Buried Alive by Love escrita por MayonakaTV, Ana Bela


Capítulo 1
My tomb is where your heart is.


Notas iniciais do capítulo

Lau: O 'queria estar morta' nunca foi tão verídico.

Yas: Eu sempre soube que as bads do HIM um dia me serviriam para algo. :'D

Nossa primeira fanfic de casal concluída, yey! ♥



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O céu estava escuro mesmo sendo dia. As gotas leves e finas despencavam do alto como pregos sobre cabeças, capas e guarda-chuvas transparentes e negros. Um considerável aglomerado de pessoas se fazia presente naquele local, tornando-o deveras desconfortável – ainda mais do que já era naturalmente. Os mais sensíveis choravam, segurando lenços, outros não conseguiam pronunciar qualquer palavra. Tentando furar o bloqueio da polícia, pessoas se acotovelavam, algumas desmaiavam. Tornava-se cada vez mais difícil respirar em meio à multidão.

Imprensa, artistas, anônimos. Dos quatro cantos do Japão, todos queriam prestar a última homenagem àquele que, em vida, havia sido tão amado.

Longe do tumulto, no interior de uma das salas de velório, o único som presente era do pranto baixo e de respirações pesadas. Dispostos ao redor do cômodo, grandes vasos de porcelana escura comportando rosas brancas vigiavam os ali presentes, acalentando-os, compartilhando de sua dor. Sobre suntuosos candelabros, velas promoviam uma iluminação esparsa. Suas chamas alaranjadas tremulavam, indiferentes e constantes, derretendo a cera branca e lembrando a todos da brevidade da vida - esta que, tal qual aquelas velas, era pouco a pouco era engolida pela chama do tempo.

Um belíssimo arranjo para um evento tão infeliz.

Um círculo não uniforme de pessoas rodeava uma bancada de mármore. Sobre ela, um imponente caixão negro se erguia. As laterais cobertas por entalhes de sinuosos arabescos reluziam à luz das velas. Dentro dele, rosas azuis acolhiam o corpo inerte, de mãos unidas sobre o peito, em vestes tão negras quanto a peça que o carregava. Algumas mechas do cabelo escuro, liso e brilhante se espalhavam sobre as pétalas. Seu rosto lívido, livre da habitual maquiagem pesada, trazia um semblante tão sereno que, ainda que todos soubessem da cruel realidade, a impressão que se tinha era a de que ele estava apenas dormindo.

Era mesmo custoso visualizar Manabu Satou dentro de um caixão.

O luxo excessivo causava incômodo, uma sensação de imensa aflição. As flores grandes e coloridas trazidas pelos visitantes tentavam tirar, sem sucesso, a atmosfera pesada do lugar. O que, aos olhos daquele que, com tanto esmero, havia preparado a organização do ambiente, era um terrível ultraje.

Sentado no canto mais escuro do cômodo, de cabeça baixa e com um lenço no colo, Kaya trajava uma de suas melhores roupas, causando aos demais um misto de estranheza e revolta. Não deveria ser ali o lugar onde se acaba toda a vaidade? Mas seus olhos inchados carregavam um vazio tão grande que qualquer pessoa, ao passar por ele, dava-lhe um cumprimento sem palavras, solidarizando-se com a sua dor.

Deixe-me acordar nos seus braços

Ouvir você dizer que não está tudo bem


Soltou um suspiro tão alto que chamou atenção dos que estavam próximos de si. A tristeza, pela primeira vez em toda a sua vida, havia lhe abatido com força, roubando-lhe o sorriso, alguns quilos, o brilho dos cabelos e a vivacidade habitual. Nem se dera ao trabalho de fazer uma maquiagem muito complexa, uma vez que as lágrimas esporadicamente lavavam seu rosto. Amaldiçoava-se por, na pressa, ter deixado em casa os óculos escuros. Mana teria lhe dito que estava horrível.

Há alguns anos, quando iniciaram um relacionamento amoroso, Kaya nunca poderia imaginar que um dia os seus destinos entrelaçados chegariam a um fim tão abrupto e trágico.

Deixe-me tão morto e além

Tão longe da vida


A primeira parada cardíaca veio logo após um show em Osaka. Depois da apresentação, todos se dirigiram ao camarim. Kaya, por ter de esperar a diminuição da desordem que era a saída dos demais fãs, foi o último a chegar. Enquanto os demais membros da banda matavam a sede e trocavam as camisas empapadas de suor, Mana estava sentado, tendo a mão direita a agarrar com força o couro cabeludo. Nos últimos tempos, o guitarrista e líder parecia cansar-se com mais facilidade, porém, naquela noite, aparentava estar terrivelmente doente.

