Silver escrita por Isabelle


Capítulo 27
Capítulo 26 - Wade


Notas iniciais do capítulo

"Eu não posso esquecer
Embora eu tenha tentado
Eu sei que você se arrependerá, amor
Você me disse muitas vezes
Mas, eu ainda me pergunto
Porque
Você saiu com ela
E me deixou para trás?"
— Daughter



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— Alguém viu a Charlie?

Perguntei levantando o olhar dos trabalhos que eu tinha aproveitado para corrigir, enquanto todos eles estavam todos fazendo a prova concentrados em silencio. Eu não me importava mais com aquela pergunta, ou em demonstrar que me preocupava com ela de uma forma a mais do que me importava com todos eles. É claro que me preocupava, mas não como com Charlie. Todos ali sabiam o que ela era para mim. Todos eles haviam visto com seus próprios olhos Charlie e eu nos beijarmos naquele quintal escuro duas semanas antes, e mesmo se não tivessem visto com seus próprios olhos, os vídeos que tinham rolado nos sites e nos jornalzinhos da escola tinham sido distribuídos para todas e qualquer pessoa.

A coordenadora da escola havia chamado Charlie e eu para conversamos com ela sobre o que estava acontecendo conosco. Tivemos que explicar que era algo que fora fomentado antes de sabermos que eu seria seu professor, e prometer que aquilo não interferiria de maneira alguma na minha forma de avaliar os alunos, deixando que meu relacionamento com Charlie lhe desse algum tipo de privilegio. Conversamos sobre todos os aspectos daquele relacionamento, e em como ele ainda era recente, mas, mesmo assim, ela sugeriu diversos terapeutas de casais que poderiam facilitar nossa perspectiva como um casal recente que teria que enfrentar o âmbito escolar, e a pressão dos alunos, então tivemos que ir. Pelo menos em uma sessão onde Charlie simplesmente não conseguiu parar de rir após sairmos de lá.

Erica ficava tentando achar pretensões para poder irritar Charlie, mas eu ficava espantado em como ela conseguia lidar bem com a situação. Ela nem ao menos trocava uma palavra com Erica, apenas assentia com a cabeça e deixava um sorriso de deboche enfeitar seu rosto. A força que aquela garota tinha, realmente me impressionava.

Então tudo tinha se encaixado em seus devidos. Charlie e eu saiamos e não nos importávamos de quem estivesse vendo, não éramos mais acompanhados de alunos querendo pular em cima de mim, nem nada disso. Tínhamos conseguido encontrar a harmonia naquela relação, e nada realmente importava.

Nada, até aquele dia em especial.

Os alunos olharam um para os outros tentando se comunicar somente com um olhar por conta da prova, mas no fim nenhum deles fazia ideia de onde Charlie poderia estar, e fez com que imediatamente um nó se formasse na minha garganta. Bati o pé contra o chão múltiplas vezes, e mesmo assim, meu coração, nem mesmo minha ansiedade parecia diminuir. Tentei voltar a me focar nos trabalhos, mas eles não conseguiam mais prender minha atenção. Estava preocupado, e mesmo se nada tivesse acontecido sabia que Charlie teria me mandado alguma mensagem sobre seu paradeiro, e mesmo assim, a tela do meu celular continuava sem nenhuma notificação.

Afastei a cadeira levemente, mas isso não a impediu de fazer um som estridente. A atenção de todos subiram para mim, e eu apenas fiz um gesto com a mão demonstrando que eles poderiam voltar a se focar no teste.

Tentei escutar meus passos ao longo que ia andando para a porta, mas meu coração bloqueava o som com suas batidas incessantes. Eu mataria Charlie se ela estivesse jogada no sofá do seu apartamento com uma série na TV com preguiça demais para vir para a aula. Porém, eu sabia que aquilo não iria acontecer. Ela sabia que havia um teste hoje. Ela havia passado muito tempo se preparando para ele, para simplesmente no dia não aparecer. Alguma coisa estava errada, e eu precisava descobrir o que era.

Chamei a monitora que estava no corredor, e a deixei encarregada de vigiá-los, enquanto eu dava um telefonema. Ela não me olhou de bom grado, mas entrou na sala mesmo assim dizendo algumas palavras que eu não conseguia ouvir. Me arrisquei a pensar em outra coisa enquanto as chamadas iam todas para a caixa de mensagem, mas meu coração não parecia compreender minhas tentativas, fazendo com que todas elas falhassem. Meu suor começava a deslizar pelo meu pescoço, e nem ao menos havia um tempo quente aquele dia. As rajadas de vento forte que batiam em mim apenas deixava entrelinhas de que choveria por um longo tempo. Talvez a noite toda.

