Primavera Sem Rumo escrita por Anne Ribeiro


Capítulo 5
Capítulo 5 - Connor Campbell


Notas iniciais do capítulo

Esperamos que gostem!



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Casa dos Campbells, 24/03/2004 - Quarta-feira, 3:23 p.m.

Por que as lembranças que tínhamos guardadas na memória eram as únicas que não mudavam, visto que com o passar do tempo nós, humanos, mudávamos?

Essa pergunta não saía da minha cabeça desde que o meu melhor amigo, que era meu pai, havia morrido. A gente podia passar por diversas outras coisas com a intenção de esquecer uma lembrança que não deveria ter virado apenas algo para recordar depois, mas por mais que tentássemos esquecer nunca conseguiríamos. Era muito difícil simplesmente apagar aquela lembrança, pois era o meu pai que estava nela. Ele era a pessoa mais importante na minha vida toda. Desde que nasci, eu sabia, naquele momento em que me pegou nos braços, que me amava antes mesmo de abrir os meus pequenos olhos para olhá-lo de volta, antes mesmo de abrir a boca para finalmente falar a primeira palavra quando tinha quase dois anos e meio. Lembrava-me quase perfeitamente da sua voz no meu ouvido dizendo palavras que, naquela época, não fazia ideia do que eram. Enquanto fui crescendo, sempre tive a sensação de estar mais vivo que nunca com ele perto de mim. Porém, já com a minha mãe tudo que senti foi quase o oposto do que sentia pelo meu papai. Nunca soube explicar e, na verdade, não era como se me sentisse à vontade para falar sobre isso abertamente.

E agora... todos os momentos que tive com ele foram enterrados e viraram apenas lembranças que agora eu faria qualquer coisa para esquecer. Era o meu maior desejo estando nesta situação. Queria esquecer tudo, definitivamente tudo, pois a dor que sentia ao lembrar do que passamos juntos era pesada demais para guardar só para mim. E, na realidade, nada ajudava. Nenhum dia nem nenhum lugar, porque quase tudo me remetia a ele. Além disso, para me ferrar ainda mais, tinha a Páscoa, que era basicamente o principal dia do ano no qual nós dois ficávamos muito mais próximos que antes. Foi neste mesmo dia, mas que era no ano passado, que meu superpapai morrera. Depois desse acontecimento, sabia que o que eu era antes havia mudado e ainda estava mudando conforme o tempo passava sem a sua presença. Percebi, nesse primeiro ano sem ele que esse dia compactuava ainda mais com a minha mudança, quando comemorávamos a Páscoa no Ghost Gardens Park. Decerto, não estava nem um pouco animado para tal comemoração. No entanto, a minha irmã irritante insistiu tanto para que a nossa mãe a levasse que não tinha muita opção a não ser ir e enfrentar mais uma salva de dores e mais mudanças.

Comemorar a páscoa não era algo raro de se ver por aqui, mas saíamos para procurar os famosos ovos de chocolate nesse parque da minha cidade. Na verdade, essa brincadeira chamada "Easter egg hunts" era considerada, pela maioria das pessoas, uma tradição cujas famílias se reuniam no parque para participar dela juntos. Esse ano, infelizmente, não seria diferente. Por ser um dos feriados que a família deveria ficar junta, a mamãe conseguia tirar uma folga do hospital para passar conosco. Mas já não era a mesma coisa de sempre. Ele não estava aqui, e ainda que eu fosse o mais próximo dele, era óbvio que todos sentiam a sua falta. A presença dele em nossas vidas era tão importante quanto ir bem na escola, tinha certeza que meus irmãos sabiam disso. Ele fazia a diferença estando sempre presente, mesmo que não fosse tão agarrado com a Elizabeth e com o Dylan quanto era comigo. Entretanto, a sua ausência não poderia danificar a nossa longa jornada que ainda tínhamos pela frente. Eu sabia disso porque era o que ele iria querer que fizéssemos. Seguir em frente sem olhar para trás, ainda que isso fosse a parte mais difícil.

