Silver escrita por Isabelle


Capítulo 17
Capítulo 16 - Charlie


Notas iniciais do capítulo

!Na minha vida, eu tenho visto,
Pessoas andando para o mar,
Apenas para encontrar lembranças,
Assolado pela miséria constante,
Seus olhos baixos,
Fixos no chão,
Seus olhos baixo"
— Cage The Elephant



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Abri os olhos e observei o quarto tão familiar.

Soltei um sorriso quase que automático, trazendo o travesseiro com o cheiro dele para perto de mim sem me importar pois se havia alguém ali para me observar deleitar das coisas de Wade, porque não havia. Nem mesmo a minha consciência. Ela havia tirado uma folga, e esperava que ela demorasse para retornar.

Mergulhei meu rosto no seu cheiro, aquele cheiro doce e suave com uma pitada do cheiro das estantes de seu quarto, deixando que todo ele penetrasse meus pulmões causando aquela tranquilidade constante. Quase conseguia soltar uma risada de tão boa que era a sensação que aquilo me causava. Algo firme, não uma insegurança vazia na boca do estômago. Nem palavras vazias sem sentimentos. Mas como se fosse sussurro de promessas no pé do meu ouvido.

Sentei e fitei todo o quarto. Era bagunçado, mas de uma maneira organizada, como se cada bagunça tivesse um lugar distinto para ficar. Era estranho eu nunca ter parado para analisar o quarto de Wade, mas agora que o fazia, percebia que me lembrava muito a mim mesma. Havia uma pilha de livros dispersos em cima de um criado-mudo, alguns remédios que estavam organizados em uma pilha, como se estivessem em ordem de ser tomado, e uma TV. Havia um calendário com os dias riscado, tendo ao fundo um pôster de Tame Impala na parede. Sorri ao vê-lo ali.

Nem conseguia acreditar que só fazia dois dias que ele tinha viajado. Parecia uma eternidade desde que eu o tinha visto pela última vez. Soltei um suspiro abafado, quando meu pé encontrou o chão frio espantando os pensamentos ligados a Wade. Tinha medo de abrir a porta e encarar a realidade do calor que realmente estava fazendo. Queria ficar ali, sendo congelada pelo frio que deslizava do ar-condicionado e vinha até mim.

Peguei meu celular em seu criado-mudo e fui atingida pelas mensagens dele. Ai como meu sorriso aparecia fácil quando eu apenas lia seu nome na tela de meu celular. Eu queria que ele pudesse entrar nas minhas veias e seguisse caminho até meu coração, e quando voltasse me explicasse o que diabos ele estava fazendo, porque eu mesma já tinha deixado de tentar entender.

Andei da sala até a cozinha deixando a temperatura me atingir como um soco no rosto. Quis chorar ao me lembrar que eu tinha que estar na biblioteca daqui algumas horas, eu realmente não estava nenhum pouco determinada, mas lembrar do dinheiro ao fim do mês me dava uma nova motivação.

Liguei a cafeteira e fiz todos os procedimentos para preparar um café, quando a porta se abriu em um estrondo. Alex abriu a porta do apartamento e eu simplesmente parei de respirar. Estava vestida apenas com uma das camisetas de Wade, e nada mais. Não tinha pensado que Alex apareceria ali sendo que Wade nem ao menos estava no apartamento.

— Trouxe sonhos. — Ele colocou em cima do balcão e se sentou, como se já soubesse que eu estava aqui. — Mas não os seus, porque eles envolvem beijar Wade e eu não posso fazer isso acontecer. — Ele deu uma risada, meu rosto ruborizou.

— Eu não sonho em beijar o Wade. — Disse dura, minhas costas eretas declaravam minha tensão.

— Sim, claro que não. — Ele deu uma risadinha. — Vocês dois são tão óbvios, e nem percebem.

Eu me ergui na ponta do pé para alcançar a parte onde Wade colocava as xícaras, e realmente não consegui guardar um sorriso ao ver as canecas personalizadas que abarrotavam seu armário. Peguei o Darth Vader e uma de friends para Alex. Não queria encarar seu rosto ainda, então me escondi por entre e fachada de pegar café.