— Oi? — A voz soou do outro lado de telefone.

Minha cabeça palpitava.

— Alex, você tem alguma notícia da Charlie? — Passei a mão pelo cabelo.

— Ela não está na faculdade?

— Não, Alex, ela não está, não teria ligado para você se ela estivesse.

— Oh, então não, não faço ideia de onde ela está. — Estava totalmente despreocupado.

— Pode passar no apartamento dela pra ver se ela está lá? — Perguntei.

— Cara, tenho certeza que ela…

— Você pode? — Minha voz soou mais dura.

— Claro. — Bufou.

— Obrigado.

Desliguei o celular e soquei-o de volta no bolso.

Desci os degraus levemente, e percorri o caminho até a sala de Jéssica. A garota estava com um rabo de cavalo, e os olhos claros presos no quadro, quando eu pedi licença para poder conversar com ela. Seus olhos pareceram entender sobre o que eu estava falando assim que eu cruzei com os dela. Ela caminhou em silencio até uma distancia razoável da porta de sua sala, e cruzou as mãos.

— É sobre a Charlie, não é?

— Sabe onde ela está?

— Não, ela simplesmente não apareceu hoje. Mandei uma mensagem para ela perguntando onde ela estava, mas ela apenas me respondeu que precisava de um tempo para respirar hoje.

— Por que hoje? — Perguntei sério.

— Eu não faço a menor ideia, só sei que não é comum ela não ir trabalhar, estou preocupada com ela.

— Sim, eu acho que tenho uma ideia do porque hoje, mas obrigado de qualquer jeito.

— Se encontrá-la, você pode me ligar? Alex tem o meu número.

— Claro. — Disse, e me virei.

Agradeci suavemente a monitora que corou, mesmo tendo me olhando de mal grado antes, e voltei a me sentar na mesa, deslizando o olhar por todos eles. Estavam tão calmos, como se tivessem compreendido tudo que eu ficava horas e horas falando ali na frente, e agora soubessem exatamente discorrer sobre aquilo. Ele não estavam suando frio por uma pessoa ter desaparecido, nem por não saber a matéria. Eles estavam confiantes. Queria poder roubar a calma deles

Encarei o celular por minutos e minutos, mas Alex parecia ser tão útil quanto um poste. As pessoas começavam a se levantar, colocar os testes na minha mesa, e sair, enquanto meus olhos continuavam vidrados naquele aparelhinho. Tamborilei os dedos na mesa, e fiquei escutando os ruídos que os mesmos faziam. Em minha cabeça mil cenários ficavam dançando, principalmente a cena de vê-la presa naquele carro com um homem em cima dela.

Coloquei as mãos nos lábios e peguei o celular assim que o último aluno que estava fazendo a prova a entregou para mim. Todos eles voltaram para sala com um olhar meio desnorteado, e eu avisei que estavam liberados. O olhar deles parecia preocupado comigo, e até mesmo Erica ficava dançando os olhos pela carteira de Charlie, qualquer um naquela sala parecia saber mais do que eu que aquele não era um habito comum dela, e mesmo assim, eu sabia, sabia que não era do costume dela desaparecer daquela forma sem avisar ninguém sobre.

Juntei todos os meus materiais, e meu celular tocou em minha mão. Meu coração parou. O número na tela não era de Alex, nem mesmo de Charlie, mas sim desconhecido. Soltei um suspiro enquanto todos trocaram um olhar comigo. Coloquei o celular no ouvido, e perguntei calmamente quem era, a linha ficou em silencio por dois segundos antes de uma voz começar a falar. Meu coração parecia ter sido golpeado muitas vezes, e minha voz tinha sido destruída pois eu não conseguia responder as perguntas da pessoa ao outro lado da linha. Ela tentava me apaziguar com palavras calma, mas eu não conseguia mais prestar atenção em nada e nem ninguém. Não tinha a menor noção do que eu estava fazendo, apenas empurrei todas aquelas pessoas e desci rapidamente as escadas. Joguei todos meus materiais dentro do carro, e meu corpo logo em seguida.

