Lúcia passou os últimos meses falando de um garoto que conheceu pela internet. Dizia que estava namorando com o desconhecido, que o amava, que dessa vez iria dar certo. Ariana não acreditava muito nisso, sua melhor amiga tinha a tendência de achar um pior que o outro em se tratando de relacionamentos. Se apaixonada fácil, se envolvia rápido demais, e levava as coisas muito a sério.

Ariana insistia pra que ela pelo menos se encontrasse pessoalmente com o rapaz, qual era a dificuldade nisso? Mesmo que ambos morassem longe demais, tinham que dar um jeito de se ver. Não devia ter desculpas quando se tratava da pessoa amada, se o sentimento era verdadeiro, o fato de morarem em cidades diferentes devia compensar isso.

Depois de insistir muito com o tal Lucas, por pressão da amiga, Lúcia finalmente marcou de se encontrar com ele, e arrastou Ari pra isso. Não que ela tivesse se queixado, afinal, eram melhores amigas. Se o cara fosse um estuprador, um assaltante ou coisa parecida, era função de Ariana se assegurar de trazer ajuda e ligar pra polícia.

Lúcia queria se encontrar com Lucas numa praça, mas Ari não aceitou a ideia. Tinha que ser um lugar descontraído, que tivesse muita gente. E que ela pudesse se divertir, não ia ficar de vela o encontro todo. Sua sugestão de um encontro em balada foi aceita, e mesmo que não pudesse escolher em qual iria, já que Lucas que ficou de escolher, ela não perderia aquilo por nada.

Depois de um dia cheio de depilação, cabelo, unhas, roupa e o velho discurso sobre a camisinha, foram de metrô até o local marcado. Não foi muito difícil encontrar o Lucas, pra alegria de Lúcia, e ele apareceu com o melhor amigo, Trevor, o que foi mais do que perfeito pra Ariana. Ela já tinha ouvido falar dele, claro, até porque a Luluzinha vivia falando o tempo todo sobre tudo relacionado ao namorado, e isso incluía o melhor amigo dele.

Ariana apelidou o casalsinho de "os dois L", e decidiu não se preocupar muito com eles. A química entre o casal foi instantânea e apesar de ainda ter suas desconfianças, Lucas parecia ser um cara divertido e confiável.

Trevor foi o que fez com que seu coração acelerasse, e que suas esperanças para uma simples noite fossem mais do que renovadas. Era o que ela carinhosamente chamava de  BMCC, Boy Magia Candidato a Crush. Não que fosse algo como paixão a primeira vista ou alma gêmea, de jeito nenhum.

Ari era uma mulher moderna, e acreditava que da mesma forma que os homens saíam ficando com garotas quando desse vontade, as garotas podiam fazer isso também. Um beijo, ou quem sabe algo mais do que isso, por que não? Era quinta-feira ainda, mas pra uma pessoa feliz, todo dia podia ser sexta. Ou toda noite.

Trevor era incrivelmente sexy. Não conseguiu deixar de notar que ele tinha uma tatuagem escondida pela camisa, e quando pediu pra ver mais de perto, viu no braço dele um escorpião, o que o fazia parecer mais quente ainda. Perguntou o motivo dele ter um bicho daqueles tatuado, e se tinha haver com o fato do escorpião ser venenoso. Não entendeu a carranca dele. Tinha lindos olhos cinzentos, escuros e enigmáticos. Pensou que tinha se dado bem com ele, até levar um fora nela no mínimo vergonhoso.

—Obrigado, mas entre dançar com sua amiga e tomar uma bebida, prefiro a segunda opção.

Ai, essa tinha doído, pensou quando Trevor ia se afastando. Lúcia tinha aquele olhar de pena que Ariana tanto detestava, Lucas coçava a cabeça, sem jeito. Com um grande sorriso no rosto, Ari se afastou e rapidamente arranjou um parceiro de dança.

— Oi, querido, quer dançar? - perguntava, e os homens se derretiam indo atrás dela.

Dançou com um cara chamado Rafael, e depois um cujo nome era Stefan. E tinha quase certeza de que o terceiro era Dionísio, ou talvez Diogo. Havia um outro que não conseguia se lembrar nem do rosto, mas ele tinha lhe pagado uma boa bebida.

Infelizmente, nenhum prendia sua atenção, porque um certo homem que a tinha ignorado não saía de sua cabeça. Era sempre assim, o mais difícil de conseguir era o que queria.

Trevor atraia muitos olhares pra cima dele, parecia um ímã. Tinha certeza do que as mulheres viam nele, uma ótima transa. Ari via isso também, mas de uma forma um tiquinho diferente. Ele era seu novo objetivo, e ela amava coisas assim. Por questão de honra, iria sair dali com ele.

