Caderno de ideias escrita por Benihime


Capítulo 23
A Summer Promise




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Algumas histórias, por mais belas que sejam, são obviamente falsas. Outras histórias são tão incríveis que só podem ser verdade, por mais grotescas ou inexplicáveis que sejam. A minha é uma dessas.

Quando eu tinha 10 anos, meu pai morreu em uma explosão no laboratório de pesquisa em que trabalhava. Eu era jovem, e fiquei com raiva por aquilo ter acontecido. Foi uma época difícil. Mamãe estava devastada, e não aguentou. Naquele verão nos mudamos para morar com os pais dela, meus avós.

No começo, foi horrível. A cidade era pequena, cercada por um grande pântano e um lago. Eu passava a maior parte do dia sozinha, em longas caminhadas. Era maçante.

Não me lembro exatamente quando, mas um dia decidi ir ao pântano, pelo simples fato de que ainda não o tinha feito. Foi nesse dia que tudo mudou.

Se fechar os olhos, ainda posso vê-la: vestido azul-claro, pele de porcelana, olhos verde-água, descalça na beira do pântano com os cabelos loiros cacheados lhe caindo como fitas pelas costas, rindo em deleite com os peixinhos que nadavam a seus pés. Ela me fascinou, aquela garota, e passei a ir até lá todos os dias, esperando vê-la de novo. Passei a gostar de ficar lá, empoleirada nas árvores à beira do pântano.

Um dia, encontrei uma árvore maior do que todas as outras ao seu redor, e decidi escalá-la. Obtive sucesso a princípio, até um galho se partir sob minha mão. A queda não me feriu e eu estava prestes a levantar quando alguém se aproximou.

"Você está bem?" 

A voz era aguda, jovem, a voz de uma menina não muito mais velha do que eu. E eu sabia, mesmo sem olhar, exatamente quem havia falado.

"Estou" Respondi.

"Que bom! Venha cá, deixe eu te ajudar."

Uma mão se estendeu, e aceitei a ajuda. Ao erguer a cabeça, vi a garota de cabelos cor de ouro. Ela se apresentou como Marie e disse que estava ali procurando cogumelos comestíveis. Me ofereci para ajuda-la, e foi uma ótima tarde.

Depois desse dia, nos tornamos boas amigas. Marie impôs somente uma condição: eu não podia, em hipótese alguma, contar a alguém sobre ela. Sempre nos encontrávamos no pântano ou no bosque que o rodeava, sempre em segredo.

Essa condição foi fácil de manter, e Marie se tornou minha melhor amiga. Na verdade, a melhor amiga que eu já havia tido na vida. Nossa amizade durou quatro anos. Quando fiz quinze anos mamãe decidiu que eu passava tempo demais sozinha e me obrigou a sair com o filho de uma amiga sua, chamado Victor.

Preciso admitir, ele era incrível. Bonito, charmoso, inteligente ... Eu me apaixonei e, por algum tempo, esqueci completamente de Marie. Mas as grandes amizades deixam sua marca, e acabei por ir procura-la.

Ela estava no pântano como sempre, mas não parecia a mesma. Havia lama em seu rosto, nos cabelos e no vestido. Seus cachos dourados caíam em mechas desordenadas, emaranhados. Seus olhos estavam leitosos e as faces muito pálidas, sem cor.

"Isso é culpa sua" Sua voz era oca, tão sem vida quanto sua aparência "Por que me abandonou, Violet? Pensei que era minha amiga!'

E então ela desapareceu. Sumiu no ar, como se nunca houvesse estado ali. Me convenci de que aquilo fora uma alucinação, algo induzido pela culpa, e continuei a procurar por Marie. Na verdade, passei três meses procurando-a. No fim, eu estava quase doente de preocupação, e resolvi quebrar minha promessa. Vovó conhecia todo mundo na cidade então, depois de desenhar o melhor retrato que pude, resolvi perguntar a ela.

A resposta foi uma história sobre uma garota que morava em um casarão na outra margem do pântano. Ela morrera muito jovem, afogada no pântano que tanto amava, cerca de cinquenta anos atrás.

Eu não quis acreditar. Lembro de chorar e de correr para o pântano. Lembro de gritar por Marie. Lembro de procurar por ela até desmaiar de exaustão, e da sensação de afundar lentamente nas águas do pântano.

Não sei por quanto tempo fiquei lá. Só o que sei é que fui despertada ao amanhecer, quando os outros me encontraram. Eu estava fraca demais, e Victor me carregou. Enquanto nos afastávamos, vi Marie parada na beira do pântano, rindo com os peixes. Tinha a mesma aparência do dia em que nos conhecemos, uma garotinha novamente. Ela ergueu a cabeça, ainda sorrindo, e acenou para mim.

Não contei a ninguém sobre aquela noite. Disse a todos que não sabia, não lembrava. Mas eu sei. Sei que Marie me perdoou, e que ela me salvou naquela noite. Foi ela quem me tirou da água.

Volto ao pântano todos os anos, no aniversário do dia em que nos conhecemos. Nunca mais vi Marie mas, se ficar lá por tempo suficiente, posso ouvir sua risada.

É então que sorrio também, pois sei que ela sempre estará comigo e, um dia, estaremos juntas novamente.


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