Agora que meu pai se foi o que eu mais queria na vida era ficar mais próximo da minha mãe, porque não podia e não conseguiria passar por isso sozinho. Admitia que era uma pessoa difícil, mas ela podia fazer um esforço a mais para tentar me entender, né? Até porque eu também era um dos seus filhos, por mais que eu achasse que ela não ligava para esse fato. Ela ficara ainda mais próxima dos meus dois irmãos, parecia que eu não existia que era invisível naquela casa para ela. Tudo bem que não lhe demonstrava afeto algum e nunca mostrava interesse nas conversas deles. Porém, ela era a minha mãe também, poxa! Devia saber que o seu outro filho estava triste por causa do pai e que queria apenas que se preocupasse um pouco. Era muito orgulhoso para pedir a sua atenção, por isso a agonia acumulava-se dentro de mim, transformando-se em raiva. Raiva por ele ter me deixado praticamente sozinho. Raiva por ele ter ido para o céu encontrar o Pai de Todos tão cedo. Raiva por ela não me notar além deles dois.

Estávamos nos arrumando para ir. Na verdade, a mamãe arrumava eles enquanto que eu me arrumava sozinho. Queria que ela viesse até mim para oferecer ajuda, mesmo que no fim eu não aceitasse por puro orgulho de criança. Mas, não aconteceu. Nunca acontecia.

— Já terminou, Connor? Já estamos quase prontos para ir – perguntou minha mãe, pondo a cabeça entre a porta.

— Só um segundo, mãe, tô colocando o tênis — proferi em um tom que ela pudesse escutar sem olhá-la.

— Tudo bem. Ainda tenho que ligar para a mãe da Iris para confirmar se ela vai com a gente mesmo. Estaremos esperando lá em baixo. — advertiu, mais uma vez.

— Argh! — soltei um gemido de decepção — Ela vai com a gente mesmo, mãe? Não era só a família?

— Sim, mas a sua irmã insistiu que a amiguinha nova fosse com a gente esse ano. Não poderia recusar.

— Ah, claro, porque a senhora faz tudo que a Elizabeth pede — resmunguei secamente. Nesse momento, ela adentrou de corpo inteiro no quarto, colocou uma mão na cintura e falou:

— Não é exatamente assim, Connor. Ela é só uma criança e queria que a Iris fosse para não ficar sozinha sem ter ninguém para brincar já que nunca quer deixá-la brincar com você e o seu irmão. — disse. Sim, era verdade o que acabara de falar. Dylan era o meu irmão gêmeo idêntico, porém o único fato que se sobressaía mais entre nós, era a nossa peculiar personalidade que era, notavelmente, diferente em todos os sentidos. Não sabia se era porque tínhamos uma ligação mais forte por sermos gêmeos, mas nos dávamos muito bem. Ainda assim, não desperdiçávamos nenhuma briga de irmãos, porque era engraçado na maior parte do tempo.

— Mas, tinha que ser logo aquela garota chata e que se acha na maior parte do tempo? — reclamei, franzindo o cenho.

— Bem, não podemos escolher a amizade perfeita para sua irmã. Se ela se dá bem com a Iris já é um grande passo. E por que toda essa implicância com a coitada da garota? — perguntou, curiosa com o fato de sempre falar mal da Iris para ela.

— Ahm... — engoli em seco. Na verdade, não sabia muito bem por que agia dessa forma quando se tratava da amiga da minha irmã e, ao mesmo tempo, nossa vizinha. Só sabia que me irritava a ponto de me fazer implicar com ela todas as vezes. — Acho que ela não é uma boa pessoa para ter amizade com a Elizabeth. Ela é muito pra frente. Vai acabar levando a minha irmã pra um mau caminho.

— Sério que acha isso? Eu adoro a Iris! Ela anima muito a minha filhinha... — falou, olhando para um ponto cego na minha cama, perdida nos seus pensamentos.

— É, não gosto dessa garota. Mas, pelo menos não diz que eu não avisei antes quando alguma coisa de ruim acontecer com a Elizabeth sendo guiada pelas loucuras da Iris, mãe — avisei com uma carranca séria no rosto.

— Ah, querido, não vai acontecer nada com a sua irmã! Deixe a sua paranoia trancada em algum baú um pouco. O que poderia acontecer com a nossa querida Liz? Nadinha! — falou gesticulando com as mãos, decidida a me contrariar.

— Tudo bem, mãe. Está avisado. — falei mais uma vez. Ela assentiu com um aceno de cabeça e foi encontrar os meus irmãos na sala e tentar ligar a Sra. Thompson.

