Silver escrita por Isabelle


Capítulo 39
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

"Eu te faria feliz, é só me deixar
Entrar nas gavetas do teu coração
Como um botão que se agarra na blusa
E abusa o ruído e protege do frio
Como a lã que me estende do osso
E em pescoço te faz cachecol
Eu seria o carinho em cada cantinho de cada lençol
Que é pra você se deitar, descansar comigo"
— Ana Larousse



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O cheiro de comida inebriou o ar, enquanto meus pulmões tentavam se deleitar ao máximo daquele odor para acalmar meus nervos. Meus olhos eram duas orbitas que não permaneciam focadas em somente um lugar, mas sim, observavam o ambiente com tanta fome quanto as pessoas que estavam sentadas a minha volta. Minhas mãos brincavam com o guardanapo de papel que já tinha se transformado em nada mais do que apenas pequenos pedaços de papel, que continuavam a ser quebrados ao meio para que simplesmente minha inquietude finalmente cessasse.

O garçom se aproximou de mim, e murmurou algumas palavras, mas eu nem ao menos escutei. Estava muito focada em todo o ambiente a minha volta para conseguir me focar em qualquer pessoa ou qualquer coisa. Meus ouvidos eram duas máquinas que se focavam em escutar apenas risadas, ou vozes que eu pudesse reconhecer, contudo, a única coisa que chegava em meus ouvidos eram as risadas e o sotaque forte francês que eu nunca em toda minha vida havia escutado. A minha volta apenas havia pessoas desconhecidas.

— Você está me assustando. — Gabi disse em um tom bem firme.

Meus olhos repousaram por cima dela levemente, e eu soltei um suspiro forte deixando com que todo aquele ar petrificado deixasse meus pulmões que pareciam prestes a estourar. Soltei os papeis por cima dos pratos em que o garçom havia arrumado, e ele me olhou com um ar assustado, mas logo em seguida foi embora sem dizer nem ao menos uma palavra.

Gabi me fitou com os olhos pesados e um tanto preocupados, e jogou o cabelo que estava preso mas continha algumas madeixas soltas para trás do pescoço. Sua respiração caiu como um suspiro leve, e ela pegou a bolsa que estava pendurada na cadeira, junto a seu casaco grosso e, por sinal, bem caro, e se levantou, deixando algum dinheiro sobre a mesa, enquanto ainda me fitava com uma certa impaciência que eu nem ao menos podia culpá-la, naqueles dias, eu havia sido totalmente um saco de tão avoada que eu havia me tornado.

— Charlie, você está bem? — A voz dela estava realmente soando preocupada.

— Sim, claro.

— Podemos ir? — Gabi deitou a cabeça um pouco para o lado.

Peguei a bolsa de crochê que também estava pendurada na cadeira, e olhei envolta mais uma vez, desta vez com os olhos mais focados no rosto das pessoas que estavam ali, contudo, mesmo assim, não conseguia matar aquela expectativa que rondava meu coração, mas com certeza a flor que estava ali começava a murchar depois de todos aqueles meses entrando naquele restaurante todas as sextas a procura de uma pessoa que parecia já ter desistido de mim a meses, e eu, ainda firme aquelas ilusões que deveriam ter sido soterradas e mortas em solo brasileiro.

— Charlie, você está esperando alguém?

— Não, vamos indo.

Coloquei a bolsa no ombro, e consegui escutar meus passos ecoando ao longo de que eu ia andando, e encontrando a porta. O vento frio de Paris encontrou meus cabelos e os fez voar, enquanto envolvi minhas mãos envolta de meus braços. Todos sempre haviam me falado muito bem sobre Paris, mas nunca haviam me informado em quanto seus invernos eram extremamente rigorosos, mesmo com todos os casacos que eu havia levado, nenhum deles havia me preparado para o frio e a falta que eu sentia do sol, e depois de quase três meses ali, eu realmente começava a sentir falta do Brasil.

