Perturba-me escrita por Laila Gouveia


Capítulo 29
quando pequei também amei


Notas iniciais do capítulo

Sei que demorei...
Vacilo...
Mas vejam pelo lado bom, como podem notar, eu não morri.
Enfim, preparem-se para o próximo cap, viu?. Realmente preparem-se!



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Subi as escadas demonstrando um desespero ausente em Bellamy, que ao invés de parecer preocupado, mantinha uma expressão de raiva. Octavia foi carregada pelos braços fortes do irmão até o sexto andar. Paramos em frente à porta e não foi preciso que ele pedisse. Rapidamente peguei o molho de chaves em seu bolso, e abri dando espaço para que eles passassem e adentrassem no apartamento.

Enquanto ele caminhava pelo curto corredor, olhei ligeiramente para o quarto com a porta aberta que trouxe lembranças ainda frescas em minha mente: A cama que conheci sem cuidado, pingos de sangue no lençol, a cômoda bagunçada devido aos empurrões... Acabei analisando com mais atenção por todo canto o que eu não tinha sequer reparado no dia após o acidente, e, estranhamente, o apartamento dele era comum demais para minha imaginação.

O Blake colocou ela deitada de barriga para baixo na cama do outro quarto no fim do corredor, cujo cômodo era menor. A morena se contorcia de dor.

—Pensei que não sentissem... —Falei depois alguns segundos dividindo olhares na direção de ambos.

—O único momento que sentimos dor, é quando perdemos nossas asas. —Ele esclareceu a primeira duvida instalada assim que a vi. Mas a sua voz transmitiu um abalo com a afirmação.

Antes que eu fizesse outra pergunta, Octavia gritou em meio às lágrimas. Não consegui me conter e no mesmo momento sentei ao seu lado na cama, levantando a regata. Deixei sua cicatriz ensanguentada novamente exposta.

—Preciso de um pano úmido. —Avisei, tentando não chorar junto com ela.

Os dezessete anos vividos ao lado de minha mãe, proporcionou a mim um básico conhecimento médico. Nunca tinha agido em necessidades como esta, mas o sofrimento da Blake, -mesmo que não solicitado-, implorava por um mínimo cuidado antes que qualquer profissional a ajudasse.

—Não vai adiantar. —Bellamy suspirava completamente frustrado.

—Você precisa ligar para emergência! —Sequei as lágrimas que começavam surgir.

—E o que você acha que eu vou dizer pros médicos?... Diga-me como?... —Ele andou até a janela e encarou o muro extenso do prédio ao lado. —Como vou explicar o fato de ela não ter coração? Ou sobre o sangue preto que escorre de suas costas...

—Olha só pra ela! —Exclamei aflita. —Quem pôde fazer isso?

—Ninguém mais poderia ter feito isso, além dela mesma. —Era nítido o quão revoltado e nervoso ele estava. Mas não foram suficientes as palavras, o moreno pegou a primeira coisa que viu, e jogou com uma força assustadora na parede. O objeto escolhido era de vidro, consequentemente os cacos espalharam-se e voaram por todo quarto, me fazendo encolher e Octavia ficar em silêncio arregalando os olhos.

—O. —Falei melancólica. —Tá tudo bem... Estamos aqui. —Segurei sua mão tentando transmitir conforto, ou pelo menos aliviar um pouco que seja do seu desespero.

—Desculpa... —Ela soltou aos prantos.

—Não precisa se desculpar. —Soei calma.

—Por favor, me desculpa. —Foi aí que percebi que o pedido era para ele, amargamente envolto de um arrependimento sincero.

—Por que fez isso com você? —Bellamy por fim falou, mexendo em seu cabelo angustiado. —Por que fez isso comigo?

—Bell... —A Blake soluçou e virou o rosto na direção dele.

—Fiz de tudo para que não cometesse o mesmo erro! —A voz dele alcançava umas boas oitavas.

