Ondas de uma vida roubada escrita por Maresia


Capítulo 45
O renascer




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Nuvens de desespero, facas de angústia, espadas de pânico, raios de sofrimento, faíscas de dor, labaredas de perda, machados de desolação e trovões de arrependimento debruçaram-se dolorosamente sobre o espírito do nobre guerreiro Asgardiano, lágrimas com trago a limão e desonra eram derramadas pelos seus olhos lutadores, vazios e apagados, quando a ponta do seu lendário martelo almejou sem piedade nem misericórdia o ombro de seu pai, Ódin o pai de todos, o rei incontestável de Asgard.

— Pai. – Sussurrou Thor incrédulo com o que tinha feito, algo tão vergonhoso e indigno que nem as chamas infernais de Muspellheim poderiam mutilar, nem as torturas provocadas pelo passar indubitável dos anos poderiam apagar, então só restaria a vergonha, o peso e a desonra, o perdão cairia no profundo buraco do mundo. – Perdoa-me.

— Vejam bem, um jovem Deus a implorar perdão a um velho medíocre e insano, quanta humilhação conseguirás aguentar daqui para a frente? – Provocou Grimir sarcasticamente, lançando um olhar de escárnio ao príncipe.

— A tua rendição deixou de ser opção, agora somente serás tratado, julgado e punido como um herege, um criminoso e um exilado. – Prometeu o louro em tom rancoroso bramindo o seu martelo com fúria e ódio, submetendo a atmosfera à sua implacável vontade trovejante. – Ele está a jogar com as minhas emoções não irei permitir que me use a seu belo prazer – Pensou, analisando com detalhe aquela situação desfavorável, não teria a ousadia de erguer uma segunda vez o Mjolnir contra o seu pai, contudo estava sem opções.

                Sem retirar os seus aguçados olhos do feiticeiro, Thor ergueu-se suavemente nos ares escuros e silenciosos, voando habilmente nas asas transparentes do seu martelo, provavelmente aquele plano não era o mais certo nem o mais inteligente, no entanto era o único que tinha.

— Mãe fica segura, deixa tudo nas minhas mãos, eu cuidarei de tudo, fica segura. - Cismou o Deus desesperado, realizando alguns círculos no ar, tentando captar a atenção de Grimir. – Espero que ele saiba voar, ou que pelo menos baixe a guarda, apenas necessito de um segundo, apenas um segundo.

— Então Thor, não achas que já és demasiado crescido para brincar ao jogo da apanhada? – Zumbou o Titã hipocritamente, seguindo o planar do príncipe do trovão.

— Só acho que és desprezível demais para eu te enfrentar, é só isso. – Proferiu o louro em tom de desafio, tentando bloquear os seus pensamentos com o fervor das suas citações, talvez resultasse.

— Estás louco, não sabes o que dizes! – Exclamou o feiticeiro sorrindo profundamente, dando um valente soco nas costas geladas de Ódin, atirando-o por terra.

— Maldito! Cobarde! – Gritou o príncipe enraivecido, lançando diversos trovões flamejantes na direcção de Grimir, este não os esperava.

— Não cantes o hino da vitória antes da hora. – Grunhiu o Titã colérico, sendo empurrado pelo exército trovejante para trás, vendo o seu capacete rachar ao som da orquestra amarela.

— Cavaste a tua própria sepultura quando decidiste enfrentar-me Grimir, agora pagarás pelo teu erro. – Avisou o Asgardiano manipulado pela raiva, voando de forma impiedosa sobre o negro homem, desferindo fatais golpes do seu martelo, sentindo o sangue quente e imundo do titã percorrer-lhe as luvas místicas.

