Silver escrita por Isabelle


Capítulo 38
Capítulo 37 – Wade


Notas iniciais do capítulo

"A gente fica mordido, não fica?
Dente, lábio, teu jeito de olhar
Me lembro do beijo em teu pescoço
Do meu toque grosso, com medo de te transpassar"
— Liniker



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O céu tinha ido ao nosso favor iluminando a si mesmo com cada estrela possível para que nossos olhos pudessem ir ao seu encontro e nos deleitarmos. Charlie deitou a cabeça em seus braços na porta do carro deixando com que o vento frio batesse diretamente em seu rosto e fizessem com seus cabelos não fossem nada mais além de um lindo borrão prateado. Os olhos verdes eram admiradores na imensidão brilhante, enquanto a luz da rua beijava o caminho por qual meus olhos planavam sabendo exatamente onde seguir, contudo, sem saber exatamente como prosseguir ao pensar que em poucas Charlie estaria dentro de um avião indo para bem longe de mim. Eu realmente queria apenas bloquear aqueles pensamentos de minha mente.

Charlie descruzou os braços, e se sentou ereta no banco cruzando as pernas no banco. A sua respiração estava tão estável, e seu peito tão sereno que eu não sabia nem o que falar; mal parecia que eu estava bem ali ao seu lado sentado a levando para seja lá onde, por algum motivo. Ela havia vestido uma armadura para se proteger de mim aquela noite, e eu não sabia como fazer para retirá-la, nem mesmo sabia que conseguiria. Aquela mulher era um posso profundo de sentimentos dos quais eu havia obrigado a me tirarem antes mesmo que me deixasse afogar, infelizmente, naquele momento, o que eu mais queria era me afogar em sua imensidão.

Suas mãos se esticaram no ar, mas quase ao mesmo tempo se fecharam estralando. O dedo continha um anel que eu nunca havia realmente percebido, ela poderia ter ganhado recentemente, mas não saberia dizer. Nem ao menos tinha coragem de perguntar, o nó na minha garganta estava atado, seria necessário muito mais do que um percurso juntos no carro para conseguir desatá-lo. A mão continuou seguindo em frente reabrindo e pressionando seu dedo no som, o ligando.

Por algum motivo, a música que tocou em seguida era da banda Todos os Caetanos do Mundo, deixando o carro com uma tensão ainda maior da que planava anteriormente. Charlie focou o olhar reto por um tempo, mas em alguns segundos de música, ela trincou o maxilar e virou o rosto para o lado cruzando as mãos em cima do colo, e me impedindo de olhar diretamente para seu rosto. Senti um aperto em meu coração, e retirei a mão do volante rapidamente, para trocar a música.

— Não, por favor. — Disse, quase como um sussurro.

Olhei para ela, e soltei um suspiro gigante, virando em uma curva acentuada para sair da cidade. Ela nem ao menos se moveu, ou me fuzilou por fazer aquilo. Seu olhar ainda se manteve preso a janela enquanto o vento brincava com os cabelos, e suas mãos continuavam cruzadas em cima de seu colo com apenas os dedões brincando entre si.

— Você está bem? — Tentei controlar a minha voz para parecer mais estável do que ela estava.

— Sim, eu estou. — Olhos ainda focado longes.

— Charlie, de verdade…

— O que?

Os olhos dela vieram até meu rosto, e os queimaram com seu calor. Tentei manter os olhos na estrada o mais calmo possível, mas não achava que seria possível. Queria olhar para seu rosto, queria aqueles olhos fitando os meus, e estava cansado de todo aquele drama, realmente ele já tinha me enchido o tanto que fosse, eu não iria aguentar deixar que ela fosse para meio lado do mundo magoada comigo daquela forma, contudo, sabia de uma coisa muito importante. Eu não podia contar para ela sobre Lorena. Não ainda. Não naquele carro, no meio daquela pista escura com apenas o céu repleto de estrelas como expectador. Não mesmo. Estaria quase que a forçando ficar ali comigo se contasse, seria impossível ela querer ir para a França se eu contasse, e infelizmente, por mais que eu quisesse que ela ficasse, não poderia. Ela deveria ir. Deveria respirar por seus próprios pulmões, bem longe de mim.