— Então, os vinhedos…

— Os vinhedos? — Soltei uma risada. — Não deve existir nenhum vinhedo nessa época do ano, apenas mudas e sei lá, eu não entendo de vinhedos…

— Não, não existe, deveríamos ter ido em dezembro, contudo, você foi no museu do Louvre, mas também tem esse, eu não sei como é, nunca fui, mas uma amiga minha do trabalho disse que ele é ótimo. — Ela tremia, e eu conseguia ver seus olhos ansiando o carro que estava tão perto. — O Museu Orangie, achei que você ia gostar.

— Eu tenho certeza que sim. — Disse, entrando no carro. — É um museu famoso, Gabi.

— Sério? — Seu olhar não parecia muito convencido. — Mas, nem acredito que está indo embora daqui uma semana.

— É, Paris não me deixou muito confortável com toda essa escuridão.

Gabi trocou um olhar triste com o céu que mesmo em fevereiro continuava cinzento e sem cor, e soltou novamente um de seus suspiros de exasperação. Eu sabia tanto quanto ela, o quanto ela gostava do seu azul e vivo, do sol em seu rosto, e das ondas de ventos quando bate em seu corpo e te deixa totalmente revigorado. Porém, naqueles últimos meses havia sido quase impossível sair de sua pequena casa, e dirigir até Paris para que pudéssemos visitar as coisas. Havíamos conseguido nos estabelecer com alguns dias, mas a neve na maioria das vezes não nos deixava, e aquilo depois de algumas semanas havia realmente conseguido me aborrecer de uma forma que nada conseguiu. Quando tinha pensado em ir para Paris imaginava em me sentar em uma mesa e sentir a brisa com alguns garotos franceses para trocar olhares, contudo, aquele frio não fora nada do que eu realmente pensava que seria.

— Você tem falado com Wade? — Gabi disse com um tanto de receio.

Meu corpo simplesmente travou, meus olhos perderam o rumo, e eu comecei a me tornar inquieta naquele banco, com o cinto me prendendo ali. Não queria falar sobre Wade, de modo algum. Haviam se passado meses desde que havíamos nos visto pela última vez, e mesmo assim, mesmo com 3 meses sem tê-lo em presença na minha vida, ele ainda era algo bem concreto em meus pensamentos. Pensar em Wade era quase a mesma coisa que respirar. Era simples e fácil. Acontecia nos momentos que eu nem ao menos me dava conta. Sentada em um banco enfiando as botas rosas na neve, ao passar o dedo por cima da manchinha da minha pele, ao ver encarar uma árvore despida de suas folhas, ao tomar um sorvete de limão mesmo no clima pesado, ao ver um casal francês de mãos dadas nas ruas cobertas pela imensidão branca. Wade não saia de mim, de maneira alguma.

— Não recentemente. — Prendi as mãos na bolsa.

— Da última vez estavam trocando mensagens.

Queria que ela simplesmente parasse de falar sobre ele, contudo, ela não pararia. Sabia muito bem que Gabi não cessaria até descobrir o que realmente havia acontecido entre mim, e ele, e sinceramente, naquele momento, eu não estava nenhum pouco afim de conversar sobre o Wade e seu sumiço inesperado após alguns dias de trocas de mensagem. Não tentei me comunicar com ele após isso. Nem ao menos sabia como voltar a me comunicar com ele depois de tanto tempo.

— A gente só parou. — Havia ficado rouca.

Havia uma porta,

um tapete,

cheiro de álcool,

amor,

cheiro de amor,

e simplesmente

a gente só parou.

E simples como o último verso de uma poesia, esse era meu destino com Wade.

— Entendi. — Gabi mordeu o lábio, e passou uma mão nas madeixas de cabelo, olhando atentamente para as ruas. — Sente saudade dele?

Novamente, outra pergunta que eu não queria responder.

— Não quero falar sobre isso.

— Sabe, Charlie, não é feio sentir saudades e admitir, sentir saudades é algo lindo.

Soltei a mão da bolsa, e virei meu rosto até o dela que estava somente de perfil. Um sorriso estampou meus lábios, e eu coloquei o cabelo lentamente atrás da orelha, enquanto focava nela, ao mesmo tempo que conseguia ver o vago movimento de carros na rua.

