Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 91
Caretas do Destino




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A manhã caminhava insolente pelas bermas tristes e sujas das rotinas solarengas e perdidas pelos sonhos que permaneciam imóveis nas sombras das palmas das mãos daqueles que não tinham a coragem para os concretizar. Um homem imerso nesta rotina citadina e aborrecida, camuflava-se com a sua capa do mistério e das trevas, um homem cuja alma e a luz foram roubadas pelos tempos e pelas memórias loucas de alguém que abraçou a solidão e a tranquilidade do triste silêncio do mundo, caminhava cabisbaixo apoiando-se carrancudo nas hastes aguçadas da arrogância, sorrindo cinicamente aqui e ali de cada vez que se cruzava com um qualquer agente da S.H.I.E.L.D, escutando os seus previsíveis e irritantes comentários, porém mantinha-se calado, guardando as suas palavras nas colinas sombrias das madrugadas assustadas e ribombantes que cobriam o seu passado, um passado iludido pela magia da reluzente desilusão e pelo aroma saltitante do sofrimento desmedido. Os seus passos ecoavam perdidos, arrastando-se por um vasto e largo corredor, um corredor abandonado pelo barulho dos anos e pela confusão das almas neste mundo de cimento e agressividade, um silêncio tão pesado e cruel que o fez apressar a passada receando afogar-se naquela atmosfera hostil que o fazia recuar no baú do tempo, aquele tempo tão maldito e cortante para o qual ele jamais desejaria retornar.

— Venho ter com o Fury. - Informou o Caminhante do mistério em tom baixo, porém marcado pela dureza açucarada das rochas do oceano, rochas essas que moldaram a sua vida.

— Quem devo anunciar? - Perguntou o agente que estava de guarda ao gabinete do director em tom duvidoso, encarando o estranho homem com cara de poucos amigos.

— O meu nome não te interessa, sai-me da frente, tenho assuntos para tratar com o Fury. - Insistiu o viajante das trevas em tom impaciente, soprando o silêncio atroz e controlador daquele sítio para longe dos seus mais secretos pensamentos.

— Não o posso deixar entrar enquanto não me disser o seu nome, e mais, exijo que retire o capuz que lhe cobre o rosto, vamos faça-o! - Ordenou o agente de mau-humor, aproximando-se cautelosamente do homem que estava diante de si.

— Eu acho que tu não fazes questão de ver o meu rosto, acredita em mim. - Avisou o caminhante do mistério em tom baixo, no entanto forjado pelas paredes brancas da Sibéria, essas paredes que conheciam na perfeição a história bem como o seu espírito.

— Como te atreves a falar-me nesse tom! - Rosnou o agente em tom furioso, retirando a sua arma do interior apertado da manga dos seus trajes.

— O que pensas fazer com isso, não achas que é um brinquedo demasiado perigoso para uma criança possuir? - Zombou o Viajante do mistério cinicamente, retirando a pistola da mão do seu oponente com extrema perícia como se fizesse aquilo todos os dias. - Então não vais chamar os teus amiguinhos pomposos, vala usa o intercomunicador que tens escondido junto ao peito. - Provocou de forma falsamente doce, lançando na atmosfera os torrões de um açúcar tão negro e maldoso como uma serpente que cresce em todas as direcções paralisando o mundo com o seu adocicado veneno.

— Como é que fizeste isso...

— Vais deixar-me passar ou preferes que te enfie uma bala no peito, escolhe, estou sem paciência para brincar aos agentes! - Exclamou o Caminhante das sombras em tom baixo e cruel, cruzando os braços, baloiçando perigosamente a arma na ponta mascarada dos seus dedos, saboreando deliciado o terror que desfigurava o rosto do jovem agente, um terror que já cruzara a sua existência vezes de mais, um terror que lhe fazia cócegas nas noites mal dormidas.

— Vais pagar. - Resmungou o jovem em tom ferido, sentindo o seu orgulho sangrar violentamente no seu interior, nunca ninguém desrespeitara o seu posto daquela forma, nunca ninguém tivera a coragem necessária para o enfrentar daquela forma lúcida e arrogante, quem seria aquele homem? O que esconderia nas profundezas do seu capuz?