— Sabe, Charlie, não via Wade olhar pra uma garota do jeito que ele olha pra você desde que o conheci. — Lembrei que isso não fazia muito tempo.

— Você é louco. — Demorei bastante para encher uma das xícaras.

— Ele gosta das transas dele? Claro. Ele é um cara legal? Claro. Mas ele olha pra você como se quisesse te prender em uma parede e te beijar, e se ele não fizer isso logo vai morrer.

— O que? — Eu me virei e entreguei a xícara para ele.

Me sentei no balcão e peguei o sonho que ele colocou no guardanapo e me entregou.

— Não se faça de boba, eu sei como você olha pra ele também. — Ele mordeu um pedaço do sonho. — A tensão sexual de vocês chega a deixar todo mundo constrangido.

— Isso não é verdade. — Virei meu rosto.

— Diga o que você quiser, mas conheço Wade. — Ele deu de ombros, mordendo novamente o sonho. — Ele sofreu uma desilusão muito forte, quando eu o conheci só falava dessa garota Lorena, mas nunca me falava direito o que tinha acontecido, e agora, eu vejo no olhar dele que ele quer falar sobre você, mas tem medo.

— Alex, você está sonhando, sério. — Tomei um gole do café. — Nós somos amigos. Só amigos.

— Sim, claro, são sim, eu acho que… — Ele tomou um gole do café. — Meu Deus, que café gostoso, você fez na cafeteira?

— Acredita? — Eu disse. — Eu também achou que ficou muito bom por ser na cafeteira, mas né…

— Como você fez?

— Ah, do jeito tradicional. — Comecei a explicar para ele como eu tinha feito e sua cabeça ficava assentindo.

— Ah, entendi qual o seu jogo, você me distraiu com o assunto do café para pararmos de falar sobre seu relacionamento com o Wade, isso não vai colar não.

— O que? — Dei uma de mal entendida. — Preciso ir trabalhar, te vejo mais tarde.

— Cinema? — Ele disse, limpando as mãos em um pano de prato qualquer. — Sete e quinze?

— Claro.

Sai do apartamento simplesmente fechando a porta com mais as milhões de incertezas de me rodeavam. Queria apenas escorregar até o chão e bater minha cabeça com força na porta, mas sabia que não podia. Então, deslizei para dentro do meu apartamento e troquei de roupa o mais rápido possível.

☯☯☯

— A Arte da Guerra, A Busca dos Loucos — Sussurrei lentamente. — A Caminho do Brasil, A Coisa em si, Alice no País das Maravilhas, Almas da Gente Negra. — soltei um suspiro, com os olhos cansados, minha soava como uma canção de ninar lenta e paciente. – A Pirâmide Vermelha, Arte de Furtar, A Vida em Poesia — Vol I, – a sineta tocou, interrompendo meus pensamentos.

Troquei um olhar longo com uma menina de cabelos ondulados cor de areia, e soltei um pequeno bufo em desagrado. Desci lentamente as escadas do estoque pessoal da biblioteca, e fechei um dos botões do cardigã verde que usava por cima da blusa preta simplória, o ar na biblioteca estava mais frio do que o comum. Andei até o balcão, onde encontrei os olhos verdadeiramente mel da garota que eu costumava ver nos arredores da faculdade. O nome do livro deixou seus lábios, e eu me segurei para não soltar outro berro de desagrado. Qualquer um poderia ver que a biblioteca era arrumada em setores alfabéticos, ela conseguiria achar aquele livro em menos de 5 segundos, mas todos tinham a preguiça de ir e analisar as fileiras que despejavam conhecimento.

Voltei para trás do balcão, ao fundo, e escutei Jéssica chegar carregando os panfletos de sua campanha eleitoral na faculdade. Se fosse chamar os vários desabafos que Jéssica dava para mim enquanto eu só ficava absorvendo e passava as páginas dos livros, de amizade, então sim, Jéssica e eu eramos amigas de longo prazo. Desde que havia entrado na faculdade, trabalhava com Jéssica, mas nós nunca tínhamos conversando muito. Jéssica era quem falava mais.

