Os Algoritmos de Anthony Gregory escrita por MadScientist03


Capítulo 3
Neurocomputador


Notas iniciais do capítulo

Agradecimentos ao meu amigo Matheus Fernandez e à minha família que me apoiaram no projeto e continuam apoiando. Boa leitura!



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Por volta das 15 horas, John estava em seu dormitório jogando no computador de mesa. O ventilador de teto estava ligado para amenizar a temperatura elevada do quarto. A janela estava aberta deixando entrar uma leve brisa. O som do hélice girando e os cliques do mouse e do teclado eram os únicos sons que enchiam o cômodo. O uniforme dele estava jogado sobre a cama. Ele estava descalço vestindo uma regata e um short curto. Suas pernas peludas estavam cruzadas em cima da cadeira em que estava sentado.

A porta começa a ranger enquanto era inclinada para dentro do cômodo. John olhou para ela sem sair do lugar. Era Bernardo entrando com a mochila nas costas e com a apostila sob o braço. Ben ainda estava uniformizado.

― Cheguei! ― disse Bernardo batendo a porta.

John voltou sua atenção para o monitor. Bernardo larga sua mochila e a apostila sobre a cama. Ficando em pé no meio do quarto, embaixo do ventilador, ele desabotoa a camisa e a enfia em uma gaveta. Ben segue na direção de Dias, que continuava jogando, e se aproxima por trás de seu ombro direito.

― Primeiro você atordoa com o congelamento ― Bernardo apontava o indicador para a tela do computador. ― Depois lança a skill de dano contínuo. Depois a skill que o arremessa para trás. E então ataca normalmente. Repete o processo até matar ele.

― Obrigado ― respondeu secamente. ― Onde estava?

― Por aí ― Bernardo despia seus sapatos e suas calças, e em seguida vestiu uma bermuda de tecido leve. A barriga do rapaz, branca e cabeluda, não foi coberta por nenhum tecido. Seu antebraço moreno por causa do sol era destaque em seu corpo. ― Quando vai começar a trabalhar no seu projeto? ― perguntou enquanto sentava na cama ao lado da sua mochila.

― Não sei. Não tive tempo de ler, ainda.

― Eu o li. Li três vezes. Aquele texto tem uma linguagem um pouco rebuscada. Vou ser franco, fiquei interessado!

― Por que não entra para o laboratório? ― John permanecia como os olhos no monitor.

― Não quer dizer que vou me interessar por qualquer coisa que me mandarem fazer. Mas esse projeto, em especial, é fantástico! E não tenho tempo para atividades extracurriculares.

― Você só fica no computador o dia todo ― John fechava o jogo e desligava o computador. Ele se dirigiu até a própria cama e sentou nela com as pernas cruzadas. ― Pode fazer um resumo do projeto? Estou com preguiça de ler.

Bernardo abriu a mochila e puxou a apostila.

― “Neurocomputador” ― começou. ― Anthony começa comparando as potencialidades de uma máquina com as potencialidades de um ser humano. Ele toma como exemplo uma calculadora científica. Diz que ela é capaz de calcular grandes expressões em uma fração de segundo. Mas uma calculadora é incapaz de aplicar os resultados em alguma coisa prática. Foi quando ele pensou em pegar o melhor do computador e o melhor do cérebro humano, e transformar em uma mente perfeita.

― Isso não seria Inteligência Artificial?

― Não. Na verdade, o Neurocomputador não é nada mais do que seu próprio cérebro, porém com um comportamento de uma máquina ― Bernardo levou as mãos à boca. ― Pense que você quer ler um determinado livro em seu computador. Basta acessar a internet e fazer download do arquivo de texto, e em instantes ele está disponível no disco rígido da máquina. Agora pense essa mesma lógica com o seu cérebro. A prova de História é amanhã e você não leu os textos que ele indicou para fazer a avaliação. Nesse caso, bastaria a você fazer download dos textos e em instantes aprenderia as informações deles. Não teria que ler nada.

John olhava fixamente para Ben. Ouvir os detalhes fez seu coração disparar, pois a ideia do Neurocomputador parecia ser genial. Embora não expressasse de nenhuma maneira, havia ficado excitado com o projeto. O rapaz não se conteve em perguntar:

― E como vamos fazer isso?

Bernardo pigarreou.

― Primeiro precisamos construir o computador primário. Este será o elo entre seu cérebro e os arquivos que serão enviados. Infelizmente não há como fazer um download direto da internet para sua mente ― ele ajeitou os óculos com o indicador. ― A apostila contêm algumas orientações para montar o computador primário.

