Efêmero escrita por Wenky


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Algumas sugestões de músicas que me inspiraram a fazer essa one shot:

◇ Blue Blood - Laurel
◇ IDFC - Blackbear
◇ Say it right - Angus and Julia Stone

É a minha primeira fanfic com o casal, sejam bonzinhos!



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Capítulo Único

Escrito por: Wenky (Andréia)

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Eu te amava

Era desprezível, brutal, torpe,

 tudo isso e muito mais, mas eu te amava

— Vladimir Nabokov [Lolita]

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— Granger, eu sempre me pergunto afinal o que deu errado entre você e o Weasley.

Hermione revirou os olhos, Draco a olhava de forma inquisitiva, ao passo que mantinha um sorriso enviesado nos lábios, gerando um contraste um tanto quanto estranho.

Estava sentada recostada na cabeceira da cama de madeira, segurava um velho livro nas mãos que aparentemente estava lhe gerando mais tédio do que realmente a entretendo, seus pensamentos, evidentemente, não estavam acompanhando seu corpo.

Antes de responder, ajeitou preguiçosamente o lençol branco que a envolvia, cobrindo sua nudez.

— Já conversamos sobre isso — disse — Nada pessoal.

Ela provavelmente se lembrou vagamente de ter ouvido Draco soltar uma risada baixa, mas logo ignorou. Ele estava tentando lhe irritar novamente.

Honestamente, Hermione mal conseguia entender como os dois terminaram daquela forma. E, na realidade, odiava refletir sobre o assunto. Era bastante incômodo para ela pensar acerca da relação dos dois, tal como pensar em qualquer coisa diante da situação que estava vivendo.

Tudo parecia perdido com a ascensão de Voldemort. E aquele sentimento de desesperança obviamente lhe rendera atitudes desesperadas.

E então foi quando ela acabou naquela verdadeira bagunça com Draco Malfoy, a qual os dois fizeram questão de tecer nos mais minuciosos detalhes e que no final mais se parecia com uma colcha de retalhos da pior espécie.

— Certo — disse, a voz masculina ao seu lado na velha cama chamou-lhe novamente a atenção — Regra número um, nunca mencionar absolutamente quaisquer sentimentos ou emoções pessoais. Não somos amigos — repetiu numa tentativa irritante de imitar a voz de Hermione — Eu entendi, Granger — agora ele soava entediado.

Hermione se virou para ele ignorando a provocação.

— Alguma notícia?

Agora ela parecia finalmente estar de volta à realidade, coisa que para Draco mais parecia um verdadeiro pesadelo, ele honestamente preferia lidar com ela tal como se encontrara há exatamente uma hora atrás quando chegou no pequeno quarto de motel onde estavam instalados.

Aquela versão de Hermione era a que ele menos gostava e, no entanto, parecia ser a que ela estava mais disposta a expor ultimamente, tanto para ele quanto para o resto do mundo.

Alguma coisa parecia estar aos poucos se desintegrando dentro dela e, muito embora eles não tivessem muito contato durante o período que estudaram em Hogwarts, era evidente para ele que Hermione não era mais a mesma.

E o que poderia ser pior, ele sabia exatamente o motivo.

A Guerra que ela tanto ansiava ganhar, junto de Potter e Weasley, parecia estar cada vez mais perdida.

— Não — respondeu enfim, num suspiro — Os trouxas continuam morrendo, os opositores estão sendo cada vez mais perseguidos... Nada que você já não saiba — deu de ombros.

Hermione virou rapidamente o rosto antes que ele pudesse voltar a encará-la. Draco teve uma leve impressão de que seus olhos estavam marejados, mas decidiu não insistir.

Regra número dois, nunca demonstrar sentimentos ou emoções. Vocês não são amigos, afinal. Você não confia nele.

Recompondo sua compostura, Hermione retomou a conversa.

