DeBrassio escrita por Lola Baudelaire


Capítulo 9
Capítulo 9 - Agora


Notas iniciais do capítulo

Oi,



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— Juro que não entendo essa fixação que esse povo com dinheiro tem de pintar tudo de branco — falou Gwen enquanto se jogava em uma das poltronas da grande sala de estar. Ela estava bastante animada por viajar, eu posso me lembrar disso. Bem, não faz muito tempo desde que a tia Marla nos trouxera no feriado de ação de graças. Três anos se passaram e as paredes mantiveram-se como um inverno perturbador e opressor. O branco imaculado que mata silenciosamente. Seco o rosto com o cobertor, que é bastante fino, na verdade.  Um lugar bem pouco segura para esconder meu descontentamento. Apesar de suave e acolhedor, não protege da vergonha esmagadora. “Ela é a sua família, pelo menos”, é o que Gwen teria dito. Mas não resolve. O que eu estava pensando? Como eu pude ser tão idiota a ponto de esperar que um estranho leve à minha mãe.

— Você parece tão desapontada em me ver da mesma forma que eu ao te encontrar na companhia desse homem. — Ela me espera ao pé da escada, abre os braços para um abraço do qual quero correr. — Eu espero que ele não esteja te usando para me chantagear.

Qualquer chance de encontrarem um sorriso no meu rosto desapareceu ao abrir a porta. Se eu soubesse que pararia aqui não tinha nem saído da minha casa. Senti vontade de dar as costas e retroceder todo o meu caminho à pé. Mas ainda assim há um pedaço bem pequenininho de esperança morando embaixo da minha pele. Não, eu não posso voltar para casa. Não há ninguém em casa. Eu não tenho forças para fazer isso, na verdade.

— Não seja dramática, eu só trouxe a garota até você. Você precisa admitir que não sou a pessoa mais desprezível e cruel aqui. — Sr. Reddington fala, lançando o olhar em direção às mulheres espalhadas pelo salão.

— Raymond, não afronte quem sempre lhe ajuda. Porque quando você aparece na minha porta, sendo caçado feito um coelho selvagem, eu não êxito em ajudar. Então sem ingratidão entre nós apenas por você não gostar de alguns dos meus sócios.

Passara dois anos desde que nos vimos da última vez. Fazia frio e Tia Marla estava sendo soterrada para sempre na última ligação que recebeu. Eu nunca vou saber o que a horrorizou a ponto de nos deixar. O carro esportivo de Marta permaneceu estacionado na nossa garagem por duas semanas inteiras. Depois nunca mais voltou.

Hoje não há mais manchas escuras ao redor dos seus olhos. A maquiagem está tão perfeita, deve ter custado uma boa parte do seu tempo. Abaixo a cabeça e enrolo ainda mais o cobertor ao redor dos meus ombros. E pela primeira vez sinto vergonha do meu estado físico, agora eu ando exibindo um olho roxo por aí. Eu não tomo um banho direito há semanas, e eu não quero nem pensar no meu cabelo, enquanto o dela... Bem, seu cabelo parece estar bastante limpo e arrumado. Ela tem tudo ajeitado no lugar Ela não parece ter passado os últimos dois meses procurando alguém.  Seu sorriso tem traços de frieza, trabalhando todos os dias apenas para o bem próprio. É algo que a minha mãe diria.  Ela poderia muito bem ter ido nos fazer uma visita no natal. Uma mulher como essa seria capaz de me encontrar e me salvar.

Parabéns, Erin! Você conseguiu chegar em lugar nenhum. Mary-Kate revira os olhos e me insulta em algum lugar dentro de mim. Ela sabe que continuar aqui é besteira, mas também está ciente de que não tenho outro lugar para onde ir.  Eu já não tenho mais um lugar para chamar de cada.  E a cada segundo chego a duvidar ainda mais de que pelo menos a família tenha sobrado.

