Arborescente escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 28
Capítulo vinte e oito


Notas iniciais do capítulo

Acho que tô desde o capítulo 20 dizendo que era reta final haha



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Karen estava sentada na cama ao lado, olhando nostálgica para o quarto. Quando percebeu que eu estava acordada, falou-me, sem se virar:

— Pensei que não voltaria ontem.

Não respondi, o sonho ainda estava bem nítido em minha mente. A luz do sol vindo pelo vidro era uma resposta ao que me acordou. Incrível como um sonho tão curto durou as minhas horas de sono.

— Quarto lugar... Parabéns! — ela voltou a dizer, evidentemente desconfortável.

Eu não estava nem um pouco a fim de falar, mas, se permanecesse calada, ela não iria se calar. Eu não tinha muita escolha. Daqui a pouco, começaria a ouvir sobre o meu casamento com um antigo colega de turma dela.

— Karen, eu não desisti — interrompi seus devaneios — Eu só voltei para arrumar as minhas coisas. Seria covardia demais sair durante a noite, enquanto todos estão distraídos, sem me despedir.

— Seria menos doloroso — disse Karen, ressentida.

— Seria desonesto — retruquei, afastando o lençol de cima de mim.

Os olhos dela fixaram-se em minha saia.

— Você saiu usando a saia da Amizade? — ela perguntou, inexpressiva, como se decidisse como deveria agir.

— E a bota — acrescentei, jogando minhas pernas para fora da cama, e esfregando meus olhos com as mãos em punho.

Ela abriu a boca, mas logo fechou-a. Voltou a olhar para a frente.

Não importei-me com isso.

Tomei impulso com meus braços, para levantar-me da cama. Assim que o fiz, agachei-me para pegar uma mala, que estava ao lado da cama. Ao parecer, eles tinham nos fornecido para ajudar na transferência de dormitório. Karen também tinha uma, em cima da cama, aberta.

Eu não tinha muita coisa... Apenas minha roupa da Amizade, que eu tinha escondido debaixo de minha cama (para que não confiscassem), e o uniforme da Franqueza (eles tinham entregado três camisas e três saias. Fora a meia-calça que Trudie me deu). Coloquei tudo dentro.

A minha escova de dentes estava guardada em um compartimento pequeno, enquanto meu sapato preto ficou em um mediano.

— Eu não acredito que você vai mesmo fazer isso — Karen resmungou.

— Todd ficará em quarto lugar, conseguirá um emprego ótimo. Quem sabe assim a sua mãe lhe aceita mais rápido — comecei a dizer, ignorando-a — E Steven ficará em quinto. Mischa, Nolan e Jesse não estão com uma pontuação muito boa, mas vai melhorar um pouco. Apesar disso, tenho certeza de que Trudie os ajudará, toda a nossa turma foi ótima, apesar de tudo...

— Você teria um emprego maravilhoso de advogada, ajudando as pessoas, como sempre quis fazer — disse Karen — Não vai mudar nada ficando lá com eles! O que vai fazer? Mostrar solidariedade!

— Karen, você foi uma ótima amiga para mim — eu disse — Não estrague isso. Não quero que nossa última memória juntas seja uma briga.

— E eu não quero que nossa última memória seja com 16 anos de idade — ela retrucou.

Revirei os olhos, ela era tão dramática... Eu estava indo para os prédios abandonados, não para o outro lado da cerca.

— Seria muito humilhante para Karen Cumming visitar uma “amiga” entre os sem facção — disse, ressentida, antes de fechar minha mala e ir para fora do quarto, sem dar oportunidade de que ela respondesse.

Não pensei muito para onde estava indo. Quando percebi, estava em frente à sala de estar.

— Aeryn, podemos conversar?

Virei-me, vendo Trudie segurar algumas pastas.

— Tudo bem — disse, minha garganta seca.

Ela seguiu para dentro da sala, e eu entrei atrás dela.

— Eu não estava na fileira da frente, ontem, mas estava lá — ela disse, casualmente, colocando as pastas em cima mesa.