O único assunto que tanto dava o que falar entre nós dois era sobre a amizade da Elizabeth com a doida da Iris. Fora isso, não nos falávamos muito sobre qualquer outro assunto. Nesse meio tempo em que conversamos tinha parado de vez de colocar o tênis e fiquei mais focado na conversa. Agora voltei a fazer o que estava fazendo antes da minha mãe me interromper e, quando acabei, desci os degraus da escada chegando diretamente na nossa pequena sala. Quando cheguei, me deparei com a Iris estacionada na nossa sala fazendo todos rirem de algo que não fazia a mínima ideia. Suspirei profundamente fazendo todos me encararem.

— Então você vai mesmo com a gente. — afirmei secamente, demonstrando propositalmente insatisfação com a sua presença esse ano.

— Claro que vou! — respondeu alegremente, isso me incomodava ainda mais. — Não podia perder esse momento por nada nesse mundo! — completou com um sorriso irritante no rosto.

— Acho que terei um péssimo dia, então — falei sem emoção alguma na voz.

— Mas é claro que não! Você verá, Con! Vou alegrar o seu dia! Parece que você não está muito feliz hoje, tá com cara de limão azedo de novo — viu como ela se achava a rainha do pedaço? Ela era muito sem noção. Isso porque sabia que nosso pai havia morrido, imagine se não soubesse.

Todos que estavam à nossa volta escutavam a discussão, que parecia lúdica, pois não paravam de rir internamente. Sabe quando ficamos com aquele brilho nos olhos e as bochechas rosadas e brilhando? Esse era o sinal de que eles estavam rindo o suficiente para deixar o riso escapar por entre os lábios a qualquer momento. Eles seguravam a risada que tanto queriam dar. Mas eu não achava graça alguma.

— Nada vai me alegrar hoje, Iris.

— Vai sim! Você vai ver só!

Percebi que qualquer coisa que dissesse não mudaria a sua opinião sobre alegrar o meu dia. Então falei que estava pronto e todos fomos para a estação do metrô que era dez minutos longe da nossa casa e quando finalmente chegamos lá, ela comprou nossas passagens. O parque não era longe, mas andar por praticamente quarenta e cinco minutos não era algo que cogitássemos fazer. De metrô levávamos apenas quinze minutos, ou seja, economizaríamos nossa energia e nosso precioso tempo, pelo menos era o que eu achava.

Fiquei olhando para fora do metrô, ainda que não tivesse nada para ver. Ouvi eles falando sobre quem pegaria mais ovos que o outro nesse ano. A Elizabeth tinha apenas nove anos, então a mamãe ajudava a procurar ovos junto com ela, tanto para não deixá-la se perder quanto para ajudá-la na busca. No entanto, agora que esse ano trouxe uma amiga sua, que era alguns meses mais velha que ela, provavelmente juntar-se-ão para procurarem juntas, mas ainda com a minha mãe na cola delas. Forcei meus pensamentos para seguirem outra direção que não tivesse a Elizabeth nem a Iris, no entanto, justo no segundo que resolvi fazer isso alguém me chama. Não escutei de primeira, por isso ele me chamou de novo.

— Hey, Con! — chamou-me Dylan. — Acorda, mané — deu um tapinha no meu boné para me acordar para a única vida realista que tinha.

— Que foi, Dylan? — perguntei.

— Ah, nada. Só queria tirar você do seu mundinho colorido — falou para me provocar, fazendo-me levantar de onde estava sentado para, sei lá, implicar com ele do meu jeito.

— Não vivo em um mundinho colorido, é você que vive junto com a Elizabeth — falei, percebendo que não daria para simplesmente esquecer da minha irmã nem da amiga se elas estiverem próximas à mim. Lamentei internamente.

— Por que junto com ela?

— Porque ela é menina né, cabeçudo — falei, revirando os olhos logo em seguida.

— Isso não tem nada a ver, Con. Não são só as meninas que criam seu próprio mundo colorido. Aposto que você também tem, mas só tá falando isso porque se acha homenzinho demais pra admitir — disse Iris intrometendo-se aonde não foi chamada. Isso fez Dylan rir e a Elizabeth ficou sorrindo discretamente.

