Até que a Morte nos Una escrita por Nuwandah


Capítulo 15
Palavras sem sentido




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/673321/chapter/15

Era incrível como eu atraía desgraças para a minha vida. E Sakura devia ser a pior de todas até ali. Além dela já ser um grande estorvo, ela parecia atrair e me levar a situações péssimas.

Talvez na minha vida passada eu tivesse feito coisas imperdoáveis, e estava pagando por tudo nessa vida atual. Ou até estivesse pagando pelos erros de todas as minhas vidas anteriores de uma só vez.

Podia até ser uma grande besteira minha, mas, sinceramente, se pensasse em tudo que eu já tinha passado em apenas dois meses de convívio com aquela cabeça rosa, as minhas teorias sobre Karma fariam mais sentido.

Por causa de Sakura, eu fui para um parque ver artistas de circo se apresentando, mas acabei me envolvendo com outro tipo de “espetáculo”, o ataque de um cachorro irado. E Sakura me salvou no último instante, enquanto eu ajudava uma criança machucada. Por causa de Sakura, eu estava bem, são e salvo.

E também por causa dela, eu estava eu estava me equilibrando do alto de um amontoado de pedras negras, lisas e frias, usadas como parte da decoração do parque. Observava o pequeno cachorro branco que estava do outro lado do muro. Parecia assustado, não parava de latir para mim com sua voz comicamente fina e típica de filhote.

— Então, foi por isso... – Disse a mim mesmo.

Aquele filhote mudava minha interpretação da história toda. O cachorro não tinha atacado todas aquelas pessoas – me atacado – por terem entrado em seu território, mas porque apresentavam ser uma ameaça ao seu filhote.

Após tirar minhas próprias conclusões, desci do muro e pus-me a andar para a saída.

— Eei! Vai deixar ele aqui, sozinho? – Sakura disse, me seguindo rápido.

— O que você acha? – Falei sem olhar para trás.

— Mas aqui é proibida a entrada de animais! Os guardas vão achá-lo logo, logo por causa dessa confusão toda! Sabe-se lá o que vão fazer com ele! – Ela tentou contestar.

— Não me importo. – Disse secamente.

— Não acredito em você! Todo mundo adora cachorros!

— Prefiro gatos. – Isso era verdade. Em Nakai, eu sempre ajudava uma tia a cuidar das dezenas de gatos dela.

— Isso não quer dizer nada! Se você deixar esse cachorrinho aqui, ele pode ser morto, não entende? Alguém com más intenções pode achá-lo! Depois que eu vi o que você fez para ajudar aquela menina, tenho certeza de uma coisa! – Ela parou de falar, esperando uma reação minha. E finalmente olhei para ela.

— Qual?

— Você não resiste a alguém que precisa de ajuda.

Ela me quebrou de vez nessa. Tentei pensar em alguma resposta, abrindo e fechando a boca várias vezes, mas não encontrei. Bati um dos pés no chão, frustrado.

Dei meia-volta, e andei rápido até a parede, escalei-a e pulei do seu topo para o outro lado. O filhote me recebeu com latidos e o rabo abanando.

— Shhh. – Fiz para ele, enquanto o pegava no meu colo. Ele latiu novamente e segurei seu focinho por reflexo. – Quieto! – Disse, com um tom de censura na voz.

Fechei os botões da minha jaqueta até um pouco mais da metade e coloquei o pequeno animal dentro dela, tomando cuidado para não deixar que ele aparecesse. O cachorro praticamente se debateu no começo, mas quando o segurei mais firme por fora da jaqueta, ele se acalmou. Não seria muito fácil andar com esse bicho até fora do parque, muito menos no metrô. Mas não tinha outra opção.

Subi novamente pelas pedras e, quando pude enxergar o outro lado, percebi que os guardas já haviam chegado. Tinha que ser rápido.

Desci o monte com bastante cautela para não mover nenhuma das pedras e atrair atenção indesejada com o barulho. Fui o mais discreto possível, tornando-me invisível à vista dos guardas andando junto a outras pessoas. E fui assim, até chegar ao lado de fora do parque. Missão bem-sucedida. Até o momento.