— Existe uma frase, não sei se é da Clarisse Corrêa, ou da Andreia Costa, mas diz o seguinte.

— Lá vamos nós…

Limpei vagamente a garganta, e revirei os olhos.

— “A saudade é bonita só na poesia. Na vida real ela arde.”

— Profundo, mas você deveria ligar para ele. — Gabi virou em uma rua em que eu conseguia ao longe ver o jardim onde o museu ficava.

— E gastar deslocamento? — Bufei. — Foi ele quem parou de responder minhas mensagens, então claramente, ele não quer conversar, e se ele não quer conversar, eu simplesmente não vou mais atrás.

— Vocês são deprimentes.

Os olhos dela se reviraram, enquanto procuravam um bom estacionamento, o que não fora muito difícil de achar já que ninguém parecia muito no clima de visitar aquele museu em um dia como aquele, com um céu cinza todo desbotado, como minha relação com Wade.

Gabi estacionou o carro um tanto longe, sendo que a quadra se encontrava cheio de lugares para se estacionar. Brinquei com os nós do meu cabelo até com que o carro estivesse completamente parado, e preparei tanto meu psicológico, quanto minha parte física para enfrentar o vento gelado que me encontraria e riria enquanto batia suas rajadas em mim, e se aproveitava do meu pânico. Minhas mãos enluvadas encontraram a maçaneta do carro a abrindo. O vento não fora a primeira coisa que viera em meu encontro, mas sim, uma súbita saudade do sol quando meus olhos encontraram aquele céu opaco.

Gabi esperou até que minhas botas estivessem em contato com o chão, e fechou o carro, enrolando seu braço ao meu de uma maneira afetiva demais até mesmo para ela. Seu rosto se manteve firme e reto em todo o percurso até o museu, e ela parecia prestes a gritar a toda Paris que a odiava mortalmente, mesmo com suas cafeterias cheirosas, e seus belos pontos turísticos. Encolhi minha cabeça mais próxima a dela para que pudesse entender que eu a compreendia, e seus olhos se fecharam por alguns segundos em reconforto.

— Se chama Museu Orangerie porque aparentemente aqui ficavam as laranjeiras em 1852.

— Você pesquisou essas coisas antes de virmos? — Os lábios de Gabi tremiam pelo frio.

— É um dos museus que tem os quadros gigantes de Monet, como não conhece esse museu?

— Charlie, moda, eu faço moda, não conheço muito de artistas.

— Está morando na França.

— Sim, e não dentro de um museu. — Atravessamos a portaria. — Vivo metade do meu tempo dentro da minha humilde casa e a outra metade do tempo em uma sala com pessoas gritando que aquela não é a amostra de pano que eles queriam.

— Bem, ao menos você tem um emprego.

— Ao menos você não vai enlouquecer antes dos trinta. – Afirmou para mim, e não pude deixar de soltar uma leve risada.

Mantive meus olhos atentos as pinturas que estavam fixadas as paredes enquanto brincava com o panfleto entre meus dedos tão frouxos, ainda com Gabi presa em mim, mesmo que a temperatura tivesse se acalmado bastante ali dentro. Meus olhos dançaram por entre as salas, ao longo que meus pés me guiavam cada vez mais para dentro do museu que parecia ter conseguido alcançar o que quer que fosse responsável por cativar minha atenção. Meu coração transbordava com algo chamado emoção e eu simplesmente não queria tirar meus olhos de todas aquelas obras de arte, nem mesmo Gabi, que parecia tão fascinada quanto eu.

Meu corpo era levado além das salas, e meus olhos tracejavam as curvas que a parede fazia, encontrando de vez em quando algumas pessoas no meio do caminho. Uma cabeça em si fez com que seus olhos brincassem firmemente por ela. As madeixas loiras brilhavam em contraste com a luz clara que a sala exalava, o terno azul carmim caia por seu corpo como se tivesse sido mandado a fazer exatamente para sua estatura, e as mãos fixadas plenamente no panfleto revelavam um pouco para cima em seus pulsos um relógio bem familiar.