— O que pensas fazer? Queres espancar-me? És muito engraçado, não uses o coração, usa antes a razão talvez seja mais produtivo. Filho da puta! - Gritou o Viajante das trevas furioso, vendo o punho do inexperiente agente embater dolorosamente no seu rosto. - Achas que um soco de alguém que está quase a fazer xixi nas cuecas me magoa? - Questionou em tom divertido, lançando o rapaz ao chão, colocando um joelho em cima das costelas, cortando-lhe desta forma o ar. - Assim já me deixas passar? - Perguntou, dando uma pequena estalada na testa do jovem, cravando a palavra humilhação na sua alma ferida.

— Fitz! O que se passou aqui? - Inquiriu a voz rouca e mal-humorada de Nick Fury vinda das profundezas do seu gabinete, observando de soslaio a cena que decorava o corredor.

— Director Fury peça reforços! - Implorou o jovem Leo Fitz em tom estridente, afogando-se na vergonha que dolorosamente percorria a sua alma, sabia que estava a desiludir o homem que confiara nele e isso doía-lhe mais do que mil murros.

— Realmente não te devia ter resgatado dos laboratórios, tu não serves para este tipo de tarefa, desaparece daqui, chama-me a agente May, agora! - Berrou Nick furibundo, indicando o fim do corredor pelo qual o jovem agente deveria cravar os seus passos rumo ao sítio de onde nunca deveria ter saído.

— Sim senhor é para já, desculpe. - Murmurou Leo em tom baixo e tímido, as palavras do director almejaram o seu peito com a brutalidade ribombante dos canhões malditos marchando sobre o miserável campo de batalha.

— Entra. - Ordenou Fury em tom rouco, dirigindo o seu olhar frio e calculista para o capuz negro do Viajante das trevas. - Senta-te se quiseres.

— Sabe que eu não morro de amores por este sítio, então porque me pediu para vir até cá, está a fazer um teste à minha paciência, já devia saber que eu tenho um rastilho muito curto, mais curto do que você certamente gostaria. - Retaliou o Caminhante das sombras em tom áspero, sentando-se com os pés em cima do tampo imaculado da secretária do director.

— Realmente nunca deixaste de ser um miúdo, continuas rabugento e rebelde como sempre foste. - Comentou Fury mais para si do que para o homem sentado na sua frente.

— Deixe-se de conversas que não interessam a ninguém e vá direito ao assunto, este sítio sufoca-me. - Disse o Viajante do mistério em tom evasivo, fazendo algumas caretas por baixo do capuz.

— Não achas que quando estamos sozinhos poderias retirar esse capuz, acho que não é necessário...

— Conhece as minhas condições. - Interrompeu o estranho enigmático com azedume a dragar-lhe a voz irritada.

— Prefiro sinceramente quando te refugias no silêncio és bem mais simpático quando estás calado. - Ripostou Nick em tom divertido, remexendo apressado nas entranhas de uma pasta negra consumida pelo passar dos anos. - Tenho uma missão para ti. - Informou em tom baixo, olhando atento para um papel meio amarelado que retirara da pasta.

— O senhor sabe que a minha vida somente suporta uma única e constante missão, apenas essa. O senhor sabe do que eu falo. - Respondeu o Caminhante das sombras em voz baixa e triste, revirando os olhos nas profundezas solitárias do seu capuz. - Está a perder o seu tempo, eu estarei até ao fim da minha vida destacado para esta missão.

— Então lê isto, pode ser que mudes de ideias. - Revelou o director em tom impaciente, passando o amachucado papel ao homem.

— Não me pode fazer isto, eles são os principais culpados do que fui, do que sou, eu não posso! - Gritou o homem furioso, levantando-se de um salto, não acreditava no que os seus olhos escutavam, não era possível que Nick Fury o quisesse atirar para as nuvens do passado, ele não podia voltar a ser aquela estrela sem sorte nem luz, ele voltara a encontrar a sua luz, a sua liberdade, a sua rendição nas marés azuis da vida. - Eu não posso. - Sussurrou em tom agonizante como se o peso do passado tombasse cruelmente sobre os seus ombros.

— Então não irás cumprir o que prometeste naquele dia? - Interrogou Nick em tom manipulador, sabia que ele era um homem corajoso, dotado de valores morais jamais vistos no mundo, porém sabia que o medo e a raiva que recortavam o seu coração eram mais fortes do que as suas mais vincadas convicções. - O mal somente entra num coração se esse mesmo coração o permitir.

