DeBrassio escrita por Lola Baudelaire


Capítulo 13
Capítulo 12 - Antes - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Oi, esse capítulo me deu uma baita dor nas costas, mas tá aí. Passei o dia escrevendo, só que acabou não rendendo como eu esperava. Espero de todo o coração que gostem.

Esse é o ultimo de 2017 e eu realmente me esforcei para que ele saísse antes dos fogos



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Não deveria ter me permitido chorar desse jeito, agora mais brechas surgirão e vai ser mais difícil de controlar. É mais fácil de respirar agora; mas ainda é um segredo que não vai mais me devorar sozinha, levará Ricky comigo, mas a culpa cairá unicamente em mim. Há silêncio e mais silêncio, como tem sido nos últimos dias. Com a cabeça encostada no mármore frio, espero o chá que ele prometeu fazer. Os Whalen não tomam café, nem leite e um suco é frio não vai me ajudar a parar de tremer. Um chá também não resolve nada, mas Ricky insiste em fazer; quase deitada na mesa de jantar percebo que há algo de errado. Observo os músculos dançarem em suas costas enquanto lava a louça suja do jantar, eu presumo. Gwen me mandaria parar de olhar tanto para o seu irmão. Mas é hipnotizante. Eu nunca tinha reparado que as costas dele eram tão fortes. Ele pergunta sobre as marcas no meu pescoço. Não consigo pensar em um jeito de explicar, apenas desvio o olhar para as duas canecas fumegantes perto de mim, consigo sentir o calor no meu braço. Tem cheiro de anis-estrelado e maçã. Eu quero dizer alguma coisa; o silêncio é confortável, porém a cada segundo se torna tão opressivo.

Sento-me direito na cadeira e encaro o mármore branco. Olhar para Ricky sem camisa só está deixando as coisas mais complicadas para mim, eu não consigo pensar direito. É possível que isso seja só um jogo para me entregar à polícia; quem sabe ele não acreditou em mim quando eu falei que alguém morreu e vai me entregar por invadir o colégio. Começo a me levantar e vou tirando o casaco que me emprestou. É bem a cara dele, debochar de mim mais uma vez. Eu não deveria ter vindo para começar a história. Ricky não passa de um sacana pronto para me fazer de idiota. Mais uma vez. Não suporto mais ficar nesse lugar, com todas essas paredes pintadas de azul turquesa com todas essas coisas de família feliz.

— Espera Erin, não vai agora! — exclama ele, vindo à minha direção. Eu o ignoro e continuo em passos rápidos pelo corredor. Não quero olhar para as fotos pendurada na parede; eu sei que vou estar em alguma delas sorrindo. No fundo sou parte da família também, pelo menos eles não teriam me deixado sozinha. Ricky segura meu braço antes que eu consiga chegar à sala.

— Deixa de ser doida e dramática, fica aqui. Vem conversar direito — segura meu outro braço e me obriga a olhar para ele — você estava falando sério, entrou mesmo alguém na sua casa?

— claro que tem, seu idiota. Ou você acha que eu viria aqui só para inventar isso tudo — tendo sair e falho, ele segura forte, não para me machucar talvez. Ricky levanta as sobrancelhas esperando uma resposta melhor, provavelmente. Seus olhos castanhos estão arregalados, evidenciando olheiras das madrugadas inteiras jogando. Procuro me afastar, não dá para ficar aqui parada enquanto alguém apodrece no meu porão.

— Você é a pessoa mais criminosa que eu conheço. Agora me solta eu tenho que ir.

— Está dizendo isso só porque eu tirei a sua virgindade e você não gostou? — Ele ri ainda me segurando. Eu não consigo mais encará-lo. Não estou surpresa, é só Ricky sendo ele mesmo e eu sendo naturalmente estúpida. Há mais de seis meses eu pensei que poderia confiar nele e hoje, cometendo o mesmo erro, meu rosto queima de vergonha. Isso não está certo, preciso ir embora.