—Me desculpa. —Ela parecia apenas conseguir dizer isto.

—O que você fez? —Disse friamente.

—Eu não queria...

—DIGA!!! —O grito dele me fez perceber o quão intrusa estava naquele momento.

A morena iniciou um choro digno de pena. Seus olhos transbordavam lágrimas, seu rosto ganhara a tonalidade vermelha, e as veias de sua testa pareciam que explodiriam. Mas nada disso abalou ele, muito pelo contrário, sua raiva transparecia nas órbitas negras.

—Durante todos esses dias eu fugi para o fliperama à tarde, porque sabia que você só estaria lá de noite... Ele jogou comigo. Foi divertido... Eu estava feliz por estar fazendo um amigo sem ajuda de ninguém.

—Quem? —Inquisidou.

—Foi sem querer...

—Octavia! —O Blake perguntou cerrando o punho. Apertando tanto suas mãos que a borda dos dedos ficaram brancos.

—Eu fiquei todo esse tempo aqui e você sequer me olhava. Você me ignorou.

—QUEM FOI?

—Lincoln!!! —Berrou.

Paralisamos perplexos, mas a Blake continuou.

—Eu o beijei antes de voltar ao céu e ser expulsa. —Ela parecia transtornada diante da revelação.

Bellamy fitou o chão por um minuto contado. Quando seus olhos voltaram para a irmã, uma transmissão assustadora que jamais presenciei surgiu em sua expressão.

—Eu vou matar ele.

—Não!!!!! —Antes mesmo que o Blake desse um passo em direção à porta, Octavia se jogou da cama e arrastou-se no chão até grudar em suas pernas. —Por favor, Bell.

—Eu confiei nele. Confiei em você...

—Lincoln não tem culpa. Por favor! Ele não sabe o que somos. Ele não poderia saber o que aconteceria comigo.

—Mas você sempre soube!!!

—Diz pra ele, Clarke. Você disse que eu devia me despedir. —A caçula derramava lágrimas de desespero. —Não era pra ter acontecido... não sei porque desejei beija-lo.  Eu ia apenas dar adeus.

Bellamy não ouvia mais as lamentações da irmã. Ele apenas me encarava, fazendo com que eu, enfim, fosse notada.

—Lincoln é seu amigo. Ele nunca faria algo que pudesse magoá-lo ou magoar ela. —Tentei conter a situação. —Não foi culpa de ninguém.

—Como pode entregar ela nos braços dele?

—Não fiz isso! —Exclamei. —Não sabia...

—Não vê o quanto ela é ingênua? Não vê?!!

Pisquei algumas vezes com sua acusação. Tudo que eu menos queria era ver Octavia daquela forma.

—A culpa é minha. Só minha! —A Blake se manifestou, ainda agarrada as pernas dele. —Clarke não sabia que era um homem.

—Ela precisa repousar, Bellamy. —Sussurrei incomodada.

—Sai daqui. —Ele sinalizou para porta.

—Não a trate assim, Bell.—Octavia tentou me defender.

Senti-me incapaz... Incapacitada de fazer qualquer coisa útil naquele momento. Andei até a porta e olhei uma ultima vez os dois. Apenas ela me encarava.

Apertei meus dedos nos lábios e senti meus olhos queimarem. Não queria deixa-los assim. Eu sentia que, pela primeira vez, fazia parte de todo aquele segredo imortal. A única humana portadora da verdade entre os mundos. E mesmo assim, completamente inútil. Quando fechei a porta, um sentimento original surgiu. Era como se os papeis se invertessem, e no pouco intervalo que estivemos juntos, agora seria eu a vilã.  

•••

Caminhei até a sala/cozinha e sentei no sofá. Gritos começaram ecoar do fundo.

Só de pensar que tinha acordado em seus braços, e eu sequer lembrava como parei lá. Eu deveria ter dito que Não. Eu deveria ter ido até o quarto e gritado com Bellamy. Deveria dizer que ele é estupido, que não escuta ninguém, que ele me faz a pessoa mais idiota do mundo, e eu não gosto disso.