— Peça-me tudo menos isso, tem que existir outra forma, outro meio, por favor...

— Achas que se existisse eu te submeteria a uma coisa destas, achas que eu lançava no mundo uma bomba atómica prestes a entrar em ebulição? - Perguntou o director em tom duro, erguendo-se da sua cadeira de um salto. - Lembra-te que naquele dia tu prometeste que nada de mal lhe iria acontecer.

O oceano derramava pelos céus lágrimas de sangue e de raiva, pintando as suas águas de escarlate vivo e inocente, o diabo caminhava silenciosamente sobre as marés espalhando o seu tenebroso sorriso pelas milhares de tochas incandescentes e gananciosas da palma imperativa da sua mão, os foguetes da morte aplaudiam com pura satisfação as almas que lentamente caíam desamparadas pelas negras colinas alaranjadas do limbo, os corpos das marionetas do destino decoravam horrivelmente o oceano revolto e injustiçado como estrelas sem luz e sem vida, caídas do firmamento directamente na mão do demónio, aquele dia fatídico ainda hoje caminha triste e inseguro pelas bermas da solidão e do medo, escondendo-se em cada bruma espumosa do mar, temendo o aparecimento do monstro laranja que colorira as suas vestes divertidas com os pedidos arrepiantes do sangue carmesim das estrelas, palpitando infeliz em cada onda de uma vida roubada.

Algures, deitado na areia castanha e ardente, manchada pelas escaldantes passadas do diabo, dormia transtornado um rapaz, um rapaz que transportava na sua justiceira aura a borboleta da tragédia e da solidão.

— Hey, tu, acorda. - Ordenou uma voz baixa e cruel, cravando o seu passo seguro e decidido na casa da morte e da desgraça, Nick Fury enfrentava a cor escarlate do oceano, escondendo nas sombras tristes e mortas das rochas o sofrimento que destruía o seu coração. - Vamos, acorda!

— Eu, hã, eu, onde estou? - Balbuciou o estranho em tom atabalhoado, abrindo os olhos perdidos e cegos pela escuridão de um capuz negro. - Não fui eu. - Disse o rapaz de forma assustada e confusa, fitando aterrorizado o sangue e as vidas que eram sugadas pelas águas ardentes do diabo.

— Claro que foste tu. - Disse Fury em tom categórico e inabalável, cortando a atmosfera escura com os punhais cortantes da realidade embainhados na perfeição pela sua voz.

— Não posso ter sido eu, não posso. - Defendeu-se o rapaz em tom angustiado, enfiando o rosto na areia castanha e caprichosa, numa tentativa de abafar os gritos sufocantes que as imagens da tragédia traziam até aos seus olhos, porém as suas pupilas recusavam-se a cerrar mantendo-o imerso naquele vermelho adocicado com o sabor do sangue e o cheiro melancólico das lágrimas que inundavam o oceano na sua frente.

— Vamos sair daqui, anda. - Ordenou Nick em tom imperativo, segurando o estranho pelas vestes banhadas pelas trevas.

— Eu não posso ir, tenho que, tenho que...

— Não tens que fazer nada, todos eles estão mortos, já não existe nada que possas fazer, agora mexe-te! - Interrompeu Nick de forma cruel, empurrando o rapaz para o interior de um helicóptero fumegante.

— Eu sou um mostro, apesar de não me lembrar de nada, tenho consciência que fui eu quem matou todas aquelas pessoas. - Confessou o rapaz em tom assustado e confuso, sendo atirado num assento pelo director da S.H.I.E.L.D.

— Sim tu és um mostro e sim mataste todas aquelas pessoas. - Assentiu Fury em tom pensativo, observando com profunda atenção o capuz que cobria o rosto do estranho brilhando perante a torrente de lágrimas que desfiguravam aqueles olhos imersos em mistério, sofrimento e solidão. - Apesar de ter praticamente a certeza da tua identidade, ainda existe alguma dúvida na minha mente, tira o capuz.

— Eu, eu...

— Agora! - Gritou o director de forma precipitada e impaciente, retirando o capuz do rosto do homem que se encontrava sentado na sua frente, porém a sua expressão manteve-se a mesma isenta do mínimo vestígio de surpresa. - Eu sabia que eras tu, só podias ser, foste sempre tu.

