Perturba-me escrita por Laila Gouveia


Capítulo 30
a escuridão de nossos corações


Notas iniciais do capítulo

PEÇO QUE LEIAM COM CALMA.
PEÇO QUE TODA(O)S COMENTEM.



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—Ele era... —A Blake encheu o peito, orgulhosa. —O melhor irmão do mundo... Nenhum anjo tem irmão. Nós fomos um milagre. Pelo menos era assim que Greta falava. —Seus olhos brilharam por segundos. —Sinto falta daquele tempo.

—Como vocês dois eram?

—Como nós três, éramos. —Ela corrigiu. —Eu, Bell e Greta.

::▬▬▬▬▬▬▬::

Ouvi minha mãe no andar debaixo. Ela gritava sobre algo de um reality show que sempre assistíamos. Ignorei seu chamado e encarei o celular: “Anjo da morte, lembra?”. Essa frase tinha pairado repetidas vezes, como um sussurro em meu ouvido. Meu corpo estava eletrizado. Levou um momento até minha mente voltar a funcionar. Apenas a possibilidade de algo ruim acontecer com eles, despertou um desespero e pânico simultâneo, fazendo-me agir por impulso.

Tranquei a porta do quarto, caso minha mãe decidisse checar minha presença. Não queria que ela soubesse da situação em que eu vivia já algum tempo, muito menos que envolvesse polícia nesse assunto. Só de pensar no assustador fato de que nada mais parecia seguir ritmo comum, e que Jasper e Monty não tinha ido ao destino programado.

Impedi que meu corpo tremesse novamente. Amarrei meu cabelo, vestindo logo em sequência um moletom. Não tive tempo de raciocinar, coloquei o celular no bolso e agarrei o estilete ainda manchado com o sangue negro.

Pular da janela era o único plano naquele minuto. Peguei um pano qualquer no armário, limpei o rosto com descaso após minha fuga cinematográfica. Pode ser insano, mas cair de uma altura considerável parecia normal para os Blake’s, porém, para mim, a queda foi um problema.

Massageei o tornozelo por alguns segundos e prossegui meu percurso mancando de leve. A janela do meu quarto, longe e solitária, bateu com a ventania como se aborrecida comigo, e algo dentro de mim pareceu tentar alertar de alguma coisa. Infelizmente eu estava surda para tudo que quisesse parar-me.

Meu carro estava na oficina depois do acidente, e a distância me pareceu a principio uma volta ao mundo. Ignorei a dor na perna e corri como uma maratonista.

A rua do meu bairro estava vazia, como sempre. As árvores chacoalhavam com um vento tempestuoso e sombrio que arrepiava meu braço e enchia meu coração de uma fobia estranha. Foi quando em meio à vastidão escura da floresta que cercava as ruas, uma neblina que rondava aos poucos revelou uma face mascarada. Os olhos cinzentos me encararam no meio do caminho e eu travei no mesmo instante.

O homem mascarado surgiu segurando uma faca ensanguentada. Caído aos seus pés estava o corpo do meu pai. Meu cérebro tentou reagir fazendo meus pés avançar, mas acabei lutando com o ar.

Infelizmente, o pesadelo das minhas noites de sono tinha se tornado, dessa vez, real!

Senti que minhas emoções entrariam novamente em colapso. Eu estava ali, presa num déjà vu, enquanto meu pai permanecia a poucos metros de mim. A figura sombria do mascarado continuava estática observando meus movimentos com ameaçadoras inclinações na cabeça. Então um grito ensurdecedor rasgou o ambiente, me fazendo cambalear e desabar displicente com os sentidos desconexos. Tampei o ouvido, perturbada. Com meu pulmão dando indícios que se fecharia a qualquer momento. Podia sentir uma pulsação nas têmporas. Estalos suaves ecoavam em meus ouvidos, e manchas negras apareceram diante dos meus olhos.

Tremi, desejando que meus comprimidos surgissem para que eu os tomasse. Não queria entrar em surto, não agora... Uma lágrima escorreu por minha bochecha. Encarei o chão esperando que a pequena gota o atingisse. Mas algo mágico mudou tudo.

