Julgamento de uma Ilusão escrita por Mirai


Capítulo 24
Reconciliação?


Notas iniciais do capítulo

Feliz Páscoa, pessoal! ♥
Desculpa a demora em postar, semana de provas me castigou...
Sem delongas... vamos ao capítulo!



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Sem poder dar nenhuma resposta ao rapaz de olhos bicolores, eu fui atrás de Alexandre para destrocar os celulares. Não foi difícil achá-lo, na verdade: ele estava ali, me esperando.

Será que ele me viu conversando com Vicente?

— Ah, você está aí… — eu falei, apenas para quebrar o silêncio — Então…

— Aqui. — ele entregou meu aparelho e deu um sorriso indecifrável — Pode deixar que não mexi em nada.

— Ah, sim, não tem problema… também não mexi no seu. — eu entreguei o celular dele, um pouco envergonhada por ter mentido.

— Vamos? — ele me estendeu a mão para que eu a segurasse. Sem vontade de discutir, apenas o fiz para, enfim, voltar para a sala de aula.

Será que é difícil ter um ano sem esses acontecimentos estranhos?

Quando finalmente alcançamos nosso destino e nos sentamos cada um em sua carteira, pude perceber que estava um pouco trêmula.

Mas por que?

A aula fluiu mais rápido que o normal e, como “recompensa”, fomos liberados para a quadra por alguns minutos antes de ir embora. Em vez de me direcionar à quadra como os outros, eu fiquei sentada perto do portão oposto ao do ônibus. Eu tinha algo a conferir.

Depois de minutos que mais pareceram horas, o sinal tocou, revelando o horário de saída dos alunos. Aliviada por não ter que esperar mais tempo, olhei para a multidão que vinha correndo e, mesmo com dificuldade, pude avistar Lara indo em direção ao portão e indo embora, sem Vicente. Um pouco depois, o com heterocromia passou e subiu na moto, partindo logo em seguida, sozinho. Feliz de ninguém ter notado minha presença, fui correndo para o ônibus, com a quase certeza de que ninguém tinha me visto.

No dia seguinte, após fazer minha rotina pré-escolar, entrei no ônibus mais disposta que de costume. A viagem passou rápida e até pensei que o dia seria tranquilo, ao contrário do anterior.

Pensei errado.

Ia sair pela porta da frente, como sempre faço, mas a imagem da moto de Vicente parada logo de cara me assustou um pouco. Preferi sair pela porta de trás e fingir que nada havia acontecido, mas, para a minha surpresa, ele apenas entrou na escola, pouco se importando com quem estava descendo do veículo.

Bem feito pra mim!

Entrei na escola e fui subindo as escadas vagarosamente, estava sem pressa em entrar pra sala, afinal, estava até um pouco cedo. Surpreendi-me com o fato de que já tinha um casal bem conhecido parado no corredor: Alexandre e Mariana.

Mas espera, ela está com os cabelos curtos?

Sabendo que não havia ninguém mais subindo além de mim, tentei ouvir a conversa dos dois, mas só entendi quando Alex disse algo como “vai ficar tudo bem” e a abraçar. Por algum motivo, senti-me desconfortável diante dessa cena. Quando menos imaginei, senti alguém segurando minha mão de uma maneira bem mais delicada que Alexandre costumava fazer.

— Obrigado por me esperar… — ouvi a voz de Vicente em um quase sussurro — Vamos lá?

Olhei para o de olhos bicolores, que deu um sorriso encantador enquanto pressionava levemente minha mão na dele.

— Vamos! — eu respondi, com um sorriso genuíno.

Subimos o resto das escadas de mãos dadas e passamos por Alexandre e Mariana sem dizer uma palavra. Paramos em frente a minha sala, onde ele soltou minha mão bem devagar, abaixou levemente a cabeça e disse:

— Não precisa dizer nada, eu sei que isso foi estranho… foi só pra disfarçar.

