Gota a gota [HIATUS] escrita por Tamires Vargas


Capítulo 11
O que se aprende com a distância


Notas iniciais do capítulo

Yo!

Sei que vocês devem ter me xingado por meu sumiço. Então, povo nesse tempo passei por uma depressão, depois minha vida virou do avesso de forma positiva e eu me mudei para morar com meu noivo, com isso fiquei focada em fazer reforma na casa, comprar a mobília etc. Não escrevi nadinha durante isso, então quando a mudança finalmente aconteceu veio a fase de adaptação à vida nova e a falta de internet que foi resolvida faz pouco tempo.
Espero que continuem comigo. Estou de férias do trabalho e vou dar uma turbinada nas postagens. ^^
Obrigada a todos que passaram a acompanhar e aos que não desistiram.
Vou responder todos os comentários o mais rápido possível.
Bjs!♥



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Fugaku esquentava as sobras do jantar. Não era seu costume almoçar em casa, porém talvez assim esbarrasse com a esposa. Havia completado uma semana sem ela dormindo sob seu teto e as vezes que se encontraram neste período cabiam nos dedos de uma mão.

Ele sabia que Emi expulsava Mikoto todos os dias, mas esta a ignorava como se a anciã tivesse falado com o vento. A jovem só arredaria o pé da casa da avó quando o médico dissesse que não havia mais vestígios da pneumonia. Embora a saúde de Emi fosse invejável, uma doença merecia o cuidado necessário.

Fugaku comeu devagar vendo sua tática falhar de novo, sentindo-se estúpido por agir infantilmente. Apesar das derrotas, não havia cogitado ir à fonte em vez de esperar que ela chegasse a ele. Quando o assunto era Mikoto, o capitão desaparecia na sombra da inexperiência dos seus vinte e três anos.

— Mais quanto tempo isso vai durar? — resmungou engolindo uma porção de arroz e pela primeira vez prestando atenção em seu sabor. — Espero ter cozinhado mal por algum motivo porque se essa sempre foi minha comida... — Seus olhos correram ao ouvir o som da porta deslizando e permaneceram parados de expectativa.

— Fugaku? Não esperava vê-lo. — Mikoto disse indo em direção à geladeira e enchendo um copo com água. A pressa não a deixou perceber o olhar do marido seguindo seus passos e a surpresa desenhada em seu semblante. — Vim pegar uma muda de roupas.

— Outra?

— Hum? — Ela interrompeu o gole e o fitou inocentemente.

— Nada.

Mikoto compreendeu no mesmo instante, mas segurou as palavras. Não precisava dar explicações sobre a óbvia situação, porém uma parte de si imaginou se Fugaku não se sentia sozinho.

— O médico disse que deve levar um mês para ela se curar completamente.

Ele assentiu, continuando a encará-la. A compreensão e a insatisfação ocupavam igual espaço no interior de Fugaku, transparecendo no jeito que seus lábios se comprimiram por um segundo para impedir sua fala. Vendo que Mikoto não se mexera, levantou-se para lavar a louça e ficou ali, perdido de propósito enquanto ela subia as escadas.

Não demorou para que ele encontrasse uma desculpa para se dirigir ao segundo andar, no entanto o arrependimento veio na mesma velocidade. A bolsa de Mikoto comportava a metade de roupas de uma mala, porém trouxe uma sensação semelhante a do dia em que ela quase o deixou.

Fugaku empurrou a sensação em sua mente com palavras incisivas, mas após se espalhar derrotada, ela ressurgiu com uma forma diferente, carregando uma possibilidade não imaginada: talvez Mikoto estivesse partindo aos poucos. Com um dia a mais fora de casa, uma visita a menos, por um espaço de tempo menor do que o anterior, outra trouxa de roupas indo, nenhuma voltando... Sobraria algo dela até o fim do mês? Ela ainda se lembraria que era casada quando sua avó estivesse curada?

De repente, Emi parecia a desculpa perfeita para Mikoto ir embora sutilmente.

— Posso voltar para jantarmos juntos. — Ela murmurou em despedida.

— Sua avó pode ficar sozinha? — Fugaku questionou para alimentar a desconfiança.

— Ela vai adorar sentir a liberdade por algumas horas.

— Vou lhe esperar às sete.

Ele a fitou até a porta se fechar atrás de suas costas, em seguida abriu uma pequena fresta para acompanhar Mikoto andando pela rua. “A verdadeira despedida está por vir”, pensou sem questionar a certeza daquela frase.

A solidão era um preço que ele merecia pagar.

Emi olhou para a bolsa da neta como se fosse um insulto, arqueando a sobrancelha branca antes de puxar a conversa.

— Pensei que dormiria com seu marido.

— Enquanto estiver doente dormirei aqui.

— Ah, por favor, estou ótima! — retrucou um aceno desdenhoso. — Por acaso, está se aproveitando do meu estado para castigar Fugaku?

— Claro que não! — Mikoto franziu o cenho, relaxando ao refletir sobre a pergunta. — Mas acho que essa distância será boa. Ainda estou confusa sobre a minha decisão.