Ainda tinha que pegar o metrô. Ai já era mais complicado, já que eu teria que ter muita sorte – o que já era mais do que comprovado que minha vida tinha um déficit disso – e aquele filhote não latisse e nem se mexesse muito, ou seja, que ele não fosse um filhote hiperativo como qualquer outro.

Na andança pela rua, deixei que o filhote colocasse a cabeça para fora e respirasse um ar fresco, para tentar compensar o tempo que ele ficaria preso pela minha jaqueta. Mas, antes da entrada do metrô, tive que reposicioná-lo mesmo sob protesto, para que ninguém me visse entrando com ele em um transporte público.

A viagem foi até mais tranquila do que eu esperara. O pequeno animalzinho apenas se remexeu algumas vezes, nada que eu não pudesse conter com apenas com um segurar mais firme. E claro, tudo com uma ajudinha da Sakura. Sempre o que filhote se mexia ou ameaçava latir, ela começava a conversar com ele, com a voz no mesmo tom que muitas pessoas usam para falar com bebês. Tom de voz de idiota.

E Sakura só conversou comigo quando foi anunciado que a próxima estação seria a de Inagi – onde eu morava – e eu não saí do lugar, mesmo quando as portas abriram e depois se fecharam.

— Hm... Sasuke-kun... – Ela falou, ainda fitando as portas. – Pra onde pretende ir?

— Hunf. – Ri da ideia inocente dela de que levaria aquele filhote para o apartamento que moro. – Não vou ficar com esse bicho bagunçando meu quarto. Vou levá-lo pra escola. Ele ficará bem lá.

Sakura me encarou por um breve momento, ainda processando a minha fala e, após piscar duas ou três vezes, ela abriu a boca para falar:

— Ah, boa ideia. Lá vai ter bastante espaço para ele, e você pode pedir ajuda de outras pessoas para cuidar dele também. – Ela concluiu por si mesma.

Se alguém ia me ajudar, eu não fazia ideia. Mas sabia que Kiba tinha uma grande queda por cães e Naruto parecia gostar de qualquer criatura viva. Talvez esses dois pudessem tomar conta do filhote em um futuro próximo, já que eu não estava muito a fim de ter um grande envolvimento com ele. Era apenas um peso morto, afinal de contas.

Depois de saltar na estação, fui para o logo Seiko. Alguns alunos dos clubes e do grêmio ainda estavam lá e tive que tomar cuidado para que o clube de corrida não me visse enquanto eu passava para trás da uma antiga sala de equipamentos esportivos que foi abandonada quando uma maior fora construída. Era o lugar perfeito para manter o filhote longe da atenção dos alunos, além do mais, o grande galpão usado como depósito de “equipamentos reutilizáveis” – segundo o diretor – era bem ao lado, e ele poderia realizar suas aventuranças ali, contanto que não se enfiasse em lugares proibidos, como a área jardinada, entre outros.

Caso ele conseguisse permanecer naquele lugar sem causar algum tumulto ou problema, sua estadia poderia ser o suficiente até que um dono aparecesse para ele.

Depois de arranjar uma caixa de papelão e um pote com água, deixei o filhote na sala abandonada e parti para casa.

Ao tentar destrancar a porta do apartamento, acabei me surpreendendo ao descobrir que ela só estava encostada. Itachi já havia chegado? Abri totalmente a porta e me deparei com uma pequena reunião de velhos amigos. Hidan e Sasori estavam sentados juntos com Itachi em seu tão amado sofá em “L” de suede branco. Alguns petiscos estavam postos em cima da mesinha de centro e a TV 3D de 50” estava ligada em um filme de ação, provavelmente. Como o aparelho estava de costas para mim, só me restava ouvir o som dos tiros que vinham dele.

Tá, uma vez eu mencionei que Itachi tinha um jeito humilde, mas o espírito playboy adormecido dentro dele nunca conseguiu resistir a um bom filme assistido como se estivesse em um cinema.

Hidan, o mais velho do grupo, e que tinha o cabelo inteiramente branco precocemente, estava sentado no ângulo do sofá que era voltado para a porta de entrada, e por isso foi o único que notou minha presença.

 - Olha só se não é o pequeno Sasuke! Poxa, você deu uma esticada, hein? – Hidan disse, atraindo a atenção dos os demais para mim.

