Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 46
O deus da trapaça


Notas iniciais do capítulo

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Thor, embalado por uma gentil brisa, deixou-se cair no sublime manto purificado, fitando Ódin, seu pai, erguer-se das profundezas silenciosas do penoso gelo cristalino, olhando calmamente a sua adorada mãe, que sorridente lhe estendia aquela mão macia e protetora, que por mais que buscasse não encontraria em mais lugar nenhum, observou o corpo inerte de Grimir, afundando-se na penumbra surda e ambiciosa da sua decadente alma titânica.

— Ao longo dos anos, cruzei inúmeros mundos na minha constante sede de justiça e de luta, alimentando crenças e fés de desconhecidos, foragidos e devotos, saciando o meu espírito aventureiro com as suas ardentes e desesperadas preces, umas banhadas pelo perdão, outras dominadas pela confissão e outras ainda desprovidas de qualquer conteúdo concreto. Travei incontáveis guerras, combates, batalhas, enfrentei inimigos que nem o cruel passar do tempo apagará a sua tenebrosa existência, abracei por infinitas vezes a decrépita morte para renascer novamente numa alvorada gloriosa. Círculos e círculos de vivências absorvem o meu coração, fazendo-o rodopiar numa catadupa de emoções indefinidas, abstratas e sólidas que deixaram pesadas e intemporais marcas na minha alma, no entanto essas nódoas de sofrimento e desolação cravejaram o meu corpo com as insígnias da coragem e da valentia, abençoaram a minha mente com as cicatrizes da audácia e do respeito, bafejaram o meu sangue com o sagrado brasão do Norte. Em diversas eras perdi-me na estrada sinuosa das trevas e das tormentas, fechei-me nas suas sombras manipuladoras, fundi-me com as suas crateras de fumo incandescente e criminoso, amordacei-me com as grossas margens de nevoeiro envenenado e conspirador, mergulhei nas suas colinas decoradas com os espinhos do pecado e da traição, todavia silenciei a escuridão com um punhado trovejante de luzes e levantei-me do seu berço amaldiçoado. Agora, olhando com atenção e nostalgia este combate, vejo o meu passado espelhar-se nitidamente na bola de cristal do meu ser, vejo as cicatrizes arderem ao sabor do sangue inflamado, permaneço vivo, intacto, porém Grimir transportou com ele até à repugnante caverna da morte um pouco de mim. – Pensava o perdido Thor absorvido na sua vasta e nobre existência repleta de borboletas e corvos.

— Thor! Thor! Estás bem? – Perguntou a aflita voz de Sif, vinda das profundezas duras daquelas lembranças, dando-lhe diversas palmadas no ombro.

— Sif, Volstagg, Fandral, Hogun, Heimdall, meus companheiros. – Murmurou o príncipe de forma inexpressiva, estava feliz por os seus amigos voltarem à sua forma original, robustos, altivos e valentes, contudo estava massacrado pelos picos da luta.

— Estás ferido? – Insistiu a bela guerreira preocupada, debruçando-se ao lado do seu amado.

— O meu corpo está intocável, no entanto no meu coração deflagram rios de sangue que jamais cessarão a sua viagem, minha amada Sif. – Explicou Thor tristemente, pegando na mão da jovem, beijando-a delicadamente.

— O tempo cura tudo meu filho, destrói os males e as dores do passado, transformando as perdas em recompensas futuras, tu hoje superaste uma grande prova, ninguém te condena, ninguém. – Tranquilizou-o Frigga em voz doce, ajoelhando-se e acariciando a alma mutilada do príncipe, espalhando no seu coração o perfume fresco dos seus beijos.

— Eu só te condeno por estar tanto tempo privado do delicado e subtil prazer da comida! - Exclamou Volstagg sorridente, segurando Thor pelos ombros, erguendo-o do chão, suspenso pelas fortes correntes da amizade.

— Meu bravo Thor cumpriste o teu dever com exemplar distinção, dos confins do gelo observei como iluminaste um futuro quase dominado pelas trevas. – Elogiou Heimdall sabiamente, dando uma palmadinha de incentivo nas costas do Deus. – Por falar em dever, o meu está a gritar por mim, com a vossa permissão retiro-me.

— Obrigado Heimdall. – Sussurrou o louro, acenando ao seu grande amigo observador.

                A roda de amigos, incluindo Frigga, percorrera as hostes do silêncio, não por medo ou receio, mas sim por respeito incondicional, Ódin, o pai de todos, caminhava cautelosamente sobre o terreno abençoado pela sua mão divina, arrastando na ponta das suas botas o peso de um povo mítico. Todos os presentes se debruçaram numa magnífica vénia, onde o respeito, a adoração e a devoção se refletiam como se as almas fossem puros rios que reflectem a luz da altíssima lua prateada.

— Thor, meu rapaz, meu filho, bravo e indistinto guerreiro de Asgard, um homem não se avalia pela coroa que enverga, pelas armas que habilmente brame, pelos tesouros que conquista, mas sim pelas atitudes e valores que tecem a sua existência. – Principiou Ódin em voz profunda e presente, observando o seu único filho do alto dos seus incontáveis anos. – Se possuíres uma coroa, um ceptro, um legado e um povo, mas não possuíres coragem, valentia e audácia para fazeres crescer o teu reino, a tua vontade, a tua fé, o bem-estar dos que obedientemente te rodeiam, a luz do teu espírito, se não tiveres força para despontar num amanhã melhor e mais próspero, então jamais serás um soberano digno e honrado, merecedor da devoção, respeito e lealdade dos teus companheiros. Se eu tivesse tombado nesta demanda pela proteção de Asgard, morreria feliz e orgulhoso pois o meu reino cairia nas mãos certas, as tuas mãos meu filho. – Declarou, sabiamente, retribuindo a vénia realizada por Thor.

