Perdida em Crepúsculo: além do sonho. escrita por Andy Sousa


Capítulo 28
Descuido.


Notas iniciais do capítulo

Leitores novos sejam bem-vindos.
Meus leitores de sempre, obrigada por ainda acreditarem em mim.
Leitores fantasmas, obrigada por acompanharem, significa muito!
E aqueles leitores que estão aqui desde a época do orkut, poxa, muito obrigada!

Boa leitura a todos!



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Aneliese PDV

"Você me faz experimentar algo
Que não posso comparar a nada,
Estou esperando que depois dessa febre, eu sobreviva.
Sei que estou agindo feito louca,
Como uma viciada, meio fora do ar,
Com as mãos no coração, eu rezo
Para que possa sair dessa viva.
O futuro que nos espera é tão incerto,
Aposto que a sorte não estará a nosso favor.
Há um milhão de motivos para eu te deixar,
Mas o coração quer o que ele quer.
Você me deixou em pedacinhos,
Cada segundo é uma tortura e eu não consigo escapar.
Este é um conto de fadas moderno, sem finais felizes,
Mas eu não consigo imaginar uma vida
Sem esses momentos de tirar o fôlego."

The Heart Wants What It Wants – Selena Gomez

~*~

— Faz tempo que você chegou? – Foi a primeira coisa que ele perguntou ao me ver.

Examinei o relógio por um instante.

— Cerca de uma hora, mais ou menos, porque?

O xerife sequer havia se livrado de seus acessórios, ele sempre fazia isto quando entrava em casa, era de praxe. Percebi que seu semblante revelava cansaço.

— Soube do que houve com um de seus colegas de escola, não soube?

— Spencer... Sim, eu soube, fizeram uma busca no colégio pela manhã, foi ordem sua?

Ele pareceu ponderar se me respondia ou não.

— Os pais deste garoto estão desesperados, não há outra forma de descrevê-los, estou acostumado a lidar com situações difíceis, mas isto, de algum modo eu... – Charlie jamais demonstrava seus sentimentos, ainda mais quando seu trabalho estava envolvido, por isso fiquei apenas calada, observando-o com atenção. Ele me olhou de volta e reconheci que estava vulnerável – ainda não encontramos nada.

Aquiesci vagarosamente. Como imaginava, se vampiros tivessem sido os responsáveis pelo que houve, eu duvidava que um dia sequer chegassem a encontrar pistas.

— Isto é bem frustrante – desabafou.

Finalmente pareceu se dar conta de que ainda usava o uniforme completo e refez os passos, indo até o hall, onde depositou o coldre e a jaqueta. Me dei conta de que não havia preparado nada para o jantar, acabara me distraindo com minha pequena cerimônia lá em cima e me senti constrangida ao fitar Charlie.

— Você deve estar com fome, me desculpe. Se me der alguns minutos, posso fazer macarronada.

Ele ergueu a mão como quem dizia ‘não se preocupe’.

— Estou bem, mas acho que você devia comer alguma coisa. Quando foi a última vez que se alimentou?

— Já faz algumas horas – confessei com um sorriso amarelo.

Charlie pôs a mão sobre a testa, enquanto refletia.

— Aneliese, você está bem?

Não podia ser. De novo esta pergunta? Já havia perdido a conta de quantas vezes a ouvira somente hoje, será que parecia doente? Será que, de algum modo, estava diferente? O bastante para que se tornasse nítido aos demais?

— Eu estou bem.

— Anda fazendo um bocado de coisas ultimamente. A escola, o trabalho e agora essa tal banda...

Eu distingui o tom autoritário de alguém que estava prestes a dar ordens, no humor em que se encontrava, se Charlie resolvesse me tirar de alguma de minhas atividades, sem dúvidas, seria da Marrow. Não havia como eliminar os estudos e o trabalho era útil, mas ele deveria considerar minha estadia na banda irrelevante, algo como um hobby. Eu não podia correr o risco de ser proibida de continuar com os garotos, ainda mais quando eles haviam deixado claro que precisavam de mim com urgência, afinal neste final de semana teríamos a apresentação em Tacoma.

