Por trás das lentes escrita por Megan Queen


Capítulo 44
Secrets


Notas iniciais do capítulo

Olha quem voltou.... Ninguem importante só eu mesmo...rs
Então gente, eu realmente sinto muito mesmo pela demora mas não foi intencional como sempre.
Acontece que dessa vez, precisamente 16 dias atrás, perdi uma grande amiga e, cara, isso me destruiu...
Passei um bom tempo mal, mas aí resolvi entrar no nyah e, juro, chorei lendo os reviews daqui e de MM... Então, graças a vc, que tirou seu tempo ao menos pra dizer q gostou, que eu revisei os caps que já tinha escrevido e resolvi voltar a postar... Muito Obrigada!
Daqui para amanhã responderei a todos!
E vc que é um fantasminha, sem pressão, mas porque nao deixar um review? Não vai mudar o mundo, mas vaí mudar o meu dia pra muito melhor!
Boa leitura!



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Sara Lance

Caminho entre a multidão barulhenta através da Verdant, pela primeira vez incomodada com a baixa iluminação do lugar.

Em pouco tempo, graças ao Pai, localizo Regina e, inevitavelmente, Tommy, junto ao balcão de bebidas. Nem preciso chegar perto para notar o grau elevado de sua embriaguez. Respiro fundo, me arrependendo disso no instante em que o odor de bebidas embrulha meu estômago, e marcho para lá com as mãos nos bolsos do casaco.

— Oh! Olá, Sara! – a morena me cumprimenta animadamente e vejo os olhos dele arregalarem, enquanto o mesmo se empertiga.

— Sara?! A minha Sara? – questiona de forma embolada, cerrando os olhos em minha direção.

— Pode ir baixando a bola, que eu não sou sua coisa nenhuma. – retruco, segurando seu braço quando ele tenta se levantar.

— É claro que é. – ele devolve e eu até tentei impedi-lo de me puxar para si, mas aí ele começou a se lamentar e fiquei com pena.

Olho dela pra ele, que enterrou a cabeça na curva do meu pescoço.

— Ele está sofrendo, Sara! – ela aponta, compadecida. – Quase pensei que fosse chorar quando começou a contar que você o tinha abandonado.

— Ei! – o empurro e ele se sobressalta, me encarando assustado. – Eu não te abandonei! – exclamo.

— Não?! – seu olhar confuso me faz rir.

— Não, seu bobo. – seguro seu rosto e ele abre um sorriso enorme.

— Quer dizer que estamos bem?

— Calminha aí. – ponho as mãos em seu peito, o afastando suavemente. – Eu até estava pensando em te perdoar, mas olha só o que você fez: encheu a cara! Além do mais, não me lembro do seu pedido de desculpas por ter defendido uma vadia em vez de ficar do meu lado.

Surpreendo-me ao ver o idiota mais lindo do mundo se ajoelhar desajeitadamente aos meus pés.

— Sara, me perdoa, por favor! – implora em alto e bom tom, juntando as mãos. – Eu juro que segunda-feira demito a Charlote, mas me perdoa, meu amor! – diz e, à essa altura, algumas pessoas já se juntaram ao nosso redor e começaram a bater palmas, assoviar e a cantarolar: “Perdoa! Perdoa!”.

— Até você? – encaro Regina, que se juntou ao coro rapidamente, e ela apenas ri, dando de ombros.

— Tá! – reviro os olhos, erguendo as mãos. – Eu perdoo você, idiota! Agora faz o favor de levantar para sairmos logo daqui? – o puxo, pondo-o de pé.

— Eu te amo sabia? – ele declara, estalando um beijo em minha bochecha e ganhando aplausos da multidão, o que me faz corar.

— Sim, eu sabia. – digo, arrastando-o para fora junto com Regina. Mordo o lábio para não rir de seu bico decepcionado com minha resposta. – Também amo você, Thomas. – cedo. – Mas você está bem encrencado... – emendo, quando alcançamos a saída, e ele apenas dá de ombros com um sorriso infantil.

