Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 80
O futuro não é isto




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— Deambulo perdido nas margens inconstantes do sonho, um sonho esquecido e abandonado, preso e maltratado por mim e por aqueles que sozinhos me rodeiam, agarrando-se a esta ilusória realidade controversa, dura, perversa e fria, segurando com as gananciosas pontas dos olhos o tumulto sinuoso do dinheiro e do treino exaustivo do poder, libertando na sombra ardente da palavra o fogo carmesim do sangue que escorre vagabundo pelas estradas do sofrimento, arrepiado, triste e solitário como a alma corajosa de um soldado no derradeiro campo de batalha, onde a morte subjuga a vida através das lamparinas apagadas da escuridão. Abro as janelas trancadas da honra e da vontade, e lá está ela, saltando nas palmas frias das minhas mãos, o sol que anula o calor das balas perdidas, flutuando de coração em coração, chorando lágrimas de vida e felicidade pelos esporos da aurora marítima, pintalgada de azul e esperança clara, macia e corajosa, livre como o dormitar ondulante dos sonhos cristalinos dos cisnes de algodão que voam no distante futuro. O relógio do tempo levita a chegada da noite, porém o meu sol jamais se extingue, permanece intacto nas almas daqueles que embora feridos ainda recordam a liberdade, daqueles que solitários ainda veneram a honra, daqueles que traídos pela sorte ainda anseiam o recomeço, daqueles que embora perdidos ainda aceitam o reboliço do reencontro, daqueles que esquecidos pelo destino ainda acreditam no futuro. - Reflectia o caminhante das sombras, saltitando de estrada em estrada, escutando atentamente as comunicações emitidas por um rádio de polícia que transportava na sua mão, denunciando o massacre que decorria no infantário. - As pedras da angústia brincam no meu corpo como se eu fosse uma marioneta que levita sobre um precipício, corro, corro como se a minha própria vida me escapulisse do peito, transformando-se em mil grãos de areia seca que faz os olhos do mundo chorar, o caminho é longo e o ar já me sufoca o peito de tanto apertar, estico a mão, tento alcançar a luz e o calor do inverno de mel que brota nas lareiras, tenho que a alcançar. - Pensava determinado, à medida que o infantário se materializava diante dos seus olhos.

Diana percorria silenciosamente o corredor que a conduziria às crianças, tinha que captar e investigar os dados escondidos no computador da organização, tinha que descobrir os planos malignos que brotavam na mente daqueles criminosos, tinha que salvaguardar o futuro.

— Cap, estás a ouvir-me? - Perguntou a morena em tom sumido, os cientistas permaneciam inconscientes não era boa ideia acordá-los.

— Sim, descobriste alguma coisa? - Respondeu Steve de forma rápida e direta, caminhando de um lado para o outro, cravando no soalho de madeira raízes de preocupação.

— Encontrei um computador, os gráficos apresentados mostram que temos quinze minutos antes da experiência ficar concluída. - Explicou a morena de forma aterrorizada, fitando o ecrã do computador, os seus olhos apesar de estarem assustados eram bafejados pelas faíscas da revolta.

— Temos que arranjar uma maneira de desligar os mecanismos que estão ligados às crianças, consegues encontrar alguma coisa que te indique qual a melhor forma de o fazer? - Questionou o super-soldado em voz ansiosa.

— Eu não percebo nada destes gráficos, chama o Tony ele saberá certamente ajudar-me, vá lá Cap o tempo é escasso! - Pediu Diana apreensiva, sucumbindo à gelada brisa da pressão temporal.

— Isso vai ser quase impossível, ele está enfiado no laboratório e não sai de lá, vou tentar contactar alguém do Quarteto Fantástico, dá-me uns segundos, por favor. - Retorquiu o louro em tom desiludido, o que se passaria com a brilhante mente do seu amigo? Estaria ele a profetizar o cataclismo do mundo? Não havia tempo para especulações sem fim aparente, era altura de agir.

Durante os dolorosos minutos de espera, a jovem era assaltada pelas tenebrosas recordações daquele dia fatídico que mudara a sua vida para sempre, a sua mente era toldada pelo escarlate quente e puro do sangue que se aninhava no doce colo da infância, o seu coração era congelado pelas lágrimas tristes e polidas da delicada ternura, o seu espírito era arrancado do seu peito pelas cruéis ondas de uma vida roubada. O tempo corria, a escuridão aumentava e a espera persistia, o caminho do futuro era terrivelmente barrado pelos fantasmas de outrora, o choro do mundo nadava no vasto oceano e Diana atiçava o fogo da esperança no seu peito, não podia fracassar, não desta vez.

— Eu acredito num milagre! - Murmurou a Vingadora de forma corajosa, embalando a sua determinação com o poderoso ribombar do trovão do Deus Thor.

— Diana querida, estás a ouvir-me? - Perguntou a voz tranquila de Susan Storm através do intercomunicador.

— Sue, nós não temos muito tempo, ajuda-me! - Pediu a morena em voz abafada pela ansiedade, vendo uma pequena luz de ouro cintilar no horizonte hostil.