Eu sabia tudo sobre Jéssica. Seu namorado havia lhe traído há dois meses, e as vezes, eu cobria seus turnos quando via os olhos da garota imersos por lágrimas densas, e ela tinha começado a fazer o mesmo por mim em relação a André. Ela nunca havia me forçado a falar sobre nada, mas uns dias antes, eu verdadeiramente me senti bem para discutir isso com ela. Sua mãe e seu pai eram empresários e ela cobria o bico na biblioteca para ganhar créditos escolares maiores. A garota adorava conversar sobre si mesma, então, eu, apenas assentia, e trocava palavras e outras, enquanto a garota dissertava como sua vida estava sendo.

Aquele nós trabalhamos em conjunto repondo os livros nas estantes, já que a maior parte das pessoas só vieram renovar o livro. A biblioteca não costumava ser lotada, a não ser em vésperas de provas ou de grandes exames. As pessoas que normalmente vinham eram sempre as mesmas.

Sobre a morte e o Morrer

O livro já estava um tanto amassado, mas, mesmo assim, o enfiei dentro da bolsa manejável de tricô que eu havia comprado, e evitei o olhar acusatório de Jessie. A garota bufou lentamente, e passou mais um livro para mim, contudo este, fora totalmente desviado da atenção da minha atenção.

— Sabe, você me deprime lendo esses livros. – Ela disse, e jogou mais alguns para mim. Eu não se importava com o que ela dizia, estava preocupada com muito mais coisas para ligar com aquelas afirmações. — Então, seu celular simplesmente não parou de vibrar um segundo hoje… — Ela abriu aquele sorriso maldoso. — André?

— O que? — Eu me desequilibrei da escada por alguns segundos. — Não, é só um amigo que viajou e fica me mandando mensagens.

— Sei, só um amigo. — Ela riu, me passando outro livro.

Eu ri, tentando não ruborizar. Esse era meu novo passatempo tentar não ruborizar na frente das pessoas quando o assunto era Wade. Seria realmente difícil ter que olhar para ele sem conseguir deixar o vermelho percorrer minha face.

☯☯☯

Sair com Alex fora tão natural que eu mesma cheguei a estranhar. Sua presença havia se tornado uma das mais importantes, e de um minuto para o outro ele tinha criado uma intimidade comigo surpreendente. Sentia falta de Wade entre nós, mas sabia que seria um pouco mais mecânico ficar perto de Wade de agora em diante. Nem eu mesma sabia como seria quando ele chegasse. Parecíamos normal trocando mensagens, mas logo mais não seria assim. Ele voltaria a ser meu vizinho da porta da frente e eu seria a vizinha apaixonada por ele. Eu realmente tinha que começar a dar um rumo a minha vida.

Nós dois fomos ver um filme qualquer, mas ficamos conversando a maior parte do tempo e rindo, as pessoas chegaram a realmente ficar bravas conosco, mas nós apenas continuávamos a rir, e eu me senti bem mal após. Sentamos na praça de alimentação e Alex me contou algumas coisas sobre ele. Ele tinha um irmão que chamava Jonatan, os dois não eram tão próximos desde que sua mãe havia morrido de câncer, senti um frio súbito subir minha espinha nesse momento. Seu pai não era a pessoa mais carinhosa então ele cresceu em um colégio interno, e depois foi fazer faculdade. Agora ele trabalhava num escritório de administração fazia muito tempo e tinha se acomodado ali.

— Mas, e você, princesa? — Ele limpou suas mãos sujas de gordura. — O que você tem para me contar.

Então eu contei para ele, como conheci André e tinha acabado naquela louca cidade, como eu tinha realmente pensado que ele era o amor da minha vida e o quanto eu havia me decepcionado, e momento algum Alex me zoou. Apenas me olhou e prestou atenção nos detalhes. Contei sobre meu trabalho na biblioteca, sobre meus pais e todas essas outras coisas. O assunto foi cortado no meio pois resolvemos ir embora. Não queria que a noite acabasse ainda, mas no outro dia ainda seria quinta, e ambos precisávamos trabalhar.