Depois de chegarmos à calçada, destravo as portas do carro e empurro o moreno para encostar-se a ele.

— Obrigada, Regina. – agradeço, antes de abrir a porta traseira.

— Não foi nada. – ela dispensa com a mão, rindo de leve.

— Sério, nem sei como te agradecer por ter cuidado dele para mim. – acrescento, me arrependendo no momento em que vejo uma luz acender nos olhos dela.

— Na verdade, eu sei de uma maneira... – diz, um pouco acanhada e já imagino o que vem por aí. – Será que eu poderia...?

— Na bochecha. – corto, e ela abre um largo sorriso. – Bo.che.cha! – repito lentamente, para garantir, e a vejo assentir vigorosamente antes de se aproximar dele e tascar um beijo demorado em seu rosto. – Okay. – digo, afastando-a de leve e empurrando um Merlyn aturdido para o banco de trás do carro.

— Até logo, Sara! – ela se despede, dando um beijinho em meu rosto dessa vez, e saindo com a expressão de criança que ganhou doce.

— Até. – é tudo que digo antes que ela desapareça na entrada da Verdant outra vez. Sorrio e fecho a porta de trás do sedan preto de Laurel, entrando no lado do motorista logo depois e começando o percurso de volta para casa.

Logo estou novamente diante de meu prédio. Observo o banco de trás pelo retrovisor e percebo que Tommy está cochilando com o queixo apoiado no próprio peito. Suspiro, desligando o carro e me livrando do cinto de segurança antes de sair, batendo a porta em seguida, o que o faz acordar, assustado. Sorrio, abrindo a porta e encontrando-o extremamente confuso.

— Sara?! Onde estamos? – questiona, à medida que o ajudo a sair.

— Planeta Terra, continente americano, Estados Unidos, Star City, Glades, Av. Murray, prédio 4. – brinco, o conduzindo até a portaria com certa dificuldade, já que graças ao excesso do álcool ele parece ter esquecido como se caminha. – e agora estamos indo ao meu apartamento para eu decidir o que faço com você... – acrescento, lhe lançando um olhar de reprimenda quando ele quase nos faz cair ao trocar os pés. – Droga, Tommy! Por que tinha que beber tanto? – pergunto, apertando o botão para chamar o elevador.

— Eu estou realmente encrencado... – ele conclui de maneira embolada. – Você nunca me chama de Tommy. – explica, com o olhar perdido para os números acima da porta de metal.

Limito-me a sorrir de leve, vendo o elevador chegar e entrando junto com ele, que se escora na parede enquanto eu seleciono meu andar.

— Elevadores me trazem boas lembranças... – ele murmura, fechando os olhos e pendendo a cabeça para trás de modo a apoiá-la na parede, quando me ponho ao seu lado.

— Hmm... – murmuro de volta, observando suas feições cansadas e abatidas.

— Não sei como você pôde pensar por um segundo sequer que eu estivesse com Laurel... – ele continua, pondo as mãos no bolso e girando a cabeça de modo a me encarar. – Acho que te amei antes mesmo de saber quem era a garota por trás da máscara. – dá de ombros, me olhando intensamente.

— Não sabia que o álcool te deixava sentimental, Merlyn... – o provoco, com medo de que meus hormônios inconstantes de grávida me façam chorar em sua frente.

— “Eu não devia te dizer/ mas essa lua / mas esse conhaque/ botam a gente comovido como o diabo.” **. – ele cita, com um riso áspero e curto, arrancando uma gargalhada sincera minha.

— Nem que você lê poesia... – acrescento à minha declaração anterior, encontrando seu olhar melancólico à minha espera.

— Eu leio às vezes... – encolhe os ombros, virando-se para a porta quando o elevador para e ela se abre.

Puxo-o pelo braço até meu apartamento e depois de entrar, tranco a porta novamente.

Rapidamente, vejo o moreno sair trocando os pés direto para meu quarto e o sigo, tirando o casaco e jogando as chaves do carro sobre o sofá no caminho.