John lembrou que Kalina gostava de engenharia. Ele sempre gostou de fazer todos os seus trabalhos sozinho, mas a ajuda dela parecia ser de grande utilidade naquele momento.

― E depois? ― perguntou mostrando um ligeiro entusiasmo.

― Bom, é nesse ponto que começamos a ter um problema. Pelo que descobri, os projetos do diário de Anthony Gregory são todos inacabados ― disse coçando seus cachos volumosos.

― Disso eu sei.

― O computador primário é responsável apenas por fazer a transferência de dados. Ele não é capaz de fazer as modificações necessárias no seu cérebro para que possamos fazer a gestão de dados, tal como em um computador. Essa modificação é fundamental. É necessária para que você se torne meio humano, meio máquina.

―Victor disse que eu teria que perder minha humanidade ― John esticou as pernas e se inclinou para deitar na cama.

― O Neurocomputador, assim como o hominontare, é um projeto que modifica o corpo humano permanentemente. Pessoas submetidas a essas experiências são consideradas sobre-humanos ― ainda com a mochila aberta, Bernardo puxou dela seu celular. ― Para fazermos as modificações, precisamos instalar no seu cérebro um programa que é muito complicado, na minha opinião. Mas ele fará exatamente o que precisamos. Uma vez instalado, podemos fazer o gerenciamento de dados na sua mente.

Bernardo desbloqueou a tela de seu celular e o entregou para John. O navegador estava aberto em uma página na internet. Pela estrutura parecia ser um fórum.

― “@JAG” ― John leu o título no topo da página.

― Eu estava pesquisando sobre Anthony e acabei caindo nesse fórum. É um espaço para discutir sobre os projetos do diário dele.

― Interessante ― ele desenhava com o dedo uma linha vertical na tela do aparelho. ― Não imaginei que existisse algo assim.

― Agora acesse o tópico sobre o Neurocomputador.

John o fez. O tópico pedia instruções para fazer o Neurocomputador funcionar. Havia apenas uma resposta, postada quase dois anos depois. Nela estava escrito os detalhes que explicavam o que deveria ser feito após a construção do computador primário. Seu autor possuía o nick de “h@mister42”.

― Foi aí que descobri sobre o programa para gerenciar os arquivos ― disse Ben bocejando e levando a mão à boca. ― Ele explica tudo que precisamos fazer. Até mesmo disponibiliza os links para download dos programas necessários.

― Resuma o que ele diz! ― John repousou o celular do seu lado.

― Além do que eu já disse, há um segundo programa que serve como emulador. Ele é necessário para instalar programas que foram feitos para computador. Leitor de texto, calculadora, reprodutor de mídia. E também programas que eu mesmo posso criar.

― Você e H@mster42 fizeram todo o meu trabalho ― John levantou da cama esticando sua camisa. ― Me sinto um pouco culpado por isso.

― As pessoas precisam de ajuda, algumas vezes. Ninguém pode fazer tudo sozinho.

John pegou o celular do amigo e o devolveu para Bernardo.

― Quando vamos começar a trabalhar? ― Dias perguntou cruzando seus braços que, assim como suas pernas, eram mais morenos que o resto do corpo.

― O mais breve possível! O laboratório deve ter material para montar o computador primário, então você poderá montá-lo lá ― ele ajustou os óculos. ― Eu farei download dos programas que o hamster disponibilizou. Também vou montar o programa de caratê para ficar pronto em até dois meses.

― Caratê? ― John questionou achando que tivesse perdido alguma informação.

― Pela teoria do Neurocomputador, é possível você aprender artes marcais sem necessidade de treinamento. Por isso achei que era uma boa ideia fazer você aprender caratê e testar o experimento na competição interclasses, no final de Junho. Quero dizer, se você quiser, é claro!

― Por mim, tudo bem! ― John apanhou a apostila que estava sobre a cama.

― Mas o Neurocomputador não pode te dar músculos. Nem reflexos. Ou velocidade. Ele não melhora suas capacidades físicas ― Ben fez um movimento vertical no ar com o indicador apontando para John. ― Vai ter que dar um jeito nisso aí por conta própria.

John olhou para baixo, visualizando seu corpo magricela e uma barriga fazendo um ligeiro volume na camisa.

― Eu dou meu jeito.