— Nada a ver, garota. Isso não tem nada a ver — afirmei, com uma expressão emburrada no rosto. Por que ela tinha que se intrometer em tudo também? Que coisa irritante!

Inclinei-me para perto de Dylan, que estava rindo da minha cara ainda, e dei um empurrão básico nele para alertá-lo de que não era para apoiar aquela garota justo perto de mim.

— Ai, cara... — disse, esfregando o braço para enfatizar mais o seu drama. — Nem fui eu que disse isso!

— Mas você tá rindo de mim, seu babaca traidor!

— Babaca é você! — agora foi a vez de Dylamn me empurrar.

— Meninos... — advertiu mamãe para pararmos de implicar um com o outro.

— Ele que começou, mãe. Manda ele calar a boca!

— Connor, não fale desse jeito! — ordenou ela.

— Mas foi ele que... — fui interrompido.

— Isso não importa! E você, Dylan, pare de implicar com seu irmão! — ordenou mais uma vez.

— Tá bom, mãe... — resmungou, revirando os olhos com um sorriso nos lábios.

O metrô parou e descemos dele. Outra coisa que não tinha ressaltado era que ele parava justamente em frente ao parque, por isso era bom pegá-lo ao invés de caminhar até aqui. Era um lugar muito lindo e agradável. Tinha uma imensidão coberta de grama esverdeada espalhada por quase todo o parque. Por ser primavera, havia algumas árvores floridas que deixavam o local bem mais bonito e apresentável para todos os cidadãos e turistas. Gostava desse ar agradável que o ambiente trazia juntamente com o sacolejar do galhos e das folhas das árvores. Acho que esse era o único motivo pelo qual não me fez questionar a decisão da minha mãe, de me trazer até aqui. Por pior que fosse lembrar do meu pai quando vinha aqui, esse lugar me passava tranquilidade e isso era algo que nunca deixaria escapar.

— Vamos, mamãe, vamos! Já tá na hora — disse minha irmã, enquanto puxava a camisa da mamãe.

— Calma, meu amor, já estamos indo — falou calmamente sorrindo.

— Será que já começaram a caçar? — perguntou Dylan aleatoriamente.

— Acho que sim, tô vendo gente correndo pra lá e pra cá. Devem estar procurando eles — respondi.

— Aham. Mas até que não têm muitas pessoas esse ano — constatou minha mãe.

— É bom que sobra mais pra gente pegar, né Lizzie? — indagou Dylan, dando um sorrisão na direção dela.

— Claro, irmãozinho! — respondeu com um sorriso estampado no rosto evidenciando a ausência de dois dentes da frente.

Não sabia como meu irmão deixava a Elizabeth chamá-lo desse jeito. Eu nunca deixava, porque não gostava de diminutivos, mesmo que fosse usado apenas por uma criança. E também porque ela me irritava muito. Sua voz, seu jeito, tudo que ela fazia me irritava, mas não sabia muito bem o porquê disso. Talvez fosse porque ela vivia agarrada com a mamãe e roubava toda a atenção dela, que poderia estar dividindo comigo também. Iris não pronunciou-se em nenhum momento desde que saímos do metrô. Ela entrou, assim que começamos a caminhar pelo parque, numa conversa animada sobre alguma coisa que não consegui escutar junto com a minha irmã.

Já estávamos chegando no centro do parque quando mamãe instruiu-nos a ficar no centro do parque caso nos perdêssemos um do outro. Pelo parque ser grande, ela sempre nos avisava sobre o perigo que poderíamos enfrentar estando sozinhos, mesmo que o lugar fosse saturado de pessoas. Porém, Dylan e eu sabíamos nos virar muito bem sozinhos e sempre quando saíamos para esse tipo de evento, preferíamos procurar pelos ovos sozinhos. Ainda assim, esse ano seria diferente, já que não queria procurar por ovos como uma criança esfomeada por chocolate, iria com Dylan para não ficar sozinho esperando eles acabarem com aquela baboseira que participava quando meu pai estava aqui. Mas, já que estava ali, ajudaria o Dylan a procurá-los, porque não queria ficar sozinho sem fazer nada até que eles acabassem.