— Às vezes eu me pergunto até onde aquele-que-não-deve-ser-nomeado ainda pode chegar — honestamente, ela odiava ainda ter de usar aquela expressão ridícula para se referir a Lorde Voldemort, ela não o temia mais, afinal. No entanto, ainda havia o tabu — Se até mesmo você já não concorda com tanta — seus olhos se abaixaram, os dedos brincavam nervosamente com o lençol — ... atrocidade.

Os olhos de Draco se levantaram para olhá-la, mas ela os evitou. Havia algum tipo de amargura no tom de voz que Hermione utilizara que o atingiu como uma verdadeira maldição imperdoável.

“Até mesmo você.”

Você pensa tão baixo assim de mim, Granger?

Suspiro.

Tanto faz, Draco ponderou, não é nada pessoal, de qualquer forma. Vocês não são sequer amigos.

— Você costumava desprezar eles... os trouxas — ela continuou — Eu me pergunto quando ele chegou tão longe, sabe? O que fez você mudar de ideia...

Silêncio.

Você.

— Nada pessoal, Granger — Draco respondeu por fim — Se lembra?

Pela primeira vez, Hermione pareceu dar um sorriso genuíno naquele dia. Que pergunta idiota de se fazer, quando a resposta era bastante óbvia no final das contas.

— Bem, é claro. Eu criei as regras — disse.

— E ainda assim parece estar tão disposta a quebra-las — Draco retrucou.

— Eu não fui a única a fazer uma tentativa desse tipo hoje — agora o sorriso se desfazia no rosto de Hermione, seus traços se enrijeceram, gerando uma expressão séria.

— Ah, entendo... eu não deveria ter mencionado seu namorado — Draco fez uma careta ao pronunciar a última palavra, seu tom demonstrava certo deboche. Muito embora muitas coisas tivessem se modificado tais como o lado que ele defendia na Guerra e seus conceitos sobre os trouxas, afinal, caso contrário, ele não estaria tendo encontros como aquele com Hermione Granger, seu desprezo por Rony permanecia o mesmo.

Uma pequena parte dele parecia saber exatamente o que estava acontecendo, enquanto a outra, se recusava a acreditar.

Se as coisas tivessem sido diferentes, Hermione provavelmente ainda estaria com o Weasley.

Mas não havia por que ele sentir ciúmes dela por aquilo, a ideia lhe parecia completamente absurda.

Você simplesmente não pode perder aquilo que nunca teve.

E muito menos esperar por algo que nunca vai ter.

Ao ouvir a menção a Rony pela segunda vez, Hermione se levantou da cama desajeitada arrumando o lençol ao redor do corpo, quase num acesso de fúria. Sua expressão demonstrava certa irritação, mas sua voz tinha o tom mais brando e formal que ela conseguiu manter.

— Está na minha hora, me avise caso saiba de alguma coisa. Você tem a moeda para mantermos o contato — e se encaminhou logo em seguida para o pequeno banheiro que havia ali no intuito de se vestir novamente.

A expressão de Draco suavizou ao observá-la fechar a porta atrás de si. Era curioso que Hermione ainda insistisse em se esconder dele com aqueles lençóis ridículos. Não havia nada que ele já não tivesse visto ou tocado antes.

Ao menos na questão física, havia muito pouco que eles pudessem esconder um do outro.

Quando fechou a porta atrás de si, Hermione se deixou desabar no chão, as lágrimas finalmente irromperam por sua face. E tudo que ela havia evitado pensar até então invadia sua mente como um verdadeiro furacão.

Maldito Malfoy. Como ele poderia fazê-la reviver todas aquelas lembranças em troca de um comentário maldoso e sem nexo?

Rony Weasley estava morto. Harry, por sua vez, lutava para continuar acreditando e para finalizar sua busca pelas Horcruxes a fim de destruir Voldemort. Ao passo que este estava cada vez mais perto de se consolidar de uma vez por todas no mundo mágico, varrendo de seu caminho toda e qualquer oposição.

Era um cenário terrível.

Havia muito pouco para esperar daquilo, a luz no fim do túnel além de distante, parecia estar mais perto de se apagar a cada segundo que se passava.