— Você não tem nenhuma irmã? — Ele riu, estacionando o carro na porta. — Tipo você tem Gabi e vocês parecem bem próximas de irmãs, mas

— Falando na Gabi, o que foi aquela tensão sexual de vocês no meu aniversário? —

Foi a primeira vez que eu vi o rosto de Alex corar daquela forma, ele praticamente ficou sem fala. Não consegui segurar uma risada.

— Meu Deus, você tem uma paixonite na minha melhor amiga

— O que? — Ele apertou as mãos envolta do volante. — Você tem uma paixonite no meu melhor amigo.

— O que?

— Para de negar, trocam mensagem o dia inteiro. — Ele gritou. — Meu Deus, Charlie, façam um grande favor para mim e para você mesma, e se beijem, não aguento mais ver aquele olhar no rosto do Wade. Aquele olhar que quer te beijar, e fazer coisas terríveis com você, mas tem tanto medo quanto você. Droga, sabemos que vocês se machucaram, mas vocês tem que tentar, porra!

Fiquei sem fala apenas fitando o céu. Não sabia muito o que responder depois daquilo. Acho que não existiam palavras ainda que dessem para responder aquilo, então eu apenas fiquei assentindo com a cabeça para ninguém em especial.

— Pegou ao menos o telefone dela? — Mudei subitamente de assunto de novo.

— Saia do meu carro agora. — Ele disse rindo.

— Boa Noite, Alex. — Sorri.

— Vou te levar café da manhã amanhã de novo, e te pego para jantarmos as oito.

— Mal posso esperar. — Disse piscando os olhinhos.

— Eu sei, Wade pode ser uma boa visão para os olhos, mas sabemos que eu sou mais.

— Cala a boca, Alex. — Eu me virei e entrei dentro do prédio.

Minha cabeça pesava e eu entrei no elevador, sentindo meu celular vibrar no bolso. Wade havia me mandando mensagens a noite inteira enquanto eu ainda estava com Alex. Peguei o celular e sorri antes de ler as palavras impressas na tela.

Sinto sua falta, e estou com ciúmes de Alex poder estar ai com você.”

Não consegui novamente esconder um sorriso.

Ainda bem que breve a gente se vê, e eu também sinto muito sua falta, Wade.”

☯☯☯

Sexta feira chegou me abraçando, acompanhado do conhecimento de que Wade chegaria na madrugada do outro dia. Eu simplesmente não conseguia me aguentar em cima das minhas pernas. Alex e eu tínhamos saído para almoçar aquele dia juntos em um restaurante que nenhum dos dois conhecia, e ele voltou a me falar de suas teorias entre Wade e eu, mas como sempre eu consegui desviar totalmente o assunto falando de algo totalmente nada a ver.

A tarde tinha voltado para a biblioteca e gastado todo meu tempo ouvindo Jéssica me contar sobre seu novo ficante. Eu queria simplesmente que o tempo acelerasse para que eu fosse embora logo, não que eu não quisesse escutar, o problema era que ela se envolvia muito em detalhes que eu realmente não queria saber. Detalhes um tanto pessoais que eu realmente queria poder enfiar algodão no ouvido e fugir, minha única válvula de escape era Wade que estava me contando que tinha ido ao supermercado com sua mãe e ouvido ela falar os benefícios de cada legume.

Um homem chegou com uma caixa de papelão e nos explicou novamente sobre a campanha do agasalho que eles sempre faziam todos os anos. Abri um sorriso para ele, e informei onde ele poderia colocar para que todos vissem e contribuíssem.

Vou pegar alguns casacos que você não usa no seu guarda-roupa hoje, okay?”

Você sabe quais são os casacos que eu não uso?”

Ponderei um pouco e percebi que eu não fazia a menor ideia.

Não? :)”

Pegue um verde água, não é difícil achar, ele fica pequeno, e um preto com marrom. Eles são únicos não vai ser difícil de achar.”

Okay”

Bem a noite entrei no prédio e fui direto para o elevador, sem cruzar olhares com ninguém. Minhas costas doíam um pouco, mas ignorei a dor, agradecendo por estar em casa. Tomei um banho rápido e me movi diretamente para o apartamento de Wade. Havia organizado ele aquela manhã junto com Alex, e me sentia orgulhosa do trabalho que havíamos feito.

