Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 66
O choro da aurora




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O brilhante luar de Agosto inundava a sala de estar do Gavião, reflectindo no firmamento distante as inúmeras bagas prateadas que desfilavam pelo seu rosto, lágrimas de tristeza, solidão e repulsa, porém algures nas profundidades do seu coração crescia uma enorme vontade de não desistir, uma gloriosa luz que o fazia lutar pela mulher que amava, somente faltava aquela pequena amora de coragem que o empurrasse para a frente do comboio da concretização. Sem pestanejar, o Arqueiro ergueu-se do leito trémulo dos seus infindáveis lamentos, pegou no seu telemóvel, contudo não quis ler as malditas palavras que ainda cintilavam no seu ecrã, com um leve gesto do seu dedo enviou-a para o fundo do baú do esquecimento onde os seus molhados olhos jamais entrariam.

— Se perder ao menos perco a lutar. - Disse Clint em tom decidido, caminhando até á casa de banho, enxugando o rosto a uma felpuda toalha azul. - Minha doce princesa Ariel, apesar de estarmos injustamente separados não existe um único dia que eu não pense em ti, não existe uma simples e solitária noite que eu não adormeça a sentir o teu leve corpo junto ao meu. Sinto o teu perfume em cada terna brisa marítima, sinto os teus lábios em cada puro sorriso das estrelas, sinto os teus cabelos ondularem com o mágico sopro da distante e linda lua. - Escrevia o mestre das setas de forma sincera no mural do seu Facebook. - Vejo a tua elegante silhueta retratar-se em cada milímetro cristalino do firmamento, vejo os teus sonhadores olhos cor de água reflectirem cada laço do nosso indefinido futuro, vejo a nossa sorte florir em cada perfeita tulipa do destino. Volta para mim. - Concluiu, colorindo aquela honesta mensagem com uma paisagem do oceano beijado pelo firmamento.

No prédio de Steve, o fantasma da fúria ardia através das veias de Diana, alimentando o monstro do ódio que arrogantemente subia a escadaria até ao apartamento de Melissa, destruindo uma vida que tinha tudo para ser perfeita. A jovem espancava com os seus justiceiros punhos a porta que tristemente aprisionava o sofrimento e os gritos da mulher, contudo esta permanecia inquebrável não permitindo que a necessária e urgente ajuda cumprisse o seu decisivo papel.

— Eu chamei a polícia, sai da frente, eu trato disso! - Exclamou o bravo Capitão furioso, dando um potente pontapé no encache da fechadura, esta abriu-se com um estrondo tal que o silêncio perturbador tomou conta das almas dos presentes.

Os dois heróis entraram no pequeno apartamento, carregando nos seus braços mais um atroz cenário de terror, bafejado pelo temido arauto da violência. Melissa jazia inconsciente no pavimento avermelhado, emoldurada por um perfeito círculo de sangue, a pequena Aurora, sentada numa velha cadeira, berrava a plenos pulmões, olhando a sua mãe adormecida sobre o manto de maldade do seu pai, este irritado pelo choro compulsivo da criança, lançou-se sobre ela, contudo Diana antecipou-lhe os movimentos servindo-lhe de escudo.

— Filho da mãe! - Gritou a Vingadora furiosa, sentindo um grosso fio de sangue quente brotar do seu lábio superior a quando do embate do punho de Jeff.

— Não te devias ter metido miúda, realmente as mulheres não passam de vermes imundos que só servem para satisfazer os desejos dos homens. - Cuspiu o rapaz com um nojento ar de desprezo a desfigurar-lhe o rosto, segurando Diana pelos cabelos, tentando impulsioná-la para o chão.

— Achas que todas as mulheres suportam estes maus tratos meu porco? - Perguntou a Sereia indignada, dando um valente pontapé na barriga de Jeff.

— Diana pára, a polícia deve estar a chegar. - Insistiu Steve aparentemente calmo, colocando o seu pé sobre o pescoço de Jeff que caíra ao chão com o choque do ataque da morena.

— Chama uma ambulância, enquanto eu tenho uma conversinha com este nojento. - Pediu a Vingadora em voz sumida, esforçando-se por controlar o tom da voz. - Quero que ele me diga como se sente ao levar porrada de uma mulher! - Exclamou de forma rancorosa.

— Talvez possamos resolver este assunto de outra forma, tu até que não és feia de todo, talvez me pudesses fazer um favor, já que essa aí não me serve para nada. - Sugeriu o rapaz em tom provocador, lambendo os lábios, fitando com nojento interesse as pernas da morena.

— Não te atrevas a tocar-lhe com um único dedo que seja, meu cabrão! - Gritou Steve completamente tomado pela raiva, dando um valente murro na boca de Jeff, lançando dentes e sangue em todas as direcções.

Nos momentos que se seguiram, Diana desferiu toda a cólera que vinha a acumular faz dias sobre o corpo de Jeff, não gostava daquele cenário pleno de agressividade, todavia queria vingar Melissa, queria mostrar a Jeff qual o sabor das dores corporais, queria que ele se afundasse nas feridas mentais que a violência doméstica gentilmente distribuía pelas suas injustas vítimas, queria desvalorizar a aparente fraqueza das mulheres em prol da sua escondida coragem e honra, queria demostrar que o sexo feminino é digno e honrado. Steve vislumbrava aquela fúria azul desfilar pela sala de estar, pintando o horizonte de vermelho vivo e incandescente, a poderosa justiça de Diana preenchia abundantemente todo o seu ser personificando mil correntes de ar fresco.

