POV NESSIE

Estacionei o carro na garagem da casa de Charlie um pouco depois das 19h00min. Jacob havia insistido de forma quase suplicante que me acompanhasse até aqui, e eu talvez até tivesse aceitado de muito bom grado a sua oferta, se não fosse, é claro, os olhares furtivos e receosos que lançava a sua moto, estacionada um pouco além do carro de Bella.

O modo como ele a olhava era hilariantemente apaixonado e eu me senti um pouco receosa de afastá-lo da moto.

Suspirei fundo antes de sair do carro de minha irmã. Sem a presença de Jacob por perto, tudo se tornava um tanto mais difícil e assustador. Uma parte dentro de mim gritava insistentemente que estava sendo boba, e talvez até infantil. Porém, não havia como evitar. Eu simplesmente não tinha controle sobre meus sentimentos e medos idiotas.

Assim que abri a porta da frente me deparei com Bella, correndo em minha direção parecendo inegavelmente aliviada.

– Onde se meteu? Você é maluca? Sumir desse jeito? O que tem na cabeça? – Rugiu furiosa atropelando as perguntas, após me abraçar rapidamente. Cheguei a me impressionar com a mudança radical de seu semblante, em apenas um piscar de olhos.

– Acalme-se, garota! Fui apenas dar uma volta... Espairecer! – Dei de ombros, indiferente.

Retirei as chaves de seu carro do meu bolso traseiro da calça em seguida.

– Obrigada. Foi muito útil. – Comentei alcançando-as a ela.

As chaves de seu carro em cima do balcão foram realmente um alívio no momento em que sai de casa, desesperada para dar o fora de qualquer maneira.

– Ness? – Bella chamou puxando-me pelo braço e interrompendo minha caminhada rumo ao quarto, onde eu pretendia não sair até o dia amanhecer novamente. – Não quer conversar sobre...?

Sua pergunta foi interrompida por um alto suspiro de alivio.

– Graças a Deus você voltou! – Virei-me instantemente para meu pai, que vinha na minha direção com os braços estendidos e uma expressão de extremo alívio. - Eu estava pronto para chamar a polícia.

– Credo, pai, que exagero. - Resmunguei revirando os olhos e recebendo, sem reclamar, seu abraço. – Eu apenas quis dar uma volta. Não precisavam ter se preocupado tanto.

– Filha, nós precisamos conversar sobre...

– Olha, pode ser outra hora? - Não o deixei completar sua pergunta. – Eu realmente preciso de um banho. - Indiquei meus cabelos, metade secos e metade molhados.

– Onde você estava? E está descalça? - Charlie franziu o cenho analisando meu estado incomum pela primeira vez desde que eu chegara.

– Apenas mergulhei em uma cachoeira. – dei de ombros, andando de costas em direção ao meu quarto. - Acho que vou dormir mais cedo hoje. Não vou jantar, ok?

– Claro, Ness!

Para minha surpresa quem respondeu foi Sue, já que Charlie, Bella, e Leah - que aparecera junto com a mãe - analisavam minhas vestes, ainda pensativos.

Lancei um sorriso amarelo para Sue e dei as costas para os quatro. Andei dois passos em direção ao meu quarto - tendo a nítida consciência de que ainda estava sendo observada - e sem refletir duas vezes me virei um pouco relutante, na direção de minha madrasta.

– Parabéns! - Lancei um sorriso forçado para ela e meu pai.

A expressão de todos foi de desconfiança para choque total. Ignorei-os, e voltei para minha caminhada rumo a meu quarto, agora excessivamente rápida.

(…)

Acordei com o maldito despertador rugindo irritantemente alto. Desliguei-o meio sonolenta, sorrindo à medida que lembrava do sonho gostoso que estava tendo. Nem preciso dizer quem era o personagem principal, não é?

Olhei para o relógio que marcava 07h00min e meu sorriso aumentou ao me dar conta que o veria pessoalmente em poucos minutos. Pela primeira vez na vida eu estava contente em ir para o colégio. Dá pra acreditar? Eu estava definitivamente virando mais uma boba apaixonada neste mundo. Como deixei que isso acontecesse?