Não havia espaços para sentimentos num mundo como aquele, especialmente depois de Rony. Ela sequer teve tempo de se despedir. E muito menos de se desculpar. Ele simplesmente se fora.

A deixara para sempre.

Quanto a Draco, ele definitivamente lhe parecia a última pessoa na qual deveria confiar. E, contudo, uma das poucas pessoas com a qual ainda poderia contar. Afinal, ele agora ocupava o lugar de Snape na Ordem, talvez menos inteligente do que o último, ela devia admitir, mas claramente o espião do qual eles precisavam.

Mas não era seu papel de espião que a incomodava, era o relacionamento um tanto quanto estranho que os dois haviam construído naqueles últimos meses. Hermione realmente não sabia até onde um relacionamento puramente carnal como o deles poderia desenvolver algo mais.

No entanto, ela tampouco sabia como foi que eles passaram de inimigos a aliados, e de aliados a amantes em tão pouco tempo.

Ainda cambaleante, se levantou do chão, se colocando em frente a pia e evitando encarar o próprio rosto no pequeno espelho que havia ali. Sua aparência deveria estar horrível. Lentamente, lavou o rosto em prol de amenizar a vermelhidão, numa tentativa frustrada de esconder a grande prova de que havia chorado.

Quando seus olhos finalmente encontraram sua imagem no espelho, Hermione não pôde deixar de notar uma região relativamente avermelhada em seu pescoço, onde uma vez estiveram os lábios de Draco, que serviam como uma lembrança do que acontecera entre eles naquele mesmo local, uma hora antes. Seus dedos, então, percorreram lenta e preguiçosamente o local. A sensação ainda era bastante vívida em sua memória.

Foi quando, numa epifania, ela percebeu: estava quebrando as regras.

*****

Regra número um, não é nada pessoal. Hermione repetiu a frase a si mesma provavelmente inúmeras vezes nas semanas que se seguiram desde seu último encontro com Draco Malfoy.

Ela não tivera a chance de encontra-lo desde então, naquele dia, eles sequer haviam trocado alguma palavra além do breve aviso que ela lhe deixara sobre entrar em contato caso qualquer coisa de diferente acontecesse. Draco deixara o pequeno quarto antes dela e pouco pareceu se importar com sua demora anormal no banheiro.

A princípio, aquilo a fez se sentir aliviada. Ela não desejava de forma alguma que ele soubesse que ela havia chorado no banheiro em função de sua breve menção a Rony.

Hermione preferia nada a ter que encarar o olhar de desdém de Draco. Tudo menos indiferença. Qualquer coisa menos isso.

Eu não sou fraca, só estou cansada. Exausta.

Mas, no fundo de sua mente, parecia brotar um pensamento desesperador. Se por acaso alguma coisa acontecesse com ele, aquilo seria tudo o que eles tinham a dizer um ao outro? Alguns olhares raivosos e palavras vazias?

Mas, afinal, Hermione Granger sabia perfeitamente que era impossível perder aquilo que nunca teve. Fora por isso que propusera as regras, no final das contas.

A indiferença parecia tornar as coisas mais simples, ao menos até o momento em que sua barreira não fosse superada. E, ali, parada em seu pequeno quarto, ainda enrolada nas cobertas encarando o teto, ela começou a entender a verdadeira natureza das pequenas regras que criara e propusera a Draco e tudo lhe pareceu estupidamente infantil.

Era ridículo de óbvio que ela não desejava para o relacionamento deles o mesmo que havia ocorrido entre ela e Rony. Ele não era Rony, disso ela tinha toda a certeza do mundo. E qualquer coisa que havia entre ela e Draco tinha uma natureza completamente oposta.

Rony era seu amigo, cresceram juntos. Quando ele simplesmente virou as costas para ela e Harry, ainda no período em que eles estavam se escondendo pelas florestas numa barraca de camping e aparatando e desaparatando debaixo da capa da invisibilidade de Harry, lhe pareceu um completo absurdo a ideia de que nunca mais o veria de novo. Um mundo sem ele era inadmissível, inconcebível.