Parei o carro na mesma vaga de quando havia ido viajar e me impressionei com estar disponível. Olhei para Charlie rapidamente, mas quando me concentrei nela, já havia aberto a porta, e estava quase na metade do caminho para entrar. Meu coração pesou um pouco com aquela sua atitude, mas tentei apenas relevar e pensar que ela estava com muita pressa, e não que ela havia me convidado para aquilo e agora estava totalmente desistindo.

Suspirei e abri a porta, caminhando em passos firmes, mas também confiantes, e fitei os olhos de Charlie que pareciam querer me exterminar por conta de minha lentidão. Soltei um sorriso de canto de lábio que a deixou de bochechas vermelhas, mas com olhos revirantes, seus passos foram firmes e prosseguistes, enquanto uma mão minha se fincou em seu ombro, e todo seu corpo petrificou por um segundo, conseguindo se mover normalmente após isso.

Cristina veio nos receber usando um turbante na cabeça, e uma saia rodada que chegava até o chão. Os seus olhos se encheram de graça e amor ao ver Charlie em meu acompanhamento, e eu tentei não dar lhe muita esperança em meus olhos, mas ela nem ao menos o viu. Seus olhos estavam muito focado no nosso semblante, como se tudo a nossa volta brilhasse de uma forma tão maravilhosa que se você perder o brilho, nunca mais encontrara um igual.

— Fico feliz em ver ambos aqui.

— Também ficamos felizes em ver a senhora. — Charlie disse antes de mim. — Vamos na sala, tem algum problema?

— Não, nenhum, minha pequena. — Cristina deu um golpe de amor para Charlie que corou, e assentiu.

A mão de Charlie veio em encontro a minha, e eu tentei não criar muita expectativa após aquele gesto, mas era quase como pedir para uma criança não ficar empolgada após assistir seu desenho favorito. Meu coração simplesmente tinha colocado um sorriso em si, e saído desfilando se exibindo para todos os outros órgãos, enquanto eles o avisavam para ter cuidado, contudo, ele nem ao menos estava preocupado.

Charlie se sentou no mesmo canto que eu me sentei quando havia tido minha conversa com Cristina, e eu me sentei ao seu lado. Sua respiração estava tão estável que parecia estar dormindo ao meu lado, e não prestes a embarcar em um avião daqui algumas horas.

— Você vê aquela ali? — Sua mão se ergueu lentamente, junto com a luz da lanterna.

Os olhos dele não brilha mais quando olha pra mim, mamãe.” -L.G

— Eu estava aqui no dia que ela escreveu, não sei porque não apagaram, ou se ela reescreveu. — Haviam lágrimas em seus olhos. — Achei que era sobre, eu não sei, algum garoto que não olhava mais para ela, mas então, ouvi alguém murmurar que era sobre seu pai.

— O que? — Tentei encaixar todas as peças, mas ainda não fazia muito sentido.

— Eles escutam ela gritar quando ele está em casa. — Charlie finalizou. — Todos os dias aparentemente ela grita, esperneia, uma vizinha até mesmo já tentou chamar a polícia, mas ela não tem coragem de dizer o que acontece lá dentro de verdade, sabe? Ela é mais uma vítima desse mundo, Wade, e eu…

Os olhos estavam prestes a desabar de tantas lágrimas, e eu apenas pude a envolver com meus braços e deixar que ela escondesse aquele rosto no meu casaco, enquanto eu conseguia sentir as lágrimas pingando em minha camiseta, e meus braços dançavam por suas costas em uma maneira de a consolar.

— Me desculpe. — Ela murmurou.

— Ei, nada de me desculpe.

Levantei o braço com a lanterna e iluminei procurando algumas frases, e sorri ao ver uma em especifico.

— Cortei o cabelo ontem. — Comecei. — Meus amigos da escola debocharam de mim, mas mamãe disse para não ligar para eles pois eles tem inveja dos cachinhos iguais a concha de um caracol. Ela desenhou um caracol ao lado. — Dei uma risada.

Charlie levantou os olhos para ver a escrita com alguns erros ortográficos, mas tão sincera, e também sorriu. Sua mão correu até seus olhos que ela limpou rapidamente, e depois até sua lanterna, voltando a apontá-la para a parede e encontrando mais uma frase.