— Envia-me as informações através do teu cartão Id. - Afirmou a Mulher Invisível no mesmo tom apaziguador, sentando-se em frente de uma secretária.

— Certo Sue, obrigada, mas por favor tenta ser breve. - Disse Diana em tom urgente, começando a transferir os dados para o seu cartão. - Aí vai Sue.

— Dá-me uns segundos, eu vou tentar desactivar os mecanismos daqui. - Proferiu a loura de forma concentrada, começando a descodificar os códigos que traçariam o destino de centenas de crianças.

— Ora, ora, o que temos nós aqui? - Perguntou uma voz fria e calculista vinda da entrada do auditório.

— Quem és tu? - Inquiriu a Sereia em voz falsamente segura, um enorme mau presságio inundou a divisão.

— A pergunta não é essa, a questão certa é: como pensas sair daqui com vida? - Inquiriu o sujeito no mesmo tom ameaçador e perigoso, flutuando até Diana. - Não existe nada que poças fazer, estás completamente perdida, o meu plano será executado na perfeição e o futuro terá o meu nome gravado nas suas linhas.

— Não permitirei que tal coisa aconteça, eu jamais estarei sozinha! - Gritou a Sereia em voz furiosa, lançando um valente pontapé na atmosfera, atingindo a frieza desmedida daquele terrível vilão. - Susan despacha-te eu trato dele.

— Tem cuidado Diana, o M.O.D.O.K não é para brincadeiras, não baixes a guarda nem por um único segundo que seja. - Preveniu a Mulher Invisível de forma rápida e preocupada, a irritação percorria-lhe a mente, não conseguia compreender o que levara os Heróis mais Poderosos da Terra a lançarem Diana nos braços de uma organização cuja crueldade e maldade não conhece limites.

— Como podem tocar com as vossas mãos nojentas em crianças puras sem maldade nem ambição? Quais são as motivações que movem monstros como vocês? Eu quero entender, explica-me! - Exclamou a adolescente de forma reprovadora, tinha que ganhar tempo, não conhecia a força e as habilidades do seu inimigo não era estúpida ao ponto de começar uma luta sem estes dados fulcrais que certamente determinariam o desfecho daquele confronto.

— Aguenta-o Diana, aguenta-o só mais uns momentos estou quase. - Pensava Susan Storm nas instalações do Quarteto Fantástico, submetendo os dados que Diana habilmente lhe fornecera aos mais distintos e avançados programas.

— O mundo é um lugar pérfido, desprovido de inteligência que rentabilize todo o tipo de descobertas que o universo gentilmente nos fornece, é necessário brindar o globo com um exército de génios que sirvam os meus propósitos, quem melhor do que as crianças? Cuja mente está limpa, pura, sem quaisquer tipo de formatações. - Proferiu M.O.D.O.K, o sábio do mal, em tom baixo e gelado, não retirando a sua mira ocular do capuz azul água da Sereia. - Como não sairás daqui com vida, estou à vontade para falar sobre o meu plano contigo, quero que presencies a perfeição e a grandeza do meu lendário intelecto.

— Fala de uma vez por todas! O que fizeste com aquelas crianças? - Gritou Diana, perdendo o controlo das suas emoções, os ponteiros do relógio martelavam como mil adagas de aço contra o seu coração.

— A voz dela contém habilidades de paralisação, muito interessante, não admira que os Vingadores tenham escondido tão bem esta arma preciosa. - Pensou o cientista em tom apreciativo, saboreando o doce aroma da sua descoberta. - Estas crianças serão submetidas a um mecanismo que provará que a ciência tem a capacidade de implantar nos cérebros humanos tudo aquilo que mais desejamos, no meu caso específico, eu anseio um exército de sábios que não contestem as minhas ordens, pedidos ou ambições, um exército bem treinado que catapulte a mais nobre das artes para o topo, assim será feito, sem percalços nem obstáculos.

— Como é que existem pessoas capazes de roubar a vida a um inocente? - Gritou a Vingadora de forma colérica, tremendo ligeiramente. - Não irei permitir que tal monstruosidade aconteça, nem que tenha de dar a minha vida para te impedir.

— Sem dúvida tens muita coragem, mas a insegurança arrastada pela tua voz deixa-me tranquilo, não és oponente para mim. - Comentou M.O.D.O.K em voz maliciosa, levitando até perto da morena. - Então diz-me lá, queres morrer de que forma, lenta e dolorosa ou rápida e sem dor? Não sei porque me chamam de monstro, logo eu que dou a escolher a forma como os meus inimigos padecem diante de mim!

— Ainda é demasiado cedo para eu morrer, lamento não aceitar a tua generosa oferta. - Retorquiu a Vingadora em tom de desafio, olhando de soslaio para a janela, onde Thor se preparava para entrar em acção.

— Noto em ti um leve trago da arrogância e da prepotência do Tony Stark, que curioso. - Comentou M.O.D.O.K de forma fria e odiosa, segurando a jovem pelo ombro.

— Não abras essa boca nojenta para falar do Tony! - Gritou Diana completamente fora de si, dando um valente e inesperado soco no vilão.