Liguei para Alex para falar sobre os agasalhos, e o mandei trazer o jantar junto, ele riu da minha cara e disse que era para eu esperar sentada, então apenas dei de ombros e fui separar os de Wade. O guarda-roupa dele era mais organizado que o meu. Fileiras de calças, e blusas empilhadas perfeitamente como se ele soubesse exatamente onde ir com cada uma. Soltei um suspiro e encontrei as blusas que ele havia falado bem ao fundo do guarda-roupa. Havia outra. Uma preta com um desenho do Charlie Brown nela. Tentei entender o que ela estava fazendo ali, e a joguei na cama, faria ela de pijama.

Abri a porta do apartamento pronta para deixar as camisetas perto da minha pasta para não esquecê-las, e dei de cara com André parado na minha porta prestes a bater em minha porta. Seu corpo tampava toda ela e senti um frio no estômago de imediato. Ele se virou rapidamente, e encontrou meus olhos. Os olhos acinzentados golpearam meu estomago em cheio, e eu senti uma falta ar de imediata. Meu Deus, eu precisava sumir dali.

— Char?

A voz melodiosa

A voz que disse que me amava

Que eu era o amor de sua vida

A mesma voz que estava grudada no corpo do menino que havia me triado.

Respire Charlie, Respire, eu ficava dizendo para mim mesma.

— Char, você trocou de…

— O que está fazendo aqui, André? — Minha voz soou dura, petrificada, mortífera.

— Char, preci…

— Pare de me chamar assim. — Novamente dura.

— Ei... — Ele tentou me tocar, mas eu dei um passo para trás, entrando novamente no apartamento de Wade.

— Não me toque, não ouse me tocar. — Eu estava séria.

Os olhos dele pareceram receber uma dose de magoa, mas eu não liguei. Permaneceria dura nas minhas palavras, não queria que ele estivesse ali. Não agora. Não neste momento da minha vida.

— O que você quer? — Meu maxilar estava duro.

— Conversar.

A voz soou tão magoada que eu quase o trouxe para dentro e deixei que ele me contasse suas magoas, mas, de repente, minha lembrança trouxe Dani saindo da sua republica aquela manhã.

— Faça um favor, tanto para você, quanto para mim, e se mande daqui.

Eu esbarrei nele a abri a porta do meu apartamento. Infelizmente, ele me seguiu.

— Charlote, nós temos que conversar. — Ele parecia realmente persistente.

— Sobre o que você quer conversar? — Me virei e encarei os olhos dele. — Sobre o fato de você ter me traído com sua melhor amiga que também já tinha sido sua namorada, mas você nunca tinha me contado? Ou sobre o fato de você ter me pedido um tempo depois de eu ter ficado pelada em cima de você? Qual o melhor tópico?

— Char, olha só, eu e a Dani nos tínhamos esse negocio bem antes de você chegar. A gente continuou quando você estava longe, mas assim que você chegou a gente parou de vez. — Não engolia uma palavra que ele dizia. — Até, lembra quando você viajou para casa para a festa de aniversário da sua prima e…

— Oh meu Deus. — Coloquei a mão na boca.

Fora como levar vários socos no estômago, aquela tinha sido a pior viagem de todo mundo. Queria ter ficado no meu apartamento. Queria nunca ter saído do meu apartamento para voltar para casa, e André sabia. Sabia o que tinha acontecido, e mesmo assim tinha ficado com uma menina.

— Não acredito que transou com ela naquela noite.

— Nós não transamos, só nos beijamos, e aí as coisas começaram a ficar confusas, mas eu não sabia o que você estava passando, Char, eu nunca teria feito.

