Uma Semideusa Inadequada escrita por Geek Apaixonada


Capítulo 4
Memórias


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Um ano atrás

 

O show era em Nova York e eu estava no camarim da banda, jogada no sofá com uma revista da Rolling Stone sobre o Green Day. Essa era a hora em que a galera VIP entrava para conhecer a banda e Apolo foi o primeiro. Ele usava uma camisa vermelha com o desenho de um sol imenso, bermuda e Havaianas. Não era bem a roupa que os fãs costumavam usar pra ir aos shows do meu pai, mas ele conseguia fazer aquele visual parecer um luxo mesmo num show de rock.

— Eu gostei da música de vocês, mas senti que vocês precisam de um conselho. Suas rimas são péssimas! E...

Ele parou de falar, pousando os olhos em mim. Eu abaixei a revista da Rolling Stone e o encarei como quem diz “O que? O que você tá olhando?”. Mas ele não parava de me encarar e eu comecei a ficar incomodada. O rapaz de Havaianas (como eu o chamava em pensamento) era muito bonito. Tinha cabelo dourado, olhos azuis como o céu e dentes extremamente brancos e perfeitos. Além disso, ele parecia ter entre dezessete e dezoito anos.

— Hum-hum... — papai pigarreou. – Essa é minha filha, Tracy.

Apolo piscou pra mim. - Um raio de sol.

Minhas bochechas ficaram subitamente vermelhas e papai ficou subitamente irritado.

— Está mesmo dando em cima da minha filha na minha frente?!

— Estou, e daí?

Ele encarou meu pai e sorriu de um jeito que dizia “Não enche, cara”. Papai abriu a boca, mas eu o interrompi.

— Foi só um elogio, pai. Não exagera. - revirei os olhos e dei um quase sorriso para Apolo. - Aliás, obrigada.

— Não há de quê, Raio de Sol.

E largando a revista em cima do sofá, me levantei e fui ao banheiro. Me demorei lá até ter certeza que o rapaz das Havaianas tinha ido embora, então voltei.

Pensei que nunca mais fosse voltar a vê-lo, e esse pensamento não me incomodava. Eu não o conhecia.

Presente

Estamos sentadas na areia, sentindo frio com o mar agitado a nossa frente.

— Não pensei que algum dia estaríamos aqui de novo. Juntas.

— Nem eu. – diz Wendy, amarga.

— Bem, eu pensei. – Lyra diz alegre. – Como foram os últimos dois anos, Tracy?

— Internatos, shows. Internatos, shows.

Não vou contar a elas sobre Apolo nem a pau. Posso ter ficado dois anos fora, mas ainda conheço Wendy e Lyra bem o suficiente pra saber o que pensam sobre semideusas que se envolvem com os deuses. Não quero seus julgamentos.

— Deve ter sido incrível. - Lyra comentou sonhadoramente. – Ficar fora do Acampamento, no mundo real... E ainda poder ir aos shows de rock!

E sair com o deus grego das profecias...

— É, muito divertido. – diz Wendy, amarga. – Você disse que voltaria no verão.

A culpa me atinge como um balde de água fria.

— Eu pretendia vir, mas o meu pai queria que eu fosse com ele na turnê enquanto eu estava de férias, pra passarmos mais tempo juntos... Eu não ia recusar. Vocês sabem que foi por isso que eu saí daqui.

Ficamos em silêncio depois disso. Sei que Wendy não me perdoou por não ter voltado. Deve ter acontecido algo de bem terrível com ela enquanto estive fora. Há algo que ela não está me contando, mas não me importa muito o que quer que seja.

— E porque você retornou agora? – ela pergunta.

Dou um sorriso e minto.

— Cansei de toda aquela frescurada. Tive saudades.

 

❅❅❅

 

— Senti falta do seu chá. – digo a Quíron. – Você sabe que eu prefiro café, mas o seu chá é exceção, mestre Quíron.

— Obrigado. – ele beberica sua xícara e pousa ela sob a mesa. – Mas se eu a conheço bem, Tracy, você adora enrolar as pessoas e trocar de assunto.

Dou um sorriso amarelo. Ele me conhece bem demais...

— Mas eu realmente senti falta do seu chá.

— Acredito em você, agora me conte sua história.

— Só vou terminar o chá... Espere um pouco.

Quíron não faz objeção, embora eu esteja fazendo hora com a cara dele e ele saiba disso. Por fim ele suspira e começa a falar.

— Você foi embora daqui com quinze anos para ir morar com seu pai.

— É, bem... - pouso minha xícara na mesa. - Morei com ele por uns meses enquanto ele estava de férias, depois começou uma turnê e ele me mandou pra um colégio interno. O melhor da região, se você quer saber. É claro que eu fui expulsa, mas sempre havia outros internatos. Às vezes ele até conseguia me ver nos finais de semana, indo me buscar. E sempre passávamos nossas férias juntos.

— Então você passou os últimos dois anos em internatos enquanto seu pai fazia turnês, sabendo que poderia vir pra cá?

Dou de ombros e olho pra minha xícara vazia.

— Era o único jeito de ficar próxima dele. Não me arrependo da minha escolha.

Quíron franze as sobrancelhas.

— E por que decidiu voltar? Não me entenda mal, você sabe que é muito bem-vinda aqui, mas...

— Eu fugi.

— O que?

— Eu fugi do último internato.

— E o que aconteceu pra você fazer isso?

Dou de ombros novamente, olhando para a luz do sol que entrava pela janela. Evitando encara-lo a todo custo.

— Deu merda e eu senti falta daqui. Não queria mais aquilo lá.

Não é completamente mentira. Eu apenas não esclareci que merda tinha sido.

— Criança...

— Não sou mais uma criança, Quíron.

— Você sempre será minha criança, Tracy. Eu a vi crescer, retornar de sua primeira missão...

Estremeço e fecho os olhos. Quíron para de falar e suspira. Odeio quando ele suspira. Lembrou-se que a minha primeira missão é um assunto delicado, por muitos motivos, e que é sempre doloroso falar dela...

— O fato é que eu a conheço. Sei que aconteceu algo mais.

Abro os olhos, subitamente cheios de lágrimas.

"Onde você está?", falei pelo orelhão do internado. "Por que você não veio me buscar?"

"Tracy?"

"É, Tracy", respondi emburrada. "Qual é a desculpa dessa vez?"

"Mark?", chamou uma voz de mulher. "Com quem você está falando?"

"Com a minha filha... Tracy? Tracy?!"

Desliguei o telefone e segurei as lágrimas de raiva que queriam sair. Respirei fundo, voltei para o quarto, fiz uma mochila básica e fugi para o único refúgio que conheço: O Acampamento Meio-Sangue.

— Briguei com meu pai.

— E não quer me contar o motivo?

— Não. Posso ir agora?

Ele suspira de novo e me entrega uma grade de horários enquanto relembra minhas funções de conselheira-chefe.

 


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Notas finais do capítulo

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