Tombei a cabeça para o lado e observei o homem que falava tão gentilmente com uma mulher de cabelos avermelhados. Ambos pareciam estar rindo, e assim estava meu coração naquele momento depois de tantos invernos que eu havia vivido ao longo de seis longos meses, além do inverno literal que havia tido de enfrentar naquele país.

Gabi soltou uma risada para mim, e eu finquei meus olhos nela que parecia já saber o que estava acontecendo ali. O homem e a mulher se viraram para mim, usando suas roupas chiques que não seriam reconhecidas se não fossem as feições tão claras, e abriram um sorriso. Gabi soltou-se de meu braço e me deixou ser envolvida por Jessie e por Alex, enquanto meu coração transbordava uma alegria que não poderia ser explicada nem em milhões de anos. Jessie murmurava algo que eu não conseguia entender em meu ouvido, enquanto Alex ficava repetindo que havia sentido muito a minha falta. Meus olhos se encheram de lágrimas da mais pura fonte originadas a partir de meu coração, e eu não conseguia me soltar de ambos.

O cheiro do perfume de Alex dançava pelo meu olfato, e Jessie se afastou um pouco, deixando com que eu quase entrasse dentro de Alex ao lhe abraçar sozinho. Meu rosto se prendeu em seu terno azul berrante, e as lágrimas começaram a ensopá-lo. Alex se afastou brevemente de mim, mantendo as mãos em meus ombros, e me fitou com os olhos claros e bravos. Um sorriso brotou por meus lábios e ele passou os dedos por minhas lágrimas que tinham diminuído.

— Eu senti tanto a sua falta, Charlie.

— Eu senti muito a sua falta também, Alex. – As lágrimas não deixavam com que as palavras saíssem direito de meus lábios.

Virei meu corpo para o lado, e fitei meus olhos em Jessie. Seu cabelo havia crescido mais do que eu podia imaginar em alguns meses, e ela estava linda esbanjando aquele batom vermelho em seus lábios. Suas mãos voltaram a me envolver e eu deixei com que meus dedos se prendessem firmes em suas costas, ao longo que eu mal conseguia me conter de tanta felicidade.

— Acho que é a minha vez. – Uma voz entrou em meus tímpanos tão penetrante, e Jessie me soltou.

Meu corpo rodou, e parou bem em frente a pessoa a quem pertencia aquela voz.

E ali estava ele.

Os olhos castanhos exatamente como eu me lembrava deles

O corte de cabelo que não fazia parte de sua combinação que eu conhecia, mas que tinha caído como uma luva.

Os lábios travados em um sorriso.

Meu coração travado em desespero.

Meu corpo tremeu até chegar a ele, e seus braços me envolveram com tanta paixão que eu não pude deixar de chorar mais do que eu já estava. Wade prendeu as mãos devorantes em mim, e eu deixei com que minha cabeça encaixasse perfeitamente na curva de seu pescoço, como sempre havia encaixado e seus beijos brincaram com minha cabeça, Minhas mãos passaram por seus cabelos que exalaram o seu cheiro familiar. Meus olhos se fecharam naquele lugar reconfortante que tinha o mesmo sentimento que casa, e meu coração ficou batendo numa batida compassiva, enquanto eu não me sentia mais naquele inverno frio e escuro de Paris, mas sim, em uma brisa em uma praia no Brasil. Se deixasse minha mente se esvaecer conseguia me fitar exatamente sentada numa duna, com os dedos firmes nos cabelos de Wade, enquanto minhas pernas rodeavam sua cintura de seu corpo que estava sentado ao observar o céu beijando o mar.

A sensação de calma que eu sentia ao ter ele ali, era tão reconfortante que eu havia me esquecido de todas as inseguranças que eu havia tido, responsáveis por eu me afastar tanto de todas aquelas pessoas, principalmente as inseguranças por conta de Wade que me abraçava naquele momento como se nunca houvesse tido nada.

