Até que a Morte nos Una escrita por Nuwandah


Capítulo 9
O remédio que eu preciso




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— Mas que diabos foi aquilo que você fez no meio da aula?! – Suigetsu me perguntou depois que a aula acabou, o professor se retirou de sala e os garotos se amontoaram ao redor da minha carteira. Enquanto falava, ele tentava segurar o riso, mas sem muito sucesso. Depois que me fez a pergunta, caiu na gargalhada com Naruto e Kiba.

Tentei fugir de ter que responder apenas ignorando-os, mas notei que Shikamaru fitava-me, esperando uma resposta.

— Aquilo não foi nada. – Eu sabia que aquela desculpa já estava passava, mas ainda tinha esperanças de que ela funcionasse.

— Fale a verdade, Sasuke. A mim, você não engana.

Ah, droga... Shikamaru era muito inteligente para eu inventar uma desculpa qualquer e ele acreditar. Abria e fechava a boca a cada ideia que tinha e descartava logo em seguida. Sakura notou que eu estava sem ideia, e resolveu me ajudar:

— Diz que você estava falando no celular.

Pareceu-me aceitável a desculpa que ela inventou. Senti-me até agradecido, mas depois lembrei que aquilo não passava da obrigação dela, já que fora ela própria quem me causara aquele problema.

— Eu estava falando no celular com uma pessoa e ela acabou me estressando além da conta.

— Ah, é? Que coragem você tem de falar no celular escondido no meio da aula... Se isso não pode ser chamado de burrice. – Shikamaru pensou provavelmente nas regras rígidas que os professores seguem à risca naquele colégio, mas ainda não parecia muito convencido. – E quem era?

Dessa vez, formulei uma história bem rápido.

— Era minha ex-namorada. Queria voltar comigo a todo o custo.

— Ah... As garotas são muito problemáticas. – Shikamaru comentou. - Não sabia que você já teve uma namorada... – Ele se interrompeu, achei que ele ia começar a me contestar a respeito de ter uma namorada... talvez por causa do meu jeito. – Ah, quer saber? Vocês todos são problemáticos. Vou dormir. – Então, ele foi sentar-se em sua carteira e apoiou a cabeça sonolentamente sobre os braços cruzados.

— Nossa...  Eu pensei que ele ia ficar te perguntando até você dizer a verdade. – Sakura disse, aliviada.

— Eu já disse para você calar a boca! – Suigetsu disse repentinamente e alterado na carteira ao meu lado. Estava reproduzindo o momento que gritei com Sakura. Naruto e Kiba riram mais ainda e Suigetsu juntou-se a eles logo em seguida.

— Idiotas. – Rosnei.

Sakura não se pronunciara boa parte do tempo depois disso. Apenas observava os outros e a mim com uma expressão neutra.

— Hein, hein, Sasuke-kun! O que vamos fazer hoje? – Sakura virou-se para mim animada de repente enquanto eu escolhia qual bebida comprar na máquina automática.

— Vamos tentar descobrir por que você continua aqui. – Contei-a em um tom baixo.

Ela deu um largo sorriso e juntou as mãos.

— Obrigada, Sasuke-kun! – Sakura sentiu-se bastante agradecida, mal ela sabia que eu fazia isso apenas para me livrar logo dela.

Sakura me pareceu mais animada do que o normal o resto das aulas. Mesmo não sendo obrigada e nem sequer necessitar, ela prestou a atenção em todas as aulas. Seu interesse por ainda aprender era enorme.

A volta para casa foi acompanhada de uma Sakura ansiosa e saltitante, mas também de olhares e cochichos de alguns alunos. A notícia de eu ter gritado “sozinho” no meio da sala de aula já tinha se espalhado pelo colégio.

— Quando foi que você teve uma namorada? – Naruto começou quando saímos do metrô. Então, Shikamaru já devia ter explicado aos outros o porquê da minha atitude estranha em aula.

— Faz mais de um ano, eu ainda morava em Nakai. – Expliquei sem dar muitos detalhes propositalmente.

— Ah... Há mais alguma coisa assim, tipo... Importante na sua vida que você não contou pra gente? – Ele ressaltou a palavra em um tom ressentido.

