riem, tá tudo perfeito e de repente essa pessoa começa a se afastar, se manter meio longe… — Eu virei em uma rua, já conseguindo ver o meu prédio. — O problema é que eu sei que terminar tudo foi o melhor, porque chegou um tempo em que eu não conseguia mais ver o André ali, sabe? Não era mais ele, era só uma memória do que ele já tinha sido.

Dani não olhou para mim, ela desviou o olhar para a janela como se não soubesse do que eu estava falando. Claro que ela não sabia. Nunca tinha tido um relacionamento sério, o máximo que já havia tido eram alguns casinhos. Não achava que Dani alguma vez já tivesse ficado triste como eu estava por André, pelo menos ela nunca havia me contado.

— Acho que você vai superar isso rápido. — Ela sorriu para mim. — André é um idiota, e agora que ele está naquela republica ele está se achando muita coisa que ele não é. E terminar com você? — Ela parecia exasperada. — Ele não devia terminar com você, Charlie. André tem umas ideias muito malucas, você era a menina certa para ele.

— Sim, mas ele é uma pessoa totalmente diferente.

— Nem tanto. — Disse Dani, e eu assenti mesmo sem entender.

Entramos no meu apartamento normalmente, e eu nem me lembrei do fato do meu vizinho gato estar logo ali a frente, poderia ter comentado isso, mas minha cabeça estava lotada novamente com André a corroendo que nem lembrei. Dani ficaria louca quando descobrisse que Wade morava em minha frente, e ficaria muito brava quando descobrisse que eu não havia dito nada para ela.

— Está na porta do lado esquerdo do guarda-roupa, pendurada com um monte de vestidos. — Disse.

Joguei as sacolas em cima da mesa e olhei no relógio que havia na minha estante onde ficava meus livros e a televisão, ainda era cedo e faltava umas quatro horas para a festa começar, então daria tempo de assistir a um episódio da série antes de ir me arrumar.

— Você conseguiu achar? — Fui em direção ao meu quarto, e encontrei Dani totalmente a vontade com minhas roupas.

Ela não estava usando o vestido verde musgo, mas sim, um minivestido metalizado que eu havia usado em na festa de casamento da mãe e do padastro de André. Ele quem havia me ajudado a escolher o vestido, e tinha se tornado um dos meus vestidos favoritos. Dani havia me visto apenas uma vez com aquele vestido. Na festa de formatura da turma de jornalismo do ano passado.

— Eu posso pegar esse vestido emprestado? — Perguntou se olhando no espelho do guarda-roupa. O vestido simplesmente caia nela como uma luva.

— Com certeza. — Sorri sem graça para ela, mas não acho que ela notou.

— Bem, então é isso mesmo. — Ela pegou o vestido, e já se dirigiu para a porta. — Você vai passar para me buscar, certo? — Ela sorriu para mim.

— Claro, Dani.

— E você está bem mesmo, certo?

— Sim, Dani, pode ir, vai ficar tudo bem.

— Você é a melhor, Charlie. — Disse, e fechou a porta.

Andei lentamente até o sofá e me joguei lá. O controle da televisão estava muito longe, então tudo que eu fiz fora ficar deitada ali observando a televisão. Teve um momento que eu cheguei a acreditar que se eu me concentrasse muito eu conseguiria ligar a TV com a força do pensamento, mas desisti dessa hipótese depois de perceber que aquilo não aconteceria. Do mesmo jeito que eu percebi que meu relacionamento com André realmente tinha chegado ao fim.

Era realmente estranho não ter a presença dele mais, ele era algo rotineiro em minha vida, uma coisa incomum, já que eu sempre odiei rotinas, mas a presença dele ali era quase que sempre obrigatória. Eram muito difíceis as noites que André não ia para o meu apartamento, e se ele não ia, era por motivos de estudo. Provavelmente se ainda estivéssemos juntos ele estaria esparramado no sofá junto comigo, e nós estariam conversando sobre a festa. Era realmente muito estranho não ter mais a presença dele ali, e sim, somente um fantasma que a assombrava com memórias estupidas.

Me levantei sem querer sair do sofá, e me dirigi diretamente para o banheiro. Fiquei por ali por um longo tempo deixando que a água simplesmente amortecesse o meu corpo que estava rígido por conta de um coração quebrado.

Meu corpo se arrastou até o quarto e eu coloquei o vestido. Olhei meu cabelo e vi que ele estava totalmente um caos, e naquele instante eu não tinha muito animo para arrumá-lo, mesmo assim, eu o fiz. O pente deslizou por entre eles, enquanto eu pensava em como seria ver André depois de toda aquela semana sem sua presença. Esperava que ele se arrependesse do que ele tinha feito, mas sabia que nada naquilo iria realmente acontecer.

Deslizei até fora do apartamento e tranquei a porta. Meu corpo inteiro contudo foi compelido para o chão, onde eu fiquei agachada, até que eu sentisse que toda aquela dor fora embora. Era ridículo me sentir assim por causa de um garoto, mas na verdade não era tanto por causa do garoto. Era por causa das palavras falsas do garoto.


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