Tomei o café da manhã excessivamente rápido. Mentalmente eu me iludia estupidamente, repetindo que só estava agindo assim por ter me demorado mais que o normal arrumando-me, - algo inédito, devo acrescentar – e eu não queria perder a hora. Contudo, sabia muito bem que esse não era o real motivo da minha pressa extrema.

Sabia também que toda essa ansiedade de ir logo para a escola era completamente inútil, uma vez que precisava esperar Claire me buscar - e esta era irritantemente lenta no quesito embelezar-se.

Depois de escovar os dentes, peguei minha mochila no quarto e rumei para as escadas, encontrando enfim uma alma viva naquela casa, que estava me parecendo misteriosamente vazia.

– Bom dia, Leah. - Saudei-a, fazendo com se assustasse ligeiramente.

– Oh, não a vi por aqui. - Comentou sorrindo de leve. Talvez um pouco receosa se eu iria descontar minha raiva pela novidade do dia anterior sobre ela.

– Então, já está de saída? - Perguntei simpática, querendo que ficasse claro que eu estava absolutamente decidida a esquecer o dia de ontem. Pelo menos a parte do almoço. - Não quer carona?

– Ah, não. Obrigada, mas eu vou com... - Parou abruptamente, ruborizando de modo violento. – Hum... Eu vou com o Embry. - Acrescentou desviando o olhar.

– Mesmo? - Gargalhei sem conseguir me conter. – Cuide bem do meu priminho, hein! - Pisquei maliciosa, fazendo a garota corar mais ainda.

Leah revirou os olhos sorrindo constrangida e fez menção de girar a maçaneta da porta da frente, porém parou no ato.

– Hum... Nessie? - Chamou voltando a transmitir apreensão. – Seu pai mandou avisar que depois que ele voltar do médico com Sue, ele quer conversar com você.

Franzi o cenho, confusa. Chalie em casa durante o dia? Acompanhado sua mulher ao médico? Ele nunca deve ter feito isso com minha mãe...

– Ótimo! - Resmunguei rolando os olhos.

Leah acenou um tchauzinho singelo e abriu a porta. Eu estava preparada para ir até a sala, procurar algum filmeco até minha melhor amiga dar as caras, porém a expressão de surpresa de Leah, seguida com o olhar malicioso que me lançou, me fez permanecer estagnada no mesmo lugar.

– Que foi?

– Acho que a Claire não virá hoje. - Comentou sorrindo marota.

– Não? - Repeti sem entender, caminhando até onde Leah continuava parada.

De fato não era o Porsche cinza de Claire que estava estacionado em frente da casa, e nem ao menos a pessoa encostada de forma extremamente sexy no Rabbit preto parecia-se com minha melhor amiga.

Senti minha boca se abrir de surpresa, e um leve empurrão nas costas tirou-me da hipnose momentânea. Leah olhou-me impaciente fazendo sinal para que eu me mexesse logo.

Sem pensar duas vezes andei mais do que depressa em direção ao garoto que sorria lindamente para mim. O sorriso que se formou em meu rosto foi inevitável. Não estava me importando se estava sendo boba, só o que me passava pela mente era que Jacob estava a poucos centímetros de mim.

– Então, estava passando pela vizinhança e pensei, como o bom cavalheiro que sou, se havia por acaso alguma princezinha precisando dos meus serviços preciosos? - Murmurou de modo sedutor, fazendo-me revirar os olhos ao mesmo tempo em que tentava inutilmente desmanchar o sorriso insistente em minha face.

– Se parar de me chamar assim, talvez! - Ergui as sobrancelhas.

– Vou pensar no seu caso. - Comentou pensativo, desapoiando-se da porta do carro e a abrindo para mim.

Entrei no veículo ainda sorrindo boba. Jake deu a volta no carro enquanto eu observava Leah entrar em um carro azul, um pouco afastado de nós, pelo espelho retrovisor. Embry a olhava visivelmente hipnotizado.

– Tenho uma coisinha pra você. - Jake comentou, distraindo minha atenção do carro de trás.

– Uma coisinha? Tipo um presente? - Perguntei animada, e um tanto quanto surpresa.

Jake riu do meu entusiasmo antes de responder.

– Hum, este é mais como um... Pedido de desculpas? - Falou soando mais como uma pergunta.

– Um pedido de desculpas? - Repeti sem entender.

– É. - Confirmou – Espera ai.

