O cara do apartamento ao lado escrita por choosefeelpeace


Capítulo 18
Capítulo 18




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Peter

A garota do apartamento ao lado dormiu comigo noite passada. É ainda inacreditável, porém delicioso saborear essas palavras no meu interior. Rach foi minha e apenas minha. Rach me preencheu de novas cores. Essa, foi uma das poucas noites que não precisei passar com várias garotas para tentar completar um vazio que sempre esteve lá, mas parece não estar aqui, hoje. Sinto meus lábios puxarem uma linha fina como um sorriso misturado à preguiça de alguém que acabara de acordar e tateio a cama, em busca dela.

Há lençóis vazios ao meu lado, então ela provavelmente foi fazer o café. Bocejo algumas vezes e salto da cama, para aproveitar antes que eu a perca — e que alguma garota acorde e me ligue, trazendo problemas. Escuto que a porta se abre e uma voz feminina ecoa pela sala. Não é Stacey. É... Um pesadelo? Pisco, algumas vezes, para checar se realmente estou acordado e tenho péssimas notícias para mim: estou. 

Eu reconheceria essa voz em qualquer lugar. Nicole. Minha ex. Meu sofrimento e decepção, a dona das maiores expectativas antes de Rach. Isso tem que ser um pesadelo!

Quando minhas pernas, finalmente, destravam e eu consigo me desfazer da imagem dessa garota me devolvendo o anel, me visto e parto para a sala. A porta está aberta, mas Rach não está, apenas Nicole. Ela continua a mesma. Os mesmos olhos cor de mel e a bochecha rosada, o mesmo sorriso forte e seu cabelo grande. A mesma beleza que me atraiu, mas eu não sou o mesmo e não sinto nada ao vê-la. Nada além da preocupação de onde está minha Rachel. Tenho certeza que sei a resposta.

 

— Você é lindo até quando acorda! Eu tinha esquecido disso... — Seu sorriso estava imenso e ela seguiu com um abraço, tentando me manter próximo, mantendo seus braços em meu pescoço.

— O que você quer aqui? — Toquei sua cintura, tentando afastá-la.

— Eu estou ótima, também! — Revirou os olhos, cruzando os braços.

— Onde está Rachel? O que você fez com ela? — Minha voz saiu alta e desconsertada.

— A garota descabelada? — Riu. — Não me deu satisfações, Peter. Ela é estranha e não faz mesmo seu tipo. Deve ser por isso que ela saiu correndo quando eu disse que era sua noiva.

— O que você não é há dois anos, desde que quis meu melhor amigo! — Gritei com toda a força dos meus pulmões. Isso não poderia estar acontecendo.

— Eu sei e eu me arrependo por isso! Me arrependo muito, ok? — Levou as mãos ao cabelo, parecendo estar em agonia. 

— Eu não quero saber. Não dou a mínima! Preciso ir atrás dela. — Caminhei breve até a porta.

— Meu Deus, a descabelada é a sua nova namorada? Como você decaiu... — Seu tom era irônico, mas subiu de repente. — Antes de você tentar recuperar a Cinderella, preciso te dizer que foi seu pai que me ligou e disse que precisava de nós.

— O quê?! — Bufei, com as mãos na cintura. — Ele só pode estar brincando comigo.

 

Meu pai é um importante assessor da Casa Branca. Rico, poderoso, teimoso, livre de temor e com muita pouca compaixão, inclusive comigo. Tudo o que importa são suas campanhas de voto e seus números. Se a felicidade alheia coincide com a dele, você tem um bônus e o direito de ser feliz, mas se não está dentro de seus planos, ele apenas sente muito. O engraçado é que comigo ele sempre "sente muito".

Ele provavelmente tenha um plano para mim sobre as eleições do final do ano, mas eu não consigo mesmo pensar nisso, agora. Não existe mais nada na minha cabeça além de Rach e do que ela possa estar sentindo. Dias atrás eu a vi sofrer pelo que Joshua fez por minha causa. Eu enxuguei suas lágrimas e não posso acreditar que lhe causei mais dor, porque sei que causei. Prometi um mundo repleto de cores e não consigo ver nada além de um cinza pálido e um dia congelado.