― Tem dois meses para dar seu jeito! ― Ben se virou e sentou no computador ― E eu também preciso começar a trabalhar.

Dias deitou na cama e começou a ler a apostila. O vocabulário não era fácil. Ficou ainda mais difícil quando a parte teórica havia acabado e entrado nas orientações da construção do computador primário. Mais de uma vez John precisou pesquisar significado de palavras na internet. Leu o projeto duas vezes. Leu três vezes. Continuou lendo.

Ele acessou o @JAG para ver as instruções de H@master42. Não podia deixar de pensar que o nome era extremamente sem graça. Mas talvez ele fosse o tipo que tivesse um animal desses como bicho de estimação.

O cenário sonoro do quarto não havia mudado. O hélice do ventilador e cliques do computador. Bernardo ficou no computador até às 21 horas.

― Boa noite! Apague a luz antes de dormir ― disse para John enquanto deitava na cama.

Antes de dormir, Dias entrou em contato com H@mster42 através do e-mail que estava disponível em seu perfil. Ele explicou sua situação e pediu alguns conselhos para a execução do trabalho.

Era aproximadamente 6h30min. Bernardo vestia seu uniforme, o mesmo que usara no dia anterior. Ele abotoava os botões da camisa enquanto John estava coberto até a cabeça com o lençol deitado na cama. A temperatura havia diminuído durante a noite. Ben ouviu batidas vindo da porta. Ele fechou o último botão da camisa e foi até a entrada, girando a maçaneta.

― Bom dia! ― dizia a voz tímida e inaudível de Beatriz, que estava parada em frente ao quarto 314. Estava vestida com o uniforme do colégio e com a mochila nas costas.

― Oi! ― disse Ben um pouco sem jeito.

― Poderia chamar o John para mim, por favor?

Bernardo demorou alguns segundos para responder.

― Espere um minuto!

― Obrigada!

Bernardo encostou a porta e se aproximou da cama do amigo. Colocou a mão sobre o que parecia ser o ombro de John e balançou ligeiramente.

― Oi, John! ― sussurrou. ― Acorda! Beatriz quer falar contigo.

John removeu o lençol da cabeça. Seus cabelos ressecados estavam mais rebeldes que o normal. Seus olhos estavam ligeiramente cerrados. Seu rosto marcado e pálido.

― Quem? ― disse lentamente com uma voz mais grave que a de costume.

― A representante da sua turma. Ela está aqui.

― O que ela quer?

― Ver você.

John fez uma careta. Removeu o lençol de cima do seu corpo e se levantou. Foi cambaleando até a porta e a abriu.

― Oi ― cumprimentou rispidamente.

― Bom dia, John! Estava dormindo? ― Beatriz disse gaguejando um pouco.

― É o que parece. Mas do que você precisa?

― Bom ― começou a menina. Bernardo estava espiando a cena por trás dos ombros de Dias. ― Eu queria garantir que você chegaria a tempo no colégio hoje. Então resolvi vir buscá-lo.

John a encarou por uns instantes.

― Agradeço a preocupação. Mas só preciso estar no colégio mais tarde. Além disso, você nem deveria estar aqui. Esse é o dormitório masculino.

― Eu sei disso ― dizia timidamente. ― Mas você precisa chegar no horário!

― Não. E você precisa cuidar da sua vida.

Bernardo estava assustado. Não conhecia Beatriz, mas esperava que a menina começasse a chorar a qualquer momento. A fisionomia da menina mudou, mas de forma um pouco imprevisível.

― O que você acha que estou fazendo, imbecil?! ― ela gritava enfurecidamente. Seus olhos estavam fixos em John. Seu rosto demonstrava o quanto estava irritada. Ambas as mãos da garota estavam fechadas em forma de punho. ― É por causa de babacas, como você, que eu preciso tomar uma atitude! ― John estava assustado, com os olhos arregalados. Bernardo segurava a risada ― Não tenho prazer nenhum em ficar ouvindo reclamações do diretor por causa de você! Nem em ter que me arrumar mais cedo apenas para vir aqui te acordar!

O coração de John batia com mais frequência. Ficou paralisado por poucos instantes.

― Eu já volto ― Dias respondeu finalmente. Entrou indo em direção às suas gavetas.

Bernardo, que já estava arrumado e com a mochila nas costas, passou por Beatriz que estava parada na porta um pouco ofegante.

― Seja sempre bem-vinda, Beatriz! ― Ben disse enquanto saía. ― Venha nos visitar mais vezes.