— Eu sei – comecei a falar com certa urgência e ele me olhou, então procurei ensaiar melhor as palavras – que pareço estar sobrecarregada, e admito que esteja cansada, mas eu gosto. Ainda hoje pensava sobre o quanto é bom ter minha própria rotina, assim minha cabeça fica livre de pensamentos ruins, você sabe que preciso tomar cuidado com eles.

Eu não jogava limpo, Charlie não era bobo, apesar de não se lembrar do quanto Edward havia me machucado, ele sabia que eu ficara triste com sua partida e não iria querer ser responsável por me entristecer, eu tinha certeza.

Depois de uma longa pausa ele enfim falou:

— Está bem, você tem razão, é melhor que se mantenha ocupada. Mas seja sincera comigo, se por acaso perceber que está sendo demais, é minha obrigação cuidar de você.

Ele em geral não tinha problemas com restrições, costumava ser bastante incisivo quanto a isto, porém desta vez não senti como se fosse uma ordem e sim uma súplica, de alguma maneira ele me fazia um pedido, que eu fosse verdadeira, porque ele se preocupava.

— Charlie você não está se sentindo culpado pelo que houve ao garoto, está? Ou por não ter conseguido encontra-lo... Está fora de seu alcance, você sabe disso, não sabe?

Ele não respondeu e seu silêncio foi a confirmação de minhas suspeitas.

— Você não tem culpa Charlie, coisas assim acontecem, não havia nada que pudesse fazer! Você é um ótimo xerife, se preocupa com essas pessoas, eu sei que sim!

Procurei expressar o que pensava a seu respeito, era tudo verdade e eu esperava que ele me ouvisse, porém não pareceu surtir efeito, pois sua feição permaneceu apática, ele começou a convergir para a sala, passando por mim como se eu sequer tivesse dito algo.

— Procure voltar cedo destes ensaios, quero que esteja em casa bem antes das nove horas da noite.

— Mas Charlie...

Ele se voltou para mim.

— Antes das nove horas. É uma ordem! E evite ficar sozinha, você entendeu? Eu não irei perder mais nenhum adolescente dessa cidade, se puder evitar.

Ele se culpava. Me doeu muito presenciar sua impotência, naquela situação infelizmente não havia nada que um policial pudesse fazer, nada que ninguém pudesse fazer, nem mesmo os pais de Spencer teriam sido capazes de salvá-lo.

Por querer demais que ele ficasse em paz, por gostar demais de Charlie e ser grata por tudo o que ele fizera por mim eu apenas concordei, sem mais discutir. Ele enfim me deixou sozinha e aproveitei para começar a mexer nas panelas, com pressa para aprontar nosso jantar.

Ouvi o distinto barulho da televisão ecoando do outro cômodo.

— Este porta-retratos é novo.

Coloquei um bocado de água para ferver e fui até o encontro do xerife.

— Desculpe, esqueci de dizer que recebi uma encomenda de uma amiga minha do Brasil, ela me enviou este presente e uma carta.

Os cantos de seu bigode se curvaram, em uma careta de admiração.

— E o que dizia na carta? Algo sobre Bells?

— Na verdade, eu ainda não a li – confessei me sentindo muito tola, afinal havia me esquecido completamente dela, não era à toa, com tantas coisas que tinha com que me preocupar. – Vou aproveitar para fazer isso agora, enquanto espero a água do macarrão ficar no ponto. Você prefere que eu tire a foto daí?

— Não, ela pode ficar. São recordações da família e você é família, garota.

Suas palavras me pegaram de surpresa e sem pensar duas vezes me aproximei dele e o abracei brevemente.

— Obrigada Charlie. Por tudo!

Incrivelmente ele riu, depois meio sem jeito me mandou ir logo ler a tal carta e o obedeci também rindo. Esperava que isto tivesse servido para modificar seu humor, ao menos um pouco, tinha medo de que ele pudesse se sentir sozinho, quis que meu abraço transmitisse não somente a consideração que tinha, mas também a certeza de que para mim ele era um ótimo pai.

