A garota corre pelo bosque escuro. Tudo o que consegue ouvir são as batidas de seu coração, mas tem plena consciência da pessoa atrás de si. Poderoso e maligno, sedento de seu sangue.

Seus cabelos ruivos voam com o vento da tempestade e caem em seu rosto delicado, manchado pela lama que se acumulara em algumas de suas quedas. Ao afastar as mechas naturalmente cor de fogo, lembra-se de outra ocasião em que alguém as afastara de seu rosto.

A jovem ruiva abriu os olhos para deparar-se com aqueles extraordinários olhos cinza. Seu anjo, seu amor. Aquele que a conhecia como mais ninguém no mundo.

— Bom dia. — Disse, com a voz arrastada de sono.

Ele lhe sorriu e afastou as mechas ruivas de seu rosto.

— Bom dia, minha garota.

Por um momento ela se perdeu na contemplação dos olhos cinzentos em contraste com o cabelo negro e desarrumado. Ele era simplesmente perfeito. Ela continuou deitada, vendo seus cabelos ruivos espalhados pelo peito nu de seu anjo.

— Espero que tenha conseguido dormir.

— Consegui, sim. Dessa vez, não tive pesadelos. —  Respondeu com um sorriso. O rapaz acariciou seu rosto.

— Acho que eu sei o motivo — Brincou, enquanto ela rolava o corpo por cima do dele para beija-lo.

A lembrança dói no peito da jovem ruiva. Não era para terminar assim. Os dois deviam encontrar-se naquela noite e fugir para um local seguro, onde finalmente poderiam ficar juntos.

Agora, lá está ela, correndo pela floresta, sabendo que está destinada a morrer. Onde está seu anjo agora? Por que não aparece e a salva?

A jovem ruiva não aguenta mais correr e tropeça em uma raiz. Dessa vez, não tem forças para se levantar.

[...]

A jovem finalmente sente um pouco de suas forças retornarem. Seus olhos se abrem devagar.

Está anoitecendo, e ela está deitada em um penhasco. Pode ouvir as ondas batendo nas rochas, metros abaixo. Um belo lugar para morrer, estranhamente pacífico, pensa. Sabe que não vai sobreviver. O demônio a perfurou, e jamais conseguirá recuperar-se desse ferimento.

Porém, o que mais dói é o ferimento em seu coração, sabendo que jamais verá seu anjo uma última vez. Contra o céu azul cada vez mais escuro, há uma sombra negra.

De repente, ele pousa ao seu lado. Apesar da dor e da fraqueza, a jovem ruiva consegue sorrir.

— Você me encontrou. — Seu sussurro é quase sem forças. O anjo afasta as mechas ruivas de seu rosto.

— Sempre.

Ela mantém os olhos fixos no rosto do amado, tentando memorizá-lo, guardá-lo consigo pelos últimos momentos de sua vida.

Ele a pega nos braços, fazendo toda a dor desaparecer, e beija suavemente seus lábios.

— Leve-me para longe.

Ele a obedece e alça voo sobre o mar. Ela sorri placidamente ao ouvir o som do oceano abaixo de si. No céu, a lua cheia brilha, banhando a terra em sua luz prateada. Uma brisa fresca sopra e a primeira estrela aparece no céu. Tudo está em paz. Ela apoia a cabeça no ombro de seu anjo e fecha os olhos para sempre.