Ao chegar em meu quarto, o encontro largado de qualquer jeito sobre minha cama de casal com o braço dobrado sobre os olhos.

— Você vai ter uma bela ressaca amanhã... – suspiro, caminhando até o banheiro em busca de algumas aspirinas e logo retornando. – Para sua sorte, acho que posso amenizá-la. – o consolo, lhe entregando o remédio e um copo de água da torneira.

Ele se senta, tomando tudo sem reclamar, enquanto eu tiro seus sapatos e suas meias, me sentando na cama logo depois e encostando-me á cabeceira, movimento que ele repete, colocando o copo vazio sobre o criado-mudo.

— Desculpa. – é a primeira coisa que diz, virando-se para mim que apenas o encaro de volta, esperando que continue. – Eu não queria que as coisas tivessem acontecido dessa forma... – diz, parecendo sóbrio por um momento.

— Por ‘coisas’ você quer dizer...?

— Tudo isso. – ele faz um gesto expansivo de mão aberta ao nosso redor. – Odeio brigar com você, odeio saber que está magoada comigo e odeio, acima de tudo, não conseguir lidar com isso. – solta numa avalanche. – Não queria que você tivesse de me ver dessa forma... – ele desvia o olhar por um momento, me encarando surpreso quando deslizo minha mão de modo a segurar a sua.

— Se tem uma coisa que aprendi com Oliver e Felicity é que, quando amamos, temos de dividir a carga, por mais que doa. – digo devagar, encarando nossas mãos. – Sei que não bebeu dessa forma só por minha causa e sei também que seu pai ferrou tanto com seus sentimentos que você sempre espera que todo mundo te abandone como ele fez... – explico devagar e vejo seus olhos avermelharem antes que ele morda o lábio e vire o rosto.

— Sinto muito... – Sua voz soa quebrada. – Odeio o poder que ele tem sobre mim, odeio que ele continue me afetando e afetando minhas atitudes.

— Você odeia coisas demais... – comento, tentando gracejar.

— Eu só... Só queria que por um momento ele me olhasse com orgulho. Isso é pedir demais? – seu olhar infantil parte algo dentro de mim. – Você faz ideia do que é passar a infância inteira com um pai ausente e uma mãe assassinada? – pergunta. – Droga, Sara! Perdi a conta dos feriados que passei com os Queen, das vezes em que presenteei Robert no dia dos Pais! – passa as mãos pelo cabelo, bagunçando-o. – E sabe o que é mais irônico? Malcolm tem mais orgulho de Thea, que até algum tempo atrás era somente a filha caçula da família Queen, do que de mim, que sempre fui a droga do filho único dele! – sua voz falha, e ele trinca os dentes, olhando para cima em busca de controle.

— Thomas... – chamo, puxando sua mão e pondo entre as minhas. – Por que isso agora? – quero saber, antecipando que Malcolm aprontara mais uma das suas.

— Ele... – o vejo morder o canto da boca, como que tentando conter-se, mas o efeito do álcool geralmente impede segredos, e com ele não é diferente. – Malcolm me disse hoje que faria de Thea a futura CEO da Merlyn Global. – conta, e abro minha boca, chocada.

— Mas Thea nunca teve o menor interesse nos negócios nem da QC, que dirá nos da Merlyn Global! – solto, indignada.

— Não se trata de Thea, entende? Amo minha irmã, mas ela levaria um sheik à falência com facilidade... – ri, agridoce. – Este é apenas o jeito que o Sr. Merlyn achou para me dizer que confiaria sua empresa a qualquer um que não fosse eu. – estala a língua. – Foda-se a empresa, eu não dou a mínima! Mas que inferno eu fiz para não merecer o mínimo de confiança da parte desse homem?

— Nada, Thomas! – interrompo seu discurso angustiado, me aproximando dele. – Você é uma pessoa maravilhosa e se seu pai não vê isso, que se exploda! – digo, vendo um sorriso torto desenhar-se em seus lábios. – Acredite: você é a melhor coisa que me aconteceu em muito tempo e não posso deixar que ache de si menos do que é por causa dos arroubos de Malcolm!