— Achas que me deixarei vencer assim tão facilmente, quanta ingenuidade! – Atirou Grimir sinicamente, dando um poderoso pontapé no ventre do bravo guerreiro, impulsionando duramente contra o manto negro e surdo. – Vamos ver o que eu sou capaz de fazer com este brinquedo. – Sibilou, à medida que se debruçava sobre o Mjolnir caído no chão perto do seu legítimo dono. – O que vem a ser isto? Parece chumbo. – Constatou horrorizado, unindo todas as suas forças numa tentativa inútil de erguer o martelo.

— Tu nunca serás digno dele, nunca! – Vociferou o louro em voz sumida, fitando o seu precioso martelo imóvel a seus pés.

— Segura-o e entrega-mo agora! – Ordenou Grimir enfeitiçado pela loucura e pela insanidade, por momento esquecera a sua real missão, agora somente desejava humilhar, ferir, matar Thor, torná-lo um exemplo para todos os que o ousassem desafiar.

— Talvez uma nova visita te ajude a decidir, sim acho que sim. – Afirmou Grimir em tom sádico e vitorioso, levantando o seu ceptro nos ares, agitando-o numa dança horrível e cortante, transportando na sua ponta demoníaca a única pessoa viva naquele reino escuro, deserto e silencioso. – Vem dar um empurrãozinho ao teu amado filho Frigga.

— Não metas a minha mãe neste assunto. – Berrou Thor colérico, vendo a sua bela e doce progenitora aterrar no campo de batalha, todavia estava viva e expressiva. – Perdoa-me mãe. – Pediu, ajoelhando-se no chão aos pés da poderosa Frigga.

— Foste muito corajoso meu filho, não tens motivo para te envergonhares. – Disse a amada de Ódin emocionada, passando uma das mãos no cabelo desalinhado de Thor, remexendo ligeiramente os finos lábios num leve sorriso de incentivo. – A vitória sorri a quem é seu merecedor. - Murmurou, olhando o infinito negro.

— Até estou emocionado. – Cuspiu Grimir enojado com aquelas ternurentas palavras, esgueirando-se para as costas de Frigga, colocando o ceptro sobre a sua garganta, o seu olhar cheirava a morte, desalento e tortura. – Vamos subir a parada, a tua querida mamã em troca de uma gota de sangue e do martelo.

— Jamais! – Gritou o Deus frustrado, erguendo-se do chão, segurando com bravura Mjolnir, os ventos trazem a mudança, soprando na vasta copa da Árvore da Vida.

— Tanto egoísmo e tanta presunção reunidos numa pessoa apenas, devias ter vergonha do teu comportamento – Criticou o feiticeiro friamente, estava a perder a paciência.

— Não cedas querido, não ceda…

— Cala-te sua impura imunda, transmissora da vontade de Ódin. – Gritou o Titã furioso, exercendo pressão na traqueia da bela Deusa, cortando-lhe o ar.

                Thor afundava-se cada vez mais no abismo do sofrimento e do desespero, o desalento e a escuridão sorriam-lhe em cada esquina, aplaudindo divertidos o seu fracasso, a sua derrota, a sua humilhação. Olhou em redor, em primeiro plano estava a sua mãe, torturada, desonrada, envergonhada por aquele maldito sujeito. Em segundo plano, jazia Ódin imerso em gelo, silêncio e escuridão, inalcançável pela luz e pelo calor.

— Não tenho escolha. – Pensou o príncipe do trovão tristemente, pela primeira vez em toda a sua cíclica existência não tinha saída.

— Ainda bem que compreendes que não tens escolha, porque realmente não tens mesmo, agora sê um bom menino e dá-me a gota de sangue e o martelo. – Concordou Grimir feliz, hipnotizado pelas suas “fantásticas” artimanhas.

                O bravo Deus caminhou em passada lenta e insegura, quebrando a pequena distância que o separava da sua mãe, passos banhados pelo terror e pela autêntica e clara vergonha, estendia a sua mão justiceira, estendendo a ponte da derrota e do flagelo a seus pés, iria ser responsável pelo fim do mundo, pela submissão dos povos, pelo cataclismo da história e pelo apagar da luz eterna do sol.