O cheiro da grama não me agrada como agrada tantas pessoas.” -K.M

Meu namorado terminou comigo, e eu fiquei feliz por isso. Eu sou uma péssima pessoa?” -F.G

Os lábios dele já não envolvem mas meus nós dos dedos. Seus lábios estão gelados agora embaixo da terra, junto com meu coração.” - Louisa.

Eu ainda fico escutando sua mensagem na caixa de mensagem para poder ouvir sua voz.” -J.G

O norte se lembra” - Arya Stark

Charlie e eu rimos desta última juntos sabendo que era uma referencia de Game of Thrones, mas não falamos nada. Todo aquele tempo apenas ficamos sentados naquele espaço, com os corpos juntos, respiração rápida, nos movendo fracamente, e nos tocando levemente de forma impercebível para que conseguíssemos sentir aquele vibrar em nossos corações, enquanto brincávamos com as lanternas apontando para lugares distintos a ponto de encontrarmos as frases tão cheias de poesia numa forma tão simples de ser. Não precisa ser complicado. Não haviam paradigmas a serem quebrados, ou todo um ato de passar horas e horas pensando, era simples. Simples e prático, além de ser lindo de uma forma tão clara.

— Tudo bem, vamos fazer assim. — Murmurei para Charlie.

— Como?

— Vamos fechar os olhos, e apontar a lanterna para qualquer lugar com os olhos fechados, depois abrimos os olhos e lemos a frase.

— O.k — Ela disse com excitação nos olhos.

Ambos prendemos as nossas mãos juntas com mais força e deixei um sorriso estampar meus lábios ao fechar os olhos. Rodei minha lanterna na mão com uma força regulada e fiquei a rodando com sua luz iluminando a parede. Meus olhos eram guiados pela escuridão plena e total, e quando uma luz os invadiu, mesmo que fechados, uma tontura breve me rodeou, como quando você está quase dormindo e alguém e ascende a luz de seu quarto brutalmente fazendo com que você rapidamente abra seus olhos.

Charlie e eu trocamos um olhar um com o outro e após isso olhamos para a parede onde uma frase estava escrita bem próxima ao rodapé, e mais forte que todas as outras, enquanto ainda havia um circulo de tinta vermelha feito ao seu redor.

O amor não é algo do qual nos abramos a mão tão fácil. Não abra mão do seu sorvete de limão.” -Cristina.

Um sopro de ar bateu em ambos, e nós olhamos rapidamente para a porta, antes que a luz se apagasse de uma vez. Charlie e eu não sabíamos nem ao menos respirar naquele momento. Era como se de uma hora para outra tivessem retirado nossos pulmões para conhecer o mundo de fora, e só depois de um tour bem-feito eles fossem voltar para dentro. Meus olhos recaíram pelo rosto de Charlie que já estava fazendo isso sobre o meu. Seus lábios tremiam com a minha proximidade, e eu tentei não entender aquilo de forma errada, contudo, naquele momento, não achava que tinha como entender aquilo de alguma forma errada.

Minhas mãos tremeram até o percurso de seu rosto, e ela continuou intacta no mesmo lugar. Meu polegar encontrou sua boca e deslizou lentamente sobre ela como meus lábios costumavam a fazer. Aquilo naquele momento pareceu ter sido há anos, e não apenas alguns meses. Charlie trouxe seu rosto um pouco mais para perto, e eu tentei não desmaiar ao levar o meu também. As mãos pequenas com as unhas pintadas de vermelho envolveram meu rosto, e brincaram com as mechas do meu cabelo que enquadravam meus olhos, ao mesmo tempo que meu dedo ainda brincavam com seus lábios. As mãos percorreram a extensão da minha têmpora, passando por meus cabelos, e parando como último ponto em minha nuca.

Ela piscou lentamente.

Eu pisquei lentamente.

Seus olhos desceram até suas mãos cruzadas e voltaram para mim.

Meus olhos desceram até suas mãos cruzadas e voltaram para ela.

Ela tomou um gole de respiração profundo.

Eu apenas não me movi.

O coração dela começou a ecoar alto.

Meu coração começou a ecoar junto ao dela.

E de repente, os lábios dela estavam presos aos meus.