Estranhamente, todos pararam de imediato. Parecia até que eles sabiam o que tinha vindo à minha cabeça com aquela pergunta: a morte de meus pais. Mas era claro que Naruto sabia desse acontecimento funesto, porém o seu nível de lerdeza era sempre elevado a uma nova potência a cada dia que passávamos juntos.

Os outros olharam para Naruto reprovadoramente e ficaram a encarar-me apreensivos. Ficamos assim por poucos segundos, dois, no máximo, mas pareceu ser bem mais que isso. Sakura observava o clima hostil sem entender.

— Não, mais nada. – Respondi a ele.

Então, notei que tínhamos chegado à esquina que sempre nos separávamos e cada um ia para sua residência. Logo depois, os outros também notaram isso.

— Bem, nos vemos amanhã, ok? – Suigetsu falou, cortando o silêncio que tinha ficado entre nós.

Suigetsu não sabia dos machucados do incidente do dia anterior e, como despedida, deu um tapa amigável nas minhas costas. Os músculos do meu corpo se contraíram com a ardência inesperada e minha expressão mudou levemente, mas ninguém notou isso, ainda bem. Se eles o tivessem, não saberia qual desculpa dar. Nunca fui muito bom em inventar mentiras.

— Vamos fazer a pesquisa agora? – Sakura me perguntou sem jeito quando entramos em meu quarto.

— Vamos. – Assenti enquanto ligava meu computador na escrivaninha, posta na parede oposta à janela. Ela sorriu para mim. Aquilo acabou me deixando embaraçado. – O que foi?

— Nada, só estou feliz por você estar ajudando a mim, uma completa desconhecida. – Ela alargou mais ainda o sorriso.

—... Claro.

Desabotoei a blusa do uniforme para ficar mais confortável e a guardei. Fiquei apenas com a blusa branca que usava por baixo. Sakura me olhou apreensiva, logo deduzi o que ela estava pensando.

— Não se preocupe, não vou fazer um strip. – Tentei acalmá-la de um jeito divertido, mas ela pareceu mais constrangida ainda com o que eu disse. Acho que perdi a prática. Porém, o que mais me intrigou depois disso foi eu ter tentado diverti-la. No que eu estava pensando?

Após o computador ter iniciado, sentei-me na cadeira à frente dele e Sakura ficou em pé ao meu lado. Abri a página de pesquisa e escrevi a coisa mais óbvia que veio a minha cabeça.

Espíritos na terra”.

A pesquisa deu mais de 500.000.000 resultados. Não sabia que esse tema era tão popular. Pensei que, por tanta gente se interessar nisso, quantas coisas dali seriam verdadeiras ou apenas delírios ou invenção de fanáticos. Até na internet eu teria dificuldade de achar algo que preste, que saco.

Muito mais rápido do que imaginei, encontrei algo solícito. Sakura ainda lia atentamente tudo que eu encontrava.

O site falava sobre o livro de um médium estadunidense. – percebi que, praticamente, todos os médiuns que eu já tinha ouvido falar eram norte-americanos. Por que isso? Eles são tão carentes de atenção quanto parecem ser? – O livro explicava diversas coisas do mundo espiritual, entre elas, estava uma parte que me interessou. Li atentamente.

(...) afirma que os espíritos de pessoas queridas estão sempre à nossa volta, olhando por nós e até interferindo em nossas escolhas para tomarmos o caminho certo”.

Fiquei estático ao ler aquilo. “Pessoas queridas”? Ele disse que elas estão sempre à nossa volta? Fiquei confuso. Aquilo valia para todos que já tinham morrido? Uma pontada de esperança penetrou-me. Quer dizer que meus pais estavam sempre comigo? Não sabia se ficava feliz ou incrédulo. Se o que aquele homem dizia fosse apenas mentira... Mas e se fosse verdade? Talvez eu conseguisse entrar em contato com eles de alguma forma...

Não, isso já era demais, no que eu estava pensando? Estava tão desesperado assim para vê-los de novo?

Que ridículo, Sasuke! Pare de fantasias e resolva logo esse problema, disse para mim mesmo em pensamento. Então, continuei a ler:

No entanto, não são apenas esses espíritos bons que nos cercam. Muitas vezes, pessoas que morreram tragicamente continuam presas a Terra.”