Minhas mãos tremiam no voltante enquanto meu corpo todo era jogado num pânico horrendo. Eu não queria sentir aquilo de novo, e lá estava. O sentimento de perca, a dor no coração, o tremor, e o suor frio. Meu olhos queriam derramar lágrimas, mas eu me controlei para não deixar a minha fraqueza inundar meus pulmões. Prendi minhas mãos com mais força ao parar com o carro na vaga de estacionamento, e pular para fora. Cenas picadas ficavam dançando na minha cabeça, e eu sentia que podia desmaiar antes mesmo de chegar na recepção.

Meu corpo encontra o balcão, as pessoas trocam um olhar com o computador e depois me mandam sentar em uma cadeira que a qualquer momento falaram comigo. Eu não tenho paciência para esperar. Eu não quero esperar. Quero poder gritar, e invadir aquele quarto, mas ninguém parece estar preocupado com o fato que meu coração esta prestes a sair pelos meus lábios. Todos estão preocupados conversando, ou mantendo os olhos na TV para poder me informar qualquer coisa, e por isso eu estou sentado naquela cadeira gelada esperando. Esperando meu coração parar de doer.

Eu não sabia há quanto tempo a sola do meu sapato encontrava o chão múltiplas vezes revelando aquele som dilacerante que acalmava minhas veias, mas perturbava minha mente. Não sabia há quanto tempo estava sentado naquela cadeira na mesma posição. As mãos juntas no meu colo por cima daqueles jeans velhos com os cotovelos apoiados no apoio da cadeira gelada. Meus olhos rondavam o ambiente que só se distinguia por uma cor excruciante, branco, tudo muito branco.

Os sons das ambulâncias indo e vindo inundavam minhas memórias junto com o barulho da chuva forte. Eu conseguia ouvir a risada dela ecoando há metros de distância. Mesmo que fosse somente por dois segundos. Eu ainda conseguia. E eu não quero conseguia. Era doloroso demais, as coisas que se passavam na minha cabeça. Não queria escutar. Nem pensar. Eu queria saber por que ninguém me deixava entrar em seu quarto ainda. Queria saber se ela estava bem o bastante, e que nada de ruim acontecera a ela.

Passei a mão levemente pelo meu cabelo e mexi um pouco meu corpo na cadeira para dar um descanso a minha coluna que já estava doendo de tanto ficar na mesma posição. Cruzei e descruzei as mãos no meu colo e ousei ficar olhando para a televisão para tirar aquela agonia que sentia nos sons descompassados que meu coração faz.

A notícia que passava tomava minha atenção por alguns segundos, mas logo após não conseguia me concentrar em mais nada, a não ser em pensar como eu vim parar ali. Como diabos eu tinha deixado tudo aquilo acontecer na minha vida. Como estava sendo sufocante estar sentado naquela cadeira. Meu coração não conseguiria mais lidar com aquilo.

Minha cabeça estava prestes a explodir, meus olhos ardiam e minha boca estava seca. Cenas. Cenas. Cenas.

Elas dançavam entre a minha mente.

Elas brincavam com minha mente.

Elas gostavam de rir de mim.

Havia um nó gigante em meio a minha garganta que nem o maior dos experts conseguiria desfazer. Ele era grande demais para ser desfeito. Pesado demais. Complicado demais. Implicava anos e anos. Ninguém iria perder tempo o suficiente para tentar entender aqueles anos, para finalmente descobrir como desatar aquele nó ridículo que eu tinha deixado que anos moldassem. Eu deveria ter desatado ele na primeira oportunidade que tive. Agora estava ali. Agonizando com um nó gigante tampando minha garganta. Me impedindo de respirar.

Olhei para o bebedor com copos enfileirados em uma pilha de cabeça para baixo numa daquelas máquinas, e tracei um caminho retilíneo até lá. Pensei em ir contando os meus passos até lá, talvez isso fizesse aquele peso se dissipar. Mas sabia que nada faria aquele peso se dissipar, nem mesmo Alex que tinha ficado minutos e minutos falando, e ao perceber que eu não estava prestando atenção tinha fechado o rosto, cruzado os braços e esticado as pernas pelo corredor, logo após ligar para os pais de Charlie. Eu não tinha tido coragem. Não após ela ter me falado sobre Mallu. Não queria nem imaginar o que havia passado em suas cabeças quando Alex disse que sua filha estava em uma emergência de hospital.