Um floco de neve caiu lentamente do céu, até que a gravidade assumisse seu papel e o atraísse completamente até o seu limite, pousando singelamente na palma da minha mão.

Era o primeiro floco de neve em Coldwater.

O primeiro sinal.

Subitamente, esqueci o ataque de pânico em que me encontrava há poucos segundos atrás e sorri.

 

“—Aconteceu algo?

—Vai acontecer.

—O que vai acontecer?

—Neve.”

 

Bellamy tinha razão. Ele sempre tinha!

Abri os olhos, voltando a encarar a máscara. Totalmente contrária à sensatez, levantei-me confiante. Tirei do bolso o estilete e apontei, mesmo sabendo que a ameaça não seria proporcional ao tamanho da faca que ele segurava.

Aquilo que eu via, não passava de uma traiçoeira ilusão. Sabia que o homem mascarado não estaria ali desta forma. Isto é apenas para me assustar! Algo em mim se acendeu, dei um passo para frente e sem medo algum, falei:

—Você não conseguirá me impedir de salvá-los. —Minha voz entoou do mesmo modo como no discurso da formatura. —Nada vai me impedir!

Nunca havia corrido tanto. Deixei para trás apenas uma fumaça do que foi um homem ameaçador, e um corpo falso do pai que amei. O frio do inverno fora de época penetrou em minha pele, junto com pequenos e cristalinos flocos que tornaram minha alma contraditoriamente, fogo.

•••

Mesmo com clima iniciado, ainda assim suava. Ignorei os avisos desesperados do zelador do prédio, e como minha pressa era tamanha, não consegui esperar pelo elevador. Subi as escadas afoita, até chegar ao piso do andar.

—Você está querendo morrer?! —Raven abriu a porta gritando, após as incessantes batidas que eu dera. Mas sua expressão mudou de raiva para surpresa quando se deparou comigo.

—Cadê ele? —Falei ofegante.

—Ei! Ei! —Ela colocou-se em frente e bloqueou minha entrada. —Qual o seu problema? Sabe que horas são?

—Não. —Respondi categórica.

—São dez e meia da noite! Não tem como você ter perdido o caminho de casa, porque eu a deixei lá.

—Preciso falar com ele. —Disse sem dar importância ao seu argumento. E adentrei, empurrando-a.

—Eles estão dormindo. —Ela falou irritada. —Demorou muito pros dois se acertarem. Estão exaustos.

—Eu preciso dele! —Exclamei um pouco alto, sentindo que explodiria.

—Senhorita me perdoe. —O zelador intrometeu-se pela porta. —Esta moça entrou de repente, eu tentei segura-la, mas...

—Está tudo bem. —A voz grossa permeou em meus ouvidos, fazendo-me virar aliviada.

—Ah sim, desculpe. —O senhor fez um gesto com a cabeça, aparentemente envergonhado com a presença alfa que apareceu na sala. —Eu vou descer. Perdoe mais uma vez. —Dito isso, saiu.

Eu tinha depositado toda minha atenção em Bellamy. Ele estava com a mesma calça de manhã, mas não usava nada na parte de cima. Sua expressão de seriedade fez-me recordar sobre a situação com a Blake mais nova.

—Você sabe que noite é esta. Não deveria estar aqui. —Pronunciou-se.

—Não diga que veio se despedir. —Raven falou, pronta para revirar os olhos.

—Não vim me despedir. —Engoli em seco, sentindo meus olhos arderem.

—O que aconteceu? —O moreno soou mais sério.

—Acho que estão em perigo. —Minha voz, por pouco, não saiu.

Bellamy avançou o espaço entre nós e colocou as mãos em meu rosto. Descendo com o polegar em minhas bochechas. Seu toque trouxe-me mais segurança.

—Alguém lhe machucou? —Perguntou preocupado. —Fizeram algo?

—Não... Não... —Sussurrei.

Um fio invisível parecia ligar as orbes negras que não desgrudavam da minha face, - provavelmente péssima-.

—Lexa me ligou. Ela disse que está com Jasper e Monty na escola...

—Não acredito que aquela vaca esta fazendo isto. —Raven interrompeu.