— Pode prender-me se quiser, não vou oferecer qualquer tipo de resistência, garanto. - Afirmou o rapaz em tom baixo, cobrindo o rosto novamente com aquele capuz dragado pelas trevas, esticando os pulsos para que Nick o algemasse.

— Não te vou prender, olha para isto, sabes quem é? - Inquiriu Fury em voz sumida, retirando uma fotografia tirada dias antes do seu bolso.

— Não me diga que eu, eu...

— Apenas a criança estava no barco e sobreviveu. - Respondeu Nick de forma pensativa, fitando as duas figuras que sorriam felizes na fotografia. - Ela vai ser levada para um orfanato, faz o que quiseres com esta informação, vê-a como a tua estrela da liberdade. - Informou o director em tom estranho e ausente, guardando de novo a fotografia no bolso.

— Até na morte existe luz. - Murmurou o Caminhante das sombras em voz sumida, saltando pela janela do avião rumo à missão que conduziria a sua vida daí para a frente.

— Espero estar a fazer a coisa certa. - Sussurrou Nick de forma sonolenta, deixando-se cair nos assentos, engrossando as fileiras até ao vale do sono.

— Não preciso que me lembre, essas memórias acompanham os meus passos para onde quer que eu me dirija, são as minhas companheiras mais leais, jamais me abandonam. - Murmurou o estranho homem em voz sofredora, sempre fora uma pessoa dotada de uma coragem realmente impressionante, invejado por muitos e odiado por muitos, nunca vacilou perante os atrozes e hostis perigos que por obra do destino cruzaram a sua juventude, sempre esteve ali, na linha da frente, trazendo a luz e a liberdade onde somente reinava as trevas e a opressão, desta vez não iria ser diferente, não podia ser diferente.

— Tu conheces as consequências da concretização deste plano odioso, tu sabes o que implica se, nem se...

— Isto que me está a contar não é novidade para mim. - Confessou o Viajante do Mistério em tom pensativo, olhando de novo o papel amarelado que ainda repousava no tampo da secretária do director. - Desde de muito cedo que descobri que eles colocaram homens no terreno, homens que serviam como vigias, informadores ou algo do género.

— As minhas informações chegaram um pouco mais longe, sei que existe alguém muito perto dela que faz papel de agente duplo, só não consigo descobrir quem. - Afirmou Nick em voz ligeiramente dragada pelo amargo fruto da frustração.

— Mas como é que eles descobriram que ela era...?

— Eles têm espiões em todo o lado, apesar de ele ter feito um grande esforço para não a ligarem à sua pessoa foi tudo inútil. - Respondeu o director de forma triste, baixando os olhos para uma mosca que passeava pelo chão de azulejo.

— E será prudente eu deixá-la assim sozinha à mercê desses filhos da mãe, acha que devo fugir que nem um cobarde? - Inquiriu o Caminhante das sombras em tom irritado, dando um murro na sua própria perna, aquela seria certamente a decisão mais complexa e dolorosa que tomara em toda a sua vida.

— Tu não estás a fugir, pelo contrário estás a entrar direitinho na boca do lobo, isso no meu ponto de vista não é ser cobarde. - Constatou Fury em voz falsamente doce, levantando-se para pisar a mosca que zumbia de forma irritante. - Ela vai precisar muito de ti quando a levarem, e sim, antes que perguntes isso vai acontecer.

— Eu vou. - Murmurou o Viajante do mistério em voz fria e determinada, levantando-se e dirigindo-se à porta de saída. - Só espero que não me venha a arrepender disto, até um dia destes.

— Por mais que tu te convenças disso, por mais que o mundo pense que tu foste um deles quero que saibas que nunca foste um deles e não é agora que isso vai acontecer, acredita em mim como eu acreditei em ti naquele maldito dia. - Proferiu o perspicaz director em voz rouca e baixa, vendo o rapaz desaparecer pelo corredor escuro, rumo ao horizonte misterioso e imperfeito daquela duradora missão. - Certamente já não és um miúdo, cresceste.

A luz do sol proveniente da janela aberta do quarto hospitalar de Diana incidia directamente sobre o rosto de Steve, reflectindo teimosamente todos aqueles meses de espera, saudade, desespero e sofrimento, meses nublados, repletos de grossas pingas de água bem gelada e cortante, meses onde a luz do sol e os beijos do mar não chegaram.