— Se arrependeu de ter dado uma chance a ele?

— Eu não pensei direito. Deixei a emoção me tomar.

— E o que há de errado? — disse Emi, suspirando diante do olhar incrédulo da neta. — Relacionamentos não são matemática. Não vai conseguir calcular a probabilidade de dar certo. Você só arrisca ou não.

— E se eu me arrisquei por algo que não tem chance?

— Está tão cega assim por ele?!

Mikoto se sobressaltou, mergulhando na pergunta assim que a surpresa se foi.

— Eu acho... Ah, vó, quando ele me abraçou minha convicção... — Tentou explicar com as mãos, mas nem elas lhe ajudaram a terminar a frase.

— Essa casa sempre estará aqui se você precisar. Não viva temendo as consequências de suas escolhas.

— E a minha avó?  

— Consigo lhe aturar mais uns anos. — Emi devolveu um sorriso. — Agora pare com essa covardia sem sentido e vá viver sua vida do jeito que quiser! Desde quando eu criei uma garota medrosa?

— Nunca. Mas amor não é minha especialidade.

— Você se acostumou a andar por onde é confortável. Nem sei como foi acabar casando com Fugaku. Deve ter sido um surto!

— Eu não sabia que seria tão complicado.

— Não me diga que achou que afogaria todos os problemas dele em seus braços?! — Emi refreou a fala diante do olhar raivoso da neta. Se deixasse a língua dar voz àquela linha de pensamento estariam discutindo no segundo seguinte.

— Ele não era tão fechado quando o conheci. — Mikoto se limitou enquanto controlava a raiva com um suspiro profundo.

— Fugaku era um garoto naquela época, ainda é, mas sem a liberdade para tal. A morte do pai e as imposições do clã o deixaram ferido e acuado... Ele só está agindo como qualquer animal faria.

Mikoto cruzou os braços afundando no futon.

— Não sei se sou uma boa adestradora — ironizou.

— A gente não sabe um monte de coisas até tentar. A questão é: você gosta dele a esse ponto? Se não, caia fora! Será tempo perdido para os dois.

— Tem razão! — Mikoto disse deitando de braços abertos. — Eu fiquei medrosa, tanto que pensei em desistir do jantar, porque não quero quebrar a cara. Por que... merda, como ele é difícil!

Emi gargalhou.

— Vá coloque pra fora! Pare de segurar a raiva e fingir que está tudo bem em engoli-la.

— Eu gosto do jeito calmo dele, mas às vezes ele parece uma parede fria. Alguns dias ele fala, no outro fica calado, às vezes isso muda de uma hora para outra. Na maior parte do tempo sei quando dá pra manter uma conversa, mas cansa ficar calculando se é viável ou não tentar conversar. Então, deixo-o começar, mas isso só dá certo quando ele quer saber alguma coisa. — Mikoto olhou de esguelha para Emi. — Não é idiota?

— Os começos são idiotas e atrapalhados. Seu avô não era bom em cortejar e eu tão cega que dava inveja às toupeiras, mas tivemos três filhos. — Deu de ombros. — Um dia essas bobagens serão histórias para os seus netos.

Mikoto relaxou, deixando a mente descansar nas palavras de Emi e deslizou para o mundo dos sonhos.

Fugaku esperava há vinte minutos. Fizera seu trabalho na metade do tempo habitual a fim de não perder hora e agora sofria com o inesperado atraso de Mikoto.

Ele se olhou no espelho avaliando sua aparência, sentindo-se estúpido pela forma que havia escolhido matar o tempo. Reparou em como ficava diferente sem o uniforme, mais parecido com alguém da sua idade do que com o homem que dava ordens quase a todo o momento.  Logo lembrou que não havia combinado nada além do horário e uma poeira de nervosismo nasceu dentro dele. Não saberia sugerir o que fazer, menos ainda como agir naquilo que se assemelhava a um encontro.

O relacionamento com Mikoto havia queimado várias etapas e até os dois chegarem ao mínimo da boa convivência muitos desgastes forçaram o débil laço que os unia. Talvez aquele encontro pudesse preencher alguma das lacunas ou, pelo menos, sobrepor-se ao mal estar causado por Fugaku. E apagar o passado conturbado era o que ele mais desejava.

— Você pode cortar. — A voz de Mikoto o paralisou por um segundo.

— Você demorou. Pensei que... — interrompeu-se voltando a tentar ajeitar a franja que teimava em ficar sobre os olhos.

— Eu tinha desistido. — Ela completou, fazendo com que ele duvidasse por um instante do tom da resposta.

— Emi poderia ter precisado de você.

— Pelo contrário, ela insistiu para eu passar a noite aqui — soltou, observando a expressão curiosa dele através do espelho. — Mas não vou. Não conseguiria dormir tranquila.