—Tenho que ir lá. —Continuei. —Tenho que fazer algo.

—Fique onde está. —O Blake parecia ter adivinhado algo pior do que eu mesma especulava. Em instantes ele voltou do corredor vestido com sua jaqueta. —Me dê às chaves do carro. —Estendeu a mão para a morena, num gesto de ordem.

—São quase onze horas. —Ela depositou a chave na palma da mão dele. —Não pode sair este horário.

—Tem certeza que era ela? —Ele perguntou direcionado a mim, ignorando totalmente o aviso da amiga.

—Era a voz dela. —Afirmei.

—Vou deixá-la em casa com sua mãe. —Seu tom foi brusco.

—Não. —Falei confiante. —Eles são tudo pra mim, Bellamy. Não posso perdê-los também. Eu irei! Com você, ou não.

—Aquela naja com asas não deveria ter sequestrado o segundo melhor jogador de Street Fighter.—A morena fechou o zíper se sua jaqueta vermelha e nos encarou com determinação. —Vamos acabar com ela.

Olhei-a com um pingo de raiva brotando em mim. Não tinha gostado nem um pouco da forma com que ela chamara Lexa.

—Você vai ficar aqui. —Bellamy disse impassível.

—O quê? —Ela abriu a boca. —Nem pensar! Eu vou desconfigurá-la não só pelos nerds, mas também por tudo que ela fez com você.

—Não. Octavia está dormindo, você vai ficar aqui.

—Eu já disse que não estou sendo paga pra ser babá. —Caiu no sofá cruzando os braços, nervosa.

—Não irei me concentrar se ficar eu preocupado com ela aqui sozinha. —Ele finalmente a olhou, expressando o pouco de afeto existente entre ambos. —Talvez não dê tempo de voltar... Preciso que cuide dela pra mim. Eu só confio em você.

Mesmo contra vontade, Raven cedeu uma concordância no olhar.

•••

—Lexa está esperando por mim. —Falei durante o caminho.

Estávamos dentro do Jeep Commander em direção da escola em toda velocidade.

—Se eu deixar que venha comigo, você irá me obedecer?

—V-vou. —Acabei hesitando.

—Se eu disser para correr? —Ele não perecia estar brincando.

—Vou correr.

—Se eu disser para ficar dentro do carro?

—Mas...

—O mesmo que disse pra ela, vale pra você. —Repreendeu.

Fiquei em silêncio. Bellamy dirigiu pelas ruas escuras e silenciosas da cidade. Eu observava a neve que continuava preenchendo as guias. Não demorou em chegar à escola. Estacionou no leste do prédio e desligou o motor. O terreno era coberto de árvores, com galhos retorcidos e sinistros que nada sustentavam além da neblina. Atrás deles, erguia-se o colégio.

—Estou com um pressentimento muito ruim. —Falei, olhando para as janelas.

—Fique aqui dentro. Trave as portas. E tente ficar escondida. —Ele entregou as chaves para mim. —Se alguém diferente sair da escola vá embora.

—Bellamy. —Falei baixo. —Só... Tenha cuidado.

Ele assentiu ainda sério.

O Blake abriu a porta do carro, mas antes que pudesse sair, eu inesperadamente segurei seu braço. Não sabia ao certo porque tinha feito isso, mas resolvi não ir contra meus sentimentos. Não enquanto estivéssemos nesta situação. Então selei meus lábios nos seus. Era como uma troca de segredos. Uma troca de boa sorte. Foi como se minha alma se declarasse frágil, mas ao mesmo tempo inteira.

“Eu já disse que isto é nojento?” A voz da consciência praticamente berrou.

Ignorei, e observei-o sair. Com o cabelo negro e a pele morena, ficava difícil distingui-lo. O Blake atravessou a rua e momentos depois se fundiu completamente com a noite.

...

Cinco minutos se passaram. Dez minutos se transformaram em vinte. Lutei para ignorar a sensação aterrorizante de estar sendo vigiada. Observei a escuridão que envolvia a escola.

Por que ele estava demorando tanto? Procurei desenvolver algumas teorias, sentindo-me mais inquieta a cada segundo. E se Bellamy não conseguisse encontrar eles? O que aconteceria se ele encontrasse Lexa?