Mas ele jamais voltou, até que enfim fora constatado que ele estava definitivamente morto. E ela sequer teve a oportunidade de esclarecer as coisas.

Rony Weasley provavelmente morrera a odiando.

Quanto a Draco, não era como se ela pudesse destruir qualquer ligação entre eles. A princípio, não havia nada, e tudo que ela teria que fazer era impedir que houvesse algum dia, o que parecia uma tarefa bastante fácil considerando o histórico dos dois.

E relação entre os dois havia surgido em função da conexão gerada pela mudança de lados de Draco, que havia decidido ajudar à Ordem. Os motivos eram bem óbvios, e, como tudo nele, altamente egoístas, ele e sua família estavam sendo massacrados por Lorde Voldemort. Draco precisava de ajuda e, em troca disso, fingia fidelidade aos Comensais da Morte e passava algumas poucas informações que conseguia para a Ordem.

Suas informações, no entanto, eram míseras. Mas na situação de fragmentação que a Ordem se encontrava, com poucos membros ainda disponíveis, elas acabavam sendo úteis de alguma forma, nem que fosse para evitar que os integrantes remanescentes fossem capturados. Mas Hermione também deveria reconhecer, ele havia melhorado no seu papel de espião nos últimos meses. Até mesmo Harry, que ainda mantinha grande antipatia pelo Malfoy, reconhecera o progresso.

No fim das contas, restara a Hermione a tarefa de manter o contato com Draco e repassar suas informações para Harry e os outros. As razões eram simples, ela era uma das pessoas mais confiáveis do grupo ao passo que o próprio Harry não poderia se arriscar tanto assim numa saída como aquela quando sempre havia uma possibilidade de eles estarem sendo enganados. Além disso, Hermione era uma bruxa excelente que saberia lidar com qualquer situação inesperada.

No entanto, era curioso que desde que tudo aquilo começara, Draco não se mostrara disposto a enganá-los. Talvez ele de fato merecesse um voto de confiança.

Foi naquele dia, na hora do almoço, que Draco fez contato com Hermione novamente pela pequena moeda que os dois compartilhavam.

O encontro havia sido marcado para às onze da noite. Hermione estranhou o horário pois eles não costumavam se encontrar tão tarde, mas não havia como questionar qualquer coisa com aquele simples objeto de contato deveras limitado. Sendo assim, apenas lhe restou aceitar.

Sentia-se receosa pelo encontro iminente. Mas ainda era seu dever receber as informações, Harry precisava delas. Por mais estranho que parecesse ter de encarar Draco novamente depois de ter aceitado que o relacionamento entre eles caminhara para um caminho sem volta.

Era assustador pensar naquilo, especialmente porque soava absurdo e completamente insensato esperar por algo que ela nunca teria.

*****

O pequeno cômodo estava uma verdadeira bagunça, ele mesmo havia feito questão de retirar cada peça do lugar e transformar em pequenos caquinhos qualquer objeto que pudesse ser quebrado.

Quando finalmente chegou ali, muito embora o coração batesse com força contra o peito, agitado, sua expressão parecia denotar serenidade ao falar com a atendente responsável pelo local. Mas no momento em que a porta do quarto fechou atrás de si, ele logo tratou de lançar um feitiço para evitar que qualquer barulho fosse ouvido por alguém de fora e, então, desabou.

As lágrimas irromperam desinibidas pela sua face até que ele caísse num choro desconsolado com a pior certeza de que poderia ter na vida naquele momento.

Lucius Malfoy estava morto.

Destruir os poucos objetos que haviam por ali, no entanto, não parecia o suficiente para amenizar a dor. Apenas aumentava sua sensação de abandono.

Numa atitude desesperada, e até mesmo insensata, puxou a manga de sua blusa até a altura do cotovelo, revelando a marca que recebera há alguns anos atrás, composta por uma cobra e uma caveira.

Parecia ridículo que algo que havia o deixado tão satisfeito um dia pudesse se tornar sua ruína com tamanha facilidade.