— Dy, tudo bem se eu for com você esse ano? Não tô muito afim de procurar por ovos sozinho. Posso até te ajudar a vencer a Elizabeth, se quiser — falei, enquanto andava ao lado dele em direção às árvores, onde escondiam os ovos.

— Mas, por que isso agora? É por que o papai não tá aqui? Sei que é difícil lidar com isso, Connie, mas ele iria querer que a gente seguisse em frente.

— Pra você é fácil falar porque nunca foi tão próximo dele quanto eu fui. E já disse que tô tentando, mas é difícil — contestei, soltando um gemido triste ao passo que colocava as mãos nos bolsos laterais da calça.

Ele abaixou a cabeça ainda andando e suspirou alto o suficiente para escutá-lo.

— Tudo bem, vamos logo senão a mamãe e a Lizzie vão ganhar esse ano, ainda mais agora que tem mais uma no meio — virou o rosto para mim e deu um sorriso amarelo.

— Não se eu estiver aqui. Não deixarei mesmo que a Iris ganhe da gente! — falei, convencido de que ganharíamos. Não eu, mas Dylan, porque eu não estava brincando, só o ajudaria porque ele concordou em me deixar ir com ele.

Apertamos os passos e fomos procurar pelos ovos; depois de algumas horas desgastantes, terminamos e fomos descansar na grama. Contamos os ovos e o vencedor desse ano foi o time de Elizabeth, por incrível que pareça. Mas também eram três contra dois, não tínhamos tantas chances assim. Comemos uns cachorros-quentes de uma carrocinha que estava estacionada quase do nosso lado e pedimos para mamãe comprar uma bola de futebol preta e branca que estavam vendendo perto da gente também. Depois que compramos a bola, Dylan e eu posicionamo-nos na superfície da grama para começarmos a jogar, mas uma menina irritante ficou nos importunando querendo jogar também. Era futebol, poxa, meninas não jogavam, ainda mais da idade dela. E se deixasse a Elizabeth jogar, a Iris também jogaria. Nem morto deixaria isso acontecer!

— Manhê! — gritou — O Connor não quer deixar a gente jogar com eles.

Eliza, que era nossa mãe, estava sentada na grama, alguns metros afastada de nós lendo um livro e suspirou no instante seguinte ao ouvir a reclamação da filha querida. Levantou-se com o livro na mão e veio até nós.

— Connor, por que não quer deixar elas brincarem com vocês?

Por mais que eu fosse o mais afastado entre os filhos dela, pensei que ela entenderia o fato de censurá-las a não jogar bola. Entretanto, foi bem mais que o contrário.

— Porque só homem joga e elas são meninas. Se elas jogarem com a gente vão acabar se machucando.

— Quem disse que só homem joga? Meu querido, hoje em dia, as mulheres fazem quase a mesma coisa senão a mesma coisa que os homens. E você não é homem ainda, é apenas uma criança.

— Mãe... pré-adolescente. Já sou quase um homem! — exclamei, indignado por ela ainda me achar uma criança depois de tudo que aprendi sozinho sem a sua ajuda.

Ouvi Iris dando uma risada quando disse isso.

— Você só tem doze anos, meu amor — disse, rindo da minha convicção — Mesmo assim deixe elas jogarem com vocês, é só pegar leve — ordenou, após acabar com o momento que somente ela achava engraçado. Ah, não, ela e a chata da Iris.

— Mas, mãe, assim não vai ter graça. Futebol é um jogo decisivo que precisa de dois adversários para competirem entre si. Não é apenas uma brincadeira.

— Oras, desde quando você não se diverte jogando bola? Sempre se divert...— cortei a sua frase, sem apresentar remorso.

— É porque só é divertido quando se ganha o jogo. E esse é o único que ganho do Dylan, além do Guitar Hero, por isso me divirto.

— Mas, vocês estão em pares, podem muito bem jogar com elas. Outra coisa, se você quer tanto perder o seu violão por uma bobeira dessas, aí o problema é seu — murmurou com um tom ameaçador,

— Poxa! — dramatizei — Por que sempre me chantageia pra conseguir as coisas? Sempre sou eu que tenho que me ferrar — suspirei olhando para os pés. — Sabia que o Dylan também concordou em não deixá-la jogar? — menti. Ele nunca faria isso e ela sabia, no entanto, precisava arriscar colocando a culpa em outra pessoa porque não queria me redimir assim tão fácil. Apesar de que também não queria perder meu querido violão.