— Meu pai, a minha gratidão é plena, sinto-me honrado por essas palavras. – Agradeceu o príncipe do trovão nitidamente emocionado.

— A gratidão é a linha mestre de um bom e sábio governante. – Declarou o pai de todos, olhando o restante grupo, transmitindo-lhes os seus mais dotados ensinamentos. – Regressarei ao meu palácio e alcançarei um amanhecer mais florido e belo para todos nós.

— Eu acho que esta vitória ordena um grande e delicioso banquete! – Exclamou o guloso Volstagg divertido, massajando o estômago reclamador.

— Acho uma ótima ideia meu amigo, vamos a isso. – Aplaudiu Thor, tentando fugir dos fantasmas que dolorosamente o perseguiam, sabia o quanto os Asgardianos adoravam bons e elaborados banquetes.

                Daí a alguns minutos, todo o bravo povo do lendário reino renascia na grande praça central, fogareiros ganhavam vida em todos os recantos enquanto um cheirinho delicioso a carne e peixe assados na brasa deslizava pelos ares, entrando caprichosamente nas narinas dos entusiastas, copos e copos de vinho frutado e tentador floriam em todas as mãos, esculpindo sorrisos contagiantes em todos os rostos.

— Fico tão feliz por teres consagrado o teu nome, por teres salvado Asgard das garras do mal. – Confessou Sif em voz tímida, dançando uma alegre balada nos braços de Thor.

— Somente cumpri a missão para a qual fui talhado. – Sussurrou o Deus gentilmente, desfrutando aquele momento na companhia da dama que cruzaria a imensa montanha do tempo gravada no seu coração.

— Sempre modesto. – Brincou a bela guerreira sorridente, passando uma das mãos pelos cabelos dourados do príncipe. - Mas confesso que durante breves e temerosos segundos, temi pela tua vitória, peço perdão Thor. – Revelou a Lady Sif em tom baixo, contudo o louro encostou os dedos aos lábios, aquelas palavras de dúvida e insegurança manchariam aquele momento de cumplicidade e de paixão ardente, então os dois jovens caíram desamparados na melódica emboscada das cordas dos violinos, os seus lábios refletiram a união perfeita que deslumbra o céu e a terra, um beijo demoroso e apaixonado, um gesto simples, belo e delicado, colorindo a harmonia silenciosa dos glaciares.

— Hey Thor! Eu sei que beijar alguém tão elegante como a Sif é uma experiência fantástica, mas acho que comer uma bela costeleta de javali…

— Volstagg repete o que disseste seu imbecil, desgraçado e cretino! – Gritou Sif colérica, largando Thor num vendaval de raiva e vergonha, era uma mulher forte, temida e brutal, o louro era a sua única fraqueza, aquele que abria e penetrava no seu coração com a maior das facilidades, todavia aquele beijo não devia ter acontecido na presença de todos.

— Sif tem calma, ele estava só a brincar! – Exclamou o príncipe do trovão confuso, tentando segurar a fúria da guerreira.

— Sim, eu estava só a brincar, acredita, queres uma perna de borrego? – Perguntou o atarantado Volstagg, conhecia muito bem o peso do punho de Lady Sif.

— Achas que devíamos intervir? – Questionou Fandral apreensivo, vendo a cena de longe.

— Eu não me atrevo, vai tu se quiseres – Respondeu Hogun receoso, comendo um delicioso bife de borrego.

                Alguém escondido nas areias assombradas do tempo, trancado pelas hostes guardiãs do silêncio, observado pelos fantasmas do deserto, vagueava perdido na sua raiva, ressentimento e desilusão.

— Um dia tombarás, Thor meu desprezível irmão. – Rosnou Loki mal-humorado, sentando-se numa rocha revestida pelo sangue da perdição e da inveja. – Fui um estúpido em confiar naquele inútil titã a conquista do meu reino, sim porque Asgard é meu reino. – Declarou, raspando com o pé no terreno arenoso, cravando nas suas linhas castanhas a maldade que tornara Loki o maior inimigo da verdadeira luz. – Festeja enquanto podes, o tempo da tua derrota não tardará, não tardará! – Gritou, espalhando na atmosfera ventosa a cólera de alguém que desde muito jovem abraçou as trevas e a desolação, escondendo-se sobre a capa silenciosa do egoísmo e da presunção, manchando a sua alma com as trapaças de alguém louco e imprevisível.

                O mal continuará a estender o seu véu negro sobre os mundos, contudo Thor estará lá para fortalecer a coexistência pacífica e pura entre Asgard e Midgard, transportando na ponta do seu Mjolnir milénios de salvação e glória dum povo que escreveu os seus lendários mitos no grandioso livro da História.

                A ampulheta do tempo filtrará os próximos acontecimentos da nossa história, fiquem para ler!


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