― Obrigada ― disse seriamente olhando para dentro do quarto.

Enquanto Bernardo saía pelo corredor, ela entrou no cômodo e fechou a porta.

― Você não pode me esperar lá fora? ― questionou o rapaz que já estava com suas peças de roupa na mão.

― Se eu fizer isso você volta a dormir. Não vou me atrasar por sua causa.

Ela falava com frieza, mas ainda com uma voz suave e quase inaudível. “Era assustador”, foi o que John pensou. A menina virou-se para a parede, dando as costas para o rapaz. Ele se vestiu o mais rápido possível, passando a mão na cabeça para tentar ajeitar seus cabelos.

― Pronto! ― respondeu jogando a mochila nas costas ― Mas a verdade é que eu queria ter tomado um banho, primeiramente.

― Você pode se lavar no colégio. E escovar os dentes, também.

Ele abriu a mochila e colocou rapidamente escova e pasta de dentes dentro dela. Os dois saíram do cômodo. John trancou o quarto quando passou. Eles cruzaram o corredor e desceram as escadas indo em direção à saída. Beatriz se manteve calada o percurso inteiro. John olhou discretamente para ela. Sua fisionomia era séria, tal como ele nunca havia visto antes.

Atravessaram o campus chegando ao prédio do colégio. John queria ir ao banheiro, mas a garota o puxou rapidamente pelo braço alegando que ele precisava, antes de tudo, colocar sua mochila na sala. Ele a obedeceu, sem ter outra opção aparente. Chegaram à sala quando não havia ninguém lá, apenas mesas e cadeiras vazias. Dias seguiu para seu lugar de costume e depositou sua mochila na mesa. Pegou sua escova e pasta. Olhou para Beatriz, que estava do seu lado. Ele olhava para ela como quem esperava algum tipo de “aprovação” da garota.

― Pode ir ― ela respondeu.

John saiu da sala. No banheiro, fazendo caretas para o espelho enquanto escovava os dentes, observou sua fisionomia. Olheiras grandes e olhos inchados. Rosto pálido e pele oleosa. Terminando a higiene bocal, lavou o rosto e molhou os cabelos. Quando o garoto voltou para a sala, viu que a mesa ao lado da sua estava sendo ocupada por ninguém menos que a representante de sua turma, que ocupava seu tempo lendo um livro. Estava pronto pra questionar se ela ficaria seguindo ele o dia inteiro, mas preferiu simplesmente sentar no seu lugar e ficar de boca fechada. Já havia alguns alunos na sala. O professor logo chegou na sala. Era Victor Beaumont, usando seu jaleco sobre suas roupas. Ele viu John no fundo da sala e deu uma piscada discreta para ele. O garoto respondeu acenando com a cabeça. Normalmente John não assistia às aulas de Física e Matemática. Eram disciplinas que ele preferia aprender sozinho no computador, e como eram matérias que tinha facilidade, já tinha aprendido os conteúdos no ano anterior. O intervalo veio logo após a aula de História.

Beatriz guardava seu caderno na mochila quando John levantou para sair. Ele se aproximou da garota.

― Oi! ― disse Dias. Ela olhou para ele. Continuava séria ― Eu só queria me desculpar por tudo que eu disse para você.

― Não tem importância ― ela respondeu olhando para ele. Aquela frase trouxe um sentimento de nostalgia a John. Lembrou-se de si mesmo falando.

― Tem sim ― disse gaguejando. ― Eu magoei você ― tentava procurar as palavras corretas para dizer. Estava um pouco nervoso com a situação. ― Beatriz, me desculpa!

Não havia mais ninguém na sala naquele momento. Beatriz se levantou, puxando de sua mochila o livro que lia no início da aula. Em poucos instantes, John se via sendo abraçado pela garota. Os braços dela davam a volta em sua barriga e sua cabeça se apoiava no peito dele. John ficou com os braços retos e estava completamente imóvel. Ela o soltou sorrindo.

― Pode me chamar de Bia! ― sua voz suave estava mais clara dessa vez. Ela deu as costas e saiu.

John Dias estava completamente confuso.


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Notas finais do capítulo

Como você deve ter percebido, o capítulo saiu mais cedo essa semana. Isso pode acontecer. Haverá semanas que ele sairá mais cedo, porém haverá semanas que não conseguirei lançar na data prevista. O capítulo 4 será lançado no dia 09/01. Obrigado por ler e feliz Ano Novo!



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