Depois de tanto tempo sem se manifestar, Dylan tenta se defender.

— Eu nada! Você que é egoísta e competitivo, Connie. Tinha deixado elas jogarem, sim!

Já estava preparado para rebater com ele, mas a mamãe foi mais rápida.

— Ok. Chega! Vamos para casa então, já que vocês não param de brigar entre si.

— Mas e... — pronunciei, entretanto fui interrompido por Dylan.

— Mas, mãe! A culpa é do Connie por não deixar a Lizzie e Iris jogarem, não minha! Isso é muito injusto com quem não provocou todo esse alvoroço todo, sabia?!

— Eu sei, querido, é por isso que as coisas têm que ser assim para que nenhum de vocês voltem a fazer de novo. Têm que aprender a serem mais unidos. Porém, isso depende mais do Connor do que de qualquer outra pessoa. Se ele deixar elas jogarem junto, ficaremos mais um pouco. — disse ela, tentando entrar em um consenso.

— Viu, Connie! Por que você sempre tem que estragar tudo? Deixa elas jogarem logo, poxa!

— Mas elas só vão atrapalhar a gente.

Elizabeth ficou assistindo àquela discussão quieta sem dizer uma única palavra, todavia, decidiu pronunciar-se.

— Não vamos, não, irmãozinho! Né, Iris? Por favor, deixa a gente jogar também. — pediu, desesperadamente.

— É! A gente não vai! — disse Iris.

— Não me chame assim, sabe que não gosto!, — franzi os olhos na direção de Elizabeth e isso a fez se calar — tudo bem... mas se se machucarem não vêm pôr a culpa em mim, não.

— Êêê! Obrigada! — ela fez menção de me abraçar, no entanto afastei-me no mesmo instante porque odiava abraços ainda mais os dela. Então ela abraçou Iris e deram alguns pulinhos de alegria.

Vi mamãe sorrir e retornar ao seu lugar que antes estava ocupando.

— Tá, tá. Agora temos que brincar de outra coisa que não envolve adversários, mas que ainda utilize a bola. Alguma ideia, Dy? — virei-me na sua direção para vê-lo melhor.

— Ahm... nenhuma, Connie.

— Também não vem nada na minha cabeça agora — balbuciei, com um tom de aborrecimento.

— Eu sei uma! — Elizabeth levantou a mão — Que tal brincar de "João bobo"? — fez uma sugestão.

— E como é isso? — perguntei , irritado por ela ter alguma ideia antes de mim.

— É assim: como somos quatro, é melhor fazer um triângulo e o bobo fica no meio. Daí jogamos a bola um para o outro, menos pro bobo. Se o bobo conseguir pegar a bola justo na hora que uma das três pessoas jogou, essa pessoa vai ficar no bobo e o bobo anterior fica no lugar da pessoa que havia jogado a bola. É simples e utiliza a bola. — explicou perfeitamente bem para alguém da idade dela. Pigarreei por um segundo.

— Parece divertido. O que acha, Connie? — indagou o meu irmão.

— Adorei a ideia, Liz! — exclamou sorrindo para a amiga. Eliizabeth apenas sorriu em agradecimento.

— Não sei... mas e se o bobo demorar pra pegar a bola? Vai ficar nessa até a gente ir embora? Parece ser cansativo e sem graça. — falei. Não queria admitir que a ideia era boa, e era sempre assim tanto que me tornei do contra quando se tratava da opinião de Elizabeth. Estava sempre contra ela, porque constantemente tinha ideias boas e que todo mundo acabava gostando.

— Ah, só se quiser, porque quando a gente quer alguma coisa, sempre conseguimos se fizermos um esforçozinho, não é, Dy? — ele concordou com a cabeça — Mas eu prometo que a gente vai se divertir, Con! É sério!

— Tudo bem... vamos logo com isso antes que mamãe decida ir embora.

Caramba... por que a Liz tinha que ser mais inteligente que eu? Isso era tão natural para ela como conseguir andar de bicicleta na primeira tentativa, sem levar qualquer tombo. Argh, odiava a minha irmã!

 


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Notas finais do capítulo

Obrigada por lerem!



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