Fugaku aprovava o zelo de Mikoto por sua avó, no entanto sentia um fio de inveja por não possui alguém para se dedicar da mesma forma. Havia perdido sua mãe ainda menino e seu pai refutava cuidados mais do que Emi reclamava deles. Ele engoliu o amargor como se nada tivesse acontecido, contudo o modo que seus olhos rapidamente se desviaram para baixo deixou claro que o assunto demoraria a morrer.

Mikoto ignorou as pessoas ao redor quando passou ao lado do marido rumo à área reservada para eles. Embora o restaurante estivesse cheio não foi difícil tomar o lugar mais disputado do recinto. Fugaku apenas pediu uma mesa e num estalar de dedos estava se sentando diante dela.

A pouca luminosidade doava intimidade ao local. Os abajures possuíam o desenho de ramos de cerejeira e comportavam velas que expulsavam o aroma de orquídea negra. As paredes marrom escuro brilhavam como se tivessem recebido verniz há poucos minutos e combinavam com a mesa de madeira rodeada de futons carmim.

Fugaku ignorou a extravagância e sentou, analisando o menu. Seu olhar tentava se concentrar no que lia, mas corria para Mikoto a cada frase lida. O rosto dela nada lhe dizia embora o tempo que perdia observando o local certamente significasse algo. Foram precisos dois minutos para ela se desligar do ambiente e retribuir a atenção do marido.

— Não planejei isso. — Fugaku se apressou em dizer. — Mas não vi mal em aproveitar a... cortesia.

— Que é frequente devido ao seu cargo.

— Sim.

Mikoto se ajeitou no futon, espelhando o silêncio do marido ao escolher o prato. Tudo era elaborado demais para a simples intenção que havia ali, mas ela não queria questionar qualquer coisa no momento. Sem hesitar, optou pelo que primeiro saltara aos seus olhos e esperou até Fugaku exprimir sua escolha. Ele decidiu logo depois, tocando o sino dourado ao seu lado e em alguns minutos o ambiente voltou ao silêncio.

Fugaku evitou o contato visual, concentrando-se nas linhas da mesa, no entanto ao seguir uma delas viu que seu fim se encontrava debaixo da mão esquerda de Mikoto. Passou para outra e outra até concluir que todas corriam para o mesmo destino como se tivessem sido desenhadas para aquele propósito.

Por que havia sugerido o jantar? Era tão mais fácil comer em casa como sempre fizeram. O mesmo clima e as poucas frases ditas aqui e ali num padrão de cordialidade confortável, que apenas em mínimos momentos saía disso para algum assunto mais profundo, ainda assim nenhum deles girava especificamente sobre o relacionamento dos dois. Seria mais tranquilo estar sob o teto de sua cozinha do que entre paredes que exalavam uma sensualidade permissiva e confidente.

Ele sentiu os músculos se retesarem enquanto controlava a urgência que desejava inundá-lo. Havia uma obrigação imposta por aquele ambiente que prometia quebrar sua serenidade como se fosse inadmissível sair dali sem tomar uma atitude.

— Obrigada por quebrar a rotina. — Mikoto soltou sem se preocupar se ele entenderia.

Fugaku assentiu, mas estava claro, pela expressão de seu rosto, que não fazia a mínima ideia do significado por trás daquela frase.

O diálogo no jantar se deu em doses homeopáticas como era de costume por parte de Fugaku, contudo Mikoto falara menos do que ele recordava. Houve um par de tentativas de fazê-la falar um pouco mais, porém ela parecia distante e o silêncio perdurou durante o retorno para casa até Mikoto cessá-lo:

— Não precisa me acompanhar.

Fugaku diminuiu o ritmo enquanto assimilava a frase e a distância entre eles se tornava visível como a que havia se desenhado em sua mente horas antes. Logo a ingrata certeza repousou em seus pensamentos e os passos lentos se aceleraram para alcançar a mão de Mikoto.

Ela se esquivou por instinto, estranhando a urgência do toque e encarou o marido com uma pergunta no olhar.

— O que eu fiz? — Fugaku exprimiu ainda processando a forma que seu toque fora refutado.

— Nada. — Ela devolveu procurando no rosto dele o motivo para aquela atitude. — Só não há necessidade de você me acompanhar até a casa da minha avó. — A frase soou como uma explicação a uma criança.

Fugaku abriu a boca ensaiando a réplica, contudo a fechou ao perceber a aproximação de um grupo de pessoas. Viu-se obrigado a responder alguns cumprimentos que aumentaram a tensão e lhe doaram impaciência, porém quando a chance ressurgiu, esses sentimentos deram lugar a apenas um.

— Como seu marido pensei que gostaria da minha companhia.

— Eu gosto, mas silêncio por silêncio prefiro ficar sozinha. Obrigada mais uma vez.

A suavidade da voz dela fez da despedida uma ferida dormente e Fugaku só conseguiu seguir seu caminho depois de perder Mikoto de vista.


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Notas finais do capítulo

Escrevendo esse capítulo vi que nos outros a Miko estava meio melancólica e muito séria. Gostei de fazer o diálogo sério e ao mesmo tempo descontraído dela com a Emi. ^^
Quem ainda está aí? Fale comigo!
Bjs!♥



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