— Não, não foi estranho. — eu dei um sorriso, tentando encorajá-lo a fazer o mesmo — Foi… até bom… — eu abaixei a cabeça, um pouco envergonhada.

Respiramos fundo e nos despedimos, na esperança de passar as coisas a limpo depois. Eu entrei na sala, fechando a porta atrás de mim lentamente e colocando minha mochila sobre uma das mesas próximas à janela. Depois de um tempo, Alex entrou junto da Mariana e os dois se sentaram um ao lado do outro. Eu nem sei por que eu me surpreendi com isso.

Ao contrário da viagem de mais cedo, a aula passou devagar, talvez até demais. Quando finalmente o sinal tocou, estava tão desanimada para levantar que preferi esperar todos irem primeiro. Fui me arrastando até a porta, até que senti uma mão pousar sobre meu ombro gentilmente.

— Estava te esperando. — o com heterocromia disse, me fazendo olhar em sua direção, um tanto assustada. Tanta determinação assim só por causa de ontem? — Vamos?

— Tá, né… — disse, sem muita escolha. Depois de tanto tempo sem falar com Vicente, uma reaproximação repentina era o que eu menos esperava.

Ao contrário do que pensei, ele não me respondeu e se limitou apenas a segurar a manga do meu casaco – provavelmente com vergonha de segurar minha mão de novo. Quando alcançamos a quadra, ele se sentou em um banco e fez sinal para que eu fizesse o mesmo.

— Bom, eu nem sei por onde começar… — ele coçou a cabeça, sem graça — Tanta coisa aconteceu nesse meio tempo que a gente ficou sem se falar. Mas vamos começar pelo mais importante. — ele deu um meio sorriso — Eu quero te pedir desculpas, por mim e pela Lara.

— Pela Lara? — eu repeti suas palavras, tentando entendê-lo — Por que?

— Você sabe… ela e o Alex conversaram, ou melhor, discutiram ontem no intervalo. Você chegou no final de tudo, mas eu estava lá desde o começo. — ele disse, olhando para o chão — Você recebeu mensagens horríveis, não foi? Quem enviou tudo foi ela.

Eu não estava tão surpresa com o fato de ser a Lara, afinal, ela era minha suspeita principal. Mas tinha uma pergunta que queria fazer e era agora ou nunca.

— Mas por que ela fazia isso?

— Bom… aí a gente entra num assunto bem complicado. Se eu disser que entendi tudo, mentirei. — ele disse, finalmente me olhando nos olhos.

— Então me conte o que você entendeu. — pedi, embora meu tom desconfiado tenha feito isso soar como uma ordem.

— Desde o ano passado, quando a gente… se afastou… — ele abaixou de leve a cabeça — eu comecei a conversar com ela. Não era nada de mais, só coisas relacionadas à escola. Eu não percebi o quanto ela estava me monopolizando totalmente. Antes da Lara conversar comigo, ela tinha duas amigas, — ele olhou na direção de duas meninas da turma dele, as quais, obviamente, eu não conhecia — mas elas pararam de conversar com ela e comigo, do nada. Quando eu vi, era só eu e a Lara, ninguém mais se aproximava.

— Eita… — murmurei, sem a intenção de interrompê-lo, mas ele acabou ouvindo.

— É, complicou mais ainda quando eu falei para ela que queria te pedir desculpas. Eu nunca pensei que ela poderia ter uma postura tão agressiva. Sabe esse arranhão? — ele apontou para uma cicatriz no pescoço, que ele cobria com a gola da blusa — Foi ela.

Mas que garota agressiva!

— Vicente, por que você não se afastou dela?! Ela te machucou! — eu me levantei, nervosa, mas logo o com heterocromia colocou as mãos sobre meus ombros, tentando me tranquilizar.

— Porque eu tinha medo que ela fosse te machucar.

Senti meu rosto ficar um pouco mais quente que o normal. Que droga.