Aquilo me pareceu familiar. Afastei dos meus pensamentos como tinha sido a morte de meus pais. Se continuasse pensando naquilo, tornaría-me um louco obsessivo. Olhei para Sakura sugestivamente. Ela já tinha lido o texto e me encarava sem saber o que dizer.

— Hm... – O que eu queria perguntar a ela era desapropriado de se fazer, mas se quiséssemos continuar com aquilo, tinha que ser aquilo. – Como você morreu?

De semblante triste e olhos perdidos, ela me respondeu:

— Eu não me lembro direito... Quando tento me lembrar disso, a imagem que me vem é de um lugar escuro.

Senti uma imensa vontade de xingar naquele momento, mas me controlei.

— Isso não ajuda em nada. Você pode ter morrido em um lugar fechado, como um quarto de hospital, ou ao ar livre durante a noite. – Analisei.

Sakura abaixou a cabeça tristemente.

— É, eu sei... – Ela disse. Suspirei.

Passei a página um pouco mais para baixo.

 “Alguns espíritos não querem ir embora porque se sentem culpados pelo mal que causaram ou por sentirem que ainda têm tarefas a cumprir.”

Pelo mal que causaram? Eu não conhecia aquela garota, mas, pelo que já tinha visto, ela não era capaz de matar uma mosca- Ah, sim... Lembrei que ela já tentou me matar. Mas não achei que uma garota de treze anos pudesse ter feito algo tão catastrófico em sua vida.

Sentir que ainda tem alguma tarefa a cumprir fez mais sentido. Virei-me para Sakura novamente.

— O que acha?

Ela pôs e dedo indicador sobre o queixo, mostrando que ainda tentava lembrar-se de algo.

— Hm... Que difícil... Não me lembro de muita coisa de minha vida. Seria algo como uma promessa?

— É possível.

Ela ficou quieta, ainda pensando. Vi que aquilo não daria em nada naquele momento. Se ela não se lembrava de sua vida, teríamos que saber sobre isso primeiro.

Li o resto do texto:

 “No entanto, uma pequena porcentagem daqueles que morrem não consegue fazer essa passagem. Fica perdida em uma grande escuridão, uma espécie de limbo: são os chamados espíritos errantes, que se sentem presos ao mundo físico. Isso ocorre devido a uma série de fatores. O mais comum é a morte violenta”.

Um frio percorreu toda a minha espinha quando li aquele parágrafo. Estranhamente, supor que Sakura tivesse morrido de forma violenta era inquietante. Com a visão panorâmica, observei Sakura sem que ela percebesse e vi que ela tinha ficado desconfortável ao ler aquela parte. Tirei logo da página e voltei para o site de busca. Entrei em um site nacional. Algo familiar me chamou a atenção: “Nirvana” era parte do título do texto.

Aquela palavra estalou na minha cabeça. Eu a conhecia, e não era da banda, é quando a alma alcança o dukkha, o estado de libertação do sofrimento.

Aquela possibilidade também me pareceu razoável. Era fácil pensar que Sakura não tivesse encontrado paz. Era quase o mesmo do que tínhamos cogitado antes, sobre a tarefa a ser cumprida.

— Acho que já acabamos por hoje. – Falei para Sakura e ela concordou com um sorriso. Fechei a janela e desliguei o computador.

Direcionei-me ao banheiro para tomar um banho, mas Sakura me impediu que o fizesse.

— S- Sasuke-kun, espere. – Virei-me para ela e esperei que continuasse. – Deixe-me ver suas costas, por favor.

Fiquei atônito. De alguma forma, ela percebeu que eu estava machucado, mas como?

— Para quê? – Perguntei-a. Sakura acabou corando levemente.

— É que eu vi quando o Suigetsu-kun bateu em suas costas agora há pouco. Você pareceu ter sentido dor. – Que garota inacreditável, e eu que achei que ninguém notaria aquela pequena alteração. Ela prosseguiu. – Foi lá nos trilhos, né? Se doeu, elas não devem estar muito boas. Você as tratou? – Nem tinha pensado naquilo. Eu nunca tratava minhas feridas, que o fazia era a minha... Esquece.