Agora ele tinha um sorriso torto e amargurado desenhado no rosto, as lágrimas já não escorriam com tanta facilidade, mas a sensação sufocante continuava ali. Seus olhos recaíram mais uma vez sobre a marca antes que ele começasse a arranhá-la com as próprias unhas, esfolando a pele a cada nova tentativa.

Não demorou muito para que pequenas gotículas de sangue começassem a brotar no local, o que tampouco lhe importou. A dor o deixou tão anestesiado por alguns momentos a um ponto que ele não saberia dizer como foi que encontrou a pequena moeda que Hermione lhe dera e decidiu chama-la até ali.

Ele precisava vê-la, precisava dela.

Mas ela não poderia encontra-lo naquele estado.

Regra número dois, se lembrou por fim, não demonstrar emoções pessoais.

Quando Hermione enfim apareceu na porta, Draco já havia recuperado sua compostura e o quarto já se encontrava em seu mais perfeito estado de ordem. Rapidamente abriu a porta, abrindo caminho para que ela finalmente pudesse adentrar o cômodo. A garota, por sua vez, levantou uma das sobrancelhas, confusa.

— Draco você não vai fazer a pergunt — antes que Hermione tivesse a chance de completar a frase, a porta atrás de si já havia sido fechada e seu rosto capturado pelas mãos do rapaz que agora a beijava com força, como uma necessidade estranha. Ainda surpresa, ela demorou a corresponder. Mas ele não parecia se importar.

Dane-se a pergunta, Granger.

Seus lábios procuravam ansiosos pelos os dela, mas Hermione o correspondia numa calma um tanto quanto irritante. E, no momento seguinte, ele já havia abandonado os lábios da garota, uma de suas mãos puxava-a pela cintura, apertando-a contra si. Ao passo que sua boca percorria o pescoço dela, marcando-o com os dentes.

Hermione soltou um gemido de dor quando ele cravou os dentes em sua carne uma força além do habitual.

— Draco para com isso — protestou num tom abafado pela proximidade entre os dois — Você está me machucando.

Draco suspirou, largando-a abruptamente, finalizando o processo de maneira tão repentina quanto havia o começado.

Preciso sentir alguma coisa, qualquer coisa.

Qualquer coisa além daquele vazio que parecia estar o consumindo desde o começo daquele dia quando recebera a notícia da morte de seu pai.

— Qual é o seu problema? — Hermione disparou, a voz levemente alterada. Encontrava-se encostada contra uma parede atrás de si respirando ofegante e com uma das mãos agora no local onde os dentes dele estiveram segundos atrás, ao passo que Draco estava recurvado sobre ela, em função de suas diferenças de altura, com um dos braços descansando contra a mesma parede, impedindo que ela saísse dali, apesar de agora haver alguma distância entre os dois.

Ele não respondeu. Desviou o olhar irritado.

— Você pode simplesmente olhar para mim?

— Faz algum tempo desde a última vez que nos vimos — disse enfim, agora se afastando. Evitou encará-la.

— Alguma novidade desde então? — Hermione se recompôs.

Da última vez que eles se encontraram, também não havia novidade alguma. Mas ela marcara um encontro da mesma forma.

— Não — disse secamente — Queria te ver, só isso.

Hermione se calou. Agora ela pôde finalmente perceber um pequeno copo estilhaçado no chão perto de seu pé esquerdo.

Como se seus olhos acompanhassem os movimentos dos dela, Draco logo sacou sua varinha do bolso direito e recompôs o copo, colocando-o de volta no criado mudo que havia ali.

— Você pode ir se quiser... se não está se sentindo disposta. Eu não me importo.

— Eu...

Ele ainda não a olhava.

Será que agora você pode simplesmente olhar para mim?

— Eu vou ficar — Hermione respondeu virando-se para a beira da cama onde ele havia se sentado alguns segundos antes.