Abandono a casa, sem dar explicações e desço as escadas, com pressa. Seu perfume está por todo lugar e sei que ela esteve por aqui, sem ter a paciência de descobrir se o elevador está funcionando ou não. Se ela desceu tão depressa assim... Doeu mais do que pensei. 

Engulo em seco e levo as mãos à cabeça quando chego na portaria. Bob está varrendo e tento não atrapalhar, mas preciso de respostas.

 

— Rach passou por aqui? — Minha voz está nervosa.

— Sim. — Ele não deu a mínima para mim. Está bravo, é claro.

— Como ela estava? Faz tempo? — Arregalo os olhos.

— Como você acha que ela está, menino? — Olhou para mim, incrédulo. — Ela saiu, correndo. É tudo o que eu sei. 

— Obrigado. — Acenei com a cabeça e corri para a porta.

— Boa sorte com a sua noiva ou quem quer que essa seja. — Disse, sarcástico.

 

Eu sou incapaz de responder. Sei o que ele está pensando — que eu arquitetei isso de ter uma e na manhã seguinte ver a outra, mas não foi mesmo assim. Jamais pensei que veria Nicole, outra vez. Muito menos que meu próprio pai me obrigaria à isso.

Saio, desenfreado pelas ruas do bairro, mas o cheiro dela se perdeu e se misturou com o de muitas outras pessoas. Não é mais questão de cheiro e sim de instinto, então corro até o seu trabalho, para tentar a sorte. Ela não poderia estar em outro lugar. Não poderia, mas está, porque não a vejo ali. Corro até o balcão e Mark acena para a atendente, explicando que ele assumiria dali, o que era bom, já que ela estava com uma cara horrível para mim.

 

— Bom dia. — Ele parecia ser um cara descolado. Tinha uma camisa com estampa alegre por trás do avental, um brinco e cabelo afro bem cuidado. Apesar de parecer um cara tranquilo, estava tenso. 

— Bom dia. Rachel já chegou? — Olhei em volta outra vez, iludido.

— Dia livre dela. — Pegou um pano, esfregando-o no balcão. — Mais alguma coisa?

— Ela passou por aqui?

— Sim e já foi embora.

— Ela estava bem? — Que pergunta idiota. Ele me encarou e desviou o olhar.

— Próximo!

 

Rach não estava bem e isso partiu meu coração de várias maneiras, mais ainda por não saber onde ela poderia estar. Não sei tanto quanto gostaria sobre sua vida, mas sei que ela não teria lugar para ir, então olho em volta mais uma vez e volto para casa.

 

•••

 

Nicole segue aqui, apropriada do meu sofá, como se fosse a dona da casa. Lembro meu pai dizendo que nos daria um apartamento no Upper East Side, com certeza muito melhor que esse, mas sem esse casamento lucrativo, ele me jogou no primeiro lugar que encontrou. Na verdade, não fazia questão de muita coisa. Estava triste demais para pensar sobre questões fúteis e esse prédio foi logo o primeiro que encontrei na Internet.

Ela sorri para mim. Sorri como se nunca tivesse saído e me deixado. Como se fossemos as mesmas pessoas de anos atrás. Ela talvez seja, já eu...

 

— Encontrou sua garotinha? — Sentou-se.

— Não. — Essa palavra foi dolorosa.

— Bem, eu sinto muito, mas ela vai ficar bem. — Levou a mão ao largo cabelo. — Precisamos falar sobre nós.

— Não existe nós, Nicole, mas o que meu pai quer com essa aproximação?

— Seu pai vai fazer um evento em New York, amanhã, com o candidato dele. — Levantou e andou vagarosamente pela sala. — Ele me contou que você virou um playboy, mas também me contou do acordo que vocês tem, então você sabe que é melhor aceitar a proposta dele.

 

Droga, o acordo! 