Balancei a cabeça negativamente. Sakura fez uma expressão reprovadora e gesticulou para que eu mostrasse logo minhas costas a ela. Suspirei em derrota, desabotoei minha blusa enquanto andava até ela e virei de costas já sem a peça de roupa.

Ela balbuciou algo quando olhou para minhas feridas.

— Sasuke-kun, isso está horrível! Está começando a infeccionar.

— Não deve estar tão ruim. – Disse, tentando, inconscientemente, convencer-me disso.

— Olhe no espelho e repita isso. – Sakura falou com a autoridade e preocupação de uma mãe. Fitei-a, sentindo-me fortemente tentado a ignorá-la e ir tomar o meu desejado banho, mas, estranhamente, caminhei para o banheiro, não para tomar banho mas, sim, para olhar o espelho.

Sakura estava certa. Sem limpeza e cuidados adequados, as feridas praticamente infeccionaram, tomando uma aparência bem mais desagradável do que da última vez que as vira. As partes que não estavam cobertas pelo pus estavam com um vermelho intenso e, ao redor, rosadas.

Sakura, ao notar o meu olhar de espanto, olhou-me vitoriosamente e, depois, atenciosamente e disse:

— Nós temos que tratar isso. – Finalmente, tirei meus olhos do espelho e voltei-me para ela.

— Nada de “nós”. Eu sei muito bem cuidar de mim mesmo.

Sakura deixou escapar uma risada divertida, que logo foi abafada por sua mão.

— Qual é a graça?

— Ah... Desculpa, Sasuke-kun. É que isso foi mesmo engraçado... – Ela então me olhou desafiadoramente. - Diga-me: o que se passa em machucados? – Ah, então era isso. Ela achava que eu não sabia cuidar de mim mesmo.

— Pomada. – A respondi, aceitando o “desafio”.

— ... Mas só isso? – Sakura divertiu-se com a expressão de dúvida que se formou em meu rosto. Mas não era mesmo só aquilo?

Tentei lembrar-me de quando eu me machucava quando era criança. Mesmo sendo muito agitado, não caía muito. – Agilidade e reflexos bons. – Por isso, não me lembrava direito.

— Só isso. – Ela riu de novo, não se controlando tanto quanto na última vez.

— Completamente errado, Sasuke-kun! Agora vá tomar banho e, depois, pegue a caixa de primeiros socorros que te ajudo.

Depois de mostrar a mim mesmo que não sabia o que fazer naquele caso e sem muitas opções – era ela ou Itachi - , bufando, fui tomar um banho rápido, tomando cuidado para não fazer nada que fizesse minhas costas arderem novamente.

Após o banho e, usando apenas uma calça moletom, fui até o quarto de Itachi e retirei a caixa branca de madeira da parte mais alta do armário e a levei para o meu quarto. Coloquei-a sobre a beirada da cama e a abri. Sakura sentou ao lado.

Tinham tantas coisas que me senti confuso. Poderia até saber como usar todos aqueles rolos, bisnagas e frascos se eu lesse a instrução de cada um. Inviável, gastaria muito tempo para fazer algo que nem fazia grande questão de fazer.

— Pegue a água oxigenada. – Ela apontou para um frasco de cor opaca e tampa azul-escura. Apanhei-a. – Agora, dois pedaços de algodão. – Belisquei uma parte do rolo e a dividi em dois. – Coloque água no algodão e passe com cuidado nas feridas.

Hesitei, aquele líquido pareceu-me duvidoso. Possivelmente, era um alerta do fundo das minhas memórias.

— Isso vai arder? – Sakura riu de mim novamente.

— Por quê? Tem medo de sentir dor?

Fechei a cara por conta do constrangimento que senti com aquela pergunta e, para mostrá-la uma resposta negativa, esfreguei de vez o algodão molhado em minhas feridas. Logo, parei bruscamente com o movimento por causa da dor forte e concentrada que senti.

— Uuh... – Sakura fez ao ver a minha expressão de dor.

— De que inferno veio isso? – Estava revoltado com a ardência.