Assim que parou o carro em uma sinaleira fechada, virou-se para o banco de trás do carro tirando de lá uma caixa retangular e estendendo a para mim.

– Espero que seja o tamanho certo. - Acrescentou assim que puxei o pacote de sua mão.

Rasguei o papel branco que embalava uma caixa de papelão, e retirei a tampa nitidamente curiosa. Minha boca se escancarou assim que meus olhos se focaram no par de rasteirinhas brancas que havia dentro da caixa.

– Pode trocar se quiser. - Jake comentou, possivelmente receoso com o meu silêncio surpreso.

Aproveitei o fato de ele estar estacionado em mais uma sinaleira e me atirei em cima dele, puxando seu rosto para o meu e captando seus lábios em uma tentativa desesperada de agradecer aquele seu ato inesperado e incrivelmente doce.

– Nossa! - Sorriu contra meus lábios, expressando surpresa e satisfação ao mesmo tempo. – Se é assim que você reage quando recebe um presente desses, estou ansioso para ver como você vai reagir ao outro.

– Outro? - Repeti depois de receber mais um selinho rápido dele.

– É. - Beijou-me mais uma vez, ao mesmo tempo em que uma buzina irritante soava atrás de nós.

Havia esquecido completamente que estávamos no meio da rua. E aparentemente Jake também, uma vez que se separou rapidamente de mim e deu partida no carro, sustentando um sorriso leve no rosto.

– Então, qual é o outro presente? - Insisti analisando meu novo par de rasteirinhas, muito mais bonito do que o meu antigo.

– Nessie, você quer estragar a surpresa?

– Aham. - Respondi prontamente, fazendo o rir.

– Pois vai ter que esperar. - Respondeu para meu desespero.

– Ahhh, Jake! - Insisti. – Por favor? - Fiz biquinho reparando que ele já estava estacionando o carro no colégio. Como o tempo passou tão rápido?

POV JACOB

– Esse biquinho não vai me persuadir, Swan. - Tirei o cinto de segurança, sem desviar os olhos dela.

Nessie bufou soltando o cinto também.

– Deixe o presente aqui. Eu te levo para casa na saída. - Acrescentei saindo logo do carro.

Parei antes de fechar a porta, já do lado de fora, percebendo que Nessie não havia se mexido ainda. Ela parecia estranhamente preocupada, mordendo o lábio inferior e uma ruginha mínima localizava-se em sua testa, enquanto fitava a caixa em suas mãos visivelmente confusa.

– O que houve? - Indaguei curioso.

Nessie apenas lançou-me um olhar estranho, sorrindo de forma pouco convincente. Franzi o cenho e ela logo respondeu:

– Nada não. Vamos?

Desviou o olhar de forma suspeita, saindo do carro imediatamente. Por um momento considerei a idéia de insistir o interrogatório, porque afinal algo de errado estava acontecendo. Contudo, logo me lembrei do meu problema urgente e eu realmente precisa resolvê-lo o quanto antes.

Era exatamente esse o motivo que me levara ir ao colégio incomulmente cedo. Precisa urgentemente conversar com Quil e antes da aula seria o momento perfeito para isso.

Estava tentando transparecer ao máximo possível que não havia nada de novo e desagradável me atormentando. Queria apenas aproveitar aqueles momentos indescritíveis e inegavelmente prazerosos com Nessie. Mas realmente não tinha muito tempo se queria conversar com Quil ainda antes do sinal tocar.

Decidi que retornaria a este assunto mais tarde, afinal pretendia passar o tempo que pudesse ao lado de Nessie.

Encaminhei-me até onde ela me esperava, lançando olhares furtivos a todos os cantos, ainda mordendo o lábio carnudo de forma adorável.

– Sabia que você fica extremamente sexy fazendo essa carinha? - Sussurrei em seu ouvido, fazendo com que estremecesse surpresa.

– Você está abusado hoje. - Comentou sem conter o sorriso, depois de receber meu beijo estalado em sua bochecha ligeiramente rosada.

– Só pode culpar a si mesma. - Passei os braços ao redor de seus ombros, guiando-a até onde sabia que teria sua primeira aula da manhã, fotografia.

Nessie pareceu meio relutante a principio, porém logo abraçou minha cintura permitindo ser guiada por mim.