Ergui meu corpo pronto para seguir até o bebedor, mas mudei meu caminho, seguindo até o balcão onde há duas moças ao telefone. As moças que pediram que eu me sentasse, que logo logo teria alguma notícia. Uma eternidade parecia ter passado, e nada ainda havia acontecido. Uma delas era loira com uma pinta na testa. Estava rindo de alguma coisa enquanto fazia anotações em um bloco verde amassado. Tinha olhos escuros. Era tudo isso que conseguia captar, queria notícias. Notícias. A outra era morena, com lábios pintados vermelhos, com batom até nos dentes, mas, mesmo assim, ela sorri com se tudo estivesse perfeito, e não como se tudo estivesse desabando.

Desligou o telefone quando me vê se aproximando, e focou aqueles olhos profundos em mim.

— Posso ajudar, querido? — A palavra querido causou náuseas em mim. Não conseguia fitá-la normalmente, e não sei se conseguiria abrir a boca para outra coisa além de vomitar.

Não sei quando ou como eu comecei a me sentir assim. Meu mundo parecia desabar, como quando você toca num caminho cheios de dominós, e todos eles vão caindo. Tinha jurado que eles haviam parado de cair, mas fazia onze meses que eles estavam caindo e simplesmente não paravam. Não sabia como reagir. Não sabia nada dessas coisas. Precisava respirar, precisava pensar, mas não conseguia. Toda vez que tentava meu mundo voltava novamente para aquela noite. Para as sirenes. Não queria pensar naquela noite. Não queria ver os olhos das pessoas apenas curiosas e não preocupadas. Não queria. Não queria. Não queria. Não queria ver os olhos dela antes da porta se fechar.

— Al- Alguma notícia de… — Minha voz travava ao dizer o nome dela. Não queria me lembrar dos olhos verdes piscando para mim antes de sair do meu apartamento para ir trabalhar aquela manhã.

— De Charlote Fontes?

Charlie. O nome dela é Charlie.

— S-s- im. — Gaguejei e senti minhas mãos tremerem.

— Ela ainda está sedada por conta dos ferimentos, mas daqui a pouco vão poder ir vê-la no quarto e conversar com o médico que vai explicar tudo que aconteceu.

— Mas ela está bem?

— Está sim, querido, ela teve uma grande sorte. — Um sorriso.

Queria gritar com ela por sorrir. Ela não tinha me dado nada além de informações vagas, mas ao menos sabia que Charlie estava bem, e isso me dava um conforto em todo o coração. Voltei a me sentar ao lado de Alex, quando a porta se abriu com Jéssica entrando desesperada. Alex e eu trocamos um olhar com ela, e ela nos encheu de pergunta, mas enquanto Alex as respondia, eu preferi ir até o bebedor para tomar uma água. Não sabia se conseguiria aguentar aqueles socos no meu coração, ainda mais com Alex tudo de novo.

☯☯☯

— Você não acha isso injusto?

Revirei os olhos, e a escutei bufando ao ver o que eu fiz.

— Isso é uma grande chance, Wade, não só para mim, para nós dois. Eu estou cansada de desenvolver esses projetos de casas chiques que eles nem mesmo ligam porque querem casas caixotes feitas de uma maneira… É a minha chance de poder desenvolver um daqueles prédios que as pessoas passam perto e ficam encantada, tipo o Empire State.

Sabia que seus argumentos eram totalmente válidos, mas ainda sim, continuei mantendo meus olhos presos a TV, fingindo não me importar muito com aquilo. Queria me sentar e debater sobre aquilo, e não com ela organizando malas, enquanto dançava de um lado para o outro.

— Não pode construir um Empire State no Brasil?

Lorena bufou novamente, enquanto estava zanzando pela casa somente de sutiã e uma saia preta longa. Seus cabelos loiros estavam soltos quase alcançando sua cintura, e seus lábios estavam pintados se rose claro.

— Estou cansada de brigar por causa disso, Wade.

Parou com seu corpo seminu em frente a TV, e eu revirei os olhos para ela novamente, preenchendo aquele seu rosto extremamente pálido de uma fúria que o coloriu de vermelho, e fez com o olhar que ela me lançasse fosse de total descontentamento.