— Como estás linda. - Murmurou Rogers em tom baixo e emocionado, debruçando-se sobre a cama da morena, beijando-a ternamente na testa, tanto que rezara para que aquele momento preenchesse o seu coração. - Como te sentes?

— Bem eu vou até casa, passei aqui a noite a minha tia certamente está preocupada, agora o Cap faz-te um pouco de companhia, certo? - Disse Peter em tom ensonado, olhando para Steve buscando uma resposta, sabia o quanto ele sofrera perante a terrível ausência de Diana, sabia o quanto ele lutara para a encontrar, agora aquele momento era deles os dois, estava na altura de vencer meses e meses de separação.

— Podes ir Homem Aranha eu agora fico com ela, obrigado por tudo. - Respondeu Rogers em tom amável, apertando a mão do jovem herói.

— Certo, volto mais tarde. - Assentiu o Aranha em tom feliz, quantos miúdos não gostariam de apertar a mão do maior herói de todos os tempos. - És um sortudo Peter. - Pensou impressionado, saindo pela porta principal do hospital.

— Desculpa Steve, eu, eu...

— Não digas nada, não peças desculpa, não te expliques nem justifiques, somente diz-me que estás bem. - Interrompeu Rogers em tom doce, acariciando o rosto ligeiramente pálido da adolescente.

— Eu estou bem Cap. - Murmurou Diana em tom abafado, derramando milhares de gotas de prata no leito daquele desejado momento.

— Eu tive tanto medo de te perder, naquele dia da explosão todos nós pensámos que era o fim, todos nós pensámos que tinhas morrido. - Confessou o super-soldado em voz baixa e apagada, lançando na atmosfera as lágrimas prateadas da liberdade e do sonho. - Estou tão feliz por estares de volta.

— Eu também estou muito feliz por estar de volta, não houve um único dia em que eu não pensasse em todos vós. - Confessou a jovem Vingadora em tom triste e baixo, abraçando com força o pescoço da sua estrela da liberdade.

— Não penses mais nisso, agora já estás de novo no lugar onde pertences, nada mais importa. - Murmurou Steve de forma ternurenta, beijando delicadamente a morena no rosto. - Agora já estás junto de mim. - Pensou aliviado, no entanto algumas questões começaram a assaltar a sua mente como uma chuva pesada e adocicada que teimosamente encantava a sua mente e os seus lábios para formularem as questões que assombravam os seus pensamentos, sonhos e pesadelos durante meses.

— Eu sei no que estás a pensar Steve, sei que fui egoísta, imprudente, ingrata, infantil, no entanto eu tenho o dever de me justificar perante ti. - Disse a Sereia em tom honesto, ele merecia saber, ele tinha que saber, não era justo deixá-lo fora da sua vida não depois de tudo o que passaram juntos, não podia permitir que aquela peripécia estragasse tudo aquilo que unidos conseguiram criar.

— Não tens que te explicar, não sintas essa obrigação...

— Eu quero, não me sinto obrigada, mas tenho que falar sobre o que aconteceu. - Interrompeu Diana de forma rápida e irrepreensível, segurando a mão digna do super-soldado. - Naquele dia, durante o rapto do infantário eu, o Thor e o Homem Aranha fizemos tudo o que estava ao nosso alcance para colocar todas aqueles inocentes em segurança, conseguimos, claro tínhamos que conseguir, era a nossa prioridade, era imperativo o sucesso daquela missão, não existia margens para falhar. Quando a bomba rebentou, eu ainda estava no interior das instalações, senti a morte a pegar-me pela mão, como ela é fria e possessiva, pensei que realmente era o meu fim, garanto-te que estava pronta para morrer, pois o meu coração estava bafejado pelo doce sabor do dever cumprido, morreria feliz, certamente não haveria salvação possível para mim, tu sabes o que um Vingador tem de mais certo é a morte, certo? - Perguntou em tom sumido, parando para respirar fundo, observando o sinal positivo que Rogers desenhava com a sua cabeça, estava sem palavras, apenas queria escutar os argumentos de alguém tão jovem, mas que conseguira elevar a sua coragem mais alto do que muitos adultos, atingindo os seus mais reluzentes limites, a morte em prol de uma causa maior. - Então só me lembro de acordar dias mais tarde, deitada numa pequena cabana num meio solarengo de uma vereda campestre. - Diana fizera nova e prolongada pausa, recordando os dias que passara na companhia do rio, da paisagem verde e do Caminhante das sombras. - O meu corpo estava coberto de feridas, queimaduras e saudade. - Disse em tom triste, tacteando o seu próprio corpo, como se o simples facto de ter prenunciado aquela frase trouxesse de novo à tona do seu ser aqueles momentos de agonia, desespero e dor. - Ele salvou-me da morte, enfrentando-a nos olhos como um anjo que enfrenta um demónio, cuidou de mim, curou as minhas feridas, tornou-me mais forte e prudente, foi um verdadeiro amigo...