Fechei a porta atrás de mim e caminhei reto para o meu quarto. Apenas olhei para eles no caminho e, sem parar de andar, disse um “oi”.

— Itachi, vou passar o resto da tarde estudando. Gostaria de não ser interrompido. – Eu disse, enquanto passava exatamente por ele.

— Tudo bem, Sasuke. Mas se, uma hora, quiser se juntar a nós, fique à vontade. – Itachi convidou casualmente enquanto eu abria a porta do meu quarto.

— Não. Obrigado. – Respondi, já de costas para ele, e fechei a porta.

— Sasuke-kun, que grosseria! – Sakura me repreendeu, mas a ignorei.

Antes de poder me afastar da porta, escutei Sasori dizer algo que me chamou a atenção:

— O que deu no seu irmão? Desde quando ele age assim?

Como era sobre mim, obviamente, me interessei pela conversa. Então, encostei minha orelha na porta para poder ouvir melhor, enquanto Sakura, fantasmagoricamente, atravessou apenas a cabeça pelo pedaço de madeira para poder observar a cena, deixando um corpo decapitado ao meu lado.

Pude ouvir Itachi dar um suspiro.

— Ele se comporta assim, mas eu o entendo... Entendo como ele tem sofrido.

— Tem sofrido? Mas ele já não sofreu o que tinha que sofrer? Já faz seis meses, não?

— Sim, mas o caso de Sasuke é diferente. Ele se culpa pela morte dos nossos pais porque foi ele quem pediu para que todos viessem a Tokyo no meu aniversário. Sem contar que foi bem mais difícil para ele aceitar a morte dos nossos pais, já que ele acordou vários dias depois até mesmo da cremação. Nem gosto de lembrar de quando tive que contá-lo tudo o que aconteceu por ele não se lembrar de nada graças à perda de memória.

— Por causa do tiro, né? – Sasori perguntou com uma voz solene.

— Sim... – Itachi disse com um tom de melancolia na voz.

— Entendo, mas isso não é motivo para ele te tratar assim. – Hidan tentou contestar.

— Essa é outra parte complicada. A morte dos nossos pais, o coma, a longa estadia no hospital para a recuperação, tudo foi muito traumatizante para ele. Tudo contribuiu para que a perda fosse mais dolorosa ainda. – Não conseguia entender aquela atitude de Itachi. Por que ele estava me defendendo depois de tudo? Afinal, como ele sabia aquilo tudo sobre mim? Sobre como eu me sentia a respeito de tudo? – E ele não quer passar por isso de novo, então começou a se afastar de todos. – Ele deu uma breve pausa e continuou, com um tom doloroso na voz: - Até de mim.

— É difícil acreditar que aquele moleque puxa-saco seu tenha mudado a esse ponto. – Hidan comentou.

— ... E eu notei que ele te chamou pelo nome. Não me diga que ele parou até de te chamar de “nii-san”. – A voz de Sasori denunciava um estado incrédulo.

— É como eu disse: o Sasuke cortou qualquer atitude afetiva.

— Ah... E então? Ele já se lembrou do “incidente”? – Hidan retomou o início da conversa.

— Ele não diz nada, sempre desvia do assunto quando o pergunto. Mas sei que, no mínimo, alguma coisa ele lembra do sequestro. Nos primeiros dias aqui, ouvi ele gritar durante o sono várias vezes. É possível que sejam só alguns fraguimentos que ele se recorde, senão ele teria, pelo menos, alguma pista sobre os sequestradores e iria pedir para fazer um novo depoimento. Mas não tenho total certeza. O médico disse que talvez as memórias voltem um dia, ou talvez não. Tudo é muito incerto quando se trata do cérebro.

Não ouvi mais nada. Todas aquelas palavras... Tudo caiu sobre mim. Fazia sentido. Ele... estava certo.

Era surpreendente como, mesmo Itachi e eu não convivendo direito durante dois anos – desde quando ele se mudou para Tokyo –, ele ainda me conhecia muito bem.

Como eu estava sendo idiota...

Além de Itachi ter que se preocupar com os problemas das lojas da família e a faculdade, ele estava se preocupando com seu irmão que mudou completamente após ver os pais morrerem...