— Espero que o julgamento divino faça o seu trabalho e me ofereça a punição que eu realmente mereço. – Declarou Thor corajosamente, erguendo a cabeça, se ia morrer ao menos queria olhar a morte nos olhos, só lhe restava a honra de sucumbir como um verdadeiro guerreiro, Valhala abriria as suas sagradas portas para a sua alma desfeita, aí repousaria sobre as plumas do perdão e da ressurreição.

— Acredita, ele virá mais breve do que tu imaginas. – Afirmou o sádico feiticeiro orgulhoso do seu feito, olhando obsessivamente para a esticada mão de Thor na qual pousava suavemente o martelo que vencera o tempo.

— Não desistas Thor, não entregues o martelo que foi forjado a partir da tua vontade, coragem e bravura. Não abraces as trevas, beija a luz eterna do teu coração. Não mergulhes Asgard na escuridão e no mal, cria uma nova era, uma nova história, um novo amanhecer, uma nova lenda. Vamos lá meu filho, voa nas asas cintilantes do trovão, flutua até ao castelo da vitória, pinta a fortaleza do teu espírito, pinta-a com as cores claras da paz, da honra e da dignidade. Luta Thor, luta, o sangue da esperança e da felicidade corre nas tuas veias. – Declarou Frigga de forma irrepreensível, olhando Thor com aqueles olhos quentes, capazes de derreter glaciares.

— Mãe. – Murmurou o louro emocionado, sentindo cada palavra prenunciada pela sua lua protetora inundar-lhe a alma de calor, harmonia e tranquilidade, afogando o seu desespero, o seu sofrimento e a sua vergonha num mar de luz e flocos macios de neve.

— Isso é meu! – Exclamou Grimir obstinado, largando Frigga por uma luminosa fração de segundo.

— Nem que vivesses milénios este martelo seria teu! – Ripostou Thor em voz audível, renascido das profundezas celestiais do paraíso do norte, usando cada palavra de sua mãe como um maravilhoso degrau que o guiaria para a vitória, como um fresco e prateado escudo que o protegeria contra as trevas, o mal e o silêncio congelante, seria a brilhante estrela que abriria uma nova e fértil alvorada.

                Um florescer de trovões incandescentes brotaram perigosamente da ponta cravejada de coragem, valentia e amizade de Mjolnir, almejando brutalmente a maldade e a ganância que desfilava nas veias titânicas de Grimir. Uma torrente de golpes esvoaçantes, brutais e inflamados alcançaram o negro coração do pérfido feiticeiro, roubando-lhe a fome de vingança, de desolação e de conquista.

— A luz continua a meu lado. – Murmurou o negro Titã em voz sufocante, caindo desamparado com as costas no abençoado tronco da Árvore da vida, soprando uma enorme possa de sangue no terreno bafejado pela cobiça desmedida.

— Enganas-te, a única coisa que vagueia a teu lado é a incontestável rainha das trevas, a morte. – Declarou Thor em tom trágico, desferindo o golpe de misericórdia no seu talentoso e cruel oponente.

— Por mais que lutes as trevas jamais te darão tréguas, um dia elas consumir-te-ão, reduzindo-te a insignificante pó. – Sussurrou o feiticeiro num último rasto de rancor e raiva, mergulhando no vasto posso que conduz ao berço da morte.

— Voltaste a levar a melhor Thor, o teu dia chegará! – Exclamou a mesma voz trocista repleta de azedume e mau-humor, enquanto vagueava por um deserto arenoso.

                A vida regressava de novo a Asgard, as estrelas voltavam a brilhar no céu platinado, a esperança floria em cada sorriso, a bravura crescia viciante em todas as veias dos corajosos guerreiros, a amizade fortalecia-se com o poder de mil trovões e a honra de Thor renascia em cada folha da sagrada Árvore da Vida, fertilizando o renascer confiante de uma antiga lenda.


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