Julgamento de uma Ilusão escrita por Mirai


Capítulo 20
Paranoia


Notas iniciais do capítulo

A fic completou um ano já tem um tempinho e, pra comemorar, eu decidi começar a conferir meus capítulos e acrescentar detalhes na história que havia deixado sem explicar. Esses capítulos estão no Wattpad, mas em breve vou atualizá-los aqui também.
Ah, também tem a nova capa!
Obrigada por acompanharem essa fic e espero que gostem desse capítulo! ♥



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— Cheguei! — gritei para o vento assim que coloquei meus pés dentro de casa.

Deixei minha mochila sobre a cama, corri para o banheiro para me trocar e, logo após, peguei meu celular para checar minhas redes sociais. Havia uma mensagem não lida, da Karol.

Será que vou receber dois conselhos só hoje?”, pensei e ri. Estava feliz de, finalmente, ter pessoas que se preocupavam genuinamente comigo. Perdida em pensamentos bobos desse gênero, eu respirei fundo e abri a mensagem.

“Bonjour, Beatriz!

Estava esperando suas provas acabarem para eu te responder. Conheço você e sei que suas notas são mais importantes que tudo na sua vida, às vezes parece que você vive pelo ranking da escola.

Li várias vezes seu texto e refleti bastante antes de te escrever essa resposta. Você diz que o Vicente tá diferente e que fica te vigiando, que o Alex fica sempre perto de você e parece que está tentando te conquistar… quer minha opinião sincera? Você tá é paranoica!

Bia, entende uma coisa: garoto nenhum que gosta de uma menina trataria ela do jeito que esses dois te tratam. No mínimo esse Alexandre deve estar tentando te iludir (de novo) e o Vicente deve estar ficando com pena por isso.

Amiga, por favor! Você não era assim!

Tem um menino que conheci aqui na França que é um amor comigo e eu tenho certeza que ele gosta de mim. Porque ele é gentil e me trata bem, não porque ele me vigia no canto da quadra ou porque ele tenta me assediar.

Fica longe desses dois e tenta sair dessa, eles, além de não te merecerem, estão te deixando maluca, fica o conselho.

Espero que as coisas melhorem para você como estão para mim agora.”

— Mas o quê!? — exclamei, indignada — O que foi isso que eu recebi?

Pensei em respondê-la, mas, além de ela não estar mais online, eu não sabia nem por onde começar. Estava completamente sem ideia de como lidar com aquilo. Independente do que ela queria dizer, a única coisa que eu estava sentindo era raiva.

— Paranoica, maluca… — disse, enquanto me levantava da cama. Estava tão nervosa que não conseguia pensar em nada para fazer — … fala sério!

Saí do quarto com o humor péssimo e fui para a sala para tentar passar o tempo assistindo televisão, já que nem fome eu estava sentindo depois do que li. Sentei-me no sofá e procurei alguma coisa para assistir, mas não achei nenhum programa que me interessasse, assim que desliguei a TV em seguida. O sentimento de indignação que encheu meu coração quando li o “conselho” de Karol estava se esvaindo, deixando no lugar um vazio estranho e uma pergunta que, ao menos por enquanto, não tinha resposta: por que?

Voltei para o meu quarto e peguei meu celular, com a intenção de investigar até entender aquela mensagem. Não demorou para achar a primeira pista.

Uma foto com um rapaz desconhecido para mim.

Com um pouco mais de esforço, consegui descobrir que, assim como ela, ele havia viajado com a família devido a uma proposta de emprego que os pais dele receberam. Pelos múltiplos comentários que os dois faziam um nas publicações do outro há um tempo, dava para perceber que eles eram bem amigos.

— Mas não parece passar disso, dona Karol… — eu murmurei, enquanto continuava “investigando” a mudança da minha amiga.

Depois de minutos vasculhando tudo, eu cheguei a uma conclusão ótima:

— A maluca e paranoica, no mínimo, é você! — exclamei um pouco alto demais, com um tom sarcástico.

— Falando sozinha?

Virei-me, totalmente surpresa com a voz. Não era a primeira vez que minha mãe chegava em casa e eu não percebia, mas ela nunca havia me assustado dessa maneira antes.

— Ah, mãe… que susto! — eu disse, tentando me acalmar.

— Que susto digo eu! — ela disse, levantando as mãos — Não é todo dia que você acha sua filha sozinha falando coisas sem sentido.

Apenas me calei. Ela tinha razão.

— Bom… — minha mãe continuou falando — tenho encomenda para amanhã.

— Ah, sim, vou te ajudar. — eu disse, deixando o celular sobre a cama e indo em direção à cozinha com ela.

— Você almoçou? — ela questionou.

— Não… — respondi, sendo honesta — Não estava com fome.