Sakura riu mais uma vez. Como ela conseguia rir tão facilmente de tudo? Seu humor me intrigava cada vez mais.

— Isso é para limpar, está ardendo porque o seu machucado está sujo – Sakura explicou-me com paciência. -, na verdade, ele está beem sujo. Você não esfregou no banho, certo? Acho que ainda pode ter sujeira dos trilhos do metrô dentro deles. – Mas é claro que eu não esfregaria. Aquela porcaria doía que nem o cão.

Eu tinha que limpar a ferida, então, serrando os dentes, passei novamente o algodão nas costas, e, depois, limpei a espuma branca e incômoda que se formou com o outro algodão.

— E agora?

A garota ficou pensativa.

— Conheço um remédio melhor do que esses remédios modernos. Franzi o cenho pensando no que ela aprontaria dessa vez. – Você tem aí mostarda moída?

— Acho que sim.

Ela levantou-se da cama em um pulo.

— Vem comigo. – E saiu em disparada para a saída do quarto.

— Ei, espere! – Tentei fazê-la parar, mas ela já me aguardava na cozinha.

— Vem logo!

— O que pretende fazer aqui? – Indaguei ao alcançá-la. Ela levantou o dedo indicador e piscou para mim.

— Remédio caseiro!

— Tá falando sério?

— Uhum! É bem mais seguro e saudável do que os de hoje em dia.

— Sabia que você está falando como uma velha?

— Não me importo! Essa é a verdade! – Deixei os ombros caírem, derrotado pela irritante persistência dela.

— O que preciso fazer?

— É simples. Esquente água e coloque os grãos. Depois é só pôr nas feridas e pronto!

Fiz o que ela pediu. Pus água na chaleira e a deixei esquentar por pouco tempo, para que apenas ficasse morna. Quase toda a preparação foi acompanhada pelo olhar atento de Sakura e ela dizendo “Menos água!”, “Não! Assim você vai se queimar.”, “Precisa de mais mostarda.”, “Se você fizer isso, vai estragar tudo!”.

Fiz o remédio mais rápido do que esperava. Sakura me fez retornar ao quarto para passá-lo.

— Pegue o rolo de gaze e o enrole em volta da pasta depois que passá-la.

Fui para frente do espelho já sem muita paciência. Por que eu estava fazendo tudo o que ela mandava ao invés de mandá-la me deixar em paz?

Virei de costas para o espelho e olhei para trás, podendo visualizar bem onde estavam as feridas. Passei a ponta dos dedos na pasta que tinha feito momentos antes. Estava morna ainda, aquilo provavelmente iria arder.

Passei cuidadosamente, doeu menos do que pensei. Peguei a gaze e pensei se deveria passar por toda extensão das feridas, mas, se eu fizesse aquilo, ficaria com o tronco completamente enfaixado, bem parecido com uma múmia. Então, passei apenas nas partes que os cortes eram mais profundos, o que resultou no meu tórax enfaixado completamente.

Finalmente, tinha acabado aquilo. Voltei-me para Sakura.

— Feliz?

Ela estava séria, perdida em seus pensamentos enquanto olhava fixamente para o meu ombro esquerdo. Mais especificamente, para a pequena cicatriz cilíndrica nele. Tapei-a rapidamente com a mão. Ela não precisava saber dessa parte da minha vida.

Com o meu último gesto, ela despertou de seu “transe”.

— Hã? Disse algo?

— ... Não. – Disse já indo para minha cama, e, no caminho, pegando uma blusa para que pudesse vestir e tapar aquela maldita cicatriz.

— O que foi?

— Nada. – Me joguei de bruços por sobre as cobertas. – Absolutamente nada.

Por quê? Por que ela tinha que me fazer lembrar daquilo? E não era nem a primeira vez. Lembrar daquela noite era torturante. Como, de modo tão inocente, Sakura conseguia fazer aquilo comigo e com tanta facilidade?

— Sasuke-kun? – Sakura chamou.

— Fique quieta um pouco, por favor.

Enterrei o rosto no travesseiro, estava quente, aconchegante... Aquilo estava tão convidativo ao sono que me entreguei. O que estava acontecendo comigo? De repente, senti-me tão cansado... Dessa vez, nem tive força para levantar e, ao menos, apagar a luz. O sono estava avassalador.