— Sara... – ele começa, mas ponho as mãos ao redor de seu rosto, o forçando a me encarar.

— Posso não ser boa em muitas coisas, mas sei reconhecer alguém especial quando vejo e, sem mentira, eu soube que você me mudaria no instante em que pus os olhos no cara de máscara quase 6 meses atrás. – admito. – Você disse que me amou mesmo sem saber quem eu era, o que você não sabe é que foi recíproco! – confesso corada, diante do seu olhar penetrante. – E se tem algo que me fez admitir o que sentia e me deixar envolver por você pode ter certeza de que o crédito é todo seu. – beijo seus lábios suavemente, o odor de álcool misturado com menta invadindo minhas narinas e me causando náuseas. – Só um instante. – digo, rapidamente, levantando e correndo para o banheiro, onde vomito todo o conteúdo do meu estômago.

— Sara?! – Thomas surge na porta do banheiro com uma velocidade suspeita para um bebum. – Está tudo bem? – pergunta, preocupado, enquanto lavo minha boca na pia.

— Pensei que você nem se aguentasse em pé... – desconverso. – Fingiu estar bêbado? – semicerro os olhos em sua direção.

— Eu realmente bebi bastante... – ele desvia o olhar, passando o peso de uma perna para a outra.

— Mas não está bêbado... – acuso, levemente divertida.

— Posso ter exagerado um pouco para granjear pena... – admite, me olhando temeroso. – Estou encrencado?

Sorrio, caminhando até ele.

— Não por isso... – brinco, o abraçando. Porém, nova vertigem me assalta quando aspiro o perfume de sua camisa e sou obrigada a voltar para o banheiro.

Não é uma cena que gostaria que ninguém visse quanto mais meu namorado: eu, ajoelhada ao lado do vaso e quase colocando o estômago pela boca. Vai por mim, nada bonito.

— Santo Deus! – ele se abaixa ao meu lado, segurando meus cabelos. – O que há com você? – pergunta e eu apenas o empurro para caminhar novamente até a pia e escovar meus dentes. – Sara?! – ele cobra, cruzando os braços, à espera de uma resposta.

Ao ver sua expressão mandona, não consigo conter o riso.

— O que é tão engraçado? – ele arregala os olhos, incrédulo. – Eu abraço minha namorada e ela vomita. Acha isso engraçado? – se estressa, entre preocupado e confuso.

Enxáguo minha boca e seco meu rosto, voltando-me para ele em seguida.

— Não é isso, amor! – falo, pegando sua mão entre as minhas e me sentindo formigar com ansiedade. – Foi só o seu perfume, que por um acaso é irritantemente enjoativo... – explico, rindo.

— Mas como? É o mesmo perfume que eu uso desde quando nos conhecemos e você nunca passou mal por causa dele... Tem certeza de que não está doente, Sara? – seu tom se torna preocupado novamente.

— Tenho. – digo. – Na verdade, nunca estive melhor. – acrescento, me aproximando um passo dele, que franze a testa confuso. – Como eu ia dizendo, você é a melhor coisa que me aconteceu em muito tempo... – falo, devagar. – E a segunda melhor coisa foi você que me deu 3 semanas atrás... – concluo, lembrando-me do exame de sangue que Cisco fez na Star Labs, depois da insistência de Thea para saber quanto tempo tinha o bebê.

— C-Como assim? – ele murmura.

Em resposta, me limito a levar sua mão até minha barriga e espalmá-la ali. Realmente, concordo com Thea sobre a necessidade de uma câmera, pois adoraria registrar a cara de Tommy ao entender.

— Você...? – ele balbucia, com os olhos rasos d’água.

— Parabéns, papai... – digo, com a voz trêmula e não mais tão confiante. – E, não importa o que você acha, eu sempre terei orgulho de ser a mãe do seu filho! – afirmo, antes que ele acabe com minha apreensão e me puxe para seus braços, enquanto sorri de forma nervosa e ao mesmo tempo maravilhada.

