Caderno de ideias escrita por Benihime


Capítulo 16
Anjo da Morte




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Entro no pequeno quarto com paredes brancas. A pouca luz me permite ver a garota deitada na cama. Minha próxima vítima.

Ela está deitada de lado, encolhida por causa do frio. A ponta de seu cobertor forma uma pequena bola, na qual ela está abraçada. Ajoelho-me perto dela para poder ver-lhe o rosto e o que vejo me faz ofegar. É a mulher mais bela que já vi!

Reparo no pingente em forma de coração prateado que pende entre seus seios e a mais pura emoção toma conta de mim. Giovana! A mesma garota que já vi tantas vezes, por quem tantas vezes me encantei. Recosto-me em sua cama, sendo seu hálito puro, e deixo-me levar por memórias do passado, das vezes em que fui atraído pela chama da alma dessa mulher ...

20 de agosto de 1999

Entro no pequeno quarto de hospital. Eu odeio colher almas de crianças recém-nascidas. Em momentos como esse, percebo quão tolo fui em ceder a uma paixão insensata e aceitar me tornar um monstro.

Minha pequena vitima está inquieta, mas sua jovem mãe dorme pesadamente. Me aproximo do leito sem fazer barulho e estou quase colhendo sua alma quando hesito. Não consigo. Ao invés de colher a alma da bebê, pouso minha mão em seu peito suavemente.

— O que a Morte pode tirar, também pode curar. — Sussurro.

Uma luz suave emana da palma de minha mão por um segundo e depois a respiração da pequena volta a ser estável. Segura.

Coloco a bebê de volta nos braços adormecidos da mãe, reparando em sua beleza. Será uma bela mulher, caso sobreviva. Cedendo a um impulso, deixo meus lábios tocarem sua testa antes de partir. 

08 de janeiro de 2010

Caminho pela praia, esperando que minha vítima apareça. Sim, eu sempre sei quando e onde uma morte vai acontecer. Todos os Anjos da Morte sabem.

Uma garota loira passa correndo por mim, seguida de perto por uma garota morena e bronzeada que imediatamente me faz ficar paralisado. Ela corre para a água e eu a sigo com os olhos, admirado com sua graciosidade.

 Fico esperando que emerja, mas ela não reaparece. Sem pensar em nada, corro para a água e mergulho atrás dela. Eis o motivo pelo qual ela não retornou à tona: Giovana mergulhou, bateu a cabeça e foi arrastada pela água até uma parte mais funda. Eu a pego em meus braços e levo-a para a praia. Uma mulher de cabelos cacheados vem correndo até nós, preocupada.

— Ela está bem, senhora. Só está inconsciente. — Digo, curvando-me para fazer uma respiração boca a boca nela.

Nesse momento, mal penso no fato de estar quase beijando-a. Só paro quando ela enfim abre os olhos e me fita, meio grogue.

 Afasto-me rapidamente pela praia, sentindo seus olhos cor de chocolate em mim durante todo o caminho. Quando enfim paro e me viro, vejo-a sentada perto da água, olhando para o local em que eu estivera antes.

Voltando ao presente, olho de novo para ela. Giovana aparenta algo em torno dos trinta anos de idade. Mal consigo acreditar que faz tanto tempo desde a última vez que a vi.

Suas pálpebras estremecem e vejo aqueles fantásticos olhos castanhos me encarando. São como buracos negros, puxando-me para si, prendendo-me com sua força.

— Lucien ... Você veio me buscar, não é?

Não pergunto como ela sabe, simplesmente aceito o fato. 

Não se eu puder evitar.

Ela senta-se na cama, ainda me encarando. Seus cabelos bagunçados caem em seu rosto. Ela é adorável.

— Estou morrendo, Lucien. — Sussurra — Você me deixou esperando tempo demais.

— Como ... ?

— Eu me lembro. No hospital quando eu era bebê, na praia, quando sofri aquele acidente de carro ... Você me salvou.

Tem razão. — Admito — Era eu. Sempre estive aqui.

— Mas por que? — Seus olhos brilham de lágrimas — Meus pais também estavam naquele carro. Por que só eu fui salva?

Porque você é especial.

Um longo silêncio se instala. Giovana encara o nada, mordendo o lábio inferior com força.

— Então ... Você é mesmo um Anjo da Morte? — Pergunta finalmente. 

Dessa vez sou eu quem não tem coragem de olhar para ela. Não quero ver o medo em seus olhos quando souber. Devagar, faço que sim com a cabeça e um pequeno milagre acontece: sinto suas mãos envolverem as minhas.

— Tome cuidado. — Diz suavemente — Não quero que se machuque.

Finalmente consigo olhar para ela e não vejo medo em seus olhos. Vejo apenas aceitação. Isso é mais do que um milagre, é um sonho.

— Não vou me machucar. — Garanto, entrelaçando meus dedos aos dela, desfrutando daquele calor.

Ela se inclina e encosta a cabeça em meu ombro. Solto suas mãos para poder abraça-la. Ficamos assim por um bom tempo, até ela erguer a cabeça e me olhar novamente nos olhos.

Palavras não são necessárias enquanto meus lábios encontram os dela. O beijo acontece naturalmente, assim como todo o resto.

*******************************************************

Acordo com Lucien ainda ao meu lado e sorrio. A noite passada não foi um sonho. Enquanto olho para ele, admirando a beleza daquele homem, ele abre os olhos e sorri.

— Bom dia. — Sua voz é um tanto rouca, e eu amo isso.

— Bom dia — Sorrio de volta.

Ele se inclina e me beija levemente. Aquele simples gesto me lembra da noite anterior, da chama que se acendeu entre nós, e também de que não tenho muito tempo.

Balançando a cabeça para expulsar esse pensamento, chego mais perto dele e o abraço. Lucien acaricia meu cabelo.

— O que foi, pequena? O que a está incomodando?

Fico surpresa com o fato de ele perceber, mas logo me recupero. Lucien e eu temos algo especial, uma ligação.

— Eu não tenho muito tempo, Lucien. A leucemia vai me levar.

— Não, não vai. Eu posso evitar que isso aconteça.

— Como?

— Tornando-a como eu: imortal.

— E o preço seria coletar almas?

— Claro que não. — Ele sorri e enrola os dedos em algumas mechas de meu cabelo — Eu jamais exigiria isso de você.

— Qual seria seu preço, então? O que eu precisaria fazer?

Ele me olha, os olhos brilhando de malícia.

— Você precisaria ... — sua mão livre ergue meu queixo, deixando-o na posição correta para mais um beijo. — Aturar um homem muito, muito apaixonado.

Não posso deixar de sorrir ante sua "condição". Exatamente o que eu teria pedido, mais cedo ou mais tarde. Pensando bem, percebo que ele está me oferecendo exatamente o que mais quero.

— Nesse caso eu só tenho uma coisa a dizer. — Fico por cima dele e distribuo beijos por seu rosto, terminando nos lábios. — Sim, sim, sim e sim.

— Pensei que diria só uma coisa.

Eu rio de sua provocação.

— Eu te amo. — Ouço-me dizer.

Ele sorri como um garotinho que acabou de acordar na manhã de Natal, como se tivesse ganho todos os presentes do mundo ao mesmo tempo, e em seguida sou deixada sem fôlego por um beijo exultante.

— E eu ... — Ele diz enfim, afastando-se mas me mantendo em seus braços — Te amo mais ainda. Esse é o começo da eternidade.

— Da nossa eternidade. 


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