Valentina acordou confusa e observou a sua volta, onde estava? As lembranças do que havia ocorrido voltaram-lhe a mente quando viu Ethan deitado ao seu lado em uma posição engraçada, mas ela sentiu vontade de chorar novamente. Sentou-se na cama e então avistou a janela, o lado de fora escuro, já estava à noite? Apalpou o short em busca de seu celular e então o encontrou na cama, era quase nove da noite e havia várias mensagens e ligações perdidas, as mensagens de Alice e os telefonemas de sua mãe, Vale resolveu ignorar os dois.

— Ethan, Ethan... — a garota chamou, tentando acordá-lo. — Ethan! — chamou um pouco mais alto e o sacudiu de leve, o mesmo abriu os olhos.

— Oi Vale. — ele disse simples, como se não lembrasse do acontecido.

— Só quero te avisar que estou indo, está tarde.

— Que horas são? — perguntou confuso, se sentando na cama.

— Quase nove da noite, minha mãe deve estar louca. — disse mais para si mesma do que para o menino. — Obrigada por tudo Ethan, e desculpe por ter aparecido do nada.

— Ai meu Deus, Vale! Eu tinha me esquecido, desculpe. — levantou-se num pulo.

— Mas eu nem te contei nada...

— Outras pessoas contaram, você sabe como as notícias correm.

— É, sei.

— Desculpa, tá? Eu não sabia quando você chegou e...

— Não tem problema Ethan, obrigada por me acolher, mas agora eu tenho que ir. — a menina o cortou, se levantando.

— Vou te levar.

— Não precisa, você já fez demais por mim hoje.

— Claro que precisa, está tarde e você não pode sair por aí sozinha.

— Ah, por favor, Ethan, não precisa disso.

— Precisa sim, vamos.

— Argh, então vamos. — bufou e eles saíram do quarto, descendo a escada em seguida. — Nós podemos passar em uma farmácia no caminho?

— Claro, mas pra que Vale? — indagou, fechando a porta de casa quando já estavam do lado de fora.

— Quero me pesar.

— Por quê?

— Por nada ué.

— Não vai me dizer que acredita no que aquelas pessoas falam.

— Lógico que não, só quero saber. — tentou soar convincente.

— O.k. então. — seguiram o rumo e pararam na primeira farmácia que surgiu na avenida pouco movimentada.

— Não precisa entrar comigo, volto rápido. — ela disse e Ethan assentiu, a menina não gostava que os outros soubessem seu peso, era vergonhoso para a própria. Entrou no estabelecimento e foi até a balança, respirou fundo e subiu na mesma com receio. Suspirou ao ver o número que surgiu e segurou as lágrimas, não era o que desejava, 48 quilos não estava bom, dois quilos a menos era muito pouco, queria muito menos. Na verdade não tinha uma meta estabelecida, Valentina só sabia que queria sempre menos, quanto menor o número no visor, melhor. Saiu rapidamente daquele lugar antes que se descontrolasse e encontrou Ethan na porta.

— Demorou. — ele disse.

— Desculpe.

— Não foi nada, só fiquei preocupado.

— Preocupado? Eu estava numa farmácia. — Vale falou risonha, passando pela porta.

— Eu me preocupo ué... — respondeu, sorrindo tímido. Chegaram na casa da garota pouco tempo depois e Ethan se entristeceu.

— Preciso entrar... Obrigada Eth. — a menina disse, o abraçando.

— Não foi nada Vale, desculpe não te ajudar. — ele disse, acariciando suas costas.

— Não me ajudar? Você me ajudou muito! — desfez o abraço.

— Que bom Vale, então entre antes que a sua mãe enlouqueça. — beijou a bochecha dela.

— Tudo bem, tchau. — acenou enquanto o garoto se afastava. Virou-se para entrar em casa e deu de cara com Laura, que esperava a filha parada na porta.

— Onde estava Valentina? — ela perguntou séria.

— Pergunte a sua querida Heloísa. — respondeu rude, entrando.

— Me responda direito Valentina, sou sua mãe. — alterou a voz e entrou, batendo a porta.

— Estou dizendo, pergunte a Heloísa. Ah não, ela não sabe por que não se importa. — continuou irônica.

— Estava na casa daquele garoto? Quem é ele? — indagou.

— Não importa.

— Responda! — ordenou, elevando o tom outra vez.

— Sim, eu estava na casa dele. — falou contra sua vontade.

— Fazendo o quê? Ele é seu namorado?

— Não.

— Tem certeza? — seguiu insistente.

— Eu não posso ter amigos homens? — questionou brava.

— Você não tem amigos.

— Pois é, ele é o único e nada mais. — retrucou e subiu as escadas batendo os pés.

— Você não pode falar comigo assim, garota! — gritou e a menina deu de ombros enquanto terminava de subir.

Vale tomou um banho um pouco demorado para pensar um pouco e tentar organizar as ideias, não deu muito certo. Saiu do banheiro já vestida e sentindo-se mal, pegou seu notebook e abriu uma aba, pesquisando “Pró-Ana” em seguida, abriu a primeira página que apareceu e começou a observar o blog a sua frente, fazia tempo que não entrava em um daqueles, fazia tempo que não entrava em nenhum.

Olhou algumas postagens e percebeu que não estava dentro dos “padrões” do site, entrou na aba de “Thinspirations” e se sentiu mais triste ainda, aquelas mulheres eram lindas e magras, coisa que a mesma nunca seria. Deixou algumas lágrimas caírem, porém foram poucas, não queria se sentir mais fraca do que já era, mais fraca do que se sentia diariamente.

Resolveu deixar uma pergunta na página, uma pergunta muito importante, então digitou e em seguida enviou, esperando ansiosa por uma resposta.

“Qual é o peso Ana para 1,58?” — ficou encarando o questionamento por alguns minutos até receber seu aguardado retorno.

“O peso Ana para 1,58 é 38 quilos.” — uma das administradoras do blog a respondeu.

“E como faço para alcançar isso o mais rápido possível?” — continuou indagando.

“Depende do seu organismo. Quanto você pesa agora?”

“Quarenta e oito.”

“Nossa! E só tem 1,58 de altura? Está precisando mesmo perder uns quilinhos.”

“É, eu sei.”

“Eu também preciso perder dez quilos, o que acha de me adicionar em alguma outra rede social para corrermos atrás das nossas metas juntas?”

“Acho ótimo! Você me ajudaria?”

“Claro, é pra isso que estou aqui.”

“Então me passa seu e-mail, vou te adicionar no facebook.”

E assim foi feito, Valentina adicionou a pessoa desconhecida, que se chamava Clarisse e continuaram a conversar. Vale descobriu que a garota era anoréxica há bastante tempo e sabia muitas técnicas “boas”, que a mesma acabou aprendendo também. Sua nova amiga media 1,65 e pesava 45,00 quilos, alguns ossos estavam aparentes, porém ela queria chegar a pelo menos 35 quilos para poder ver mais alguns e prometeu a Vale que a ajudaria a emagrecer também, a menina ficou alegre por finalmente encontrar alguém que realmente a entendesse e ajudasse.

A primeira ordem de sua amiga foi que ela miasse mesmo que não tivesse comido e continuasse assim pelo maior tempo possível, juntas elas chegariam à perfeição, juntas chegariam ao fundo do poço e encontrariam a morte, mas ao menos morreriam bonitas e isso era tudo que Valentina queria.