— Vá embora daqui, André. — Eu cuspi as palavras com ódio as lágrimas deslizando meus olhos. — Eu não acredito que você me traiu aquela noite, na noite em que… Meu Deus, some daqui. Eu não acredito que dentre todas as noites…

Ele veio até mim e traçou os braços envolta de mim. Meu corpo inteiro sentiu um súbito conforto, ao mesmo tempo que ódio. Queria deitar nos braços de alguém e chorar, mas não nos dele, os braços deles eram os últimos que eu queria envolta de mim naquele momento. Não queria sua pele perto da minha, nem queria aquele cheiro tão familiar, nem mesmo as lembranças que vinham me nocauteando lentamente. Não queria ele perto de mim nem por dois segundos pois isso fazia a falta que eu sentia dele voltar totalmente de onde quer que eu a tivesse escondido. Isso me fazia pensar que enquanto eu estava deitada em um chão sujo de hospital gritando e soluçando, deixando lágrimas espessas descerem meus olhos, ele estava beijando-a e abraçando-a como ele fazia comigo. Que enquanto eu mandava uma série de mensagens para ele sem resposta era porque ele estava ocupado demais para me responder. Meu Deus, como eu tinha sido estupida.

— Sai daqui. — Eu tentei empurrá-lo, mas ele era muito mais forte que eu. — Por favor, vá embora. — As lágrimas queimavam na minha garganta.

— Char, me desculpe, eu nunca, nunca mesmo…

— Não fala nada. — Eu gritei, me afastando dele o máximo que eu podia. — Meu Deus, André, aquela noite, dentre todas as noites.

Meus olhos eram as nascentes de um rio prontas para aflorarem.

— É para isso que você está aqui está noite? — Passei a mão fria e dura no rosto. — Para me machucar mais? Já não foi o bastante?

— Me desculpe. — Ele parecia prestes a chorar também.

— Charlie? — A voz de Alex soou tão clara que eu quis simplesmente agradecer a Deus.

Me afastei mais ainda de André e fui andando em passos pesados até Alex que passou os braços pelo meu ombro de uma forma protetora que realmente me senti grata. Quis apenas paralisar o momento e deitar em Alex, deixando que as lagrimas caissem pelo meu rosto sem nenhum problema.

— Que merda é essa? — Alex disse para André. — Você é o tal do André? Cara, some da vida dela.

— Quem é você? — A mão de André estava cerrada em um punho.

— Vai embora, André. — Eu disse rouca. — Você já fez estrago demais pra uma noite.

Engoli em seco, minha garganta ardia.

O olhar de André relaxou, e ele olhou para o teto antes de voltá-lo para mim. Eu conseguia ler aquele olhar. Um olhar de culpa e puro arrependimento. Eu sabia que tinha sido doloroso admitir o que ele havia me admitido, contudo, eu não estava nenhum pouco perto de perdoá-lo. Apenas sentia uma dor no meu coração, e só queria que ele fosse embora.

— Charlie… — Ele apertou a mão uma na outra. — Tem que saber que eu amo você, com todo meu coração e nunca quis te magoar. — Trocou os pesos das pernas. — Nunca teria feito o que fiz se soubesse o que tinha acontecido com a Mallu. Nunca mesmo.

Então ele citou o nome da Mallu. Meu estômago petrificou e o olhar de Alex deixou André para seguir o meu. Meus olhos estavam pesados de lágrimas e eu quis vomitar a bile que tentava escapar.

— Por favor, vá embora. — Eu disse por fim, e ele fez exatamente isso.

Deixei um soluço escapar pela minha garganta e me ajoelhei no chão do meu apartamento. Meu coração pesava tanto que era quase uma ancora me fixando ao chão e silenciando a voz de Alex. Eu não estava chorando por André. Não mesmo. Estava chorando pelas memórias que ele havia trazido a tona, por uma memória em especifico que ele sabia que eu não podia nem ouvir falar. Sobre um passado que ele havia trago a tona. Um passado que eu tentava enterrar por anos tentando me sentir melhor, e do nada ele se torna ainda pior.

— Ei, do que ele está falando? — Ele me trouxe para seus braços. — Vai ficar tudo bem, Charlie, vem aqui, só, respire fundo, ok?

E eu respirei, bem fundo, e depositei uma série de palavras em cima dele. Contei tudo. Tudo sobre aquela noite. Contei sobre cada detalhe que eu ocultava por anos. Contei tudo para o garoto que eu havia acabado de conhecer e tinha se tornado um dos meus melhores amigos, e a melhor parte? Eu me senti muito leve quando terminei.




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