– Mana, sente-se bem? – Perguntou o mais novo, já aflito.

Sem ao menos encará-lo, o mais alto murmurou estar com dor de cabeça.

– Quer algo para a dor? Posso buscar pra você, e...

O guitarrista negou com a cabeça, respirou fundo e inclinou-se para frente, levantando-se em seguida. Em pé, levou a mão da cabeça até o peito e passou alguns segundos imóvel, com expressão de muita dor.

– Mana...? Está--

Não houve tempo de completar a pergunta. Diante de seus olhos, o mais velho tombou com um baque surdo. Assustado e desesperado, Kaya se abaixou ao lado dele, tocando-lhe o ombro e o chamando pelo nome. Os outros, vendo o que aconteceu ao líder, correram até os dois e, enquanto Seth e Sugiya carregavam o corpo desacordado para um sofá ali existente, Hayato se prontificou a solicitar a ajuda dos paramédicos presentes na casa.

Prestado um primeiro atendimento, os paramédicos conseguiram reanimá-lo. E, ao longo dos meses, outros sustos vieram. Teimoso como era, Mana relutava em procurar um médico e Kaya, tão teimoso quanto, insistia que o amado deveria buscar ajuda especializada, pois poderia ser algo grave. Depois de muitas brigas e mal-estares, foi marcada a fatídica consulta...

Onde o coração do guitarrista, por já dispor de certa idade, foi diagnosticado como “fraco, incapaz de tolerar emoções fortes e propenso a sofrer uma parada definitiva a qualquer minuto”.

E, a partir dali, começou o inferno na vida do casal.

Feche meus olhos,

Abrace-me forte...

Era um dia nublado e frio. Kaya tirara o dia livre para se concentrar em atividades que gostava. Estava na cozinha preparando alguns pratos que Mana adorava, em poucas horas receberia a visita deste, quando seu celular começou a vibrar. Era Közi.

– Közi?

Houve apenas um pesado e longo suspiro do outro lado da linha.

– Alô...?

– Kaya, preciso que venha para o hospital agora mesmo – seu tom era hesitante, apreensivo. Parecia estar escolhendo as palavras antes de usá-las.

– Aconteceu algo com Mana...?

Não houve resposta. Bastou apenas mais um suspiro do amigo para que Kaya entendesse tudo e deixasse cair o celular no chão. Movido pelo desespero, só conseguiu reaver o celular e sair de casa às pressas, ignorando o fogo ainda ligado e a chuva torrencial que caía naquele momento.

E enterre-me dentro de seu coração

Molhado, descabelado e com o celular na mão, adentrou o prédio obscuro, dirigindo-se à recepção. Só queria saber do amado, não possuía a menor paciência para as burocracias de atendimento.

Obtendo enfim a informação que esperava, independente de ser ou não liberado, dirigiu-se ao primeiro elevador que encontrou, entretanto, a demora o fez mudar de ideia. Correu para as escadas, subindo três lances sem ao menos parar para recuperar o fôlego. Ao parar no último degrau, sentindo o peso do cansaço, inspirou profundamente e, ao levantar a cabeça, viu Közi no corredor à frente, parado diante de um quarto. Pretendia chamar por ele, mas, antes que sua voz saísse, viu saírem do quarto dois enfermeiros conduzindo uma maca coberta por um lençol branco. E tudo o que conseguiu fazer foi chamar pelo nome do amado.

– MANA!

Közi mal teve tempo de assimilar o que estava acontecendo. Ao virar-se, já tinha em seus braços um vocalista com lágrimas nos olhos, atirando-lhe, aos gritos, mil perguntas confusas.

– Onde está ele? O que está acontecendo aqui? Közi, por que não me disse nada no telefone? Eu quero ver o Mana, eu...

– Kaya, acalme-se, por favor – Pediu o mais velho, tentando segurar o jovem alterado. – Mana teve outra parada. A ambulância chegou depressa, mas ele...

– Eu quero vê-lo, quero falar com ele! Leve-me até ele!

– Não pode vê-lo agora, ele...

– Por favor, Közi, sai da frente, eu preciso vê-lo!

Közi sabia que, naquele momento, não haveria diálogo. Já se condenava pela atitude que tomaria a seguir, entretanto, fê-la mesmo assim. Era tudo ou nada.