– O que este bando de enxeridos tanto olham? - Ela murmurou baixinho desviando o olhar de um grupo de meninas que, de fato, nos encarava sem discrição alguma.

Não me surpreendi com isso. Eu sabia que seria assim. Ao que parece as pessoas, principalmente garotas, não estavam muito preparadas para me ver tão carinhoso com uma mulher, e muito menos parecendo estar em um relacionamento. Notei isso quando os rumores ridículos sobre eu estar namorando Leah rolaram pelo colégio.

– Não se preocupe. – Comentei depois de perceber duas loirinhas cochicharem e apontarem descaradamente na nossa direção. - Sou eu. Nunca se acostumarão com o fato de eu ser extremamente gostoso.

Nessie lançou-me um olhar do tipo “cala a boca”, porém não conseguiu segurar o riso e quando me dei por conta estávamos os dois gargalhando prazerosamente, arrancando ainda mais olhares curiosos.

– OH MEU DEUS! - Um gritinho histérico fez com que nós dois parássemos de andar e começamos a procurar a fonte do ruído bizarro.

– AAAAAAAAAAAAAAH, NÃO ACREDITO! - Gritou ainda mais alto a amiga louca de Nessie, e suposta namorada do meu melhor amigo.

Nessie revirou os olhos quando enfim reconheceu quem era o ser excessivamente escandaloso, ao mesmo tempo em que a pirada vinha correndo – lê-se saltitando - na nossa direção. Ela jogou os braços ao redor de mim e de Nessie, juntado nossas cabeças e pulando alegre no mesmo lugar, levando-nos consigo.

Definitivamente eu não sabia se gargalhava, ou tentava me afastar daquela louca varrida que meu amigo era supostamente apaixonado.

– Claire, pirou de vez? - Nessie resmungou exatamente o que se passava pela minha cabeça, logo após finalmente sermos soltos pela garota.

– Eu que pirei? Você nem ao menos para me contar uma novidade dessas? Que tipo de amiga você é? - Retrucou visivelmente ofendida e brava.

Nessie lançou-me um olhar arregalado, refleti que aquela expressão em seu rosto deveria ser o reflexo da minha.

– E quanto a você! - Apontou o dedo para mim de forma ameaçadora, fazendo-me recuar um passo, ligeiramente receoso de a garota pular em meu pescoço. O que parecia um tanto quanto provável.

– Eu? - Indaguei engolindo a seco.

– Se você machucar minha amiga de alguma forma, eu juro que...

– CLAIRE! - Nessie gritou, visivelmente alarmada com uma possível ameaça de morte.

– O quê? - A garota agiu como se nada estivesse acontecendo. Ela é bipolar ou o quê?

– O quê? Você está bem? - Nessie questionou com a testa enrugada, possivelmente considerando o provável distúrbio psicológico da amiga. – Olha, eu já encontro você lá dentro... - Foi dizendo, porém um grito saudoso extremamente exagerado de Claire abafou o resto de sua frase.

– NAHUELl! - Abanou animadamente para o otário loirinho que se aproximava cada vez mais, com um sorriso irritantemente grande no rosto.

– Olá meninas! - Saudou ambas com um beijo da bochecha. Bufei alto.

O palerma focou os olhos em mim, aparentando esperar alguma reação de minha parte.

– E aí. - Cumprimentei-o de má vontade.

Ele abriu um sorriso bizarramente simpático na minha direção. Pelo canto do olho tive a nítida impressão de que Nessie e Claire trocaram um discreto olhar recheado de zombaria.

– Hum... Claire, onde está o Quil? - Perguntei ignorando aquele momento estranho, no mesmo momento em que meu problema iminente voltou a minha mente a tona.

– Ele tinha que entregar um trabalho para o professor de cálculo, acho que deve estar na sala. - Respondeu prontamente.

– Certo, eu tenho que falar com ele. - Pensei alto, voltando meu olhar para Nessie.

A garota lançou um olhar sugestivo para os outros dois, que entenderam imediatamente o que ela queria e abriram sorrisos maliciosos idênticos.

– A gente se fala depois, gata.

O futuro defunto – lê-se Nahuel – comentou após lançar a Nessie uma piscadela.

– Ah, claro! - Claire piscou maliciosa para amiga, imediatamente rumando para dentro da sala de aula com o loirinho abusado.