O celular tocou dentro do meu bolso, fazendo-me assustar.

—Estou vendo você. —Disse a voz feminina quando atendi. —Está sentada no carro.

—Onde você está? —Perguntei tremendo.

—Estou vendo você de uma das janelas do segundo andar. Jasper e Monty estão brincando comigo.

—Pede pra eles vir aqui. Eu quero vê-los.

—Sabe que não posso. Nossa brincadeira está bem divertida. Vem, Clarke.

Ela desligou.

Com o coração na garganta e totalmente irracional, saltei do carro. Olhei para as janelas escuras do colégio. Não achava que Lexa soubesse que o Blake estava lá dentro. A voz dela parecia impaciente, ela não estava zangada nem irritada. Minha única esperança era que ele tivesse um plano e não deixasse que nada acontecesse com os meninos.

Uma nuvem escondeu a lua. Sob a sombra do medo, caminhei para a porta ala leste. Mergulhei na semiescuridão. Meus olhos levaram vários segundos para distinguir uma faixa de luz que vinha da rua, que atravessava o vidro na metade superior da porta. A cerâmica do piso refletiu um brilho fosco. Os armários estavam alinhados nos dois lados do corredor como se fossem sonolentos soldados robôs. Nunca imaginei que voltaria para a escola, pelo menos não tão cedo após meu adeus.

Em vez de uma sensação de paz e tranquilidade, os corredores vazios irradiavam ameaças ocultas. As luzes externas iluminavam alguns metros da passagem, mas depois disso eu não conseguia ver mais nada. Perto da porta, havia uma série de interruptores. Liguei todos, mas nada aconteceu.

Fiquei imaginando se isso era parte do plano dela. Eu não podia ver ninguém. Precisaria tatear de sala em sala pela escola, em um lento jogo de eliminação, até encontra-los.

Guiei-me pela parede e me arrastei pela frente. Já tinha caminhado mais da metade do corredor térreo até ouvir um som baixo. Olhei rapidamente para a porta ao meu lado. Mesmo com meu coração palpitando de temor, girei a maçaneta lentamente. Encontrei o armário do zelador, cheio de vassouras, rodos, panos e produtos de limpeza. Forcei minha visão outra vez até descobrir o dono dos murmúrios abafados.

Maya estava encolhida no canto, ela usava um curto vestido branco que transparecia seu biquíni por baixo. Suas mãos estavam amarradas junto com seus pés. Ela arregalou os olhos quando me viu. Sem demora, agachei-me e tirei a fita que cobria sua boca.

—Você está bem? —Perguntei afoita.

—Alguém me bateu na cabeça. —Lágrimas desesperada escorriam por sua face vermelha.

—Onde Jasper e Monty estão?

—Não sei... —Soluçou. —Nós estávamos no carro. Eu liguei pro meu pai dizendo que iriamos chegar logo, depois disso não me lembro de mais nada.

Comecei a desamarra-la.

—Segure minha mão. —Estendi o braço, ajudando-a a levantar. —Você sente alguma coisa?

—Estou com medo. —Revelou, secando as lágrimas.

—Precisamos sair daqui. —A conduzi para fora da pequena sala.

—Acho que estou cega. —Ela praticamente gritou.

—Shhh. —Sinalizei para que ficasse em silêncio. —Estamos na escola. Está tudo escuro. Eu também não estou enxergando.

De repente, um vulto me fez dar um pulo. Antes que eu pudesse gritar, uma mão tapou minha boca.

—O que você está fazendo aqui dentro? —Bellamy sussurrou.

—Lexa me pediu para entrar. Ela está com eles. —Respondi baixo, assim que ele nos soltou.

—Você não tem noção do que está acontecen... —O Blake interrompeu sua própria frase e caiu de joelhos no chão. Seu corpo começou a suar.

—Bellamy. —Tentei abaixar, mas ele indicou para eu não me mover. E então, lentamente levantou, fazendo uma expressão igual à noite passada em meu quarto. —Que horas são? —Ele encarou Maya, que carregava um delicado relógio de pulso.