Terminei de subir os degraus e me sentia incrivelmente ansiosa, ao adentrar o quarto foi que percebi que havia me esquecido do computador, ele permanecera ligado, mas a página havia travado, por isso eu não ouvira mais música nenhuma. Revirei os olhos e o desliguei, sem mais delongas fui até minha mochila e retirei de dentro o envelope, abrindo-o com cuidado.

Sorri ao ver novamente a letra de minha amiga, eu me lembrava exatamente de como era, os inconfundíveis coraçõezinhos que ela usava como enfeite, as iniciais rebuscadas.

Rafaela começava me cumprimentando, em seguida falava sobre sua própria vida, ao que parecia Henrique já era passado, ela agora estava de namorado novo. Contive o impulso de rir, eu sentia tantas saudades que até mesmo suas aventuras amorosas pareciam ser a melhor parte. Curiosamente ela não disse sequer uma palavra sobre Bella, seu relato se baseou apenas em si mesma e isto me incomodou um pouquinho. Mas conhecendo minha amiga, sabia que ela não havia feito por mal, na realidade me impressionou sua iniciativa em me escrever pelos métodos antigos, por assim dizer. Rafaela era seguidora fiel dos avanços da tecnologia e optaria imediatamente por uma mensagem ou no mínimo um e-mail. Concluí que Bella deveria ter lhe dito que meu celular mal funcionava e era verdade que eu tampouco checava minha caixa de mensagens eletrônicas.

Uma carta escrita à mão, apesar de não fazer seu estilo se mostrou o método mais eficaz. Resumindo ela devia ter me escrito muito a contragosto e não quis se prolongar.

Ao final ela me perguntava como estava e pedia que lhe contasse sobre minha própria vida romântica, pois segundo ela era impossível que depois de tantos meses eu não tivesse me envolvido com alguém. Rafaela foi bastante clara sobre esperar uma resposta minha o quanto antes, ela devia estar realmente afoita por novidades.

Não importava qual fosse o conteúdo daquele envelope, era uma carta de minha amiga e eu me senti feliz por recebe-la. Apesar de estar ocupada no momento, prometi a mim mesma que responderia assim que tivesse tempo, provavelmente depois do jantar. Tive de deixar a correspondência de lado enquanto retornava a meus afazeres na cozinha.

Eu estava deitada de barriga para cima sobre um grosso tapete, não me mexia, pois tinha a vista mais bonita ao meu alcance: a floresta repleta de mistério e beleza etérea. Repentinamente uma brisa leve me alcançou e ao voltar meu rosto me deparei com Edward ao meu lado, seus olhos me fitavam de volta e ele sorriu levemente. Ergui minha mão, ansiosa por tocar seu rosto, eu sentia o aroma bom de sua respiração me atingindo em leves lufadas. Ele estava tão próximo de mim, eu me sentia tão feliz...

Abri meus olhos e permaneci quieta. Estivera sonhando?

— Não acredito nisto.

Levei as mãos à face e a esfreguei, procurando me livrar dos resquícios de ilusão que dançavam por trás de minhas pálpebras. Que sonho cruel! Porque eu tinha que ter essa capacidade? De nada adiantavam meus esforços quando meu próprio subconsciente se encarregava de me maltratar.

Deixei meu olhar recair sobre o despertador e tive a infeliz surpresa de constatar que acordara antes da hora, por isso me sentia um tanto desnorteada. Talvez o súbito despertar tivesse sido uma tentativa desesperada de meu cérebro em me livrar da agonia e fiquei contente pela interferência, seria mais difícil esquecer as cenas se tivesse chegado a realmente tocar Edward, mesmo se tratando de uma fantasia.

Apesar da noite dormida eu ainda me sentia cansada, Charlie não errara por completo em pensar que eu estava me esforçando bastante, mas eu não voltaria atrás agora, ainda mais depois que me comprometera com a Marrow. Como ainda tinha tempo permaneci na cama, aproveitando para me espreguiçar até sentir cada parte de meu corpo relaxada.