Ele finalmente a olhou, e então a situação que parecia estar tomando formas inusitadas tornou-se novamente banal. De repente, ela estava mais uma vez diante o mesmo velho cenário que já conhecia tão bem.

As razões pelas quais ele a queria ali eram bem óbvias, afinal.

— Certo, venha aqui, Granger — disse dessa vez num tom mais suave do que o anterior.

Hermione se aproximou, abandonou seus sapatos de qualquer maneira pelo chão do aposento antes de se posicionar no colo dele. Por consequência, adquirira uma visão superior de Draco, sentado na borda daquele mesmo colchão.

Seus olhos se encontraram por breves segundos antes que Draco desviasse o olhar e que ela se inclinasse para beijá-lo, as pontas de seu cabelo roçaram de leve contra o rosto dele, causando uma sensação curiosa de formigamento.

Ela o beijava de forma completamente diferente do que ele havia feito minutos atrás, lentamente, capturou seu lábio inferior nos seus antes de aprofundar o beijo assumindo um ritmo lento que permitisse aos dois provar um do outro de uma maneira que haviam evitado durante todo aquele tempo.

Tinha gosto de veneno, Draco pensou, mas ainda era incrivelmente doce.

Instintivamente, ele a puxou para mais perto de si, um dos braços envolvendo-a pela cintura, enquanto a outra mão segurava-lhe pelas raízes do cabelo.

É melhor você não parar agora, Granger.

Hermione, por sua vez, apoiava-se nele, ambos os braços apoiados lhe envolvendo pelo pescoço e seu corpo mais relaxado a medida que ele a puxava para si.

Era só um beijo, ela havia o beijado antes, inúmeras vezes. Mas pareceu... diferente.

No entanto, quando quebraram o contato entre os lábios, e as mãos de Draco já haviam removido sua blusa, deixando-a somente com sutiã, e ela mesma já tivesse se livrado da blusa de mangas compridas que ele usava, seus olhos recaíram na conhecida marca em um dos braços do rapaz.

— Não... olha... pra isso — ele disse imediatamente num tom pausado, os dedos segurando a garota pelo queixo, de forma a trazer sua atenção de volta para si. Eles ainda se encontravam perto o suficiente para que ela pudesse sentir a respiração dele contra seu rosto.

Hermione franziu o cenho, a marca estava diferente, a carne se encontrava avermelhada, esfolada e com alguns resquícios de sangue. Era como se ele tivesse tentado por contra própria remover a imagem dali e falhado miseravelmente.

Draco sabia que deveria ter utilizado magia para consertar o estrago que fizera, mas aquele símbolo lhe parecia muito melhor quando ele não era obrigado a vê-lo com clareza. Ela não podia culpa-lo por isso. E, afinal, desde quando Hermione se importava?

— Você estava tentando removê-lo? — Hermione perguntou, a voz assumindo um tom de incredulidade.

Desde quando ele decidira se mutilar, afinal?

— Você sabe que não é possível remover — Draco rebateu num tom entediado — Agora, será que você pode simplesmente continuar o que estávamos fazendo? Sinceramente, meu pau já estava ficando du...

— Não — ela interrompeu, se afastando dele e se colocando em pé novamente — O que está acontecendo com você?

— Não discutiremos assuntos pessoais, é a nossa regra, se lembra? Agora volte aqui, Granger — ele retorquiu imediatamente.

— Isso não é pessoal.

— Isso não é da sua conta.

Hermione engoliu em seco. Os motivos pelos quais decidira não se envolver emocionalmente com ele agora lhe pareciam mais óbvios do que nunca.

Mas não era como se ela simplesmente pudesse se virar e ir embora àquela altura.

Era tarde demais.

Então, contrariando todo bom senso que mantivera até ali, ela se colocou sentada ao lado dele na beira da cama. Ele já havia parado de olhá-la e tratado de esconder os olhos marejados. Mas Hermione se manteve firme.

— Você não vai ofender falando essas coisas, espero que saiba disso.

Silêncio.

Você não vai quebrar minhas defesas, Granger.