Quando ela e eu nos separamos, eu quis morar sozinho e recomeçar a vida, mas como um jovem que detesta trabalhar teria dinheiro para se mudar? Foi então que meu pai teve a "brilhante" ideia de que ele me daria tudo e inclusive me bancaria, mas que eu prestasse favores e principalmente os eleitorais que ele me pedisse e isso é o que faço para ganhar a vida.

 

— O que ele quer, Nicole? — Cruzei os braços, com impaciência.

— Nikki! Eu não gosto quando me chama de Nicole... — Fingiu estar decepcionada, fazendo bico. — Enfim, meu pai também decidiu fazer parte da chapa eleitoral e com a entrevista que vão dar amanhã querem passar a pose de família tradicional, então querem que nos vejam de noivos, não é o máximo? Seu pai disse que não devíamos deixar um erro sexual no nosso caminho e acho que ele tem razão!

— Não, ele não tem! Não vê que estão fazendo um jogo conosco? — Gritei.

— Jogo ou não, eu não ligo. — Se aproximou e tocou meu peito. — Eu só sei que você tem que jogar o que ele quiser.

 

Eu me odeio por ser tão fraco e aceitar essa imposição. Por estar de mãos atadas e não ver uma solução. Se ele tivesse dito que eu precisava mostrar uma namorada, eu tinha uma. Ou eu quase tive uma.

Suspiro. Só me resta aceitar.

•••

 

Já faz mais de 24 horas que tudo aconteceu e Rach não voltou para casa. Eu praticamente não dormi e permaneci no sofá, a noite toda, pronto para qualquer barulho, mas não ouvi nada além de Stacey e Paul, os quais interroguei e pareceram tão surpresos quanto eu, mas a garota se propôs a procurar por ela mais à fundo — e eu sei que isso incluiria até que ela ligasse para o tal do Joshua, mas eu não me opus. O importante era achar Rachel, o que não aconteceu até então.

Pego o único terno que tenho e a camisa social que sobrou, escondida no canto do armário. Sorrio leve ao notar que ela levou minha outra camisa. Pelo menos a princesa me tem com ela de algum modo...

Faz tempo que não vejo meu pai, mas depois dessa manipulação, não consigo sentir saudades ou alívio em vê-lo. O único motivo que me faz sorrir, é ver Jessie no mesmo evento que eu. Apesar de absurdo e impossível, olho ao redor, procurando o rosto de Rach, mas ninguém e nada ali se compara à ela. É tudo vazio.

 

— Irmãozinho! — Jessie me recebeu com um grito tradicional, seguido de um abraço. Olhou Nicole e então me olhou. — Cadê a Rachel?

— Eu gostaria de saber o mesmo... — Acariciei seu braço, sentindo o olhar frio da minha acompanhante sobre nós.

— Você trouxe essa garota no lugar dela? Ou o papai fez um plano para você também? — Abaixou a voz.

— Como assim, também? Ele fez isso com você?

— Sim, me arrumou um namoro com Joshua Alexander... Pelo menos estava solteiro e é um gatinho.

— Você está com o ex da Rachel? — Cerrei o punho, lembrando de como esse cara foi um idiota.

— Sim, mas você estava com Rachel! E agora... Meu Deus.

 

Sei que Jessica estava com uma pontada de culpa, mas acabava sendo tão vítima das armações quanto eu. E isso me dava espaço para falar com ele sobre o sumiço da minha garota.

É claro que ele não estava envolvido, mas se propôs à procurá-la comigo, após o evento. Eu o odeio por fazê-la chorar, mas toda ajuda é bem vinda. Eu só preciso saber como e onde ela está.

Estou despedaçado, mas em cada flash e cada foto, tenho que provar o contrário.

Com o fim desse evento estúpido, Joshua, Jessie e eu saímos, por separado, atrás de Rachel, mas nenhuma pista de onde ela possa estar. Nem no trabalho estava. Ela não pode ter se mudado. Ou pior... Não pode ter voltado para Los Angeles!

Chego no prédio e subo, derrotado. O cheiro dela parece já não estar por parte nenhuma. Normal e diariamente eu quebro corações alheios e ligo bem pouco para isso, mas não é assim com ela. Desde que ela chegou, venho me comportando estranho e até me desconhecendo. Rach é diferente de todas as garotas que conheci e sabendo isso, quis guardar e proteger, mas dei vários foras e a perdi mais de uma vez.