Como gostaria, havia respondido à carta de Rafaela na véspera e não me preocupei em inventar mentiras ou justificativas, fui apenas verdadeira. Desabafei com minha amiga, me abri. Depois de recrimina-la por ter relatado somente paixões acabei por fazer o mesmo, lhe falei somente sobre Edward do começo ao fim e revelei todo o amor que sentia por ele – escondendo, logicamente o fato dele ser vampiro. Pensei que Rafaela ficaria feliz em saber que eu enfim me apaixonara novamente, ela vivia pegando no meu pé quanto a isto, pude até mesmo imaginar seu rosto quando lesse minhas palavras. Será que ela conseguiria captar a intensidade de meus sentimentos através de meu relato? Será que entenderia pelo menos um pouco de minha história de amor? Gostaria tanto de poder lhe contar tudo pessoalmente!

Quem sabe você não possa?

Senti minha testa se franzindo automaticamente, não era como se aquilo fosse uma impossibilidade, na realidade era o contrário, já fazia tempo que eu estava em Forks e se a hora de partir chegasse?

O despertador soou nesse instante me tirando à força da linha de raciocínio que alimentava e ao fim não fiquei incomodada, eu não estava disposta a iniciar meu dia já me preocupando com coisas tão complicadas.

Com um suspiro me levantei da cama.

— Você se sentirá melhor se eu tentar falar com ela? É verdade que já faz algumas semanas que não tenho notícias de Bella, embora acredite que ela esteja bem.

Charlie não respondeu, mas ergueu as sobrancelhas em resposta, interpretei seu silêncio como um ‘sim’. No café da manhã acabamos conversando um pouco sobre minha antiga casa e inevitavelmente o assunto parou em sua filha, estava claro que ele se importava com ela e pensei que faria bem ao seu espírito ter novidades.

Como de costume, ele saiu antes de mim, me faria o favor de colocar minha carta no correio, então só me restou ir até o andar de cima e terminar de me aprontar. Antes de partir coloquei o celular dentro da bolsa, iria tentar contatar Bella o quanto antes, não queria ter de esperar até a noite, por me preocupar com Charlie.

Saí para mais um dia cinzento, o tempo estava frio, mesmo dentro de casa eu já tremia, corri para a picape contente por me refugiar dentro da cabine, liguei o motor e o rádio e manobrei para fora do quintal. O veículo tinha um cheiro bom, por conta do trabalho podia me dar ao luxo de mantê-lo regularmente limpo e me sentia à vontade estando ali. Alguns de meus vizinhos saíam de suas casas, a rua estava movimentada.

Enquanto dirigia a caminho da estrada principal eu cantava junto com a música, a rádio em geral tocava as mesmas faixas neste horário, chegando próximo à faixa de pedestres notei que havia um garoto querendo atravessar e desacelerei a caminhonete para lhe dar chance de passar, eu observava o movimento ao redor e quando me virei outra vez na direção do pedestre vi que ele não havia se movido. Como usava capuz pensei que talvez estivesse com fones de ouvido, fiz uso da buzina, procurando lhe alertar que o esperava, em resposta ele me fitou, porém continuou estático.

Prendi os lábios, não estava disposta a me estressar no trânsito, era perda de tempo, então fiz um gesto largo, minha mão se estendendo e apontando até a outra extremidade da rua. Durou apenas um segundo, mas quando tornei a virar minha cabeça o garoto havia sumido. Confusa olhei ao redor, mas não havia qualquer sinal dele. Sem motivo para continuar parada retomei meu trajeto, ao fazer a curva aproveitei para procurar ao longo da estrada, mas não pude ver nada.

— Que esquisito – falei enquanto soltava um risinho.

Adolescentes e seus truques, imaginei que o menino devia estar escondido em algum lugar, rindo de meu papel de trouxa, que brincadeirinha mais sem graça.

Por sorte a pausa não me impediu de chegar cedo a Forks High School, meu relógio indicava que faltavam alguns minutos até o sinal soar e assim que parei no estacionamento aproveitei para pegar meu celular. Deveria ter ficado espantada ao encontrar o aparelho funcionando perfeitamente, mas eu já me acostumara com o fato peculiar, tentei a sorte de conseguir fazer uma ligação, mas não funcionou e parti logo para a mensagem.