—O que está fazendo aqui? —Uma voz atrás, me fez virar.

Raven estava entrando no apartamento. Sua aparência indicava que tinha passado a noite fora, e possivelmente não dormira.

—E-u... —Gaguejei, tentando não desabar ali na frente dela.

—O que tá acontecendo no quarto? —Ela notou os gritos.

 —Octavia.

—Aquela bastarda já foi? —Raven falou irritada.

—Não. —Respirei fundo. —Ela está no quarto.

—Ela tá aqui? —Seus olhos se iluminaram com a surpresa.

—Raven, não. —Impedi que seguisse até o corredor. —Eles precisam ficar a sós.

—O que aconteceu?

—Ela está machucada... As asas dela...

—Não acredito! —Reyes colocou a mão na boca e soltou seu casaco vermelho, constatando antes mesmo que eu encontrasse palavras para explicar.

—Queria ajuda-la, mas ele não deixa...

—Não tem nada que você pode fazer, loira. —Ela segurou meu braço. —Acho melhor você ir embora.

—Será que dá pra pararem de agir assim? Que saco!

—Esse não é o melhor momento pra você tentar ajudar, ou sei lá o quê você tenha vindo fazer aqui. Só eles podem resolver isso. —Disse serena.

—Eu sei... É só que, Octavia é minha amiga também.

—Olha... —Ela piscou algumas vezes. —Posso te dar uma carona. Ok?

•••

Raven estacionou o Jeep preto em frente da minha casa. E nós duas ficamos fitando o nada, assim como no caminho todo.

—Foi difícil pra ele ignorá-la todos esses dias. —Ela teve a coragem de quebrar o silencio primeiro.

—E como acha que foi pra ela ser ignorada? —Questionei.

—Octavia é muito importante pra ele... Vocês duas não entendem, mas... ele não queria o mesmo destino pra ela. Isso tudo foi pra protegê-la, fazer com que ela se desencantasse... É complicado. —Suspirou. —As coisas vão ser bem diferentes agora.

Continuei muda. Não sabia ao certo o que falar.

—Não consigo entender. —Deu sequencia, percebendo que eu não abriria a boca.

—Não consegue entender o quê? —Olhei para ela curiosa.

—Demorou um pouco pra eu descobrir. Bellamy me obrigou a não contar para os outros sobre a descendência. Simplesmente porque ninguém entenderia o fato de um ser amaldiçoado, ter a chance de se tornar o que sempre quis em segundos, e estranhamente descartar essa oportunidade... É difícil assumir, mas acho que você realmente entrou pra exclusiva lista de mulheres importantes na vida dele.

—Mulheres?

—Até um tempo atrás só tinha duas. —Ela sorriu. —Acho que vou ter que me acostumar com as novidades, afinal. —Seu suspiro exasperado fez com que eu soltasse uma risada leve.

Abri a porta, porém antes de sair, retornei a falar:

—É verdade, o que vai acontecer com ele está noite? —Não consegui esconder a curiosidade.

—A meia noite se iniciara o Cheshvan, então, sim. O que é uma droga, já que agora vou ser obrigada a me tornar enfermeira e babá por um mês. Enquanto o Blake desaparece por qualquer parte do mundo a força. —A morena bufou com o pensamento. —Esse é o inferno que ele paga por ter cometido erros.

—Deveria ter me afastado quando você avisou, não é? —Perguntei com o ar entristecido.

—Com toda certeza. —Ela respondeu sincera.

Dessa vez sai por completo do carro e travei a porta, seguindo pensativa pelo quintal.

—Ei, loira! —Ela gritou.

Olhei para trás.

—Se serve de consolação ao drama de sua vida. —Raven ligou o motor do carro. —Do mesmo jeito que você não conseguiu se afastar... O bacaba do Blake também não.