—Onze e dez. —Ela disse, levantando o braço tremendo.

O moreno secou o suor de sua testa e torceu os lábios, expressando incômodo.

—Não quero que vá embora. —Falei abalada por imaginá-lo desaparecer em breves minutos.

—Tenho que te levar pra casa antes que dê meia noite. Você tem que estar em segurança.

—Por favor, não. Eles ainda estão aqui. Salve-os, por favor. Por mim... —As lágrimas estavam querendo surgir.

Bellamy refletiu alguns segundos.

—Eu vou tira-los daqui. Mas vocês duas irão sair por aquela porta e se trancarem no carro. —Não soou como suplica.

—Obrigada. —Sussurrei chorando. A verdade era que eu queria dizer algo mais, só que não parecia ser o momento para isso.

Como se a lua obedecesse ele, uma suave claridade estendeu-se pelo corredor entre as janelas. Apresentando a porta no final, por onde eu havia entrado.

—Ela disse algo sobre estarem no segundo andar. —Alertei.

Com um ligeiro aceno de concordância, o Blake sumiu magicamente, como um espírito.

Maya encolheu os ombros e começou a tremer.

—Como? Como ele...? —Ela colocou a mão na cabeça. —O que está acontecendo?

—Não tenho tempo pra explicar. Bellamy vai resgatar os meninos e a gente vai voltar em segurança. Só precisamos correr até aquela porta em silêncio, ok?

Segurei sua mão, e estendi o estilete com a outra. Ela seguiu meu ritmo em passos rápidos e silenciosos. Quando estávamos no meio do corredor, - a poucos metros da porta entreaberta-, as luzes começaram a piscar.

—Clarke! —Maya gritou assim que Lexa apareceu um pouco à frente segurando um revólver. —Meu Deus... Meu Deus... —Repetia desesperada, escorada no armário, totalmente estática com o pânico.

—Está fugindo de mim? —A voz da castanha não parecia igual. Tinha algo inexplicavelmente diferente.

—Lexa. —Falei, tentando manter-me segura. —O que está fazendo?

Um pequeno fecho de luz surgiu em seu corpo, fazendo com que eu enfim visse seu rosto.

Meu coração acelerou quando enxerguei seus olhos. Não era mais as intrigantes e lindas orbitas verdes que enfeitavam sua face, e sim um vermelho brilhante assustador.

—Você fugiu de mim, porque não sou ele. Não é?

—Eu... E-eu —Gaguejei.

—Mostrei a você o quanto perigoso ele é. Mostrei as inúmeras vezes que ele tentou matá-la. Mostrei o que sinto. Mostrei, mostrei, mostrei... E então você se deitou com seu assassino. —Ela falava ereta e robótica.

—Não. —Disse automaticamente.

—Como ousa mentir pra mim? —Seu grito ecoou por toda a escola vazia, o que me fez temer seu estado ainda mais.

—Eu não fiz nada. Não fiz...

—Você me considera tola? —Questionou ameaçadoramente.

—Nunca a considerei tola. —Respirei fundo. Ouvindo minha voz soar baixa e vacilante. Eu era tomada por uma culpa interna, quase como se uma vontade inesperada de chorar surgisse. —Não me deitei com ele. Não sei o que aconteceu, mas não fiz isso. Eu juro!

“Não tem que se explicar. Sabe que não foi você.”

Era como se aquela vozinha sussurrasse, me dizendo que eu não precisava sentir aquilo. Que eu não estava errada.

—Fiz de tudo para protegê-la. Pela primeira vez, eu não era mais um monstro que tira a vida das pessoas. Que as faz chorar... Eu era um anjo da guarda, e me senti bem assim. —Divagou observando o nada.

—E você é! —Dei um passo para frente, diminuindo nossa distância. —Lexa, pare com tudo isso.

—Meu nome não é Lexa!! —Novamente o grito dela ecoou por todo o espaço, dessa vez, fazendo com que os vidros das janelas quebrassem.

Fiquei agachada, protegendo-me dos cacos. Fiz um grande esforço interno, levantando-me e avançando outro passo, tentando criar coragem e impedir que algo mais acontecesse.

