Um ano atrás

— Oi, Raio de Sol.

Me viro e ao meu lado está o loiro de olhos azuis com um sorriso presunçoso. Olho para ele de cima a baixo. Dessa vez, usa sapatos chiques, jeans e camiseta sem mangas. Esse visual também não se encaixa muito no padrão dos outros fãs do meu pai, mas fica bem nele. Parece o tipo de cara que ficaria lindo até mesmo vestido com um saco de batatas.

— Você está me perseguindo?

— Talvez.

Olho para o palco atrás de mim. A banda do papai logo vai entrar e começar a tocar, mas por enquanto dá pra falar e ser ouvido mesmo que seja gritando. Agora... o que o rapaz das Havaianas está fazendo aqui? Nós tínhamos tocado em Nova York ontem e agora ele aparece noutro show em Nova Jersey? Eu sabia que meu pai podia ter certos fãs obcecados, então logo estranhei.

— Como você se chama? – perguntei, gritando para ser ouvida.

— A...dam. Adam.

— Prazer, Adam!

— O prazer é todo meu!

Depois dessa noite, Adam continuou aparecendo em todos os shows, como se estivesse acompanhando a turnê. Papai tinha uns cinco ou dez fãs que faziam o mesmo, mas eles não eram VIPs como Adam.

Ele sempre ficava comigo na área mais VIP de todas, e eu gostava de sua companhia. Era bom ter um amigo no meio de toda aquela correria que era uma turnê.

Presente

Faço um rabo-de-cavalo no meu cabelo, agora roxo novamente, e vou para os estábulos. Para a minha surpresa, encontro Trent lá. Aos poucos os semideuses notam a minha presença e me observam curiosos.

— Meu nome é Tracy e eu serei a professora de vocês. – falo com a expressão séria. - Escolham seus pégasos e eu vou ensinar a como sela-los corretamente.

Só que ninguém se meche. Continuam me olhando como se eu fosse um E.T.

— Você é filha de... Panagýos?

Esse é um dos nomes de Despina, significa “Senhora do Frio”. As pessoas tinham tanto medo dela que sequer pronunciavam seu nome de verdade.

Encaro a garota que fez a pergunta. É a mesma filha de Afrodite que veio falar comigo quando cheguei.

— Sou. – todos ficam em silêncio. – Se alguém tiver mais alguma pergunta, esse é o momento.

Eles olham uns para os outros como se quisessem dizer algo, mas não dizem.

— Já que ninguém vai perguntar nada, podem começar a escolher os...

— Por que você voltou?

Por um momento penso que é Trent. Mas não. A multidão se abre e um adolescente sai do meio dela. Um adolescente que eu não tinha visto até agora. Estava escondido. Ele tem cabelo preto naquele corte meio Beatles modernizado, olhos castanhos escuros e pele pálida, mais pálida que a minha.

— Essa é uma pergunta pessoal, Liam. – respondo com a voz suave. – Por favor, vá escolher seu pégaso.

E ele obedece, mas não sem antes me lançar um olhar triste que partiria meu coração se não tivéssemos terminado daquele jeito.

Desvio o olhar dele e percebo a filha de Afrodite olhando dele para mim, confusa. Ergo as sobrancelhas para ela em desafio.

— Não sei seu nome, mas se não andar logo não vai sobrar pégaso pra você.

Ela me dá as costas e começa a andar, mas então se vira e diz irritada:

— É Juliet. Meu nome é Juliet.

Quase digo “foda-se”, mas me contenho.

Depois que todos já escolheram seus pégasos, chamo um para fazer uma demonstração.

— Odeio isso. — ele reclamou enquanto eu colocava a sela nele.

— Eu também não gosto de ter que fazer isso, mas tenho que ensinar a eles. Ah, não relincha pra mim não! Nós iremos voar sem selas e você vai ganhar um monte de torrões de açu...

— Você fala com o pégaso?! – Juliet indaga, a boca entreaberta.

Suspiro e olho para ela.

— O irmão gêmeo da minha mãe é o cavalo mais rápido do mundo e o próprio Pégaso é meio irmão deles por parte de Poseidon, meu avô, que alias é o criador dos cavalos.

Juliet me dá um olhar arrogante e cruza os braços.

— Meu avô é o próprio Urano, deus primordial dos céus e pai dos titãs mais poderosos.

— Poseidon também comeu Gaia e não perdeu tudo por isso. Inclusive, não foi castrado pelos próprios filhos!

Um relâmpago corta o céu lá fora, depois ouvimos o trovão e eu me arrepio. Falei demais outra vez. Merda. Por que eu sempre esqueço? Em dois segundos insultei dois deuses primordiais. Agora todo mundo está me olhando como se eu fosse algum tipo de maluca.

— Menina — diz o pégaso. – Você não tem medo não?

— Tenho. Claro que eu tenho. Por que você não cala a boca e deixa eu terminar de pôr essa maldita sela em você?!

Depois disso, todo mundo passou a obedecer as minhas ordens sem me desafiar e, para a minha surpresa, quando a aula acabou, Juliet veio falar comigo.

— Você é boa com qual arma?

— Arco e flecha, espada... Mas geralmente prefiro só uma adaga. Por quê?

— Quero você na minha equipe de captura a bandeira. Hoje.

Da última vez que joguei isso meu time massacrou o chalé de Deméter. Isso foi uma noite antes de eu deixar o Acampamento.

— Times?

— Afrodite e Ares contra Hades, Atena e Deméter.

— Tô dentro.

Um ano atrás. De novo.

— Acho que estou trocando o dia pela noite... - comentei distraída. - Obrigada por me acompanhar até aqui.

— Eu gosto da sua companhia... Só que não dá pra curtir muito com o seu pai gritando no meu ouvido pelas caixas de som.

Já fazia um mês e meio desde que nos conhecemos. Ele estava em todos os shows, sempre me fazendo companhia. E depois me acompanhava até o meu quarto no hotel junto com o segurança.

— E o que você sugere? - pergunto.

Adam sorri e ergue dois ingressos na minha frente.

— Não. Acredito.

Sem pensar muito, atiro meus braços em volta dele e levanto os pés enquanto ele me gira.

— Você é maluco! – eu ria. – Eu te amo!

— Mesmo? – ele me põe no chão, sorrindo.

 É quatro da manhã e nós ainda temos energia. Eu não consigo parar de sorrir.

— Como amigo...

O sorriso dele parece murchar. Tenho vontade de me jogar em seus braços novamente e enche-lo de beijos. Só que... Calma. Apesar de tudo, ele ainda pode ser um fã obcecado pelo meu pai.

— Mas... Mas vai ser praticamente a mesma coisa, a única coisa que vai mudar é que será o Deryck Whibley gritando pelas caixas de som e não o meu pai.

— Ah é... - ele dá um sorriso fraco. - Mas você tinha dito que é a sua banda favorita, então...

— Eu amei!

Me atiro sobre ele novamente e ficamos abraçados. É bom, muito bom. Tão bom que ficamos assim até o segurança que nos seguia de longe nos alcançar e soltar um pigarro pra chamar a minha atenção.