Rihanna, a bartender que tanto odiava, parecia não se cansar de flertar com ele. Detestava aquela mulher com todas as suas forças, e era um dos motivos pelo qual evitava ir naquela balada em questão. Mais um motivo pra sair dali com Trevor, seria maravilhoso fazer isso na frente dela.

Pediu pra que Lúcia fosse embora de uma vez com o Lucas, e que desse um jeito de Trevor ficar responsável por levá-la pra casa. Pleno século 21 e existiam homens que achavam que mulheres não podiam se cuidar sozinha, mas tudo bem, podia se aproveitar disso.

Dito e feito. Trevor tinha se oferecido pra levá-la pra casa, e isso sim era ganhar na loteria. Exceto que... ele não parecia tão contente assim.

Quase desaninou, mas não iria dar o braço a torcer. Pensou que tivesse conseguido chamar a atenção dele, pois Trevor chegou a um ponto em que não conseguia tirar os olhos de cima dela. Contudo, ele não parecia disposto a ter nada com ela, e se mostrava frio e distante.

Estava feito, não desistiria enquanto ele não terminasse implorando por ela. Mas antes disso, aproveitaria um pouco mais da noite.

A música tocava forte e alto, e as luzes piscavam sem parar. Mudavam de cor em questão de segundos, e se acendiam e apagavam. O lugar podia não ser tão grande quanto os que estava acostumada a frequentar, mas podia se perder facilmente ali.

Era uma sensação incrível poder se dar o luxo de esquecer, nem que fosse por meros minutos, qualquer coisinha que estivesse incomodando. Os problemas ficavam distantes, como se num mundo exterior, e só por aqueles momentos, enquanto prestava atenção na letra e nos instrumentos musicais, podia ser tudo o que desejasse ser.

Dançar, rebolar, chamar a atenção dos que estavam por perto e dominar o espaço do lugar, isso era bem fácil depois de anos de prática. Suportar as dores nos pés por conta disso valia a pena.

Depois de dançar até ficar sem fôlego, voltou sua atenção para o desafio da noite. Resolveu tentar conversar com ele, o que não foi muito simples. Era distante, discreto, do tipo misterioso. Tentou algumas de suas melhores frases de paquera, e acabou ganhando como resposta um "você é desequilibrada". Não costumava ligar muito pra quando diziam isso dela, ouvia muito disso.

Se deparou com duas escolhas : ignorar e conseguir o que queria ou dar um tapa na cara dele ou coisa parecida. Preferiu ficar com a primeira opção, não queria ter que brigar ou discurir. Até porque, como ele saberia que ela detestava ser chamada daquilo?

Procurou levar na base do flerte e quando deu por si, estava no carro dele, sendo facilmente ignorada. Tinha se recusado a dar seu endereço pra ele, não iria ser despejada assim.

Porém, estava ficando realmente preocupada. Trevor chegou a pegar seu celular em seu sutiã e agido totalmente indiferente quanto a isso, como se fosse algo normal. Que homem tocava no peito de uma mulher e não reagia a isso?

Irritada pela forma como as coisas estavam indo, deu um beijo nele pra ver se mudava a situação e nada, nem isso funcionou. O cara tinha namorada, era isso? Devia ser  comprometido, só podia ser. Ou era gay. Quem recusaria uma noite com ela, com Ariana?

Talvez tivesse usado uma abordagem ruim com ele. Talvez devesse calar a boca, mas não gostava daquele silêncio horrível, era deprimente.

— Sinta a energiiiiia no aaaaarr - começou a cantarolar. - Se envolva nessa dança... É uma mistura que não vai te deixar, solte o corpo e deixe rolar.

Ariana soluçava em algumas partes da música que cantava, tinha bebido um pouquinho mais do que o considerado apropriado. Mas quem ligava pra isso? Tentou dançar sentada, mas Trevor a olhou de uma forma tão ameaçadora que preferiu ficar só cantando mesmo. Qual era o problema com aquele cara?

Depois de passar a viagem toda calado, Trevor estacionou o carro no estacionamento de um prédio e Ariana pensou que finalmente o clima mudaria. Ele a guiou pela entrada e pela primeira vez encostou nela. Uma pena que parecia mais um segurar de "cuidado se não você vai cair no chão" do que um "quero uma noite de coito com você".

No elevador, Trevor a olhava de um jeito estranho, como se estivesse pensando em algo. Ariana sorriu, insinuosa, mas sua bela imagem foi arruinada por um outro soluço e um quase arroto.

Ariana teve vontade a chorar, e Trevor se aproximou.

— Ei, loirinha, calma aí. - ele disse, parecendo com receio de se aproximar. - Não vou fazer nada com você, eu prometo.

Esse era o problema, Ariana pensou. Tinha acabado com o resto das chances que tinha, e ele ainda debochando jogando em sua cara.