— Sabe… — ele continuou — eu confesso que, no começo, pensei que seria melhor te deixar em paz. Eu quero dizer, o Alexandre sempre passou mais segurança que eu e você não merece uma pessoa tão incapaz que nem eu era do seu lado. Resumindo: eu morria de ciúme, mas deixava quieto. — ele deu um riso que passava um nervosismo tremendo.

— Por que você pensou assim? — eu acabei rindo que nem ele — Você podia ter me tirado de uma furada imensa…

— O que ele fez? — ele me encarou, dessa vez mais sério.

— Nada tão sério como a Lara! — eu garanti — Mas é só que ele me trata de um jeito estranho… fora o que dizem por trás de mim por causa dele…

— Espera, você estava no grupo? — ele perguntou, surpreso.

— Da festa? Não, mas eu vi no celular do Alex. — eu respondi, mas logo me atentei a um detalhe — E por que você estava?

— Dois motivos: o primeiro — ele ergueu o indicador da mão direita — pra ter certeza de que aquele traste não levaria você. O segundo — ele ergueu o outro dedo, simbolizando o segundo motivo — pra acompanhar a Lara, mas, no dia da festa, eu fui embora mais cedo.

— Entendi… — eu disse, olhando para o chão.

— Desviamos o assunto… — ele riu — Enfim, durante todo esse tempo eu quis conversar com você, pra pedir desculpas por ter se afastado, por ter te tratado muito mal… enfim, por tudo o que fiz. Foi tudo errado.

— Tudo errado não foi. — dei um meio sorriso — No fim das contas, vocês se gostam, né?

O que eu menos imaginei era que ele fosse apenas abaixar a cabeça. Curiosa, perguntei o que havia acontecido, mas a resposta que recebi era bem inesperada.

— Todo mundo acha isso…

— Como assim? — questionei novamente — Vocês não…

— Não. — ele me interrompeu — Eu pensei que conseguiria gostar dela, mas… eu não conseguia ficar perto dela sem pensar que você estava sozinha e o Alexandre sempre vindo como um herói para te fazer companhia. Eu queria ir lá agora e dar um soco na cara dele só por causa do que ele fez na escada!

— Aquilo… eu acho que é normal. — respondi, dando de ombros — Não é como se eu gostasse dele, nem o contrário. Ele pode falar o que quiser, eu não acredito.

— Ele é um canalha… — Vicente disse, visivelmente irritado.

Como se fosse para nos boicotar, o sinal tocou, anunciando a hora de voltar para a sala. Vicente se levantou e estendeu a mão para que eu fizesse o mesmo. Ainda que um pouco relutante, eu segurei a mão dele e levantei.

— Você tem algum plano para hoje de tarde? — ele perguntou, parecendo mais tranquilo.

— Nada de especial… — respondi,

— A gente pode continuar a conversa pelas redes sociais, o que acha? — ele perguntou, enquanto começávamos a nos dirigir cada um a sua sala.

— Por mim, tudo bem. — eu disse, com um meio sorriso.

Acenamos um para o outro e eu entrei na minha sala, mas, para minha surpresa, já havia bastante gente lá dentro, incluindo Alexandre.

Sentando na mesma carteira de mais cedo, não pude deixar de sentir olhares que pareciam perfurar minhas costas. A aula ia ser longa, com certeza.

Quando o sinal tocou para anunciar o fim do dia letivo, eu me senti totalmente aliviada. Arrumando meu material para sair, senti quando alguém colocou a mão sobre meu ombro e sussurrou bem próximo de mim, em um tom ameaçador:

— Que linda menina… ele você perdoa, não é?

Assustada, levantei a cabeça para ver quem estava próximo de mim: Alexandre.

— É engraçado. — ele disse, agora mais alto e um tom cínico — Ele você perdoa, passa o intervalo todinho colocando a conversa em dia e a mim… você ignora, trata que nem lixo e, provavelmente, se eu caísse, você até pisaria em mim!

— Alex… eu não sei do que você está falando! — eu disse, começando a tremer de nervoso.