— Não, Enrique, estou dizendo por causa da criatura nojenta que você é — consigo me soltar e viro de costas — sei que você pode esconder o corpo de alguém sem ficar com a consciência pesada. Porque nem isso você tem, né.

— Agora você pegou pesado — dessa vez apenas coloca a mão no meu ombro e continua — você quer que eu te ajude a sumir com o corpo?

Claro, que sim, mas não digo em voz alta. Uma vez prometi a mim mesma que nunca mais chegaria tão perto. É melhor ignorar isso tudo e ir embora porque já passei vergonha demais por ter me permitido chorar. Não tenho ninguém para confiar, vou resolver eu mesma. Travesso a rua, com os braços cruzados para me proteger do vento. Minha casa ficaria melhor se um furacão arrancasse daqui, apagaria todos os vestígios e ninguém me culparia. Eu só preciso pegar algumas coisas e depois ir embora. Abro a porta destrancara e pego a mochila do chão, onde abandonei antes de sair. Paro apoiada na porta fechada; a sala parece imaculada, ainda cheirando ao aromatizante de vanilla. Onde minha mãe deve ter estado uma ultima vez antes de me deixar aqui, antes de deixar um marido violento e um homem morto do porão. O que mais falta acontecer agora, pegar fogo e destruir tudo? Seria maldade se não me levasse junto também.

No meu quarto procuro por um casaco dentre as roupas que eu nunca mais vou precisar usar. Eu cresci aqui, mas não posso ficar mais um instante. Se ela foi embora eu vou também; posso ir para casa de Laurel. O cartão de crédito é para emergências, não é? Agora diga que essa não é uma emergência grave. Coloco duas blusas na mochila, junto com uma calça jeans e um moletom. Não importa que as roupas estejam todas dobradas, quando eu estiver bem longe observando a confusão talvez tenha tempo de organizar.

 No canto do armário vejo uma ponta de tecido vermelho escuro. Isso me desarma. A parka preferida da minha mãe na adolescência, que agora é minha desde o meu aniversário. A sua imagem me pedindo para ter cuidado, as ruguinhas do sorriso no canto dos olhos. Ela disse que eu estava orgulhosa de mim, eu estava me tornando mulher de verdade. Não mais uma criança, mas alguém que agora sabe como lidar muito bem com os problemas. Não, mãe, eu não sei como lidar com a confusão que você me deixou. Eu tenho medo e só consigo pensar em chorar. Visto-a com pressa e coloco a mochila nas coisas. Desço correndo às escadas em direção à cozinha. Eu não sou uma adulta responsável, ainda não estou pronta para ser deixada por conta própria. Mas álcool pode resolver.

— Erin, você não vai fazer isso! — a voz de Ricky me faz parar de ligar a ultima boca do fogão.

Não me viro para encará-lo, vou acabar perdendo tempo. Pego do fundo do armário a garrafa de tequila, escondida pela minha irmã há muito tempo, e a quebro no chão. Eu deveria ter comprado gasolina antes de começar. Não dá mais tempo, pego o álcool de limpeza e derramo fazendo uma trilha até a sala.

— Você não precisa colocar fogo na casa, Erin — o barulho do gás escapando cessa.

— O que você está fazendo? — grito, procurando fósforos na gaveta onde minha mãe guarda os potinhos de tempero. Não encontrando paro para encara-lo — me empresta seu isqueiro?

Ele diz que vai ficar tudo bem e isso me faz revirar os olhos. Dessa vez eu o acerto no olho quando tenta me segurar pelo braço. Ele recua, me mandando ficar calma. Não dá para ficar calma. Não tem como ficar calmo numa bagunça dessa, eu deixei um homem morrer na minha frente. Entretanto não há o que chorar. Ricky me abraça, tomando o vidro de álcool da minha mão. Deixa de ser doido e dramático, Ricky, eu não vou machucar ninguém que não já tenha se machucado. Eu luto para sair, mas seus braços são mais fortes que o meu. Pelo amor de Deus, ele não precisa fazer essa cena.