Trevor se afastou e quando chegaram ao andar certo, ele a levou até seu apartamento e ofereceu comprimidos e água.

— Vai ficar tudo bem, loirinha. - ele tentava consolá-la. - Uma boa noite de sono cura qualquer ressaca.

Ressaca? Precisava beber bem mais que aquilo pra chegar a uma ressaca. Por mais educado que ele fosse, Ariana pensou em ir pra casa. O metrô ainda devia estar funcionando. Pegaria um ônibus, iria pra estação e depois pegaria um outro ônibus e acabaria em casa, enquanto Lúcia se divertiria a onde quer que estivesse.

Trevor a deixou dormir em seu sofá, deu cobertores e uma almofada e se trancou no próprio quarto. Era um cara realmente gentil, não era todo dia que uma pessoa deixava um completo desconhecido em sua casa. Se Ariana fosse uma ladra e resolvesse fazer um assalto, provavelmente se daria bem. Ou tinha alarme de segurança?

Ariana riu de se mesma, e ficou pensando nas suas possibilidades. Não era assim que queria terminar seu dia. Ficou pensando no motivo de estar ali. O que Trevor poderia ter de tão especial pra acabar deitada no sofá dele depois de ter sido rejeitada? Qual é, nenhum cara valia isso, de jeito nenhum.

Desafio era uma coisa, dar murro em ponta de faca era outra. Iria dar uma última chance a Trevor e se fosse o caso, tentaria só mais uma vez. Não ia ficar se matando por isso, não tinha tanta paciência assim. E não eram nem duas da manhã, sua única opção não era sua cama fria, podia partir pra uma outra pessoa.

Se levantou do sofá e bateu na porta dele. Ouviu um barulho dentro do quarto, e em seguida Trevor apareceu.

— Algum problema? - ele perguntou, parecendo preocupado.

— Por que você não me quer? - Ari perguntou, indo direto ao ponto. - Onde foi que eu errei?

Trevou pareceu ligeiramente surpreso, mas não se fez de desentendido.

— Olha só, não é você. - ele começou, e Ariana o interrompeu.

— Não me venha com aquela velha desculpa que os caras costumam dar. Qual é? Tem que ter uma razão. Não estou a procura de um namorado, ta. Só queria uma noite, só isso.

Trevor abriu a boca pra falar alguma coisa, e desistiu a meio caminho. Olhou Ariana de cima a baixo, e deu risada.

— Então? - ela perguntou de novo.

— Eu ia dizer que o problema não é o seu corpo. É que você fala muito. - ele enfim respondeu, dando de ombros. - Não me leve a mal, loirinha, mas além de tudo, eu gosto de morenas.

Ariana bocejou, sentindo sono, e decidiu não perder mais tempo com ele. Um idiota, na sua opinião, ele mal sabia o que estava perdendo.

— Obrigado pela carona e coisa e tal. - ela disse, voltando pra sala e pegando a bolsa. - Eu vou indo, ta? Mas você é um idiota. Eu falo muito? Por favor. Pelo menos eu não fico toda calada, feito um ranzinza.

Tentou abrir a porta pra ir pra fora, mas não conseguia colocar força o suficiente na maçaneta para abrí-la. Trevor a seguia, olhando de perto a cena. Quanto mais Ariana fracassava, mais ela insistia em dar risada.

— Dá pra mr ajudar aqui? - ela perguntou, tentando se controlar.

— Você está bêbada. - ele disse.

Sempre assim. Uma pessoa não podia despejar felicidade que todo mundo achava que tinha algo errado com ela, e logo colocavam a culpa na bebida. O mundo era tão infeliz que se alguém ia contra isso, era um bêbado?

Trevor puxou a bolsa de seu braço, quase fazendo Ariana cair no chão .

— Ei! - ela reclamou, a cabeça começando a latejar. - qual é o seu problema?

— Você está bêbada, carente e precisando dormir. Se o Lucas realmente levar a sério essa Lúcia, não vai gostar de saber que eu deixei a melhor amiga dela fazer merda.

— Acha que vou fazer merda? - Ariana perguntou, balbuciando - Você nem me conhece!

Ariana soluçou de novo, e se sentou no sofá. Se sentia tão errada, tão estranha.

— Sinto muito, okay? - falou para o Trevor, que continuava parado ali. - Não sei o que deu em mim. Eu estava disposta a tentar ser sua amiga, afinal, nossos melhores amigos estão juntos, e você me trocou por uma bebida.

Trevor se sentou do lado dela, suspirando. Os dois ficaram em silêncio por alguns minutos, ouvindo o barulho de suas respirações. Trevor foi o primeiro a falar.

— Nem sabia que ele estava namorando atê você falar. - ele comentou. - Tem certeza de que era namoro mesmo? Porque nos últimos meses, eu vi ele com mais garotas do que posso contar.