— Obrigado! – é tudo que ele murmura, entre lágrimas, assim como eu. – Obrigado. – repete.

E simplesmente parece certo.

** Carlos Drummond de Andrade (Poema de sete faces)

~*~

Oliver Queen

Entro no carro e dirijo pelas ruas escuras e desertas de Star, refletindo nas muitas decisões que tive de tomar e nas que estou tomando agora. Inevitavelmente, meus olhos se voltam culpados para a mochila no banco do carona, que contem meu equipamento e meu traje.

Há uma sensação de familiaridade latente em estar dirigindo de madrugada pela cidade outra vez e a adrenalina corre por minhas veias quando paro em frente ao meu antigo esconderijo da minha época de Argus.

— Está atrasado. – Helena é a primeira a me notar quando entro, enquanto eu apenas prendo minha respiração assimilando tudo isto.

É como se nada tivesse mudado. Aqui estou eu, me preparando para mais uma missão. Amanda, exatamente como eu me lembrava, sentada imponente atrás do computador central e Dig treinando com a Bertinelli, cada um com seus pedaços de bambu, me encarando arfantes e suados pela luta.

— Estive ocupado. – devolvo, pondo a mochila no chão e deixando a realidade me atingir como um soco.

Tudo mudou.

Não há nenhum resquício de confiança e cumplicidade nessa equipe, além de entre mim e Diggle. Helena não é indiferente a isso, Amanda tampouco o é. E eu não poderia ligar menos. O que mais quero desde que isso começou, é que termine. E, pelo visto, não sou o único.

— Guarde suas ocupações para quando terminarmos. – Helena torce os lábios, me jogando um bambu, que pego com o mesmo reflexo de dois anos atrás.

Tiro minha camisa rapidamente e me aproximo, começando a duelar com a morena como se nunca tivéssemos deixado de fazer isso. Depois de um minuto de hesitação, nos observando como se pudéssemos saltar no pescoço um do outro ou algo do gênero, Dig se junta a nós e logo estamos numa coreografia praticamente esquecida por nós três, como se ainda fizéssemos parte do mesmo team que se desfizera há tanto tempo.

Amanda se levanta e se encosta à mesa, nos observando como se fossemos a atração principal do dia ou, para ser exato, da madrugada.

Entre as voltas que damos, giro meu torso impedindo que Helena me acerte e, ao mesmo tempo vibro um golpe de encontro às suas panturrilhas, a derrubando.

 - Woa! – ela expulsa o ar dos pulmões de forma ofegante, ao mesmo tempo em que ri divertida. – Você não perdeu mesmo o jeito, Queen... – elogia, quando estendo a mão para ajudá-la a levantar.

— Desculpe pela queda. – dou de ombros à medida que ela se endireita, prendendo o cabelo num coque alto e expondo o rosto avermelhado pelo exercício.

— Não é como se você estivesse arrependido. – ela pisca um olho, com o humor negro de sempre, me arrancando uma risada breve.

— Tudo bem, meninas, o dever nos chama... – a voz áspera de Amanda se faz presente e todos nos viramos para ela. – Ao que parece, não teremos tempo para planejar. – avisa, quando nos reunimos ao seu redor. – Damien pretende sair da cidade tão logo seja possível e se conseguir fazer isso, é provável que se passem anos antes de termos outra oportunidade como essa.

— O que isso quer dizer? – é Dig quem verbaliza a pergunta.

— Atacaremos amanhã à noite. – a Waller sentencia, nos surpreendendo. – Pelo que pude ver, todos estão em ótima forma então não precisamos e não podemos perder muito tempo. Eu quero uma missão rápida e sem falhas e, até onde me lembro, escolhi os melhores que conheço para executá-la. Não me decepcionem.

— Apostou em nós. Deixe que façamos o serviço. – retruco, indiferente.

Sinto o olhar dela cortar o ar em minha direção, mas já não dou a mínima, esse não é mais o meu mundo de qualquer forma.