Em algum momento deve ter havido um acordo entre os dois homens e Marta, pois não estamos mais parados na entrada.  Eu os sigo o Sr. Reddington que por sua vez acompanha minha avó para até uma porta no canto do salão.  Olho para Dembe — eu me lembro do seu nome — que segura algo que eu penso ser um fúsil nas mãos. Ele nos acompanha, porém mantêm um olhar desconfiado, parecendo que pode sentir alguma ameaça por perto.

Eu não o culpo. Mas em quantos segundos ele leva para quebrar alguém em um abraço? Já chega, Erin. Tento não pensar nessas coisas, porque se eu fechar os olhos, me afogo numa torrente de violência que me engoliria para sempre.  O que não parece ser o caso do resto do salão. Ninguém tá dando a mínima para um homem enorme e armado andando por aí.

A sala em questão é uma biblioteca. E como já sei que vai demorar bastante e que ninguém aqui faz a menor ideia de onde esteja a minha mãe, sento-me no divã do outro lado da sala, perto das prateleiras. Não tem mais jeito de ignorar a dor, a euforia que antes me entorpeceu havia ido embora. É provável que tenha seguido o mesmo rumo da minha mãe.

— Com o que elas trabalham aqui? — Gwen perguntou em uma das noites em que passeávamos entre livros atenciosamente organizados em prateleiras de madeira maciça. Ainda estávamos tão animadas com a ideia de sair da cidade “sozinhas” que o sono não apareceu. A biblioteca não era muito menor que o saguão, porém parecia ser mais o cômodo mais acolhedor da casa. Provavelmente o único que não mantinha a aparência fria e estéril.

— Sei lá, filantropia, essas coisas de caridade — respondi, me estirando em uma das poltronas espalhadas pelo quarto. — Tia Marla diz que elas ajudam muitas pessoas.

— Duvido!  Ninguém ganha dinheiro o suficiente para ter uma mansão dessas só com caridade — Ela ri, enquanto lê as lombadas expostas — Isso aqui parece mais um dos tipos de casa que os dos Van der Woodsen teria em New England. Sua avó é illuminati, no mínimo. Daqueles que escravizam pessoas para ganhar dinheiro pra eles.

Ela disse isso, eu me lembro. E por mais que eu tente eu não consigo prestar atenção na conversa dos dois. Enquanto Marta parece discutir com meus acompanhantes dou uma na parede ao lado da porta. Há um vidro que nos permite ver o lado de fora, mas parece que não dá para fazer a mesma coisa do outro lado. As moças que antes se distraíam com seus chás agora estão ocupadas com papeis que parecem ser importantes. Algumas das mulheres permanecem tricotando. Como da última vez não vejo a presença de homens. Ajudar pessoas, Marla nos disse uma vez. E o que tudo isso tem a ver conosco?

— Tá, mas onde está minha mãe? — Mary-Kate pergunta. Ela quer acabar logo com isso; não faz sentido postergar o inevitável. Minha mãe não está aqui e pronto. Por mais que seja difícil de aceitar, a realidade é implacável. Mas sinto que Mary-Kate possa lidar com isso no meu lugar. Não é isso que precisamos na vida, um bode expiatório, para depois assumir toda a culpa também?

— Ela não é a sua mãe, eu presumo — Raymond Reddington observa. Ele Tira o chapéu e o coloca em cima do joelho. Parece estar confortável demais, esse drama todo parece divertir os seus olhos curiosos. — Marta não seria cruel a esse ponto. Olhe só, Marta ela é só uma criança. Que espécie de ser humano a deixaria vagando por aí?

É, que tipo de pessoa faz uma coisa dessa, não é mesmo? Porque eu tenho certeza que alguém deve ter sentido a minha falta. Alguém tinha que ter feito uma ligação avisando que eu não estava onde deveria estar. Pelo amor de Deus! Eu não dou notícias há um tempão, ninguém pode ter sido negligente a esse ponto. Caso contrário, não devo ser Erin, a esperta, nem Mary-Kate, a corajosa, eu posso ser Maya, a negligenciada; ou qualquer outro nome aleatório. Já não faz mais diferença.