— Eu sei disso, depois de tu teres desaparecido todos os Vingadores mergulharam no desespero e na loucura, ninguém queria acreditar no que tinha acontecido, tu não podias ter morrido, era simplesmente impensável, talvez fosse uma ilusão maldita do destino, mas num fraco momento de lucidez revi as imagens daquele dia com mais detalhe e atenção, e lá estava ele fugindo escondido pelas sombras, transportando o teu corpo nos seus braços, roubando-te corajosamente das garras da morte. - Explicou Rogers em voz digna e carinhosa, olhando a janela, não conseguia olhar nos olhos de Diana quando recordava aqueles fatídicos momentos em que pensara que tinha chegado o fim da sua própria vida. - Ele fez o que eu devia ter feito por isso o odeio, porém agradeço-lhe do fundo do meu coração por te ter salvo. - Confessou a muito custo, limpando o rosto com as costas da mão. - Devia-me odiar a mim, porém o meu ódio é para com ele, aquele que me substitui, aquele que esteve junto dela, aquele que fez frente à morte, sou completamente ridículo. - Pensou irritado, escutando alguns passos que caminhavam pelo corredor rumo ao quarto da Sereia.

— Vejo que estás muito bem acompanhada, como te sentes? - Perguntou uma médica de meia idade em tom jovial, entrando energeticamente no quarto, espalhando o seu doce sorriso à sua volta.

— Sinto-me bem, posso ir para casa? - Questionou a morena em tom rápido, detestava hospitais, porém ao proferir aquela pergunta uma nova e estranha sensação tomou conta do seu espírito, a saída do hospital implicava ter que enfrentar todos os restantes Vingadores, teria que encarar o mundo, estaria pronta para isso?

— Diana não ouviste a doutora Mélanie? Podes ir para casa, tens alta! - Exclamou o Capitão América em tom alto, percebendo que a mente da adolescente voara para bem longe dali.

— Certo, fantástico. - Disse a Sereia sem grande convicção na voz, como iriam reagir todos os seus companheiros ao seu regresso, já que somente Steve e Peter apareceram para a visitar.

— Então, as tuas melhoras, aqui tens os teus papeis, tem mais cuidado contigo. - Despediu-se Mélanie em tom doce, saindo do quarto, deixando os dois heróis imersos no estranho silencio, milagrosamente Rogers sabia o que percorria a mente da Vingadora.

— Vai tudo correr pelo melhor, eu estou aqui. - Afirmou o louro em tom amável, ajudando a jovem a sair da cama.

— Antes de ir para casa, posso visitar o Clint? - Perguntou a Sereia em tom inseguro, de todas as reacções a que ela mais temia certamente seria a do Gavião Arqueiro.

— Claro que sim, ele está na ala dos homens, levo-te até lá. - Respondeu o ícone Americano em tom falsamente calmo, o feitio de Clint não era fácil, só esperava que ele conseguisse controlar os seus impulsos mal-humorados, temia que a atitude do mestre das setas tivesse repercussões irremediáveis no regresso da jovem, não a podia perder outra vez. - Vá lá Clint, sê sensato. - Reflectiu apreensivo à medida que a porta do quarto do Arqueiro surgia nos seus campos de visão.

Conseguirá Diana romper a grossa corda de saudade e sofrimento que isolou o coração de Clint? Quantos perigos ainda se escondem no futuro dos nossos heróis? Será este reencontro apenas uma ilusão do destino? Quais os passos da missão do Caminhante das sombras?


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