– Ele morreu, Kaya!

Silêncio. Com os olhos a quase saltarem das órbitas, Kaya apenas conseguiu encarar o mais velho, mover levemente as pupilas sobre o ombro deste em direção à maca ainda vigiada pelos enfermeiros, e retornar o olhar para o rosto descorado de Közi que, assentindo com vagar, pôs fim àquela cruel dúvida que se apoderava de seu ser.

A ficha caiu como se um taco de beisebol tivesse lhe atingido o estômago.

– Não pode ser verdade... Não pode ser verdade!

Antes que o outro pudesse interferir, Kaya se soltou do abraço e praticamente voou de encontro à maca, agarrando-se ao lençol e o puxando sem ao menos pensar no que estava fazendo. Travou no momento seguinte ao encontrar ali o corpo lívido do amado, que parecia apenas dormir.

– Mana...

Incapaz de cair em si, segurou o cadáver pelos ombros, sacudindo-o, chamando-lhe o nome.

– Acorde, Mana! Você não pode morrer ainda!

Os enfermeiros tentaram impedi-lo, contudo, a força empregada nos chutes e socos que desferia contra os profissionais tornava quase impossível a tarefa de tirá-lo de perto do cadáver. Observando a situação, tomado por um misto de dor e vergonha, Közi conseguiu segurá-lo pelo ombro, afastando-o dos demais. Kaya ainda se remexia e proferia palavras sem nexo.

– Agora já chega, Kaya! – Esbravejou o maior.

– Insensível! Me solta! Você não sabe como eu me sinto! Você não sabe na--

Antes que ele pudesse continuar a protestar, Közi o acertou com a mão aberta no lado direito da face, produzindo um estalo que ecoou pelo corredor já um tanto cheio de médicos e enfermeiras que vinham ver o que acontecia ali.

– Não sei, Tatsuya? Eu estive com ele desde a adolescência, eu acabei de perder um melhor amigo e não sei como você se sente?

Novamente o silêncio. Em meio ao constrangimento geral, os enfermeiros trataram de recolher o tecido que cobria Mana e colocá-lo onde estava inicialmente. Abalado, Kaya levou a mão direita ao local atingido, finalmente se dando conta de seu papel de ridículo. Além da grande dor que se apoderava de seu ser e da onda de vergonha que se fez presente, uma fraqueza fora de hora tomou seu corpo e o fez desabar sobre os próprios joelhos. Alguns funcionários vieram tentar oferecer-lhe ajuda, no entanto, Közi gentilmente recusou, comprometendo-se a assumir dali. Com um profundo suspiro, ajoelhou-se em frente ao menor, tocando-lhe o ombro.

– Desculpe.

Entristecido e envergonhado pela severidade, Közi abraçou o amigo como se buscasse redenção. Todavia, Kaya parecia nem sentir, da mesma forma que não sentia mais as lágrimas caindo incessantemente de seus olhos. Imerso em seu próprio mundo, ainda via nitidamente a figura de um Mana sem vida deitado naquela maca.

A cada encontro que tinha com Mana, sentia uma felicidade tão grande que, por várias e várias vezes, pensou que seu coração fosse parar. Só não esperava que o palhaço destino, numa piada mórbida, fizesse o coração de Mana, literalmente, parar primeiro.

Tudo o que eu sempre quis era você, meu amor

Você... Tudo o que eu sempre quis é você

Você é tudo o que eu sempre quis, só você

E, no dia seguinte, ali estava ele, diante daquele lustroso caixão. Após passar a noite arcando, por livre e espontânea vontade, com a preparação e os custos daquele suntuoso velório, mal tivera tempo de comer ou dormir – e acreditava piamente que estava melhor assim.

Desejara viver eternamente em sua imaginação, que vagueava pelas memórias nas quais Mana estava respirando, vivendo a sua vida da melhor forma possível. Sua mente criava um grande contraste com a realidade, em que encarava o amado imóvel, sem soltar um mísero sopro de vida.

Deixe-me nunca ver o sol

E nunca te ver sorrir


Saído de sua reclusão, prostrando-se mais uma vez diante da bancada, suspirou pesadamente, com o olhar vazio e opaco encarando o ex-guitarrista a tristeza parecia aumentar gradativamente. Para quem o via naquela situação, ficava a dúvida entre ir até ele e prestar-lhe o devido amparo ou deixá-lo digerir o acontecido dentro de seu próprio tempo. Para Okabe Satoru, a primeira opção pareceu mais válida. Consideravelmente atrasado, já causando certo burburinho ao entrar, aproximou-se do centro da sala e, após dar uma rápida olhada em Kaya, tocou a borda do esquife, curvando levemente a cabeça em sinal de respeito.