—Você me disse que a Greta de anos atrás ficou no passado. Que a garota que eu conheci e amo, se chama Lexa. Vou chama-la assim pra sempre, porque sei que ter sequestrado os três não a faz um monstro. Você não é esta que clama por vingança, sei que não é.

—Você me beijou. —A castanha disse perdida em pensamentos.

—Eu me afastei. Fui eu! Fiz você se afastar de mim, e  me odeio por isto. —Eu sabia que ela sentia a mesma amargura. Eu a machuquei e agora ela queria me machucar. Estamos nos ferindo mutuamente, e isso era como se o meu coração estivesse novamente se despedaçando.

—Você não quis me beijar de verdade. Porque não sou ele. —Ela fechou os olhos, sem esperar que eu continuasse. E lá estavam as barreiras erguidas entre nós mais uma vez.

De repente, um vento invadiu o corredor, fazendo meu cabelo balançar.

“Sabe que nunca será eu, Greta.”

A voz aparentemente tranquila do Blake adentrou em nossos ouvidos.

—Vou matá-lo, Bellamy. —Ela apontou a arma, tentando encontrar o dono das palavras.

“Sabe que não pode fazer isso.”

—Eu fui sua amiga de verdade, mas você nunca se importou comigo. Eu vivia ao lado do seu egoísmo. Você me deixou... —Os olhos vermelhos encontraram os meus, e um sorriso assustador fez-se em seus lábios. —Abandonou minha amizade por Victoria. Sua amada Victoria. Mas ela não o quis. —Lexa iniciou uma risada perturbadora. —O mundo deu voltas, e você foi abandonado assim como eu.

“Sempre irá me invejar”

Ele continuava.

—Eu o odeio! —Ela berrava descontrolada, movendo a arma. —Sempre foi você! O único a receber uma irmã. O único a ser perdoado por todos os pecados. Você sabe o que sinto pela Clarke, e mesmo assim a roubou de mim. —Lexa olhou-me confiante. —Mas não dessa vez! Não vai ganhar de novo.

“Greta, Greta, Greta”

Ele pirraçava. E eu não estava gostando disto.

—Vou tirar toda sua felicidade. Cada motivo que o faz feliz. —Por que aquelas palavras não pareciam ser dela?

“Encontrei seus amigos. Saia daí agora.” O sussurro dessa vez tinha sido para mim. Somente para mim. Bellamy estava enrolando Lexa e monopolizando o seu tempo.

Porém, esse tempo não me ajudou.

Um milésimo de segundo, e os braços do Blake abraçaram-me por trás. Um milésimo de segundo e ele desapareceu. Assim como milésimos de segundos em que o assaltante atirou na cabeça do meu pai. Este milésimo não foi diferente.

—Achei você. —Lexa falou sorrindo, enquanto uma puxada no gatilho tornou-se real.

A fumaça seguida por pólvora abriu espaço para a bala disparar e meus olhos captaram em câmera lenta.

Fiquei paralisada.

Não consegui dizer nada até minha mão descer em meu peito. Ao contrário do que esperei, não senti algo atravessar meu corpo. Involuntariamente uma lágrima de alívio escorreu por meu rosto, e cada músculo tremeu desconhecido pelo pavor.

Olhei para Lexa com a boca aberta, e sua expressão fez-me surpresa. O barulho seguinte foi do revólver caindo no chão. Os olhos dela tornaram-se verde esmeralda, e uma cintilante lágrima escorreu por sua bochecha igual a mim. Aquela era a garota que eu conhecia. E ela não conseguia ter ideia do que acabara de fazer.

Lentamente segui seu olhar abalado, virei-me ouvindo meu coração soar como tambores. As descargas elétricas que corriam por cada célula, cessaram.

O pequeno vestido praiano estava embebido por sangue. As mãos saíram displicentes de um furo quase imperceptível do tecido. Encarou-me com dor, até suas pernas não suportarem o peso e fazê-la tombar.

Uma poça escura tornou-se consequência do tiro mortal.  O mesmo chão que ganhou passos de alunos risonhos, recebera Maya em sua queda inconsciente.

 


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Notas finais do capítulo

(T-T)



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