Logo entendi o assunto, embora já desconfiasse.

— Tru... — tentei dizer.

— Eu sei que estão todos te julgando. Isso não é o que a Franqueza realmente significa. As pessoas podem dizer seus segredos, sem medo do que dirão delas — ela continuou dizendo, virando de costas para a mesa — Todos vão te dizer que você não deve jogar a sua vida fora por causa de um cara assim, porque ele não é um cara de facção. Mas isso não é uma coisa que eles devam escolher por você, é uma escolha sua. Assim como você escolheu a Franqueza na Cerimônia de Escolha. Toda a nossa vida é feita de escolhas, mas você vai precisar passar pelas consequências delas;

— Do que está falando? — perguntei, descolocada.

— Quando eu tinha a sua idade, eu me apaixonei por um erudito — disse Trudie, dando de ombros — Isso foi uns 3 meses antes da Cerimônia de Escolha. Saíamos escondidos, tentando ignorar que a Cerimônia estava próxima, mas esse não é o tipo de coisa que se ignore. Um de nós teria que sacrificar-se, para que aquilo desse certo. Eu não me sacrifiquei, ele tampouco. A questão é que: sempre uma das partes vai precisar abrir mão de algumas coisas.

— Não é como se ele tivesse essa escolha — dei uma risada seca.

Ela suspirou, olhando-me com carinho.

— Aeryn, o que estou te dizendo é que: não há volta. Se as coisas derem errado, você não tem a opção de voltar atrás. E, talvez, seja isso que o preocupa — ela disse.

— Espere! Como sabe que ele não quer que eu faça isso? — perguntei, desconfiada.

— Quem ama de verdade, quer o melhor para a pessoa que ama — disse Trudie — Eu nunca ouvi falar sobre uma pessoa que tenha desistido por um sem facção. Talvez as coisas sejam abafadas, para que não haja essa “opção de fuga”. Ou talvez ninguém nunca foi corajoso o suficiente para abrir mão do que tem.

— O que aconteceu com esse homem? — perguntei, tentando desviar do assunto de Evan.

— Casou-se, teve uma filha... E ela escolheu a Franqueza — disse, olhando fixamente para os meus olhos, como se esperando que eu entendesse.

— Ah, meu Deus! — sussurrei — Petal...

Ela deu-me um sorriso triste, voltando o olhar para suas mãos.

— Eu podia ter sido a mãe dela... Mas decidi ficar — sussurrou — Ele me culpa pelo que aconteceu a ela, eu sei que o faz.

— Como pode ser culpada de uma doença? — perguntei, confusa.

— Eu não sei... — ela deu de ombros — Mais de 16 anos se passaram...

— Você se arrepende? — perguntei.

Trudie assentiu com a cabeça, virando-se para a mesa.

— A questão, Aeryn, é o que realmente é pior — ela disse, voltando à sua compostura — Arrepender-se de abrir mão da sua vida, ou arrepender-se de não ter tentado.

Fiquei observando as suas costas, enquanto ela organizava as pastas na mesa.

— Não é uma escolha fácil — disse Trudie.

— Eu acho bem fácil — contradisse, apertando a alça da mala com força.

Ela virou o rosto de lado, dando um sorriso para mim.

Fui caminhando devagar até a porta, como se esperando que ela dissesse mais alguma coisa.

Ela não disse mais nada.

Minha decisão já estava tomada, eu só precisava ver mais uma pessoa.

***

Saí da sede facilmente. Ninguém veio falar comigo, e nem eu fui falar. Não queria me despedir de cada um de meus colegas, vendo seus olhares de incredulidade. Uma hora ou outra, eu acabaria explodindo para cima de um deles. Provavelmente, Pacey.

Imaginava que Mischa seria a única que me apoiaria, ela gostava dessas coisas, seguir um caminho incerto. Na Audácia, suicídio era apenas isso: arriscar-se, sem saber o que acontecerá depois. Para mim, não passava de uma idiotice.