– Meus pêsames – proferiu, solene.


Não recebendo resposta do mais novo, suspirou, tentando dar um rumo à conversa.

– Olha, eu sei que é difícil, mas você vai superar.

– Eu jamais vou superar isto, Gackt – respondeu-lhe enfim o outro vocalista em um murmúrio, virando o rosto pra encará-lo com expressão de mais puro desconforto. – Não fale por mim.

– Só está dizendo isto porque está magoado agora. Verá que em pouco tempo já terá esquecido. Terá até, quem sabe... – Um sorriso torto e debochado se fez presente em sua face. – Um novo amor...

Aqueles que se achavam ao redor dos dois e ouviram, ainda que parcamente, esta parte da conversa, sentiram que a qualquer segundo algo explodiria. No caso, alguém, e este alguém certamente seria Kaya, cujo rosto antes de um branco quase fúnebre atingira um violento tom de vermelho vivo. Sempre alerta, Közi já sentia o cheiro da iminente confusão, mas o membro da família com quem conversava não o largaria tão cedo.

– Nunca encontrarei alguém como Mana – rebateu o mais baixo entre dentes cerrados, tendo em seu tom de voz certa fúria contida. – Eu não quero.

– Deveria. Sabe, com o passar do tempo os gostos variam – insistiu Gackt com indiferença. – Talvez o próximo tenha um gosto melhor para a decoração do funeral.

– Vá embora, Gackt – ordenou Kaya, elevando a voz a tal ponto que todos os presentes voltaram os olhares para ambos.

Interrompendo a bruscamente a conversa com um pedido de desculpas, Közi deixou o dito parente de lado e se apressou em adentrar a discussão, a fim de evitar que se tornasse um completo desastre.

– Gackt, acho melhor conversarmos um pouco lá fora.

– Por que, Közi? Devo sair só por estar dizendo a verdade? – Após rir-se, o artista balançou a cabeça em uma breve negativa, empinando o nariz. – Só por dizer ao nosso pequeno Kaya que ele pode arranjar coisa melhor? Ora Közi, para que sofrer por Mana, quando sabemos que Kaya não era a única puta que ele tinha?

Não houve meio de impedir que a destra de Kaya o atingisse em um fortíssimo e certeiro tapa que lhe virou o rosto pra o lado. Ouviram-se exclamações e frases de indignação. Todos ali ficaram admirados, passando os olhos atentos do agressor para o agredido. Gackt saiu de seu estado imóvel, voltando o rosto para Kaya, que agora derrubava lágrimas de tristeza e raiva. O maior ainda abriu um meio sorriso insolente.

– A verdade dói, não é mesmo?

Antes que Kaya avançasse contra o mais alto, Közi o conteve em seus braços.

– Gackt, acho melhor vo--

– Não se preocupe, eu já estava de saída. – Falou despreocupado, dando meia-volta e se dirigindo para fora do recinto.

Ao som do último passo do cantor expulso, as pessoas desataram a falar todas ao mesmo tempo, cercando Közi e Kaya, perguntando ao segundo se precisava de ajuda e lhe oferecendo copos d’água. O barulho adentrava os ouvidos do pequeno como uma orquestra desarranjada, ouvia apenas vozes confusas que faziam sua cabeça latejar. Tudo o que queria era livrar-se daquele zumbido infernal.

– Saiam todos daqui – pronunciou categórico, não evitando que sua voz falha se alterasse até transformar-se em um grito. – Saiam daqui agora!

Os que entenderam o recado sem dificuldade caminharam um pouco desconcertados para a saída da sala. O resto se dividiu naqueles em que se calaram e uma minoria insistente ainda oferecendo auxílio para o cantor, no que Közi teve de outra vez intervir, aos sussurros: “Vão, por favor. Eu converso com ele”.

Finalmente todas as pessoas deixaram o local, restando apenas os dois parados em frente ao caixão. O mais novo chorava baixo, respirando rápido quase sem controle, enquanto o outro procurava as palavras corretas para tentar acalmá-lo.

– Gackt é um idiota, não acredite nele – aconselhou o amigo, oferecendo a Kaya um abraço terno. – Nós dois sabemos que é tudo mentira.