— Me solta, seu bastardo! — eu protesto, empurrando seu corpo em direção à parede. Chuto sua perna, mas seu abraço permanece irredutível.

— Eu vou dar um jeito de esconder aquilo, você não precisa explodir a casa.

...

Afundo ainda mais no banco do carro velho que Ricky pegou emprestado. Quando eu finalmente consegui me acalmar fui arrastada até a casa da Srta. Strauss, a velhinha que mora no fim da rua. Ele não precisou de muito para conseguir o carro emprestado, apenas garantir que o tanque continuaria cheio. Não precisei ver o corpo mais uma vez, porém Ricky não me deixou ficar sozinha. Eu me sentei em cima da maquina de lavar enquanto ele o embalava como se fosse bacon. O corpo se chamava Harper e tinha quarenta e cinco anos, disse Ricky quando encontrou a carteira de motorista quase derretida, mas pediu para que eu não pensar nele como uma pessoa, já que não vai mudar a situação. Nada que eu fizer vai mudar o que aconteceu. Ele demorou vinte minutos para enrolar tudo na nossa antiga piscina inflável, depois me pediu para que eu o ajudasse a subir a escada e a colocar no porta-malas do carro estacionado bem perto da porta. Se alguém perguntasse era para dizer que estávamos levando caixas de roupas para doação.

— De início achei que era você invadindo a escola. Vocês são muito parecidas, sabia? Na verdade, eu achei que você não tinha força para carregar aquele arquivo. — tira os olhos da estrada e sorri para mim — Mas eu estava errado, não é mesmo.

— Me desculpa, eu não que...

— Tudo bem, você só ficou histérica. — interrompeu, correndo os dedos pelo meu cabelo — mas eu fiquei assustado. Vou ter que ficar o resto do mês usando isso.

Ricky se refere aos óculos escuros pendurados eu seu nariz. Encolho-me com vergonha, queria poder ir para casa, mas ele não me deixara ficar sozinha. Não consigo me decidir se acho isso bom ou ruim. Ricky é um idiota, mas me impediu de colocar fogo na minha própria casa. Eu não sei o que estava pensando. Eu não ando sabendo mais de nada.

— Me desculpa por mencionado a nossa situação complicada. Você ficou muito puta comigo por causa daquilo e nunca deixou espaço para eu pedir desculpa.

Dou de ombros e fecho os olhos ignorando suas desculpas. Ricky foi julgado e declarado culpado por ser um idiota. Um idiota que sabe o suficiente para me incriminar. O arrependimento pesa machucando minhas costas. Era só fechar a porta, deixar apodrecer e pronto. Eu realmente estou ficando maluca. Talvez deva dormir.

— Você disse que ele não chegou perto de ti, mas não esclareceu essas marcas no seu pescoço — questiona após jogar o pacote no mar. Não há ninguém na praia que possa nos ver entrar com o carro. Tivemos que entrar no mar e Ricky nadou para arrastar o corpo um pouco para o fundo. Ele me garantiu que não iria boiar.

— Vamos, Erin, vem aqui me esquentar — ele me puxa para um abraço, me fazendo revirar os olhos. Já está tarde e talvez passar a noite com Ricky seja melhor do que ficar em casa com a fechadura quebrada. Mesmo que eu pudesse trancar a porta Shawn poderia usar sua chave.

— Eu não vou transar com você, tá — anunciei, entrando no carro — eu vou dormir com você, mas não vou dormir com você.

—Relaxa meu bem, não vou fazer nada que você não me peça. Sou um bom garoto agora — ele ri enquanto veste uma camisa seca.

Parados atrás de um posto de gasolina, após tirar o arquivo do porta-malas, Ricky me oferece um baseado. Ele diz que eu preciso relaxar e eu aceito dando de ombros. Eu sei que não conseguirei dormir de outra forma, pois cada vez que fecho os olhos as coisas começam a se repetir. Eu não tenho para onde correr.


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Notas finais do capítulo

Que o nosso 2018 seja cheio de coisas novas e que a quinta temporada de The Blacklist seja incrível [os primeiros 8 já estão]



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