— Parece que toquei no ponto sensível, ele de facto tem a capacidade atrair mulheres bonitas para o seu colo, agora ainda me deste mais vontade de te matar, quero que ele ouça os teus gritos a implorar misericórdia, quero que ele suplique para que eu te deixe viver. - Decidiu o malvado cientista em tom calculista, lançando na atmosfera um riso horrível, reflectindo toda a sua malvadez e todo o seu ódio.

— Vilão retira as tuas mãos indignas do corpo sagrado da donzela, ordenou Thor o príncipe do trovão! - Berrou o deus enraivecido, entrando a flutuar pela janela partida, desembainhado o seu lendário martelo. - Serás julgado pela luz amarela do trovão! Sereia cuida das crianças, eu trato deste herege.

— Sim, obrigada Thor. - Afirmou Diana em voz baixa, estava desiludida com a sua falta de segurança, mas agora não havia tempo nem espaço para tomar conta do seu coração.

— Diana, consegui desactivar os engenhos, só precisas de retirar os implantes que estão ligados às crianças, força miúda. - Anunciou a voz serena de Susan Storm, finalmente Diana podia respirar de alívio, mas seria mesmo assim?

— Obrigada Sue, assim o farei. - Assentiu a Sereia em voz decidida, entrando de novo na sala, escutando os urros provenientes do combate entre Thor e M.O.D.O.K.

Muito lentamente a adolescente começou a acordar as crianças, retirando com delicadeza os engenhos que prendiam aquelas flores às raízes de controlo que palpitavam num jardim de submissão. As suas mãos tremiam suavemente, o seu coração saltitava de hesitação, a sua alma vagueava leve e tranquila pelas imediações inseguras da sua mente, porém o seu único foco naquele momento era colocar aquelas pérolas do futuro a salvo, longe das garras pestilentas do mal.

— Não façam barulho, vai ficar tudo bem. - Sussurrou a Vingadora em tom doce, acariciando o cabelo ruivo de um menino que não tinha mais do que dois anos. - Venham comigo, vou colocá-los em segurança.

— O Capitão América? - Perguntou um menino de tez negra, segurando na mão de Diana.

— Eu prometo que um dia o irás conhecer, agora anda, vamos lá. - Jurou a morena de forma gentil, segurando o pequeno menino nos braços. - Venham atrás de mim, sempre atrás de mim aconteça o que acontecer.

— Não os vais levar! - Gritou M.O.D.O.K de forma maníaca, a quando da entrada de Diana no auditório completamente devastado pela orquestra trovejante.

— Enganas-te. - Murmurou a Vingadora em tom de desafio, dando um valente pontapé no cientista, enviando-o de novo até á clareira de trovões. - Vamos crianças, ele já não vos pode fazer mal.

— Nós cuidamos das crianças, obrigada Vingadora. - Disse um polícia em tom amável, vendo Diana sair do edifício. - Tens a certeza que o infantário está vazio?

— Vou verificar, cuida deles. - Pediu a jovem em tom abafado, as suas emoções começavam a tomar conta do seu coração.

— Um agente da S.H.I.E.L.D conhece os seus compromissos, fica tranquila Vingadora. - Proferiu o suposto polícia em tom carinhoso, pousando uma mão no ombro de Diana.

— Tu és um...?

— Tu sabes a verdade mais ninguém precisa de saber, agora vai. - Disse o estranho homem, indicando a porta aberta do infantário.

— Sereia onde vais? - Perguntou Thor de forma apreensiva, saindo do edifício com o vilão inconsciente.

— Espera por mim, eu já volto. - Murmurou a Sereia em tom corajoso, virando costas à nebulosidade do futuro.

— Ela não devia ir sozinha. - Preveniu o Homem Aranha em tom preocupado, saltando do telhado.

— Deixa-a ir, ela precisa de matar finalmente os seus fantasmas. - Proferiu o deus em tom imperativo, impedindo o Aranha de seguir a sua amiga.

Diana vagueava lentamente pelos corredores moribundos e desertos do infantário, segurando na palma da sua mão as almas luzidias das crianças do orfanato Spring, segurando os seus sonhos, as suas vontades e as suas mais divertidas brincadeiras, segurava os seus puros sorrisos, as suas mais ingénuas birras e as suas loucuras infantis. Sentia a leveza da nostalgia adormecer-lhe a mente, o corpo e o destino improvável das ondas do mar, estava livre, longe dos dentes famintos da culpa, agora podia ser feliz.

— Quem perdeu a capacidade de sonhar, perdeu a capacidade de ser feliz. - Pensou a jovem de forma sonhadora, encarando a muralha transparente da fantasia onde o futuro caprichosamente se escondia.

De súbito, algo inesperado quebrou aquela atmosfera celestial, o terror crescia a cada passo que a morena dava, o som telintado do tempo conduzia a explosão eminente de uma bomba, o tempo parou, embalado por um clarão vermelho e escaldante, o Diabo sorriu escondido na escuridão azul dos olhos da bela Sereia.


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