— Aí está tudo que vocês precisam saber. – ela desliza 3 tablets sobre a mesa, me ignorando, e nós os pegamos. – Onde ele dorme, onde ele come, quando faz qualquer coisa e quem está com ele. Vocês precisam decorar cada passo desse homem nas próximas 20 horas ou estarão perdidos. Essa é uma tarefa para profissionais, não há brechas para improvisos. Irão fazer exatamente o que eu disser, quando eu disser e como eu disser, estamos entendidos?

— Ou...? – é a vez de Helena desafiar e sinto certa pontada de orgulho por sua petulância, mas passa rápido.

— Ou vocês morrem. – Amanda rebate, sem se alterar. – E, infelizmente, não serei eu a matá-los. Será Damien. – conclui.

— Infelizmente?! – Dig questiona.

— É. – Amanda o encara, fria. – Se eu os matasse seria rápido, eficiente e quase indolor. – observa as próprias unhas como se fossem a coisa mais interessante do mundo. – Damien gosta de se divertir um pouco antes de mandar suas vítimas para o outro plano. Garanto que não vão querer brincar com ele. – termina, nos dando as costas e voltando para trás do computador. – Queen?! – chama, depois de se sentar, enquanto os outros vão para um canto do galpão, analisando as informações dos tablets.

— Eu?! – aponto para meu peito, caminhando na direção dela.

— Tem outro? – ela bufa, indicando a cadeira à sua frente, onde me sento relutante. – Posso lhe fazer uma pergunta?

— E eu posso te impedir? – devolvo, dando de ombros.

— Você realmente sabe quem é Felicity Megan Smoak? – ela solta cada sílaba numa velocidade calculada.

É como se uma mola me impulsionasse, me pondo de pé numa fração de segundos.

— Não vou discutir isso com você. – grunho entredentes. – Já disse para mantê-la fora disso! – lembro, cerrando os punhos para não alterar o tom e chamar a atenção dos outros.

— Só fiz uma pergunta. – ela dispensa com a mão. – Não há necessidade desse estardalhaço. – zomba. – Apenas achei que você podia ter curiosidade sobre o passado da doce Felicity... – comenta.

— Não preciso de você para saber algo a respeito de ninguém, muito menos de Felicity. – retruco, me preparando para lhe dar as costas.

— Se mudar de ideia...

— Acabe.

— Salvei o arquivo dela em seu tablet. – ela faz um gesto com a mão, me dispensando. – Mas você é quem sabe. Afinal, não há segredos entre vocês, suponho. – ela cutuca minha ferida e me viro para não dizer nenhuma tolice diante de sua ameaça velada de expor todos os meus segredos, ainda que Felicity já saiba alguns deles.

O problema é que aquilo que escondo, principalmente sobre o que estou fazendo agora, é o suficiente para afastá-la de mim. E sou consciente da necessidade de encerrar logo esse capítulo de minha vida antes de deixá-la entrar de vez.

Observo o tablet em minhas mãos enquanto me acomodo num pequeno sofá longe dos outros, uma única pergunta me atormentando.

Será que algum dia estaríamos livres do peso de nossos próprios segredos?

~*~

Felicity Smoak

Estava gelado.

Podia sentir em cada osso meu e, ainda assim, também percebia a umidade se acumulando em meu corpo. Encolho-me à medida que meu suor frio escorrega por minha coluna, o ardor de tê-lo deslizando por minhas feridas ainda abertas.

Fecho meus olhos com força, apesar de não poder enxergar nada mesmo, graças à escuridão.

Lá no fundo, minha cabeça lateja, o pulsar acompanhando a batida do meu coração e, por um instante, me concentro em minhas pulsações pela mera necessidade de pensar em algo que não seja a dor em meus pulsos cada vez que me mexo, as cordas apertadas assando a carne ao mínimo movimento. Algo que não seja o sabor metálico do sangue em minha boca, causado pelo corte em meu lábio inferior.

Tum. Tum. Tum.

Conto debilmente cada batida, falhando de forma miserável em distrair meus pensamentos atormentados.