— Onde é que esse aguçado sentido de justiça te levará? - Pensou Rogers impressionado, vendo Jeff ser projectado contra uma parede despida de mobiliário. - Diana já chega, acho que ele já aprendeu a lição, agora espera-o alguns anos na prisão, certificar-me-ei que não serão fáceis, garanto.

Ao longe, a cidade que nunca dorme ressoava com as estridentes sirenes dos carros dos oficiais da polícia e das ambulâncias de socorro. Minutos depois, um pequeno grupo de fardas adentrava pelo apartamento, olhando com reprovação o quadro que se afigurava diante das suas pupilas oculares. Num panorama avistavam Melissa coberta de sangue inconsciente sobre o pavimento, noutra perspectiva viam Jeff manchado de vermelho contorcendo-se no chão agarrado ao rosto e ao peito, em segundo plano estava a pequena Aurora, sentada na sua cadeira, dando aos frágeis bracinhos, chorando a plenos pulmões, por último os seus olhos recaíam sobre Steve e Diana imóveis fitando o rapaz com cara de poucos amigos.

— Capitão América, poderá fazer-nos um relato concreto do que aconteceu? - Perguntou um polícia que parecia ser o comandante da patrulha, batendo continência a Steve demonstrando todo o seu respeito pelos feitos do ícone Americano.

— Como o senhor certamente terá a capacidade de constatar, estamos perante um caso de violência doméstica. - Explicou Rogers em tom perplexo.

— Quem é a vítima afinal? - Questionou outro agente da autoridade confuso, olhando de Melissa para Jeff.

— Nunca ouvi uma pergunta tão estúpida como essa, está claro que a vítima é ela! - Exclamou Diana indignada, apontando para a jovem caída no chão. - Ela tem que ir para o hospital, do que é que estão à espera? Levem-na!

— Pelo que podemos averiguar estão ambos mal tratados, como pode provar que se trata de um caso de violência doméstica? - Interrogou o comandante em voz arrogante, fitando Diana com cara de poucos amigos.

— O comandante está a duvidar do meu testemunho? - Inquiriu o louro maldisposto, detestava estes novatos desprovidos de eficácia e de bom senso, não durariam um minuto que fosse num cenário de Guerra.

— Longe de mim tal ousadia Capitão, somente estou a apurar a veracidade dos factos. - Desculpou-se o agente, retraindo-se ligeiramente perante tal acusação. - É que avaliando o estado destes dois, eu não sei que conclusões tirar.

— Ele agrediu-a, e pelo que me apercebi esta situação é recorrente, só não vê quem não quer comandante. - Gritou o Capitão sem paciência.

— Como consegue afirmar isso com tanta certeza, tem como provar as suas palavras? - Insistiu o oficial de justiça, não desmontando a sua postura implacável.

— Eu posso provar, fui eu que o deixei assim. - Desvendou a Vingadora em tom de desafio, dando um passo em direcção aos polícias.

— Sabe que essas declarações dá-nos motivos suficientes para a prender? - Questionou o comandante incrédulo, olhando a morena com desconfiança.

— Diana não devias ter dito nada, não te consigo imaginar a passares os próximos anos enfiada num reformatório. - Pensou Steve angustiado, olhando a Sereia com profundo orgulho. - Lamento informá-lo mas isso não vai acontecer comandante, como seu superior não lhe dou permissão para cumprir essa diligência.

— O que leva o Capitão América a virar as costas à lei? - Interrogou o agente em tom cínico.

— As leis por vezes têm que ser contornadas, a minha namorada apenas fez justiça, acho que ela não merece ser presa. - Justificou-se o super-soldado envergonhado com o seu comportamento, odiava recorrer à mentira para solucionar os seus problemas, porém naquelas circunstâncias não tinha outra opção de fuga.

— Podem levá-los para o hospital, esse aí tem direito a escolta policial na porta do quarto. - Ordenou o comandante pouco à vontade, não teria a coragem de desrespeitar uma ordem direta do Capitão América.

— Comandante e a bebé, o que fazemos com ela? - Perguntou um dos paramédicos preocupado, analisando o estado da pequena Aurora. - Talvez seja melhor comunicarmos a ocorrência à protecção de menores.

— Acho que não existe necessidade disso, eu e a Diana cuidamos dela enquanto a Melissa estiver hospitalizada. - Prontificou-se o louro de forma determinada, não deixaria que aquela doce menina fosse encarcerada numa qualquer instituição de solidariedade.

— Será que o Capitão América terá tempo para cuidar de um bebé tão pequeno e frágil? - Questionou o comandante em tom de desafio.

— Tempo é o que não me falta, se não tem mais nada para fazer aqui, boa noite. - Despediu-se o super-soldado de forma arrogante, fazendo sinal em direcção à saída.

Steve e Diana olharam-se durante alguns momentos, depois correram até Aurora, pegando-a ternamente entre os braços, afagando-lhe carinhosamente a sua farda cabeleira. No céu floriam perfeitas auroras repletas de frescura e luz, nas quais a pequena bebé derramava as suas lágrimas de prata e inocência, todavia os escudos do destino garantiram-lhe protecção, conforto, amor e calor humano.


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