Eu nunca pensei na possibilidade de subir no trem em movimento, como os da Audácia faziam, mas eu não tinha opção melhor. O máximo que podia me acontecer era adquirir alguns arranhões... Aquele devia ser o dia em que todas as facções finalizavam seus treinamentos, eu não tinha dinheiro para pegar o ônibus, e não era dia para a Amizade vir na cidade. Eu teria que me virar.

— Tem identificação? — um dos guardas do portão perguntou.

Esqueci daquele detalhe.

— Eu... — fiquei sem saber o que responder.

— Ela está comigo.

Olhei para trás, e vi Soren correndo na nossa direção.

— Temos negócios a tratar — ele disse, seriamente — Ela é da Franqueza.

O guarda olhou para a minha saia, incrédulo, mas decidiu passar.

— Da próxima vez, use uniforme completo. Não vão te levar a sério assim — aconselhou, depois que entramos.

Senti meu rosto queimar, e virei o rosto para que ele não percebesse, mas ele riu, indicando que tinha percebido.

— Obrigada! Me salvou de uma — agradeci a Soren.

— É o meu dever — lembrou-me.

— Prefiro não pensar nisso. Faz com que o que fez não tenha tanto valor — disse.

— Fazemos para ajudar as pessoas, não para ter reconhecimento.

Revirei os olhos, mordendo a língua para não dizer algo.

— Sinto muito, fui rude — ele apressou-se em se desculpar.

— Não teve a intenção — eu disse, forçando um sorriso — Perguntaria como é o treinamento na Abnegação, mas creio que não temos permissão para falar disto.

— Eu creio que não — concordou — Embora rumores surjam...

— Como está Austin?

Não fazia nem 24h que perguntei isso a Eleonore, mas muita coisa podia acontecer nesse meio tempo.

— Tendo dificuldades para se adaptar, mas ele vai conseguir — disse, confiante.

Era complicado conversar com ele. Eu não poderia perguntar sobre ele, já que ele não podia pensar muito em si, também não estava a fim de falar sobre mim. Então, Austin e Eleonore eram meu tubo de escape.

— Eu não me lembrava que o caminho era tão longo — disse, depois de um tempo, dando uma risada sem graça.

— Se fosse pela sua boca lá na Abnegação, estávamos salvos — ele brincou, indicando a frente com a cabeça.

“Como se eu tivesse essa sorte sempre” pensei.

Depois de caminharmos mais alguns minutos, cada vez mais próximos, concluí que eu disse antes da hora, como costumava fazer.

— Certo! Deixo-lhe aqui! É melhor não demorar. O problema é entrar, certamente, mas, supostamente, estamos aqui juntos — disse Soren, por fim.

— Eu posso dizer que passei mal — dei de ombros.

— Você não está na Franqueza?

— Ainda não decidi.

Ele olhou-me confuso, senti seu olhar sobre minhas costas, enquanto eu me afastava, caminhando em direção à minha antiga casa.

Abri a porta, sem grandes dificuldades. Senti um nó na garganta, ao ver minha mãe com roupas velhas, avental, e o pincel na mão, concentrada na tela.

— Aeryn! — meu pai assustou-se, ao descer as escadas.

Isso chamou a atenção de minha mãe.

— Querida, o que está fazendo aqui? Aconteceu alguma coisa? — perguntou, apressada, enquanto tirava o avental.

— Se eu quisesse desistir de tudo, você me odiaria? — perguntei, sem responder.

— Você já desistiu de tudo — ouvi meu pai murmurar.

— Talbert! — minha mãe ralhou, voltando-se mais calma para mim — Minha filha, do que está falando? Eu nunca lhe odiaria! Você é minha filha! E deve fazer as suas escolhas, seja quais forem.

Não aguentei, comecei a chorar, indo abraçá-la. Como eu senti falta dela...

Era hora de começar a escrever a minha história.


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Notas finais do capítulo

Inicialmente, eu ia escrever dois finais. Mas não tem como escrever tudo isso para, no final, ela voltar para a Franqueza, tranquilamente.