Ficamos abraçados por o que pareceu uma longa eternidade. As pessoas entraram e saíram daquela sala, levando Alex, Jessie, e Gabi para outro cômodo, enquanto, Wade e eu ainda estávamos presos naquele momento, naquele reencontro, naquele abraço. Eu não havia tido a menor percepção do quanto a falta dele doía em mim até aquele momento em que meu coração ficou sobre o dele.

Meu coração batia na mesma sintonia que o dele.

O coração dele batia na mesma sintonia que o meu.

Éramos naquele momento, aquelas duas pessoas do começo.

As duas que não haviam se decepcionado uma com a outra, nem mesmo chorado uma pela outra. Eramos um momento.

— Não vai embora. — A voz dele soou suplicante. — Fica comigo.

Meu rosto se ergueu para o dele, e algumas mechas do meu cabelo ficaram em meus olhos. Os dedos de Wade dançaram por entre elas e as afastaram, enquanto tudo que meu corpo queria fazer era se afastar dele. Uma insegurança tão grande tomou o meu estômago, e eu deixei com que com alguns passos eu me afastasse dele.

— Wade…

—Não posso nem começar a dizer o quanto eu senti a sua falta, Charlie, não posso ficar sem você. Preciso de você. — Ele se aproximou. — Do seu corpo, do seu braço, do seu cabelo prateado. Preciso de você. Preciso desse coração cheio de amor.

— Wade…

Meus olhos estavam submersos em lágrimas dançando aos arredores de uma sala vazia com quadros maravilhosos que me observavam com atenção ao conversar com ele.

— Charlie, olha…

— Não podemos fazer isso aqui, tá? — Limpei meus olhos rapidamente. — Não agora, não aqui.

— Precisamos fazer isso, exatamente aqui, e exatamente agora, eu preciso que você entenda um monte de coisas.

— Não me ligou. — Minha voz impediu com que ele continuasse falando. — Não mandou mensagem, não me deu algum sinal da sua existência.

— Não podia. — Tombou a cabeça. — Precisava deixar você pensar e respirar pelos seus pulmões.

— E por que justo agora quis voltar pra minha vida desse jeito?

— Porque eu não consigo passar mais nenhum segundo dessa minha existem cia sem sentido nesse planeta sem você. — Sua voz saiu desesperada. — Se for para aturar esse mundo tem que ser com você.

— Então, por que você foi embora? — Eu gritei, as lágrimas ameaçavam cair, mas eu não as deixaria cair novamente. — Por que foi embora quando eu estava naquele hospital e não voltou?

— Porque eu estava machucado.

— Eu também estava, estava machucada com o coração danificado, e nem sei dizer o quanto você me magoou. Nem ao menos me explicou por quê. — Gritei, e me virei, com as veias em fogo puro.

Não queria ficar mais perto dele. Tinha viajado para outro continente para ficar bem longe dele, e não encontrá-lo em um museu maravilhoso francês onde estavam as obras mais lindas do mundo. Não. Não queria aquilo. Queria por meus pés em movimento para fora daquela sala oval que me recobria e recobria Wade. Precisava realmente me afastar dele e de qualquer efeito que ele causava em mim. Eu o amava fortemente, e entendia que meus sentimentos por ele eram muito fortes, mas não queria resolver aquilo ali. Não. Não ali. Queria sair dali. Escapar dele.

— Mulher do povo. — Gritou.

Meu corpo parou, e eu me virei, sem entender o que ele havia acabado de dizer.

— O que? — Disparei.

— Seu nome. — Os olhos castanhos me hipnotizaram. — Seu nome significa, mulher do povo ou a versão francesa de Carlota.

Mantive meus olhos presos a ele, sem saber o que responder, mas não tive tempo porque sua voz veio logo em seguida.