Estávamos incendiando, eu podia afirmar isso, precisávamos sair dali o mais rápido possível pois em segundos tinha a completa certeza que colocaríamos fogo em toda aquela sala, e destruiríamos o trabalho daquelas pessoas que faziam aquilo com todo o coração, mas quando abri meus olhos rapidamente para deslizar o rosto para o lado, estávamos iguais a dois minutos antes, contudo, algo dentro de mim estava tão quente que eu poderia afirmar que estava pegando fogo, totalmente, desesperadamente, incontrolavelmente, naquele momento eu estava pegando fogo por ela, e eu gostava disso.

Meus lábios dançavam sobre os delas e as nossas mãos permaneciam intactas no mesmo lugar, eu não sabia sobre ela, mas tinha medo que o menor movimento pudesse fazer com que ela se afastasse de mim, e fizesse como na noite em que a beijei no elevador. Sabia que tinha sido um completo idiota aquela noite, mas naquele momento eu estava entregue a ela. Naquele momento eu era dela, e Charlie era minha, e quem ousasse se opor a isso teria seriamente que lidar comigo e com as forças dos Deus que eu tinha certeza estar a favor daquele momento.

O rosto dela foi para trás rapidamente, e eu senti um medo me invadindo de uma forma que eu, novamente, fiquei sem respirar, até o momento em que ela estampou um sorriso naqueles dentes que tinham a leve separação nos dois da frente.

— Vamos sair daqui?

Suas intenções ficaram bem claras naquela frase, eu apenas assenti com a cabeça.

Charlie tomou o volante naquele percurso, seus braços ficavam firmes na direção, enquanto ela apenas nos levava para fora da cidade, enquanto eu não entendia o porque ela apenas não nos levava de volta para o apartamento. Seus braços giraram no voltante fracamente ao entrar em um tipo de estrada de terra que me pareceu um tanto duvidoso, mas ela apenas estacionou ali, e deixou com que meu coração ficasse pesado dentro de meu peito.

Um frio tremendo invadiu todo meu corpo e eu queria poder mover meus rosto para me livrar daqueles olhos mortais, contudo, por algum motivo eu não queria, e nem precisava. Me sentia um tanto desconfortável, mas, ao mesmo tempo, deles vinha uma sensação tão calma, tão calorosa, que da mesma forma que ela conseguia fazer um frio gelado se dissipar por minhas veias e encontrar meu corpo, aquele frio não encontrava meu coração, nele apenas havia um sentimento bom, alto quente e confortável, então, eu não me movi. Deixei meus olhos serem engolidos inteiros pelos olhos dela.

Charlie encontrou meus lábios com uma avidez que me deixou um pouco desnorteado, e até mesmo fez com que meu corpo travasse de uma vez, mas quando finalmente assimilou o que estava acontecendo, ele apenas relaxou, e deixou com que minhas mãos dançassem até sua cintura, e a trouxesse para cima de mim, enquanto seus lábios eram ávidos em tentar me preencher com toda aquele amor e dor que ela estava sentindo. Suas mãos correram pelo meu cabelo e a sua proximidade fazia com que meu corpo todo esquecesse o frio que ele havia sentindo minutos antes, e fizesse com que ambos estivéssemos em chamas, como sempre estivássemos em momento como aquele. Éramos somente um naquele momento, como tinhamos sido tantas vezes, e por algum motivo aquilo me doeu. Não queria que ela fizesse aquilo e se sentisse magoada por se lembrar de toda a dor que eu a havia causado. Queria que ela estivesse sem toda aquela angustia, que seu coração estivesse puro e renovado, e muito menos que ela estivesse indo para o outro lado do mundo.

Separei meu rosto do seu por alguns segundos e deixei com aqueles olhos brincassem com os meus novamente. Eles estavam límpidos, sem nenhuma dor, ou rancor dentro deles. Era só dois olhos esperando para que eu lhes dissesse o que havia acontecido. Abri a boca para deixar com que as palavras saíssem de meus lábios, mas a mão de Charlie veio ao encontro de meus lábios, os selando. Sua mãos saiu e deu espaço novamente a seus lábios que apenas dançaram sobre os meus, causando um arrepio tremendo pelo meu corpo. Tateei suas costas com as mãos e a trouxe mais perto, enquanto sua mão brincava com a minha têmpora até encontrar meu queixo.