— Lorena, essa não é uma decisão que eu quero fazer com você sempre estando atrasada para ir para algum lugar. Você mal fica em casa por causa dessas suas reuniões. — Cruzei os braços. — Quero me sentar naquela mesa, e debater os prós e os contras, mas lá vai você de novo, correndo para a cidade vizinha, para viajar pro outro lado do país para resolver questões que a gente mesmo não parou para resolver.

— Está sendo extremamente injusto comigo.

— O que? — Me levantei e cobri meu corpo minúsculo. — Lorena desde que nos casamos você só faz isso, joga decisões em cima de mim, e sai, me deixando para lidar com elas sozinhas. Mudar para outro país é uma decisão grande, a gente precisa sentar e debater ela, como duas pessoas casadas, a não ser que você queira o divorcio.

— O que? — A voz dela se elevou. — É isso que você acha? — Passou a mão no cabelo e deu passos pesados para longe. — Eu amo você mais do que tudo. — Lagrimas queimando os seus olhos. — Se não consegue perceber que esse emprego é tudo que eu sempre quis, eu não posso fazer nada, mas quero que você leve em consideração que você também é tudo o que eu sempre quis, Wade. Não vou conseguir lidar em ir morar em outro lugar se você não estiver comigo, e é por isso que quero que reconsidere. Eu te amo mais do que tudo, e preciso que entenda isso. Preciso que decida vir comigo.

— Você iria sem mim? — Uma linha reta se formou nos meus lábios.

— Se eu precisasse. — Havia derrota em sua voz.

Abaixei o olhar para o chão e deixei sua voz ecoar em minha mente. Um vazio pareceu preencher meu coração, mas ela deu um passo para frente e prendeu seus braços envolta do meu corpo. Havia alguma coisa queimando nos meus olhos, mas eu não queria deixasse que ela me visse fazendo aquilo. Não queria deixar ela sair de casa pensando que suas palavras tinham causado um nó na minha garganta que nunca mais poderia ser desatado.

☯☯☯

Não conseguia olhar para a doutora quando ela falava pra mim sobre Charlie e sua situação, minha mente estava em outro lugar. Ela estava lá com Lorena, há meses. Ela não tinha nenhuma novidade para mim que eu já não soubesse. Era apenas um bando de informação de rotina para tentar aliviar o peso no meu coração, mas queria apenas que ela parasse de falar e me deixasse atravessar a porta. Eu queria deitar no peito de Charlie e trazer ela para perto de mim.

— Havia uma quantidade de álcool encontrada em seu sangue.

Minha garganta se fechou, ela não podia ter sido capaz de cometer tal imprudência.

— Nada muito abusivo como o homem que bateu o carro ao dela, mas sim, uma quantidade que poderia tê-la deixado um tanto desnorteada. — A médica trocou um sorriso conosco. — Mas, esse é o básico que posso afirmar para vocês, ela não teve nenhum trauma, nada a ponto de precisar de cirurgia, mas fraturou o braço direito no impulso. Tiramos uma tomografia, e nada foi encontrado, então quando forem ver o curativo em sua cabeça apenas não fiquem desesperados. Tudo está bem com ela.

—Obrigado. — Disse.

Alex repousou uma mão no meu ombro, como se aquele toque dissesse que eu não deveria brigar com ela agora por estar alcoolizada. Mesmo que eu odiasse a ideia de ter que esperar, sabia que era verdade. Ela deveria estar com uma pressão horrível em cima de si.

A porta do quarto se abriu.

Alex e Jéssica entraram primeiro do que eu, e consegui escutar a voz de Charlie cumprimentando a eles. Meu peito se encheu de coragem, e eu comecei a andar, até atravessar a porta e encontrá-la deitada na cama. Seu cabelo estava solto, os olhos verdes focados em mim, um grande esparadrapo em sua testa, e um braço enfaixado e engessado encostado sobre sua barriga.

Soltei um suspiro enorme, e caminhei até a cama. Um sorriso cobriu seu rosto, e peguei sua mão na minha, e ela soltou um sorriso. Poderia chorar a qualquer momento, mas não podia fazer aquilo. Não agora.

— Me desculpe. — Ela mordeu o lábio. — Me desculpe por fazer isso com vocês.

— Não vamos fazer isso agora, ok? — Dei um beijo de leve na sua cabeça. — Não agora, não quando você tem que melhorar.

— Wade...

— Sério, amor.