“Olá Bells, tudo bem? Faz algum tempo que não nos falamos. Charlie anda trabalhando bastante e pensei que faria bem a ele saber como você está, se tem novidades. Ele não sabe sobre Alex, mas pensando bem talvez isso acabasse por lhe confundir ao invés de ajudar – risos. E como estão todos? Mantenha contato! P.S.: Diga a Rafaela que recebi sua carta. Sinto saudades dela. Um beijo, L.”

Assim que terminei de digitar ouvi o sinal de entrada soar, abri a porta no mesmo instante em que jogava às pressas o aparelho de volta na mochila, ouvindo-o cair com um baque surdo. Marchei para o corredor onde ficavam dispostos os armários, pois precisava de meu livro para a aula de espanhol. Cheguei ao meu destino e notei que o diretor se encontrava próximo, ele caminhava e parava para cumprimentar os alunos, me lembrou um político em época de eleição. Deliberadamente fiz uso da porta de alumínio para esconder meu rosto, contudo não consegui ser eficaz como queria.

— Senhorita Rodrigues, como está?

Me virei e procurei ser gentil, apesar de saber exatamente como lidar com ele eu não estava inclinada a fingir estar gostando e tampouco entendi o que pretendia com aquilo tudo, afinal.

— Estou bem.

— E o xerife?

— No trabalho.

Meu tom não soou tão educado quanto eu pensava, senhor Greene se deu conta disto.

— Seu desempenho melhorou bastante nos últimos dias pelo que eu soube, chegara a pensar que não precisasse mais cobrar sua suspensão. Acredito que se lembre de que foi punida por ter brigado com outra aluna há algum tempo – informou sugestivamente.

Minha testa se franziu.

— É verdade. Realmente tinha me esquecido disto.

— Na época e senhorita ficou hospitalizada e não considerei uma boa oportunidade perturbá-la. Espero que faça jus à minha bondade demonstrando que mudou.

Não achei boa ideia contrariá-lo, de fato havia me esquecido daquele castigo e preferia não ter que pagá-lo. O que fiz foi sorrir em resposta, procurando ser genuína, isto serviu para fazê-lo se afastar e ir perturbar os demais estudantes, vi quando cumprimentou Jessica e ela por sua vez veio ao meu encontro parecendo entediada.

— Ele deve estar procurando acalmar os alunos, fazer valer seu cargo de diretor. Depois do que aconteceu, não seria pra menos – esclareceu quando lhe questionei sobre a estranha atitude do diretor.

Suspirei.

— Não parece que foi real, não acha? Enquanto você e eu estamos aqui conversando, a família desse garoto sofre sem ter qualquer sinal de seu paradeiro, é muito cruel – apontei.

Jessica apenas concordou com um meneio de cabeça.

Caminhamos para nossa aula de espanhol juntas, logo assumindo nossos lugares na sala. Senhora Goff surgiu em um de seus habituais vestidos – ela jamais usava calças, me perguntava como lidaria com o frio – distribuindo o aroma de seu perfume forte pela sala e ao assumir seu lugar pediu a atenção dos alunos.

— Buenos días!

A turma respondeu em uníssono.

— Devo comunicar a vocês que os resultados de seus exames estarão afixados no quadro de avisos que fica no corredor central, poderão consulta-los entre a troca de aulas, mas os aconselho a fazer uso de horários mais flexíveis, como o de almoço, ou talvez a saída, de modo a evitarem aglomerações.

O burburinho foi inevitável, até mesmo eu que costumava ser quieta me virei para discutir a novidade com algumas de minhas colegas, porém senhora Goff logo pediu por silêncio e tive de deixar os comentários para depois.

Eu tinha alguns minutos de folga antes de precisar estar na Newton’s e foi justamente deste tempo que fiz uso para ir até o quadro de avisos, a esta altura a maioria dos estudantes já tinha tido oportunidade de checa-lo e o local estava vazio, exceto por algumas pessoas que ainda andavam pelos corredores. Foi fácil identificar meu nome, a lista estava organizada por ordem alfabética, corri meu dedo atentamente por cada linha, me sentindo ansiosa, mas ao fim minha ansiedade se provou sem fundamento.

Sorri largamente. Eu havia me dado bem, não ficara com nenhuma nota ruim, na realidade, meu desempenho foi excelente!