— Não? Não sabe mesmo? — ele quase gritou e começou a rir como um louco — Oh, ela não sabe, que legal! Vai se fazer mesmo de desentendida? Já se fazia de cega!

— Eu vou perder o ônibus… — eu murmurei, tentando fugir, mas ele me encurralou no canto da sala.

— Eu tô querendo é mais que o ônibus exploda! — ele berrou, parecendo ter perdido a sanidade — De preferência com aquela vagabunda e aquele retardado dentro.

— Alexandre, por favor, me deixa passar! — foi minha vez de gritar — Por causa da Mariana que você quer que eu te perdoe? — perguntei, cruzando os braços.

Ao contrário do que imaginei, ele ficou em silêncio e de cabeça baixa.

— Pelo que você quer que eu te perdoe? — perguntei, tentando fazê-lo olhar para mim.

Ficamos alguns instantes em silêncio, até que eu consegui olhar fixamente nos olhos dele, que estavam cheios de lágrimas.

O que está acontecendo? Por que está parecendo que eu sou a vilã?

— Você… não sabe? Não mesmo? — ele pareceu retornar a si, enquanto secava as lágrimas — Não, não precisa falar mais nada. Só quero que você me perdoe pelo que fiz agora. — ele tirou a carteira da mochila e me entregou uma quantia de dinheiro — Pra pagar sua passagem. Eu vou te levar até seu ponto de ônibus, não é todo mundo que tem uma moto. — ele deu um sorriso triste, enquanto abria a porta e fazia um gesto para que passasse na sua frente.

Caminhamos em silêncio até chegar ao ponto, pois, como eu suspeitei, o ônibus escolar já havia partido. Após dizer em qual ponto eu descia, Alex pareceu se surpreender.

— Também moro por lá, ao menos não vai ter problema para nenhum de nós dois. — ele deu um sorriso totalmente falso, enquanto dava sinal para o ônibus em que deveríamos pegar.

Entramos no veículo e pagamos nossas passagens, mas não tinha lugar para nos sentarmos juntos. Recusando a oferta de que eu me sentasse e ele ficasse em pé ao meu lado, sentei-me bem distante dele, olhando para as minhas mãos em seguida.

— Ainda estou um pouco trêmula… — murmurei, falando comigo mesma.

A viagem era mais rápida no transporte comum e a visão do ponto onde eu descia nunca me deixou tão feliz. Corri para a frente do veículo em busca de Alexandre e baguncei o cabelo do mesmo, numa maneira um pouco indelicada de dizer “até amanhã”, e voltei correndo para a porta de trás para descer enquanto uma mulher subia pela da frente.

O dia escolar finalmente havia acabado. Não faltava muito pra fazer o de sempre.

Corri em direção à minha casa, a mochila parecendo pesar menos e a chave se tornando algo mais especial para mim que de costume. Abri o portão, tirei meus sapatos e corri para meu quarto, onde me joguei sobre a cama e encarei o teto, procurando algum tipo de resposta para a minha vida.

Antigamente, quando pensava em Vicente, lembrava de todas as vezes nas quais eu conversei com ele. Alexandre, por outro lado, só me despertava más lembranças.

E o que fazer quando os dois me deixam totalmente mal até quando troco uma palavra com eles?

Falar com Vicente foi algo libertador, mas, ao mesmo tempo, que me consumiu por dentro. Foi como se, por um momento, eu tivesse dependido dele. Como se eu tivesse comemorado infinitamente pela Lara não ter sido nada dele. É como se, por um momento, eu tivesse assumido que gostava dele, mas algo dentro de mim ainda queria consertar as coisas com Alexandre, queria dar uma segunda chance a ele. No fim das contas, os dois tinham qualidades que me atraiam.

Como que para quebrar o silêncio que estava dentro de casa e impedir minhas lágrimas de rolarem, meu celular vibrou, anunciando uma mensagem de Vicente.

Procurei você antes de sair, mas não te achei. Você saiu mais cedo? Estava fugindo de quem?


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