Ele estava realmente se sentindo intranquilo com a minha situação, e eu tive que ouvir uma conversa escondido para me tocar no quanto eu o estava fazendo sofrer.

Levei as mãos à cabeça. As costas, já apoiadas na porta, deslizaram até eu ficar sentado. Cada cotovelo apoiado em um joelho.

Estava sentindo um imenso peso de culpa. Como eu nunca havia me tocado de tudo aquilo?

Sakura, ao voltar com a sua cabeça de volta ao quarto, me viu, e ajoelhou-se ao meu lado.

— Sasuke-kun...

Não a respondi. Apenas queria ficar ali, pensando, refletindo sobre o que tinha feito todo aquele tempo.

Após um bom tempo de silêncio absoluto entre nós dois, ouvi Sakura respirar bem fundo e soltar o ar vagarosamente pela boca. Ela matinha a cabeça baixa todo o tempo.

— Dizem que a morte é uma libertação, mas estou presa. E só você pode me libertar... Sua vida é a jaula que me prende a este mundo. – Sakura tirou os olhos das mãos, que estavam apoiadas nas pernas dobradas, e aproximou-se mais de mim, já encarando os meus olhos com firmeza. – Sasuke-kun, eu já estou morta, não tenho como continuar vivendo normalmente, mas você pode. Então, quero que me faça uma promessa. Prometa que viverá por mim... Não. Prometa que viverá por nós dois.

Nenhuma das palavras que Sakura me dizia naquele momento fazia o menor sentido, além do mais, eu realmente queria ficar sozinho naquela hora. Virei meu rosto em direção ao dela com um olhar quase suplicante.

— Pare de dizer essas coisas estranhas, Sakura, por favor. – E então suspirei, ainda pensando nas palavras de Itachi. Meus olhos voltaram a se perder no chão de madeira. – Até você está mais viva do que eu.

Sakura recuou, indefesa com o que eu disse. Ela separou os lábios para rebater, mas lhe faltaram palavras. Não era de se surpreender que, naquele momento, Sakura havia ficado sem saber o que falar.

Afinal, o que eu disse era verdade.

A garota levantou-se devagar, como se seu peso tivesse aumentado o dobro ou mais, e andou, do mesmo modo, em direção à janela, desaparecendo logo em seguida. Não consegui ver seu rosto no processo, mas tinha certeza que a havia feito chorar mais uma vez.

Engraçado, considerando o estado de espírito de nós dois, era eu quem deveria estar chorando. Mas claro que eu não faria uma coisa dessas, nem mesmo se eu quisesse. A “armadura” que eu usava – segundo Itachi, em outras palavras – não permitia isso. Fazia tempo que eu não sabia o que era chorar. Mesmo ainda estando no período de luto, todas as lágrimas que tinha para expressar minha dor já tinham sido derramadas durante o confinamento naquele maldito quarto de hospital, no decorrer do mês da minha recuperação.

Meus sentimentos morreram, por isso até mesmo Sakura era mais vívida que eu.

O sol se pôs, a lua subiu e desceu, o sol voltou outra vez e um certo fantasma assombrado também, e eu ainda não conseguia tirar os diálogos do dia anterior da minha cabeça enquanto arrumava minha mochila. Tanto as palavras de Itachi quanto as de Sakura. A diferença é que eu compreendia o que ele disse, e o que Sakura disse, não.

Para mim, não existia muita lógica nas últimas palavras que tinha ouvido dela. Mas que porcaria foi aquela? Código? Sentido figurado? Simbologia? Era tudo quase a mesma coisa, mas minha mente estava assim, confusa.

Pensando bem, Sakura disse que só eu podia libertá-la... Pois bem, se ela mesma já estava farta de toda aquela demora em mandá-la para o Outro Mundo, se ela já estava cansada de bancar a legal comigo e começava a me mandar indiretas para eu agir de uma vez por todas, eu iria fazer a vontade dela, iria resolver logo tudo aquilo.

— Sakura. – Chamei-a.

Ela parou de olhar o céu matinal pela janela e olhou para mim.

— Hm?

— Vamos para Nakai.

Continua...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Até que a Morte nos Una" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.