◘◘◘◘

▬▬▬▬▬▬▬

Comecei a arrumar a bagunça do meu quarto, totalmente dispersa. Quando terminei, sentei em minha cama e passei a mão pelo lençol arrumado, refletindo sobre tudo que envolvia minha vida.

Distrai-me desenhando em meu caderno. Havia muito tempo que não desenhava. Minha mãe acordou no fim da tarde, e disse que a partir de amanhã iriamos arrumar as malas para viajar. Não concordei com sua proposta, mas não consegui discordar, então apenas lhe ajudei com a janta em absoluto silencio.

A noite já caira por completo, e o céu parecia estar diferente. O que me fez recordar da noite em especifico. Pensei em Bellamy e sobre o fato de não podermos nos despedir adequadamente das formas verbais mais opressoras por minha parte... Pensei em Lexa e por onde ela estaria desde a noite que prometera voltar.

Depois de jantarmos, subi até o banheiro e entrei debaixo da ducha quente. Eu me sentia suja apenas por pensar naquela manhã, e ao mesmo tempo incompleta. Algo dentro de mim transbordava arrependimento, mas eu não saberia explicar. Queria que minha vida voltasse para quando era uma criança e eu não precisasse mentir. Podia dizer para todos que amo, sobre minha sina. E que talvez, mesmo sendo um destino inseguro, eu não quisesse mais me afastar das verdades e descobertas.

Muito pelo contrário, eu almejava ir até o fim.

Assim que sai do banho, me tranquei no quarto. Comecei a pentear meu cabelo molhado e me encarar no espelho, analisando o quão mais velha eu aparentava estar desde o ultimo semestre. Foi quando um barulho abafado me chamou a atenção. No começo pensei que fosse o despertador com defeito, mas o aparelho permanecia mudo. Andei em passos lentos, imitando as batidas do meu coração. Receosa, segui o som e olhei debaixo da cama, o único lugar que ainda não mexi. O que encontrei piscando ali fez a minha mente entrar em curto circuito por breves segundos.

Era meu celular.

Temi em tocar nele com medo de que fosse alguma alucinação. Mas o aparelho continuava piscando e emitindo um som gradativamente mais alto. Como isso é possível?... Meu celular tinha ficado no casaco com a mulher do carrinho de saco de lixo. Tinha certeza disso.

 Eu senti minha mão tremer enquanto estiquei até alcança-lo.

—Alô. —Atendi de uma vez, antes que me arrependesse.

—Clarke. —Falou Jasper. A ligação estava ruim, com muito chiado se sobrepondo à voz. —Onde você está?

—Onde estou? No meu quarto... —Disse confusa. —E vocês? Como esta a praia?

—Nós não fomos lá. —Sua voz parecia distante. —Estamos na escola. Nós a invadimos.

—O quê? Como assim invadiram?

—A gente...

Um som incompreensível fez-se do outro lado da linha, e de repente a voz mudou.

—Você não está ocupada, não é?

—Lexa? —Reconheci a voz facilmente.

—Venha brincar conosco.

—O que vocês estão fazendo juntos? —Falei rouca.

—Venha brincar, Clarke! Se você não vier, acho que os meninos vão conhecer um pouco sobre minha especialidade. Anjo da morte, lembra? —Sussurrou.

Meu coração gelou, mas a ligação já havia caído.

 


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Notas finais do capítulo

MOVIMENTO FAÇA UM AUTOR FELIZ
Comentar em uma fic é mostrar para o autor o quanto você respeita e gosta da historia. Não custa nada e não demora dois minutos, então por que não comentar?
Com certeza todos que leem essa nota já escreveram algo
e viram como é ruim escrever para as paredes. Muitos desistem, outros desanimam.
Então faça uma forcinha, nem que seja para dizer que amou ou odiou. Com toda certeza o autor se sentirá melhor.



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