Pulo na cadeira quando a porta é aberta de uma vez, a fisgada em meus pulsos trazendo lágrimas aos meus olhos e fazendo-me arrepender pelo movimento brusco. Abro meus olhos devagar, não só pelo incômodo que a luz causa em minhas retinas, mas pelo pavor mórbido que tenho de saber quem está entrando.

— Doce Lissy... – a voz de Cooper, o tom que eu aprendi a odiar, chega aos meus ouvidos assim que meu olhar o encontra, num verdadeiro suplício audiovisual e, ainda assim, me limito a encará-lo, sem forças. – Por que você insiste em tornar as coisas difíceis para nós dois? – ele diz, manhosamente, se aproximando e se agachando à minha frente. – Acha que não dói em mim vê-la desse jeito? – sua mão fria toca meu rosto e me retraio instintivamente, com asco de seu toque. – Entenda que jamais desejei machucá-la. – ele puxa meu rosto, segurando meu queixo e forçando-me a nivelar nossos olhares. – Jamais quis esse inferno para você, querida.... – seus olhos se nublam por um momento de uma forma que, alguns meses atrás, me faria crer que estava sendo sincero. Mas agora, o único amor que Cooper poderia sentir por mim é, no mínimo, doentio.

— Então, deixe-me ir... – minha voz rouca e arrastada arranha minha garganta e dói em meus ouvidos pelo tom semimorto.

— Eu não posso, Felicity! – ele fecha os olhos, levemente irritado, antes de voltar a me fitar. – Você não entende? Damien me mataria, mataria a todos nós! Percebe que éramos apenas uma gangue qualquer, mas com você... Meu amor, você nos tornou valiosos para ele e ele sequer sabe da sua existência... – ele raciocina sofregamente. – Ele não sabe que envolvi mais alguém nessa, que pus uma testemunha em nosso meio e, se você não me ajudar e ele descobri-la, sua primeira ação será eliminá-la e a mim também.

— Como pôde fazer isso conosco? – minha voz falha, um bolo se formando em minha garganta. – Fazer isso comigo? – sinto uma lágrima descer por minha bochecha. – Não vê que me destruiu?

— Então me ajude só mais essa vez, princesa. – ele toca meu rosto numa carícia lenta e nauseante. – Com este dinheiro sumiremos no mapa, eu e você! – dá um sorriso insano. – E poderemos ser felizes outra vez...

— Felizes?! – tusso após minha curta risada amarga. – Eu e você?! Nem em mil vidas consecutivas eu seria feliz ao seu lado. – arquejo e assisto seu olhar inflamar antes que sua mão alcance meu pescoço num aperto brusco. – Eu te odeio, Cooper, entenda isso de uma vez... – encontro forças para continuar apesar de seu olhar ensandecido. – Nunca te ajudaria a fazer merda nenhuma!

— Ninguém pode dizer que eu não tentei... – ele dá de ombros, friamente, largando-me e deixando-me respirar. O vejo tirar o comunicador do cinto e levá-lo à boca. – Tragam-na! – ordena.

Sinto meu coração acelerar bruscamente antes mesmo que entenda do que se trata. Mas, ao observar a porta ser aberta e ver a mulher sendo arrastada pelos dois brutamontes de Cooper, desabo de vez.

Numa atitude desesperada, caio de joelhos no chão, derrubando a cadeira comigo e não dando a mínima para a dor lancinante em meus pulsos. Entre as lágrimas de meu choro convulsivo, faço aquilo que jamais fiz durante meus 5 meses de cativeiro: imploro.

— Por favor... – soluço quando forçam-na a ajoelhar na minha frente, puxando seus cabelos para fazê-la manter a cabeça erguida e encostando o cano da arma em sua têmpora. – Deixe-a ir por f-favor! – esperneio e me contorço, o olhar sofrido dela preso em meus hematomas e cortes.

— Minha garotinha... O que fizeram com você? – ela estica o braço, tocando meu olho inchado e que sei estar roxo apesar de não ter nenhum espelho. Seu toque dura pouco, pois logo ela é puxada com violência de perto de mim e arrastada para fora outra vez.