— Ela morreu. — O sorriso travou em seus lábios. — Em um acidente de carro, ou pelo menos os policiais dizem que o acidente a matou. Ninguém sabe, eles encontraram só o que sobraram do seu corpo, e levaram meses para identificar quem era a vítima por causa da onda de assassinato que estava havendo, cada vez pior, chegaram a encontrar cemitérios de corpos com muitos corpos, e o serviço policial estava ficando muito mais pesado, e difícil de conseguir desvendar as vítimas, mas você por algum motivo facilitou tudo quando sofreu aquele acidente de carro, pois um dos policiais que veio ao seu encontro viu a ficha com seu nome. Charlote Fontes. O mesmo sobrenome que Lorena, para falar o dela é Lorena Alvez Fontes, mas o Fontes os fez ligar a minha declaração sobre o acidente dela, com o seu sobrenome.

O meu maxilar trincou, mal conseguia respirar, meus olhos estavam queimando com lágrimas.

— Wade, pare, por favor…

— Então, enquanto eu estava no hospital dormindo ao seu lado, o meu telefone tocou, um policial do outro lado da linha disse que tinham a encontrado, eu só escutei isso, qualquer coisa que ele pudesse ter me dito depois passou batido, porque um êxtase entrou dentro de mim. Pensei no mesmo momento que era ela, que era Lorena que havia voltado para mim. Que ela estaria viva e que tinha voltado para mim, e me senti tão culpado, porque eu também a amava, amava muito, mas eu também te amava, me senti horrível por ter conseguido superar seu desaparecimento e colocado você na minha vida, mas naquele momento, eu nem ao menos me preocupei, só queria chegar na delegacia, e sentir seu cheiro, abraçá-la, e dizer que ficaria tudo bem, mas quando eu cheguei lá… — Ambos estávamos chorando, imersos em lágrimas. — Eles não tinham nem ao menos o seu corpo para me mostrar. Ela já não era mais do que apenas um saco de ossos.

As lágrimas queimavam em meus olhos, enquanto minhas mãos prendiam meus braços.

— A mulher que eu amava tinha realmente morrido, ela tinha se desfeito, tinha deixado esse mundo por conta de um psicopata que achou engraçado ou sei lá o que fazer isso com pessoas inocentes, e ali estava eu, apaixonado por outra. E ali ela estava realmente morte, não desaparecida ao mundo, eu tive provas que ela estava morta, e eu não consegui lidar, Charlie. Não consegui nem ao menos saber como eu olharia para seu rosto, porque ao mesmo tempo que uma ânsia tinha preenchido meu estômago ao saber que ela realmente tinha partido dessa, eu também fiquei aliviado por saber que ela não estava viva, porque assim eu poderia ficar com você. Desse jeito eu poderia ficar sem você, sem precisar ter medo de estar sentindo aquele amor. Foi quando a ficha caiu que ela estava morta, e eu estava sentindo um toque alívio por isso, e eu me senti um monstro, me senti tão horrível, que não quis mais te ver. Não queria te ver de modo algum. Não queria saber que de alguma forma você tinha conseguido roubar aquele amor que era totalmente dela, para você.

Meus lábios tremiam enquanto meus olhos rompiam em lágrimas, e as mãos pareciam não ter mais estabilidade.

— Me desculpe por não ter lhe contado isso, mas eu não conseguia, eu só…

— Não. — Disse baixinho, e ele parou de falar.

Aquilo fazia um grande pedaço que não tinha sido colorido simplesmente se encaixar. Eramos como aqueles quadros ali, o sentido leste representava o amanhecer, o sol nascendo, o sentido oeste representava o entardecer, onde o sol se punha, e deixava de nos iluminar, deixava de me iluminar como fazia muito tempo que eu não sentia, contudo, na minha história com Wade, um pedaço daquele entardecer havia simplesmente ficado em branco, e agora uma grande parte estava simplesmente se encaixando nas lacunas vagas de minha mente, me deixando ainda mais perdida do que eu estava no começo.

Meus pés caminharam até o outro lado onde havia um grande banco oval. Repousei meu corpo naquele pequeno espaço e fiquei olhando para o quadro de Monet. Eu estava sentada bem em frente a sua obra que retratava um amanhecer, naquele momento queria racionalizar a tudo aquilo que Wade havia simplesmente havia me dito, e me prender aquela obra que representava o amanhecer, um novo dia, novas oportunidades. Eu precisava daquele amanhecer, de uma nova perspectiva, principalmente para saber o que eu faria com Wade, ou com aquele amor naquele meu peito.