Me sentei em um banco que havia ao lado de sua cama, e fiquei ali, escutando Charlie conversar com Jéssica sobre várias coisas. Elas conseguiam inventar assunto até de coisas que eu nem ao menos sabia. Alex ficava trocando olhares com seu celular, enquanto também tentava participar da conversa. Tentei falar algumas coisas, mas meu coração ainda estava muito pesado, eu estava extremamente amedrontado e não conseguia falar nada, mas sim, apenas prestar atenção em como todos eles pareciam todos calmos, e não como se ela tivesse estivesse a um risco de sua própria vida.

— Quando vai receber alta? — Jéssica perguntou. — Porque qualquer coisa posso dormir com você aqui amanhã, e então…

— Não, não precisa que nenhum de vocês fiquem porque…

— O que? — Disse, interrompendo-a. — Não precisa, Jéssica, e eu vou ficar aqui com você Charlie, vou ficar aqui com ela a noite toda, e até você ser liberada, é impossível que eu vá conseguir pregar o olho essa noite longe de você.

— Wade…

— Estou falando sério. — Meus olhos repousaram nela. — Totalmente sério.

— Tudo bem.

O olhar em seu rosto era preocupado, tentei dar um sorriso para ela, mas não pareceu confortá-la, mas apenas deixá-la mais preocupada. Não conseguiria explicar para ela o que eu estava sentindo naquele momento, além de poder falar que era uma dor enorme. Além de uma preocupação absurda, e uma vontade imensa de gritar com ela, sobre tudo aquilo. Sobre toda aquela preocupação que tinha angustiado meu coração. Ela não podia fazer isso apenas porque estava magoada por conta de sua irmã ou qualquer coisa do tipo. Ela não podia fazer aquilo ao meu coração que já estava sofrendo tanto.

Dormi com a cabeça na maca de Charlie e suas mãos brincando com meu cabelo. Eu nem mesmo vi a escuridão me atingir. Ela veio silenciosamente e em poucos segundos eu estava dormindo, sem sonhos, sem pensar no horror que eu havia passado aquele dia. Mas sim, em uma calmaria que eu deveria ter estranhado. Deveria realmente ter estranhado. As vezes queria poder prever as coisas que me aguardavam nos outros dias para que eu pudesse me preparar, antes que elas socassem meu estômago com força.

Meu celular tocou alto o bastante para me acordar, mas baixo o bastante para não acordar Charlie, quando o sol beijou meu rosto pela fresta da janela que tinha uma cortina muito fina para cobri-la. Alex havia me mandado uma mensagem avisando que já estava chegando para ficar com Charlie para que eu pudesse ir para casa, mas não era essa mensagem que havia me acordado, e sim a ligação desconhecida.

Apertei o botão de aceitar, e deixei uma ligação mudar todos aqueles meses. Me levantei enquanto ouvia a voz do outro lado da linha. Meus tímpanos começaram um zunido ensurdecedor, enquanto meu estômago era preenchido de um tipo de veneno matando as borboletas que estavam ali. Coloquei a mão nos lábios, respondi algumas perguntas com alguns murmúrios e deixei meu coração ser inundado por vários tiros enquanto todo o quarto era manchado de um vermelho, mas não um vermelho vivo, era mais como um vermelho negro, da mesma cor que meu mundo havia acabado de se tornar. Me senti perdido e sem saber o que fazer após aquela ligação.

Havia sido informado disso semanas atrás, mas nem ao menos me deixei levar. Não queria pensar o que deveria fazer caso fosse possível. Lagrimas que eu estava segurando desde o dia anterior desceram dos meus olhos, e eu precisava sair dali, não conseguiria manter aqueles pensamentos em minha mente com Charlie no mesmo quarto que eu. Precisava entender sobre o que aquilo se tratava.

Olhei para Charlie em um semblante de paz envolto a sua volta. Suspirei profundamente, e sabia que aquilo era mais por nós do que por qualquer coisa. Apertei o botão no topo de sua cama, e uma enfermeira adentrou o quarto alguns minutos depois. Avisei que meu amigo estava prestes a chegar e ela concordou rapidamente, afirmando que não haveria problema nenhum já que Charlie estava dormindo. Respirei lentamente prestes a passar pela porta, mas voltei um passo para trás. Passei a mão pelo meu cabelo, e fui até a cama depositando um beijo em sua cabeça. Passei minhas mãos em seu rosto, e deixei um pedaço de mim com ela. Eu não sabia que ao passar por aquela porta tudo mudaria


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