Por ter me esforçado muito para conseguir o feito me senti orgulhosa, principalmente com a prova de Educação Física, na qual eu quase tinha reprovado por causa da fuga que fizera a fim de resgatar Jessica.

Me sentindo leve comecei a caminhar sem pressa de volta à picape.

— Não pode ser!

Pela milésima vez eu procurei entre minhas coisas, mas todo meu material já estava espalhado sobre a cama, perfeitamente exposto, não era como se houvesse algum esconderijo que eu não tivesse verificado.

— Não, não. Não pode ser! – Choraminguei.

Ouvi quando Charlie veio ao meu encontro, adentrando o quarto sem cerimônia.

— Liese, está tudo bem?

Levei as mãos às têmporas, apertando-as como se isto de alguma forma fosse sumir com o problema.

— Meu celular. Não sei onde ele está.

— Você o perdeu?

— NÃO! – Me senti mal por ter me exaltado e baixei o olhar e também a voz. – Eu não o perdi, não posso ter perdido!

O xerife chegou mais perto e colocou as mãos sobre meus ombros.

— Está bem. Onde o viu pela última vez?

Eu já havia pensado naquilo, tinha sido minha primeira linha de raciocínio, porém querendo evitar ser rude, o respondi:

— Eu o levei para a escola, mas somente o usei na picape, pouco antes de começarem as aulas.

— Então ele está na picape – deu de ombros.

Foi impossível conter meu olhar mal-humorado.

— Não está, foi o primeiro lugar em que olhei, além do mais eu me lembro nitidamente de tê-lo colocado na mochila antes de sair.

— Bem, então talvez ele... – Me olhou cuidadosamente antes de continuar. – Ele pode ter caído em algum lugar da escola.

Gemi. Sim, eu sabia daquela possibilidade, mas era justamente o que eu não queria aceitar, se de fato o aparelho tivesse de alguma maneira caído de minha bolsa, não era certeza de que poderia encontra-lo. O que eu faria sem meu celular? Como tornaria a falar com Bella? Não era possível, eu não podia tê-lo perdido, porque fui inventar de leva-lo comigo? Todo o tempo ele estivera a salvo aqui, dentro de meu quarto.

Charlie se afastou e colocou as mãos sobre o cinto, parecendo refletir.

— Eu nunca mais vou vê-lo, vou? – Fiz a pergunta óbvia.

— Sei o quanto essas coisas parecem significar para vocês adolescentes, os tratam como a um filho – resmungou. – Mas tudo bem, você pode comprar outro. Tem algum dinheiro guardado, não tem? Podemos ir a Port Angeles neste fim de semana, eu irei inteirar a quantia que ficar faltando, você escolhe alguma coisa dessas modernas, cheias de... Como vocês falam mesmo? Complementos?

— Aplicativos – o corrigi com uma risadinha. Em seguida suspirei. – Obrigada Charlie, mas não. Eu não aceitaria seu dinheiro de qualquer forma e mesmo que aceitasse, não quero um celular novo. Eu preciso daquele— a desesperança pareceu clara até mesmo para mim.

— Você é quem sabe, mas caso mude de ideia a oferta permanece de pé. Fiquei satisfeito em saber de seu desempenho nas avaliações. Parabéns!

Notei que ele procurava me animar e me esforcei para ensaiar um sorriso, logo se virou para partir, anunciando que iria assistir televisão. Ao ficar sozinha deixei meu corpo cair, me jogando sobre a cama no único espaço em que não havia bagunça, meu rosto enfiado de qualquer jeito no colchão, como se dessa forma pudesse fugir da realidade. Eu ainda não assimilara o quão burra fora. Como eu faria agora? Não se tratava de dinheiro, eu realmente tinha o suficiente para adquirir um modelo novo, mas independente da quantia que gastasse eu sabia, sabia que jamais seria igual ao antigo.

Aquele bendito celular era especial, era meu único contato com Bella, com o mundo real e agora sem ele eu sentia que seria mais fácil me deixar levar por essa ilusão que vivia. Não foi uma notícia animadora quando a ilusão, na verdade, mais parecia um suplício.


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