Mas, de novo, o que deveria ser um merecido descanso tornou-se um pesadelo.

— Sasuke, venha cá! – Minha mãe chamava. Ela estava sentada em um banco de praça, bem ao lado do meu pai.

— Otou-san! Okaa-san! Pensei que vocês tinham me deixado. – Corri para os braços abertos e calorosos deles. – Ainda bem que estava errado... – Mas, ao finalmente alcançá-los, o som baixo e cortante de dois disparos de uma arma com silenciador me fez parar bruscamente na frente deles.

Seus olhos estavam, agora, arregalados de incredulidade e espanto. Senti o vermelho que saía de suas cabeças respingar no meu rosto. Seus corpos, já moles, penderam para frente e suas cabeças se apoiaram em meus ombros, ensopando-os.

— Okaa-san? Otou-san? Por que vocês não estão se mexendo? – Apoiei minhas mãos nas costas de cada um para que não caíssem. Senti o desespero tomar conta de mim. – E- ei... Por que não estão respirando?

Um movimento chamou a minha atenção. Atrás do banco tinha uma pessoa. Não conseguia ver seu rosto, estava coberto por uma máscara de rosto desfigurado em um longo sorriso vermelho, tapando sua identidade. Ele tinha levantado uma arma em minha direção, então, disparou.

Senti um grande impacto no ombro esquerdo, que me desestabilizou. Acabei deixando meus pais caírem no chão como se fossem bonecos enquanto segurava meu ombro fortemente com a mão direita. O sangue corria por entre meus dedos.

Queria levantar meus pais, mas a pessoa a minha frente já estava mirando em mim novamente. Fui tomado pelo medo e instinto de sobrevivência e pus-me a correr o mais rápido que conseguia daquele lugar. Qualquer um serviria, desde que fosse longe dali.

Após alguns metros, fui tentado a olhar para trás, mas o que vi me apavorou ainda mais. Ele estava indo atrás de mim, estava me alcançando. Aquele homem era muito rápido e, em questão de segundos, conseguiu me jogar de bruços no chão com um empurro forte.

Senti que ele já estava em cima de mim, meu coração se apertou. Virei para encará-lo do chão, mas o que encontrei foi sua arma apontada para a minha cabeça. Seu dedo já estava quase no final do gatilho, fechei os olhos e, então, eles se abriram. Estava no meu quarto novamente.

Olhei ao redor para me garantir disso. Só assim consegui me acalmar. Sentia meu coração bater loucamente.

Bem vindo de volta a realidade, pensei, convencendo-me de que aquilo, sim, era real.

Como assim? Já era a segunda vez seguida. E eu pensava que a quantidade de sonhos tinha diminuído significativamente.

 Espera, era a segunda noite desde que Sakura estava comigo e tudo aconteceu exatamente nesse meio-tempo. Teria ela algo a ver com isso? Não, bobagem. Ela não tinha nenhuma ligação com aquele acontecimento.

Mas o que também estava me intrigando era o que exatamente tinha ocorrido no sonho. Eu não tinha memórias certas daquele dia, mas eu sabia o que todos sabiam: um sequestro, dois carros, uma família, três sequestradores, uma rua deserta à noite e mortes.

Seria possível que, agora, minha mente estava criando releituras daquela noite? Mas que merda...!

Notei que tinha algo diferente de quando fui dormir, as luzes estavam apagadas e eu estava coberto pelo meu edredom. Itachi nunca perdia uma chance. Sentei-me na cama e olhei ao redor procurando por Sakura, mas ela não estava mais lá, tal como na última noite. Senti o leve desconforto pela região do tronco, eram as ataduras.

— Hunf...

Sakura tinha me dado o remédio para minhas feridas, mas, o que eu precisava mesmo era remédio para outra ferida, mas essa não era física, e eu ainda não o tinha encontrado. E eu sabia que isso nunca ia acontecer, jamais. Afinal, se eu me prendesse à ideia de um dia encontrar esse tal remédio, estaria em uma busca eterna.

Afinal, o remédio que eu preciso não existe.

Continua...


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