— Eu não me importo em te ofender, eu sequer me importo com você. Eu...

— Isso não te define, a marca — ela o interrompeu novamente, ignorando o tom arrogante que ele decidira assumir.

Era estranho a forma como as palavras dele haviam a atingido, como se a perspectiva de ter alguma verdade nelas lhe parecesse desesperadora.

Mas então ele voltou a encará-la e ela pôde perceber que seus olhos estavam marejados.

Ele esteve chorando, concluiu. E era um choque reconhecer aquele lado dele, especialmente porque de todas as faces que ela havia descoberto que ele tinha, aquela era a última que algum dia imaginou ter de lidar.

— Como você pode ter tanta certeza?

— Você tem ajudado a Ordem — ela disse simplesmente, como se aquilo fosse fácil de fazer.

— Eu tinha que fazer alguma coisa — Draco respondeu — Ele iria matar meu pai, onde mais eu poderia achar uma maneira de pará-lo? Você não sabe o que acontece com os Comensais da Morte que aborrecem o Lorde das Trevas. Você não viu, mas eu sim.

Ao colocar aquilo em palavras as memórias do que acontecera com Lucius após ele não conseguir cumprir as ordens dadas por Voldemort, e toda retaliação que os demais sofriam sempre que Ele não conseguia o que queria vieram à tona e Draco se sentiu enjoado.

Nunca havia contado aquilo para ninguém.

Àquela altura, era como se a barreira que ele e Hermione tanto se esforçaram para construir durante todo aquele tempo estivesse se desfazendo como um castelo de cartas ao mais mísero toque. Frágil demais.

E uma vez que começasse a falar, não saberia se seria capaz de se conter em fazer a revelação sobre o destino de seu pai, o qual teve ciência naquela manhã.

Ela era a pessoa em quem ele mais confiava no mundo naquele momento. Doía não poder admitir aquilo claramente.

Merda de regras.

Hermione se manteve em silêncio, uma de suas mãos agora descansava sobre o ombro de Draco. Era estranho estar perto daquele jeito, parecia íntimo demais. Mais do que eles jamais foram quando estavam realmente desnudos. Talvez fosse porque ali, naquele momento, ambos estivessem realmente expostos.

— Agora tanto faz — ele continuou, um som estranho saiu de sua garganta, o que ela identificou como um riso amargurado — Lucius está morto. Ele se foi. E eu não pude fazer nada em relação a isso.

A perspectiva de seu pai estar morto era, para Draco, devastadora. A pessoa que ele mais admirava na vida agora havia sido reduzida a nada.

Ainda que não houvesse muito pelo o que o admirar, no fim das contas.

E era patético, pois seu sangue puro havia feito muito pouca diferença.

Você percebe agora? Nós somos exatamente os mesmos, Granger. Estamos no mesmo barco no fim das contas... eu e você.

Mas para Hermione aquilo parecia um tanto quanto esclarecedor, agora ela poderia por que ele se encontrava naquele estado. Voldemort havia chegado a um ponto que tanto trouxas quanto opositores eram seus inimigos, mas mesmo aqueles sangue-puro que não o agradassem em algum momento, independentemente de onde estivesse sua fidelidade, eram dignos de sua fúria.

Lucius havia sido um deles, uma vítima de seu orgulho e de sua prepotência.

No fim das contas, ele morrera da mesma forma que os trouxas estavam morrendo.

Havia se tornado apenas mais um.

Ela não poderia dizer que a morte do homem a comovia, mas a perspectiva do que estava de fato acontecendo a enojava, a fazia se sentir como se um verdadeiro buraco estivesse aberto em seu peito. Era simplesmente absurdo demais.

— Eu... sinto muito pelo seu pai — sua voz saiu trêmula e um tanto embargada quando conseguiu expressar seus pensamentos em palavras.

— Não sinta — Draco a cortou — Ele não sentiria por você, muito pelo contrário.

Era impossível achar qualquer tipo de palavras no momento, os olhos de Draco agora fixavam um ponto qualquer que ela não conseguia localizar. Já não estavam mais marejados de lágrimas, seu olhar era apenas vazio.