— Não quero pensar no que estamos fazendo aqui. — Um sussurro saiu tão doce quanto algodão-doce de seus lábios. — Não quero me lembrar que amanhã não estarei mais em frente ao seu apartamento, nem toda aquela baboseira que aconteceu entre nós, Wade. Alex há muito tempo me disse uma coisa que eu nunca realmente levei a sério. — Os olhos dela rodaram pelo carro. — Me disse que você devia ter uma explicação gigante para toda aquela merda, mas naqueles momentos, a única coisa que eu queria era estar brava com você por ter me feito sofrer, e eu nem ao menos pensei que você pudesse estar sofrendo. Eu não consegui te perdoar totalmente, Wade, mas nesse momento não quero pensar naquilo. Eu quero pensar em você, em nós. Eu quero você, como eu sempre quis, não quero conversar sobre nada, Wade, quero que você me ame, como você sempre me amou.

Meu coração pesou de um forma tão grande que eu não soube nem como responder. Meus olhos tinham sido inundados por lágrimas que eu não derramaria, a mesma coisa com os dela. Seus dentes prenderam os lábios de baixo para impedir com que elas descessem, mas meus lábios o roubaram deles, deixando com que toda a dor, todos os sentimentos, todo o amor que eu sentia por aquela garota fosse liberado em um único beijo. Não queria pensar como ela havia dito em tudo que me havia acontecido. Naquele exato momento eramos só nós dois em um carro em uma estrada de terra sem um futuro certo. Não precisávamos de um futuro certo, enquanto soubéssemos que tínhamos aquele momento, porque mesmo por alguns minutos, todo o amor que ela derramava sobre mim, fazia valer a pena.

Seus dedos frios dançaram até a barra da minha camiseta que em menos de segundo estava jogada no banco de trás. Seus lábios, tão gentis, tão doces, tão amorosos, preencheram toda a extensão do meu peito com aquela força que ela conseguia derramar. Os dedos tão frios e gelados, em menos de minutos estavam quentes, e a blusa tão justa em seu corpo não tinha mais espaço naquele corpo, parecia incerto estar com aquelas roupas perto dela, era como ter uma barreira me impedindo de demonstrar tudo que eu sentia por ela, e eu não queria, não queria barreiras, porque Deus sabe que já havíamos tido muitas barreiras ao longo de meses, e em momento algum, eu deixaria que barreiras crescessem.

O banco foi inclinado ao máximo que ele conseguiu, e um sorriso brincou nos lábios dela quando sua cabeça bateu de leve no teto. Seu corpo nu novamente em minha frente fora quase como acordar meses depois de um coma quando seu corpo finalmente retomou uma iniciativa para viver e deixar com que o seu coração voltasse a bombear não um sangue fraco e sem vida, mas sim, um novo tipo de sangue, que incentiva uma coisa dentro de si, que por mais que as outras pessoas tentem desvendar ou estudar o que está acontecendo, elas nunca vão entender. Infelizmente, elas nunca serão capazes de ver a borboletas alegres brincando no jardim que acabou de renascer.

Seus lábios descolaram dos meus poucas vezes no processo, a mesma coisa sobre seus olhos, eles estavam a todo momento grudado nos meus. Era como se ela estivesse retomando o tempo que ela perdeu por minha conta, e por causa disso, precisava me redimir, então a momento algum ousei mudar meus olhos de lugar. Eles eram dela, como sempre foram, como meu corpo todo, como meu coração. Seu corpo jogava algum tipo de jogo com o meu, fazendo com que minha respiração ficasse instável, ao mesmo tempo que arrepios riam da minha pele.

Meus dedos sentiam toda extensão de suas costas, e eu pedia aos deuses em silencio para que nenhum deles fizesse aquele momento acabar. Não queria a estranheza nos olhos de Charlie, nem mesmo suas palavras vagas. Queria aquele turbilhão de sentimentos que ela estavam, sem nenhum pudor jogando em mim, enquanto eu nem sabia como reagir. Queria aquela forma de amor, ela exatamente daquela forma em cima de mim enquanto aquele cubículo era nosso expectador, era pedir demais por aquilo? Eu não queria nada menos do que seu amor de volta.

Seu corpo caiu ao banco ao lado minutos depois, enquanto sua respiração parecia não caber em seus pulmões, e a minha a mesma coisa. Suas mãos correram até o branco de trás procurando por suas roupas, mas eu fui relutante até o último momento, deixando com que ela risse alto para qualquer um que passasse por ali pudesse escutar, fazia muito tempo que não escutava aquela risada sendo redirecionada a mim, queria fazer ela durar o quanto pudesse.