– Közi, por favor – pronunciou Kaya em um novo murmúrio, abafado pela boca prensada contra as vestes do peito do maior. – Saia você também.

– Tem certeza...? – indagou Közi, receoso.

– Quero ficar sozinho.

Achou melhor não contrariá-lo. Kaya estava fora de si. Derrotado, dirigiu-se à saída, fechando a porta. Talvez um tempo a sós o ajudasse a recobrar a sanidade.

Após um suspiro profundo, Kaya tocou as frias mãos que repousavam sobre o peito do morto, sorrindo-lhe tristemente.

– Enfim sós.

Acariciando-lhe a pele gélida dos dedos, curvando-se lentamente sobre o corpo, apoiou a cabeça em seu diafragma inerte, fechando os olhos. Tomado de súbito por um intenso peso em seu peito, atormentado pelo silêncio e pela noção de solidão, desatou a chorar.

Deixe-nos ser tão mortos e tão além

Tão longe da vida


Do lado de fora, a chuva continuava a cair, mais pessoas haviam chegado, deixando o local lotado. Percorriam conversas paralelas sobre o que ocorria no interior da sala, afinal, os gritos de Kaya foram audíveis para a maioria. As fofocas e especulações ganhavam força à medida que eram passadas de pessoa pra pessoa; a imprensa não dava trégua, espalhando-se em peso querendo informações. Os sons da chuva e dos diálogos intensos abafavam o pequeno grupo de fãs que cantavam.

Feche meus olhos

Abrace-me forte

E enterre-me dentro de seu coração

Passaram-se minutos e não houve nenhum sinal de Kaya. Preocupado, Közi resolveu retornar à sala de velório para ver o que ocorria e também, se fosse possível, argumentar com o moreno. Por mais que ele e os demais entendessem sua dor, não era correto privar outras pessoas de dar seu último adeus a Mana. Contudo, não pôde fazer nada do que pretendia.

Voltando ao cômodo, encontrou lá os funcionários da funerária que, em torno do caixão já fechado, preparavam-se para transportá-lo para sua respectiva sepultura. Já estava mesmo no horário combinado. Porém, a ausência de Kaya não passou despercebida a Közi, que imediatamente indagou a um dos homens:

– Com licença... Sabem me dizer para onde foi o rapaz que estava aqui há pouco?

– Não havia ninguém quando chegamos, senhor – respondeu-lhe um dos trabalhadores.

– Não viram ninguém saindo daqui?

– Não senhor. Mas muita gente foi embora há alguns minutos.

“Ele não iria embora antes do enterro” pensou o ruivo, após agradecer as informações, dirigindo-se para fora a fim de informar aos convidados de que era chegada a hora do sepultamento. “Não deixaria o celular e os documentos no meu carro”.

Diante das mais absurdas hipóteses, acabou cedendo à ideia de que, sem conseguir aguentar a pressão depois de tudo o que lhe acontecera naquele tão curto período de tempo, Kaya poderia sim ter ido embora sem dizer nada a ninguém.

Assim que se juntou aos outros, perguntou se alguém vira o amigo, não obtendo nenhuma resposta concreta, contudo, alguns afirmaram que viram um carro escuro com alguém que parecia ser Kaya dentro se dirigindo para fora do cemitério. Soltou um suspiro resignado. Algumas pessoas foram embora após serem expulsas da sala, provavelmente o vocalista foi amparado por uma delas ao ser encontrado vagueando por ali. Não podia culpá-lo. Kaya era frágil e, naquele momento, precisava de compreensão.

Tudo o que eu sempre quis era você, meu amor

Você... Tudo o que eu sempre quis é você

A chuva aumentou consideravelmente no momento exato da saída do caixão. Os fãs mais próximos dos portões, possuindo uma visão melhor do que acontecia além das grades, aglomeraram-se de uma só vez na entrada do cemitério. Os mais ao fundo, ao verem a agitação adiante, começaram a se perguntar o que estava acontecendo, tentando se aproximar ao máximo do portão. A informação corria de boca em boca, gritos de “o caixão está saindo!” e dos repórteres chamando seus colegas de trabalho com “tá na hora!” tomaram conta do quarteirão. A barreira de policiais ao longo da rua foi rompida; com toda aquela afobação, muitas pessoas escorregavam e iam ao chão, sendo pisoteadas. A aglomeração era geral.