A verdade é que ela não merece um cara como eu. Olhe pra mim, tão covarde e inútil. Nicole vai dormir aqui mais um dia e eu sequer neguei. Eu só penso em como deve estar Rach e não tenho forças para pensar em mais nada.

Estou sentado na porta de sua casa, tentando colocar meus pensamentos em dia. Esperando que ela apareça no fim da noite e que possamos conversar. Eu tenho muito à dizer, começando por pedir desculpas. Eu sei, sempre é o mesmo, mas só pedimos desculpas se realmente temos coragem para isso. E pelo menos para isso, sei que serei corajoso.

Isso não é tudo. Eu preciso que essa garota saiba que ela voltou à abrir um coração que eu duvidei que ainda existia. Ela e apenas ela foi capaz de entrar ali e permanecer, com a sua inocência, doçura e carisma. Rachel entra devagar na vida de alguém e conquista com aquele jeito despreocupado dela...

Eu sei que estou apaixonado e não é porque dormi com ela. Eu sempre estive. E agora que tudo parecia ir bem... Eu não sei o que fazer! 

Não sei sequer se vou ganhar um perdão por isso. O que eu vou fazer se for descartado outra vez, pela garota que amo? Não vou suportar... Eu não vou.

 

•••

 

Três dias do sumiço dela e eu não aguento mais. Chorei, bebi, gritei na sua porta e... Nada. Nada muda. Não encontramos Rachel em nenhum lugar. Eu praticamente estou morando no corredor do sétimo andar, na esperança de que ela apareça, mas é em vão. Ela me odeia muito e o pior é que eu mereço isso!

Já pensei em todas as possibilidades e essas apenas pioram. É possível que ela tenha viajado ou se mudado. Talvez tenha acontecido algo com ela. Não. Não!

Percebo que acabei pegando no sono, quando sinto algo semelhante à um chute no meu pé e mais alguns em seguida. Abro os olhos, rapidamente, na esperança que seja Rachel protestando para entrar em seu apartamento, mas é Stacey.

 

— Acorda. Está bêbado de novo? — Chutou, de leve, uma das garrafas e papéis amassados que me cercavam.

— Mais ou menos. — Minha voz ressoou mole e sonolenta, enquanto eu esfregava os olhos. — Diz que me acordou porque tem notícias dela.

— New Jersey. — Cruzou os braços.

— New Jersey? — Tentei me sentar melhor e olhar para ela, mesmo incomodado com a luz.

— Rachel tem um irmão lá, Carter, e foi vê-lo.

— Como soube disso?

— Descobri no Starbucks. E tenho o endereço, era o contato de emergência dela. — Deu de ombros.

— Como deram isso para você e viraram as costas para mim? — A pergunta foi tão óbvia que ela tombou a cabeça para um lado e revirou os olhos.

— Peter, duas coisas. Um, as pessoas não te dão as coisas só por você ser lindinho. E dois, eu sou a melhor amiga, tenho informações privilegiadas, apesar de que... — Coçou a cabeça. — Foi Paul quem conseguiu o endereço com os métodos dele. Enfim, vamos ou não? Vai ficar parado aí?

— Vamos? — Franzi a testa e me levantei. — Eu pensei que...

— Que eu ia te dar o endereço e você iria sozinho? — Riu, debochada. — Qual é, Peter, isso não é um filme. Não vai tocar música romântica no fim do capítulo.

— Tem razão... — Tentei dar um sorriso, ao lhe entregar a chave do meu carro. — Vamos, você dirige.

— É isso aí, eu mesma!

 

Em algumas horas estaremos frente a frente. Nicole já se foi, mas mesmo assim eu sei que ela ainda está entre nós. A dor demora um pouco para ser dissolvida e só o tempo pode tirar isso daí. 

Eu só espero que não tire os bons sentimentos dela por mim, porque o meu amor não para de crescer.

Eu preciso de você, princesa. 

Preciso das suas cores.


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