Charlie soltou um suspiro, e abaixou a cabeça com um sorriso nos lábios. Suas mãos tatearam a maçaneta até que ela conseguisse encontrá-la e sair do carro. Meus olhos ficaram a observando enquanto ela andava, e seu ponto final fora no porta-malas, onde ela ficou encostada observando o céu. Meu peito doeu um pouco com medo de que eu tivesse feito algo de errado, então, abri a porta do carro, e sai devagar, tentando não a assustar, procurando os meus bolsos da calça para encaixar a mão. Um vento gelado nos encontrava, enquanto Charlie tinha os braços envolta de si mesma, e os olhos adentrando aquela imensidão

— O que você me disse está brincando em minha cabeça agora. — Encostei as costas na superfície gelada.

Charlie não disse nada, apenas mordeu o lábio em retribuição.

— Fiquei meses tentando culpar tudo, culpar outra pessoa, culpar a vida, e o destino, o universo, enquanto eu sou o verdadeiro culpado.

— Wade…

— Não quero que você vá para a França desse jeito, que volte e ainda tenha essa estranheza entre nós, mesmo depois que… — Fiz um gesto soltando os ombros derrotados— Não mesmo, Charlie, não vou aguentar se ficarmos assim desse modo. Ainda mais porque sei que isso tudo é culpa minha.

Seu olhar caia por cima de mim como se não soubesse muito bem como deveria responder aquilo.

— Você lembra de quando nos encontramos no elevador dias depois de você ter me arrastado até seu apartamento bêbado? — Sorri, me lembrando tão vividamente.

— Parecíamos dois idiotas. — Uma risada fraca saiu de seus lábios, e por alguns instantes me senti vitorioso. — Mas não nos conhecíamos.

— Parece que não nos conhecemos agora, sabe? Ficamos nos evitamos, e as vezes nem conversamos, e eu não quero, quero que toda essa coisa desapareça, e só sobre os sentimentos bons. Não quero…

— Eu sei, eu também, não quero, não quero essa coisa.— Ela soltou alguma forma de grito. — O que a gente fez? Por quê? Por que, Wade?

Fora a primeira vez que ela realmente perguntara aquilo para mim. A primeira vez que seus olhos se encheram de ódio e trocaram um olhar com o meu me indagando o porquê de eu ter simplesmente acabado com o nosso amor, e por mais que naquele momento algo se prendesse dentro de mim e gritasse para contar, eu nem ao menos saberia como, e sabia as consequências de contar aquilo para ela naquele momento.

— Charlie...

— Não, eu não quero ouvir isso, nem essa sua voz melancólica, meu Deus, eu nem sei porque você foi tocar nesse assunto, eu não quero saber se você simplesmente parou de me amar, ou se sei lá, eu não quero, eu quero que aqui agora, nós dois, isso é sobre nós, eu te dou o tempo que for para me contar, só…

— Nunca deixei de te amar. — Minha voz saiu tão forte.

Seus olhos quase pularam das orbitas ao escutar a parte onde eu disse que ainda era apaixonado por ela, e um brilho que pareciam não se passar apenas de lágrimas dançaram por seus olhos. Mordeu os lábios fielmente, andando para o lado, a ponto de criar espaço entre nós, e deixou com que meu olhar tentasse a reconfortar, contudo, quanto mais ela me fitava com mais medo ela parecia estar.

— Nunca, Charlie, é esse o exato porque eu me afastei de você.

Sua boca se abriu para falar algo, mas ela simplesmente engoliu tudo e ficou me fitando procurando as palavras certas para me dizer, porém, naquele momento, tanto eu, quanto ela sabíamos que não existia a coisa certa a se dizer, simplesmente lidar com aquilo, pois aquela era a vida, aquele era nosso destino, e temos que lidar com isso.

— Você quer ir tomar um café? — Ela deu a resposta enfim.

Abri um sorriso, e esfreguei a nuca.

— Claro. — Suspirei a palavra.