A primeira imagem vista ao longe foi a responsável por aumentar a tristeza e o choque. Ao invés dos funcionários, eram Közi, Seth, Sugiya, Hayato, Klaha e Yu~ki que carregavam o caixão do amigo. Os portões foram enfim abertos ao público, que entrou às pressas levando quem havia pela frente, dividindo-se de forma desorganizada nos espaços que encontravam. O batalhão de polícia, recuperado, novamente interveio, deixando uma passagem central vazia para que os músicos passassem. Andavam de cabeça baixa e com expressão séria. Devido ao peso da perda e também o do caixão, marchavam lentamente no caminho de pedras brancas, seguidos pela procissão de família, amigos próximos e artistas, enquanto as pessoas lutavam para enxergar a cena dolorosa. Rosas eram atiradas em direção ao ataúde. Choros diversos eram ouvidos e os flashes das câmeras só não eram mais claros que os raios no céu.

Mesmo em meio há tantos diferentes ruídos, não se deixavam de ouvir os comentários sobre Kaya, que não se fazia presente na cerimônia. A fofoca se dividia naqueles que defendiam o músico, entendendo o tamanho de sua dor, e a outra parte era daqueles que criticavam a maneira fria com a qual Kaya havia deixado o local sem dizer uma mísera palavra ou dar uma última despedida. E, entre tantas críticas e sem nenhuma resposta, o coração de Közi pesava. Mas ele sabia que, em nome do amigo morto e de Kaya, deveria ser forte até o final.

A sepultura se encontrava ao final de um pequeno morro. Quando chegaram ao topo, a atmosfera parecia mais carregada e a dor parecia ter se intensificado junto com a chuva. Era perturbador encarar o jazigo aberto no chão. Enquanto fãs e imprensa continuavam sua batalha por uma aproximação da área do sepulcro, o seleto grupo de pessoas reunidas ali, entre choros contidos e orações silenciosas, preparava-se para o desgraçado momento do discurso de despedida.

Um padre foi convidado para presidir o funeral. Fez uma breve e profunda oração para o ex-guitarrista. Quando terminou, um silêncio maior se apresentou, e o religioso se dispôs a ceder espaço para que as pessoas dessem suas palavras finais. Abalados demais para completar a tarefa, passaram por unanimidade aquela funesta responsabilidade a quem mais conhecia e convivia não só com o artista, mas com a pessoa de Manabu Satou: seu melhor amigo Közi.

– Bem – começou ele, sutilmente encabulado. – Não sei como começar. Talvez seja certo agradecer a vocês, não apenas por mim, mas também por Mana. Cada um aqui presente foi muito importante em sua vida, então, não há motivo pra não o serem em sua morte. Obrigado a quem enfrentou toda a dor e a chuva para estar aqui hoje... – interrompeu-se dando uma rápida olhada para a multidão apinhada aos pés da colina e suspirando profundamente. – Seja para quem, mesmo de longe, sente a mesma dor que todos nós...

Você é tudo o que eu sempre quis, você, meu amor

Você é tudo o que eu sempre quis, você, meu amor

Depois de tantas horas acordado e trabalhando naquele enterro, Kaya sentia o corpo todo doer. Sozinho no escuro, sendo aos poucos devorado pela agonia, sentia o cansaço percorrendo suas veias. As pernas pareciam pesar toneladas depois de tanto tempo em pé andando de um lado a outro, o estômago vazio se retorcia em desespero. Além daquela sensação em seu corpo, sua mente também pesava. Lembrava-se de tudo que passou nas últimas horas e queria chorar novamente, porém, não possuía mais forças para tal. Seus pensamentos eram engolidos por flashbacks desordenados de toda a sua vida, desde a infância até aquele momento. Via os preciosos momentos com Mana, a descoberta da doença, suas tentativas frustradas de curar o mais velho e o escândalo que havia feito no hospital. Pensava no trabalho dado e na mágoa que havia causado a Közi com suas criancices e com seu sumiço, mas esperava que um dia ele o perdoasse. Que todos o perdoassem.

Esse é o jeito que sempre foi

Meu coração pára de bater somente por você, baby

Naquele momento, queria apenas descansar. E, dando seu último suspiro, deixou que as pálpebras pesadas se fechassem por completo. Os lábios ressequidos se curvaram em um meio-sorriso angelical, enquanto a cabeça pesada podia enfim encontrar o descanso eterno no conforto do peito frio de seu amado Mana.

– Enfim sós...

Só por você, querido...


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