— Onde ela está? E por que ninguém nunca me ligou? — questiono, ou melhor, a outra garota dentro de mim faz isso. Ela está a ponto de perder o controle. Definitivamente Mary-Kate está perdendo o controle. Ela se aproxima de Marta e a encara de bem perto — Minha mãe é Joy DeBrassio e você sabe disso. E eu quero saber onde ela está e porque ninguém veio me procurar. Porque eu estou cansada de ninguém responder as minhas perguntas. E eu estou cansada de ter que passar por isso tudo sozinha também.

— Erin, meu bem, tome seu chá. — Marta acena para uma mesinha ao lado do divã, ignorando tudo o que eu disse. Eu não me lembro de ter visto a xícara antes e dá para ver fumaça subir. Eu não vou tomar isso.  Quem garante que ela não quer me sedar, me internar ou algo do tipo?

— Eu não vou tomar porcaria nenhuma. Você vai me responder ou não? — não tenho medo de não parecer educada. Já chega de me enrolar. Porque no fundo todos parecem saber de algo e nem pensam em me contar.

De início todos permanecem em silêncio. Eu só abraço ainda mais o cobertor e encaro a parede da frente. Onde não há vidro fora pintada de um laranja quase marrom. As paredes parecem mais quentes aqui dentro, o que não me faz sentir melhor no entanto. Já consigo fechar os dois olhos por completo, o olho direito não está tão inchado. Eu poderia descansar um milésimo de segundo e já estaria melhor. Mas quando eu abro os olhos, Marta está com uma foto da minha mãe mais jovem, emoldurada num porta retrato. Minha mãe sorri de um jeito tão caloroso que sinto vontade de chorar. Parece foto do anuário da escola. Ela parece feliz.

E então marta se aproxima e pousa a mão no meu ombro com certa cautela. Eu fecho os olhos mais uma vez. Talvez eu esteja preparada para ouvir.

— Sua mãe nunca foi exatamente do jeito você imagina. Eu fiz tudo o que eu pude pela sua mãe, Erin. Ela teve tudo. Eu consegui que ela entrasse em Yale, sempre dei tudo. Mas mesmo assim ela simplesmente desaparece. Essa não é a primeira vez, meu bem. Mesmo estando na faculdade de direito tendo uma vida estável, ela sumiu por quase dois anos e depois voltou como se nada tivesse acontecido. Por mais que eu me esforce, não consigo compreender...

E então a porta se abre. Não é ela, mas mulher da sua idade caminha até Marta e sussurra algo em seu ouvido. Parece ser bastante urgente já que ela sai da sala e volta em poucos segundos, bastante apreensiva.

— Eles estão aqui, Raymond, a polícia. — minha pobre avó, anuncia com uma cara não muito boa.

— Então vai lá atender suas visitas. — Sr. Reddington levanta, colocando o chapéu. — Vamos Dembe, a hora do chá já acabou.

— É o FBI, Raymond, você os chamou! — Marta grita, enfurecida.

Ele sacode a cabeça e dá um sorriso sem dentes.

— Marta, é falta se esconder das visitas. Diga a agente Keen que mandei lembranças. E você — ele coloca a mão no meu ombro vou te levar à DeBrassio certa dessa vez.

Eu o acompanho, ele parece saber qual a outra saída. E eu não quero ficar por aqui mesmo.

— Eu não sei porque sua avó tem essa mansão enorme aqui, onde você poderia ser a Serena Van der Woodsen dos livros, enquanto você mora naquela casinha de dois quartos do lado da minha. — Gwen sussurrou, enquanto embrulhava nossos pés. — Aqui seria tão mais legal.

— Não, acho que não deixaria a minha mãe.

Bem, pelo visto o jogo acabou virando e eu fiquei sozinha. Já no carro, o Sr. Reddington olha fixamente para foto da minha mãe. Não me lembro de tê-lo visto pegar. Logo ele percebe que eu o vi e sorri para mim. E eu não sinto medo ou coisa do tipo.

— Você esteve procurando pela pessoa errada, Erin. Barbara Chenowith. Vamos procurar por Barbara Chenowith.


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Notas finais do capítulo

Tchau



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