Resolvemos que seria melhor tomar o café de vez no aeroporto para não fazer como havíamos feito aquela vez comigo, e ela pegar o voo atrasada, então, fizemos todo o processo que tínhamos que fazer, despachamos sua bagagem, arrumamos tudo para que ela apenas precisasse entrar no portão de embarque, e por aquilo demorou muito mais do que pensávamos que iria. Algumas pessoas de seu voo pareciam não estar gratas com algumas coisas, então toda vez que Charlie pensava estar próximo de chegar em sua vez, o próximo na fila reclamava ainda mais que o anterior, e seus olhares para mim estavam de alguma forma se tornando cada vez mais impacientes.

Após todo o processo exaustivo, conseguimos apenas sentar em uma cafeteria no canto onde não haviam muitas pessoas transitando para todo o lado ou pessoas que Charlie reconhecesse da fila e quisesse esganar. Ficamos conversando sobre coisas aleatórias, até mesmo sobre o relacionamento de Alex que parecia estar dando supercerto, e naquele momento, naquela noite toda, mal parecia que todas aquelas coisas horríveis haviam acontecido conosco, eramos apenas duas pessoas sentadas em uma cafeteria, esperando as horas passarem. Eramos Charlie e Wade novamente, sem nada forçado entre nós.

— Tudo bem, pegue um guardanapo para mim, por favor.

— O que? — Peguei o guardanapo que estava em minha frente e entreguei para ela.

Suas mãos percorreram rapidamente por sua bolsa, e retiraram de lá uma caneta.

— Vamos fazer uma lista dos lugares que eu tenho que visitar na França.

— O.k. — Relaxei minha postura na cadeira. — A Torre Eiffel, obviamente.

Rabiscou levemente algo no guardanapo, e logo após subiu os olhos verdes e brilhantes para mim, por um momento a ideia de prendê-la naquela cadeira e não deixar com que ela fosse passou por minha mente como um borrão, mas logo mandei-a para longe.

— Museu do Louvre, é claro, e também o Jardim de Luxemburgo.

Novamente rabiscos.

— A catedral de Notre-Dame, claramente. — Sua voz era suave.

— O arco do triunfo, e você poderia visitar o bairro em que a Amelie Poulain morava.

Sua mão parou de rabiscar, e seus olhos encontraram o meu com tanto amor que se você focalizasse bem em seus olhos poderia ver que ele estava escorrendo lentamente, e pigando em sua roupa. Seu olhar ficou repousado em mim por bons minutos, até que ela olhasse novamente para o pequeno guardanapo e voltasse a escrever.

— Gabi disse que vai me levar em um vinhedo em Borgonha, que se chama.. — Abriu novamente a bolsa e tirou de lá um papel. — Champs Élysées dos vinhedos, aparentemente são quarenta e cinco quilômetros de vinhedos, mas nós vamos nos Côte de Nuits e Côte de Beaune.

— Vinhedos são as melhores coisas, você não parece estar empolgada.

— Eu estou muito animada, eu só, não sei, vou ficar longe de bastante coisa. — O seu olhar caiu melancólico por todo o ambiente.

— Mas vai voltar em breve, e vai dar tudo certo, amor, está indo para França.

Um sorriso fraco surgiu pelo seu rosto, e ela assentiu fracamente.

— Tem um restaurante.

— Um restaurante? — Seus olhos se focaram no grande relógio que havia atrás de mim, mas eu não quis olhar.

— É, ele se chama. — Pedi a caneta apenas com um olhar, e ela me passou, onde eu pude anotar o nome de um restaurante qualquer que me lembrava. — Dizem que é um dos melhores da região em que você está, e sexta é o melhor dia para frequentá-lo.

— De verdade? — Perguntou, pegando o papel de minha mão.

— Verdade. — Seus olhos pareciam fixo ao papel.

“Primeira chamada para o voo 878”

Um suspiro cortado.

As pupilas dos olhos de Charlie se dilataram, mas ela apenas continuou conversando comigo como se nada estivesse acontecendo, como se não soubéssemos que daqui alguns minutos ela não estaria mais ali, e sim dentro de um avião embarcando para muito longe de mim. Meu estômago se revirou com alguma coisa pesada se agitando. Tentei conversar com Charlie normalmente, mas uma pressão gigante começou a invadir meus pulmões, e todo meu corpo, eu estava hiperventilando tanto que nem ao menos conseguia responder. Charlie começou a notar isso depois de um tempo de conversa, e também se tornou um pouco mais estranha do que antes.