— Vamos fazer um lanche rápido antes de começar, então. — ela disse, abrindo a geladeira — Nem eu almocei hoje.

Ela tirou da geladeira uma torta que eu havia feito no dia anterior e colocou sobre a mesa. Aquele seria o nosso “almoço”. Enquanto comíamos, minha mãe falava um pouco sobre seu trabalho: ela havia conseguido fornecer os lanches para a escola graças às recomendações da mãe de Matheus e, inclusive, a encomenda que tínhamos era para uma reunião que seria feita na casa da mesma.

— Eu estava pensando… — ela deu uma pausa, enquanto mastigava um pouco da torta — … em levar uma torta dessas de agradecimento, sabe? Pra dizer também “Minha filha sabe cozinhar!” — ela disse, de brincadeira.

— Uma boa ideia! — concordei e ri— Eu monto a torta, mas o recheio vai ser por sua conta, não tenho tanta habilidade…

— Então capriche na decoração! — ela exclamou, colocando o último pedaço de torta na boca. Eu apenas sorri diante de tanta animação.

Quando terminamos de comer, eu fui procurar ideias para a decoração da torta na internet enquanto minha mãe fazia o recheio. Estava concentrada escolhendo uma das inúmeras opções até que minha mãe falou:

— Você não anda mais conversando mais com aquela sua amiga, né?

— Oh, nem me fale dela! — eu exclamei, enquanto separava os ingredientes.

— Aconteceu alguma coisa? — ela perguntou, curiosa.

— Não, é que… — tentei explicar sem dar muitos detalhes — … ela mudou muito. Nem parece mais a menina que eu conheci a alguns anos.

Minha mãe apenas voltou a se concentrar no recheio, sem dizer nada. Provavelmente ela não queria continuar o assunto, pois havia percebido que eu não estava bem falando sobre isso. Ficamos em silêncio por um bom tempo enquanto trabalhávamos, mas então o silêncio foi cortado por minha mãe.

— Bom… talvez ela só tenha começado a conversar com outras pessoas. A gente muda de acordo com nossas companhias. — ela disse, com um longo suspiro — Você precisa disso também.

— Hã? Como assim? — perguntei, surpresa.

— Você vai comigo na reunião, oras! — ela deu um sorriso — O Matheus estará lá, lembra dele? Vai ser bom ver alguém fora do âmbito escolar.

— É.. — murmurei — eu acho que sim.

— Agora ponha a mão na massa!

Continuamos fazendo os salgadinhos e a torta para o dia seguinte, com bastante ânimo, e conseguimos terminar antes da hora de dormir. Quando pude finalmente me deitar, me sentia ansiosa para o dia que viria. Eu realmente precisava conversar com alguém que não fosse da escola.

A manhã passou rápido e, sem que percebesse, a hora da reunião já estava se aproximando. Comecei a me arrumar para levar as encomendas junto de minha mãe, mas estava difícil de escolher uma roupa para ir. Depois de muita indecisão, eu peguei uma blusa com uma guitarra estampada, uma bermuda e um sapato qualquer.

Era só uma reunião, não era nenhum encontro.

Quando chegamos ao lugar prometido, várias pessoas já estavam em frente ao portão. O fato de sermos as únicas com algo grande nas mãos nos causou um certo desconforto, mas, para a nossa sorte, alguém abriu o portão para o grupo entrar.

Era Matheus.

Com aquele jeito educado e, ao mesmo tempo, alegre, de sempre, ele cumprimentou a todos. Passei cuidadosamente com a torta em mãos em direção à cozinha e a coloquei sobre a mesa, com cautela.

— Segunda vez que te acho mexendo com comida. — ouvi uma voz conhecida ecoar pela cozinha, seguida de uma leve risada.

— Realmente… — eu dei um leve sorriso — Já tem um tempo que a gente não se vê…

— É, o que eu posso fazer, ninguém vem me visitar… — ele disse, segurando a risada enquanto fazia uma pose dramática.

— O que fazer quando meu amigo mora muito longe? — eu fiz uma pose semelhante a dele, o que fez com que nós dois ríssemos.

Saímos juntos da cozinha e nos dirigimos ao jardim, como no dia que nos conhecemos. Sentamo-nos sob a sombra e começamos a conversar.

— Nem te contei! — ele disse, como se tivesse lembrado de algo importante — Consegui reunir todos da minha antiga banda!

— Sério? — respondi, animada — E já estão planejando alguma música?

— Pegamos uma letra que a gente começou a escrever há muito tempo e um ritmo mais antigo ainda. — ele riu — A nossa meta é terminar essa música, mas não está sendo fácil.

— Não? — perguntei, com a curiosidade estampada no meu rosto.