— Maaaaaaãe! – berro, a porta batendo com força e minha voz se quebrando em vários soluços partidos.

— E então, querida? Quando você quiser... – Cooper me olha, frio, erguendo minha cadeira e a mim. – Só não demore muito, pois detestaria encurtar a vida de minha sogra por sua causa...

A dor que sinto em meu peito quando ele beija minha testa cinicamente me faz ter certeza de que finalmente rasgaram minha alma.

~*~

Ergo meu tronco de uma vez, encostando-me à cabeceira da cama e percebendo meu corpo gelado de pavor com as lembranças vívidas de meu pesadelo.

Fazia um bom tempo, desde minha primeira ida à fazenda dos Queen, aliás, que eu não tinha esse sonho recorrente, as memórias de meu último dia de cativeiro ainda formigando em minha pele à medida que ligo o abajur.

Não sei ao certo o que causou esse flashback, se a chuva que cai de maneira insistente do lado de fora, ou a ausência de Oliver ao meu lado nos lençóis, o que só agora percebi.

Franzo o cenho, puxando o edredom para cobrir meus seios e tentando entender o que vejo, quando um papel camurça desliza pelas dobras do tecido. Não evito um sorriso leve de satisfação ao pegá-lo e acariciar o papel dobrado, antes de abrir e ler o bilhete que Oliver deixou, suas letras finas e inclinadas contra o fundo amarelo pálido.

"Desculpe ter saído enquanto você dormia, mas ocorreu um imprevisto e tive que fazê-lo. Espero que me perdoe por não tê-la acordado para me despedir, mas acredite: não consegui a coragem necessária para perturbar seu sono, uma vez que tenho um fraco pela simples imagem de você dormindo. (Nova proteção de tela, inclusive.)

Mas quero que saiba que sou muito grato por ontem à noite, por seu ouvido atento e seu apoio incondicional. Nem imagina o quanto significou pra mim dividir um pouco essa carga do meu passado com você e espero que tenha fé de que um dia lhe contarei tudo. Por agora, obrigado! Principalmente pela preocupação, mas também por mais uma vez me ceder seu corpo e me deixar me perder em seus braços como o náufrago que sou.

Amo você, cada pedacinho seu! Nunca duvide disso, okay?

Com mil beijos sonolentos,

Oliver Q.

Mordo o canto da boca tentando conter o sorriso idiota que se alastrou por minha face, mas é inútil. Instintivamente, sinto minha mão deslizar até minha barriga.

Não consegui contar a ele sobre minha gravidez, não quando ele enfrentava seus demônios. A simples ideia de que Oliver fora cruelmente torturado naquela ilha infernal gela meus ossos como só o medo de Cooper foi capaz. Sei que ele não me contou tudo, ele mesmo me disse isso, mas é bom é bom saber que não há mais tantos segredos entre nós. De qualquer forma, acabamos fazendo o de sempre e nos perdendo um no outro para esquecer nossos traumas.

Sexo entre nós nunca é apenas sexo, nós dois sabemos isso e acho que, por essa razão, nunca é igual. Na verdade, como eu disse uma vez a ele: Encontramos a nós mesmos um no outro.

A chuva se resume agora a uma fina garoa e resolvo me levantar. Observo o relógio digital na mesinha de cabeceira, enquanto tateio o chão em busca de meu robe, encontrando-o e vestindo-o. São 05h27min da manhã.

Caminho até a sala e sento no sofá, pegando o controle e ligando a televisão. Ponho em minha conta da Netflix e resolvo assistir os últimos episódios da 1ª temporada de Scorpion**, que comecei a assistir recentemente, graças ao fato de estar desempregada. Reclino-me sobre as almofadas, abraçando uma delas e fico ali até que caio no sono outra vez.

**Série sobre a vida do gênio Walter O’Brien ~amo demais~

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha compensado a demora!
Aguardo o feedback d vcs, meninas!
P.S.: Estou pensando em postar uma nova fic, o q acham?
Xero ♥



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