Os minutos pareceram se transformar em uma cachoeira rápida escorrendo.

E quando menos esperávamos…

“Senhores passageiros, essa é a última chamada para o voo 878.

Repito, essa é a última chamada para o voo”

Charlie pareceu tão chocada quanto eu ao ouvir o anuncio, e pareceu um tanto relutante até finalmente pegar sua mala. Seus braços envolveram a si mesma, e logo após suas mãos encontraram a alça da bolsa. Coloquei a mão em sua nuca a guiei o mais lento que pude até avistarmos a moça no portão de embarque. A fila não era tão grande, mas ainda haviam algumas pessoas que atrasariam nossa espera, contudo, quando mais queríamos pessoas reclamonas, e se queixando, menos havia isso. A fila correu tão rápida que em menos de alguns minutos eramos os primeiros com mais algumas pessoas atrás de nós.

— Bem, acho que é isso. — Charlie disse, a voz gaguejava.

— Bem, acho que sim. — Um suspiro pesado.

— É…

Ela olhou por cima do ombro uma última vez para mim, e mostrou o necessário para a mulher chamada Neide. Seus olhos cruzaram os meus novamente antes que ela soltasse um último suspiro perto de mim, e cruzasse os passos pesados para dentro do portão de embarque, me deixando parado ali, sem nem ao menos ter o que dizer. Não conseguiria explicar a sensação nem que tentasse mil vezes. Minhas mãos tremiam de uma forma absurda, meu coração parecia prestes a explodir, e meus olhos tinham lágrimas prontas para derramar. Meu estômago tinha começado a vacilar e me dar pontadas geladas que encontravam não só ele, mas sim todo meu corpo.

— Senhor, você vai embarcar? — Neide me jogou uma voz suave por cima de um olhar mortal.

— Não, me desculpe.

Dei alguns passos para trás com os ombros derrotados, sem nem ao menos ver os braços enrolando meu pescoço e as pernas minha cintura. Dei uma leve inclinada para trás, mas, mesmo assim, consegui me manter em pé com Charlie presa em mim.

— Eu vou sentir tanto a sua falta, tanto. — A voz parecia inebriada em lágrimas.

Lágrimas pesadas haviam começado a descer dos meus olhos sem que eu nem ao menos visse, e eu tinha quase certeza que ela também estava chorando. Seus braços ficaram presos em mim por longos, e longos minutos, fazendo com que nada se passasse em minha cabeça. Eramos eu e ela naquele momento. Não existia Lorena. Não existia Alex. Não existiam aquelas pessoas na fila, nem mesmo a moça do portão de embarque. Naquele exato momento eramos somente eu e Charlie contra todo o mundo. Meu coração batia tão forte e sabia que ele iria se quebrar no momento em que ela se separasse de mim, mas teria que permitir. As nossas respirações estavam tão instáveis que nem ao menos parecíamos aquelas duas pessoas calmas que haviam passado a noite juntas. Aquela noite tinha sido a melhor noite de toda a minha vida, e eu simplesmente teria que deixar um dos motivos de minha felicidade embarcar em um avião.

— Tudo bem. — Ela murmurou em meu ouvido.

— Tudo bem. — Tentei parecer forte.

Coloquei-a no chão novamente, e a soltei.

— Amo você. — Minha voz estava mais firme do que parecia.

Os olhos dela encontraram uma luz de tristeza, e eu assenti, compreendendo o que ela sentia naquele momento. Eramos duas pessoas completamente apaixonadas uma pela outra, e simples assim, por uma obra do destino havíamos sido separadas. Não queria deixá-la ir, mas ela precisava, precisava entender tudo, precisava daquele tempo para ela, sem a mim para pressioná-la a aceitar minhas palavras, minha história sobre o que havia acontecido. Aquele não era o fim. Não seria. Eu nunca permitiria.

— Amo você também.

Sua mão que era a única parte de seu corpo firme a minha, de repente se soltou, os passos foram ficando mais distantes e de repente, em alguns minutos, ela já não estava mais ali, e infelizmente, eu não podia fazer nada, a não ser, lidar com aquilo.



 


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Notas finais do capítulo

Geeeente, mil desculpas pela demora do capitulo eu fiquei super sem inspiração do nada, mas aqui está o cap, adoro vuxes ♥