— Não! — ele disse, um pouco desanimado — Pensa numa letra ruim. É a nossa.

— Posso dar uma olhada? — eu perguntei.

— Se você quiser se traumatizar… — ele riu e se levantou — Vou ver se acho ela lá no meu quarto, só um minuto. Se eu demorar é porque roubei algum pedaço daquela torta.

Assenti e ele entrou na casa com calma, provavelmente com medo de atrapalhar a reunião. Olhei para o céu, praticamente sem nuvem alguma.

Sem dúvidas que ficaria calor por bastante tempo.

— Achei! — ele chegou e me entregou a folha e uma caneta — Divirta-se.

— Não deve estar tão ruim assim… — disse, enquanto olhava o que estava escrito no papel.

De fato, não estava algo como uma letra de música, mas também não estava ruim como ele havia dito. Depois de muito ler, reler e pensar, tive uma ideia.

— Posso rabiscar? — eu disse, com um sorriso travesso.

— Claro, pra isso que eu trouxe a caneta. — ele riu.

Eu comecei a reescrever algumas partes da música, que tratava sobre traição. Em alguns trechos, coloquei certas palavras que queria ter dito a algumas pessoas, foi até um jeito de aliviar um pouco a tensão dentro de mim. Quando terminei, passei a folha para o rapaz, que lia rapidamente o que eu havia escrito.

— Ficou ótima, Bia! — ele disse, contente — Mas está bem realista.

— Obrigada, mas… como assim “realista”?

— Parece que você realmente entende de… ser magoada… — ele comentou, um pouco preocupado — Posso falar que nem um velho agora, mas quando eu tinha mais ou menos a sua idade, não entendia metade desses lances de ser deixado pra trás e trocado do jeito que você entende, não mesmo. — eu abaixei levemente a cabeça — Aconteceu isso com você? Seja sincera.

Lá vamos nós de novo.

Contei o que acontecia comigo para ele, de maneira similar a como eu expliquei para minha professora e para Karol. Era estranho contar dos meus problemas para uma pessoa que não teve contato com ninguém da minha escola, exceto, claro, a Mariana, mas eu não parei.

— Aí, esses seus colegas não sabem que exclusão é feio e bullying é crime? — ele disse, assim que terminei de contar — Você é muito forte por encarar isso tudo… você tem certeza que isso não te incomoda?

— Tenho sim. — eu disse, olhando-o fixamente nos olhos — Eu não me preocupo com as coisas que eles valorizam tanto. Ainda se eu recebesse o convite para a festa da Mariana, não faria questão nenhuma de ir.

— Entendo… — ele disse, desviando o olhar por alguns segundos — Mas eu tenho uma sugestão para você ver qual é a desses moleques e a dessa Mariana.

— Qual?

— Sabe, eu não sou assim, nenhuma beldade, mas… tira uma foto comigo? — ele deu um sorriso de canto.

— Hã? — eu questionei, surpresa — Pra quê?

— Pra ver se o peixe morde a isca. Esquenta não, quando morder você vai entender.

Ainda que em dúvida das reais intenções de Matheus, eu tirei uma foto com ele.

— Até que ficou bonita… — eu comentei.

— Pode colocar de perfil, se quiser. — ele disse, com um sorriso doce — De preferência, em todos os perfis.

— Faz parte do seu plano? — perguntei.

— Com certeza.

— Certo, chefe! — eu ri.

— Melhor funcionária!

Começamos a conversar sobre vários outros assuntos. Ele contou um pouco mais sobre a banda dele, dos integrantes, entre outras coisas que aconteciam com ele. Ao contrário do que eu pensei, não foi apenas uma reunião.

Quando minha mãe saiu da sala onde a reunião ocorreu, eu e Matheus já sabíamos que, infelizmente, já era hora de nos despedirmos. Ele nos acompanhou até o portão e eu agradeci pela conversa, o que ele respondeu com um sorriso discreto, porém sincero. Eu e minha mãe partimos em direção à nossa casa, enquanto falávamos sobre coisas não muito importantes. Quando chegamos, jantamos e fomos dormir. Bom, ao menos foi isso que minha mãe fez. Parecia que algo a havia incomodado durante a reunião.

Ao me deitar, lembrei que ainda precisava fazer algo importante: responder o conselho de Karol que, analisado de cabeça fria, não deixava de ser verdade. Abri minhas redes sociais e comecei a escrever.

Obrigada pelo conselho, amiga! Acho que vou passar a observar mais quem anda me preocupando. Talvez você tenha razão e eu esteja realmente dando muito valor para quem não merece.” 

Dei um sorriso enquanto enviava a mensagem e deixei meu celular sobre o criado-mudo. Estava me sentindo mais leve e, enfim, pude descansar.


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