— Uhum. Bom, mas sabe como é esses namoros virtuais, ninguém leva isso a sério. É só uma brincadeira.

Trevor coçou o queixo, claramento não concordando com a opinião dela.

— Mesmo namoros virtuais são pra valer, apesar de serem bem mais complicados. Me surpreende o Lucas não ter me contado.

— Aposto que foi apenas uma brincadeira pra ele. Espera só eu contar pra Lúcia, ela tinha que ter me ouvido. Não se leva a sério um namoro desses.

— Qual é, os dois acabaram de se ver. Vai querer estragar o lance deles? Você viu que os dois tem química.

— Sexo casual não é namoro. Posso ter química com quantos homens for, e daí? E você mesmo disse que ele saía com várias mulheres.

— Isso não vem ao caso. Espera os dois se curtirem o momento antes de estragar tudo abrindo a boca.

— Abrindo a boca? - Ariana perguntou, surpresa. - Por que você diz isso? O que eu fiz pra você me declarar uma tagarela? Sabia que se os dois L decidirem ficar juntos pra valer, nós acabariamos nos encontrando com uma boa frequência? A gente devia se tolerar, pelo menos. Você ficar me ofendendo não vai ajudar em nada.

— Os dois elis? - Trevor perguntou, e antes que conseguisse acompanhar o raciocíneo dela, Ariana começou a falar suas opiniões diversas sobre relacionamentos.

— Eu não faria mesmo como a Luluzinha, sabe, entrar em um tão cedo, o gosto da liberdade é libertador demais pra colocar tudo a perder. E ela nem começou e já pisou na bola. Olha esse seu amigo Lucas, que idiota.
— Ele não é um idiota. - Trevor se defendeu. - Nem sei por que fui te contar isso, você parece ser uma fofoqueira que mal se aguenta em guardar um segredo.

— Eu sei sim guardar segredos! - ela protestou.

— Então finja que não te contei nada.

— Mas isso não é algo que a gente guarda. Lúcia já se machucou muito com relacionamentos.

— E graças a você, imagino.

— Sinto muito por ficar forçando a barra com você. - Ariana se desculpou, se levantando de novo . - Você é um cara legal, sabe. E geralmente eu não sou... bem, a pessoa que devo ter dado a impressão que sou.

— Uma oferecida desesperada por um homem? - Trevor comentou, e Ariana corou de novo. - Ei, calma loirinha, eu só estou brincando.

— A questão é que estou agradecida, mas ta na minha hora. - Ariana pegou a bolsa e foi pra porta de novo, mas se virou pra olhar pra ele. - Falando sério, você não ficaria comigo por que eu falo demais? - Ariana perguntou. - Isso é uma coisa muito gay de se dizer.

Trevor se levantou, e Ariana se aproximou o suficiente para dar um selinho nele. Vendo que ele não se afastou, Ariana foi aumentando o ritmo, de lento pra rápido. O beijo durou até Ariana o empurrar pra trás, sem fôlego.

— Certo, colega. Acho que estamos falando a mesma língua.

Assim que Trevor foi parar no sofá, Ariana se sentou no colo dele. O beijo que deu dessa vez foi um beijo dominador, forte, daqueles que faziam com que homens se rendessem a qualquer pedido seu. Puxou o colarinho da camisa dele, fazendo com que seus corpos ficassem mais juntos ainda. E acabou soltando ele e interrompendo o beijo mais cedo do que imaginava, morrendo de rir.

Seu estômago doía de tanto se dobrar. Tentava fazer a risada diminuir, mas acabava por aumentá-la. Saiu de cima do colo dele e foi para o tapete. Ficou sentada, esperando o riso acabar, e se deitou ali.

— Você é confusa, garota. - Trevor disse, passando a mão pelo cabelo. - Devo perguntar o que achou de tão engraçado?

Ariana fez que não com a cabeça. Como explicar que sentar em cima do pau dele e perceber que estava duro tinha sido engraçado? Provavelmente acabaria ferindo o ego dele.

Trevor não estava tão imune a ela quanto pensava, e provavelmente estava mais excitado por ela do que por ela nele. Isso sim era interessante, e fazia muita coisa aparecer em sua mente.

— Se me permite, vou para o meu quarto agora. - Trevor anunciou, se levantando do sofá. - Vai ficar bem aí?

Ariana não respondeu, fechou os olhos e decidiu dormir. Trevor se afastou, não antes de ver o sorriso no rosto dela.

Meia hora depois, seu celular apitou, anunciando uma mensagem.

"Transou com ele?", Lúcia perguntou, indo direto ao ponto.

"Não, consegui uma coisa melhor", foi a mensagem de resposta que Ari mandou. Tinha conseguido algo bem melhor que uma simples transa.