A mão fria dele repousou em meu ombro, e eu continuei parada e imóvel apenas encarando aquele quadro. Seu corpo agachou em frente ao meu, tão calmo, e sereno, tão cheio de amor. Os olhos castanhos encararam os meus preocupados, e eu apenas deixei um sorriso brotar em meus lábios ao mesmo tempo que as lágrimas desciam. Meu Deus, como eu o amava, era tão simples, era como respirar. Tinha lutado tanto tempo para não aceitar aquele amor dentro de mim, para lutar com a rejeição que eu havia levado que mal havia percebido que ele era mais forte do que eu. Pensei que seria tão facil como fora esquecer André, mas não fora nada igual. Não queria comparar o amor que eu havia sentido com um e com o outro, mas algo em mim berrava para que Wade quisesse permanecer comigo, diferentemente com André. A dor de sua ausência havia me atingido, mas era questão de tempo até que tudo estivesse desbotado. Por tempos queria que aquele amor por Wade tivesse desbotado como o céu de Paris no inverno, mas ele não diminuía, apenas aumentava e me quebrava por dentro.

Abaixei a cabeça, para impedir que Wade visse as lágrimas, e ele segurou meu rosto entre suas mãos firmes e pesadas.

— Ei… — Wade deitou a cabeça em frente a minha.

Minhas mãos foram até seu rosto, e passaram levemente por suas bochechas nuas, despidas da barba tão costumeira. Meus lábios se esticaram em um sorriso sem dentes, e eu pisquei várias vezes para que parasse de chorar.

— Eu amo você. — Lágrimas densas percorreram minha bochecha e encontraram meus lábios.

Os lábios dele se prensaram um contra o outro, mas as lágrimas desceram por seu rosto da mesma forma. Seu lábio tateou minha testa rapidamente, e eu ergui os olhos para cima para encontrar os dele que me esperavam. Esperavam com que eu lhe desse permissão para voltar a me amar, para voltar para as gavetas do meu coração de uma forma que eu sempre devia ter permitido, e não simplesmente barrado.

Nos seus olhos eu conseguia ver o reflexo do arrependimento.

Nos meus olhos eu esperava que ele conseguisse ver o perdão.

— Não vai me deixar, novamente, não é mesmo? 

— Nem se me obrigar. 

Ergui minha mão, e trouxe seus lábios até os meus. Devagar eles tatearam e alcançaram não meus lábios, mas minha alma. Seu corpo se sentou no banco ao meu lado, sem se separar de mim, em momento algum. Minha mãos brincavam com seus cabelos, e suas mãos brincavam com meu coração, mas não de uma forma desleixada, mas sim com precisão, e medo de deixar com que qualquer coisa acontecesse com ele.

Nos separamos, e enlaçamos as mãos uma nas outras.

Os olhos ficaram fitando o quadro.

Os corações batiam levemente.

As respirações estavam normais.

Os lábios focados retamente, no futuro, junto a nossas mentes, mas nada de esquecer o presente.

— E agora? — Os olhos dele tatearam o quadro. — O que a gente faz?

— A gente vai amar. — Virei meu rosto para o dele.

Um sorriso beijou seus lábios, e ele prendeu a mão na minha nuca, aproximando meu rosto até ele, onde um beijo dos seus lábios tão doces encontraram minha testa. Uma lágrima fina desceu pelo meu rosto, mas eu não estava com medo, daquela vez, eu estava completamente imersa as vontades de mim, e nada tiraria aquele sentimento de poder de dentro da minha alma.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente, mil desculpas pela longa demora que eu coloquei todos vocês, eu simplesmente entrei numa onda totalmente deprimente e sem inspiração alguma.
Segundo, muito muito obrigada mesmo a todos vocês que acompanharam a historia, obrigada por lerem ♥