Surpreendendo a ele, e a si mesma, Hermione segurou o rosto do rapaz com ambas as mãos, obrigando-o a se virar para ela. Então, no momento seguinte, depositou um beijo casto em sua testa. E, quando os olhos de Draco focalizaram sua imagem novamente, ela tinha um pequeno sorriso gentil desenhado nos lábios.

Ela nunca havia sorrido daquela forma, não para ele.

— Acho que quebramos todas as regras — ela disse enfim, e então seu sorriso se alargou.

Draco retribuiu com um pequeno sorriso de canto. E então sentiu algo aquecer dentro dele, sentia-se calmo, menos angustiado. Lucius agora parecia uma ferida possível de ser curada.

— Não deveríamos mais esconder as coisas um do outro — ela começou.

— Do que você está falando?

— O que deu de errado entre eu e o Rony foi que... — ela tomou fôlego antes de continuar — ele está morto. Não numa missão secreta ou coisa do tipo como eu havia dito.

Agora parecia mais fácil contar aquelas coisas a ele. Draco demonstrou surpresa no olhar, quão mais patético ele poderia soar num único dia?

Sentia ciúmes, invejava alguém que estava morto.

— Granger, eu...

— Não tem absolutamente nada entre a gente que se assemelhe com eu tive com o Rony. Nunca teve.

Você não pode perder aquilo que nunca teve, Hermione se lembrou do pequeno mantra que havia repetido a si mesma durante tanto tempo, mas eu também não posso perder você.

— Então é isso? — Draco indagou — Você tem medo de perder as pessoas, medo de que aconteça algo assim como foi com o Weasley e, no entanto, não tem medo de perder a mim.

— Não, eu não posso perder você também.

A convicção com que as palavras saíram de sua boca, a assustou, mas Hermione se manteve. Naquele instante, seus olhos percorreram o velho relógio que ficava em uma das paredes.

Já passavam das uma da manhã.

— Granger, você vai passar a noite aqui? — ele a perguntou, fazendo-a se voltar para encará-lo.

Eles nunca dormiam juntos.

— Eu deveria?

Mas Draco não a respondeu, ele apenas se inclinou gentilmente para beijá-la no rosto e, no momento seguinte, seus lábios encontraram os dela de forma natural, quase instintiva. Uma de suas mãos subiram até um dos ombros de Hermione abaixando as alças do sutiã que ela usava, o qual ela se apressou para remover completamente.

Eles decidiram assumir um ritmo diferente do usual daquela vez, ao contrário do habitual, não parecia um crime tão grande que seus olhos se encontrassem por mais tempo do que o necessário, ou que seus beijos tivessem significado, sentimentos.

Naquela noite, eles não tiveram que se preocupar com efemeridade de suas existências, a ideia de tudo que acontecia ao redor deles se transformava num pequeno borrão insignificante.

Voldemort.

A Ordem.

Os Comensais.

A pequena marca mutilada no braço de Draco.

Rony Weasley.

Tudo se desfazia naquele momento, ainda que fossem retornar na manhã seguinte tão sólidos e reais como sempre foram. Naquela noite, pouco importava.

Porque para eles, era absolutamente pessoal.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente fazia muito tempo que eu não escrevia algo realmente longo assim numa one shot. Na realidade, fazia tempo que eu não escrevia uma fanfic desse jeito e eu honestamente quase perdi o jeito, porque eu levei uns três dias organizando tudo antes de postar, ufa!!!

Segundo, eu realmente queria fazer algo com esses dois, desde que acabei de ler a saga recentemente e fui apresentada a mais um crackship. Eu, inclusive, tinha planos para uma long, porém, achei melhor tentar algo assim para ver se levo jeito para a coisa. Portanto, reviews são super importantes.

Em terceiro, caso estejam interessados, assistam meu video dramione também https://www.youtube.com/watch?v=D_WQ67hrzJk

Aguardo suas opiniões, um beijo!!