Permaneci encarando as costas do garoto, um pouco atentando em dar uma voadora naquele topete loiro.

– Jake? - Ouvi a voz de Nessie incrivelmente perto, desviando minha atenção imediatamente para ela.

Ela me encarava curiosa, a poucos centímetros de mim.

– Você está bem? - Perguntou – Está com uma expressão um pouco irritada.

– Estou ótimo. - Respondi desviando o olhar.

– Sabe, eu te conheço suficientemente bem para saber que quando você desvia o olhar assim, é porque está mentindo. - Cruzou os braços levantando ligeiramente as sobrancelhas.

Suspirei.

– Não é nada. Vamos almoçar juntos? - Perguntei colocando uma mecha de seus cabelos atrás de sua orelha.

– Hum... - Nessie hesitou parecendo arrependida – Eu... não posso.

– Por que não? - Não consegui disfarçar a decepção em minha voz.

– Combinei de almoçar com o Nahuel. - Admitiu olhando-me como quem pede desculpas.

Bufei. Ótimo, o palerma chegou primeiro.

– Que foi?

– Eu não gosto do seu amigo. - Admiti por fim.

– Nahuel? - Questionou com o cenho franzido.

– É... Ele é um tremendo abusado se quer saber. - Comentei mal-humorado – “A gente se fala depois gata” - Repeti com o voz fina em uma péssima imitação do otário.

Nessie riu baixinho tapando a boca com a mão. Encarei-a indignado.

– Qual é a graça?

– Nunca pensei que veria Jacob Black com ciúmes. - Riu mais um pouco, parecendo extremamente satisfeita.

– Ei, eu não estou com ciúmes! - Cruzei os braços defensivamente.

– Ok, então. – Concordou sarcástica. – Vou entrar. A gente se vê depois? - Perguntou parecendo receosa.

– Com certeza! - Sorri abertamente, recebendo um sorriso gracioso como resposta. E sem me conter, grudei meus lábios naquela boca tentadoramente carnuda.

(…)

– Fala Quil! - Cumprimentei meu amigo dando-lhe um amigável pedala na sua cabeça, no momento deitada entre os braços na mesa. Ele limitou-se em me fuzilar com os olhos.

Ele já estava sentado na mesa do fundão, onde costumamos assistir – lê-se tirar uma soneca – a aula de cálculo. Ele não reparou na minha chegada por estar muito ocupado ensaiando para os próximos cinqüenta minutos daquela aula imensamente tediosa.

– Não vai nem esperar a aula começar? - Brinquei, sentando na cadeira vazia ao seu lado.

– Tô podraço! - Bocejou coçando os olhos.

– Ah, entendi. A noite foi agitada ontem? - Gargalhei dando-lhe um soco de leve no ombro, enquanto Quil revirava os olhos.

– Quem dera. A Claire não quer fazer nada até irmos ao médico. Dá pra acreditar? - Bufou revoltado. - E eu nem ao menos posso insistir muito que ela já vira uma fera. Cara, essas mudanças de humor de grávidas são muito loucas. - Acrescentou com uma careta, possivelmente revivendo algum momento com a pirada.

– Estou sabendo. - Concordei lembrando da garota quase ameaçando minha vida há alguns minutos atrás. - Mas deixando de lado a sua abstinência sexual... – Comentei um pouco mais alto que deveria, fazendo com que duas meninas lançassem olhares divertidos para Quil. Ignorei o olhar assassino do mesmo, e prossegui. – Estou com um problema.

– O quê? - Perguntou observando eu lhe estender o meu celular. – O que eu tenho que fazer com isso?

– Olhe a última mensagem que recebi. - Ordenei, aguardando impaciente que fizesse o que pedi.

Quil apertou algumas teclas, e começou a ler em voz alta:

– Oi Jake! Tentei te ligar um montão de vezes e você não atendeu. Estou tentando lhe avisar que estou de volta. hehe Saudades, beijos gatinho.– Franziu o cenho, completando. - Quem é J.S?

– Pensa um pouco, cara. Tenho certeza que você sabe quem é. - Resmunguei passando as mãos compulsivamente pelos cabelos.

Quil permaneceu fitando o aparelho celular pensativo. Aos poucos suas expressão mudava de incerteza para compreendimento.

– Oh, não me diga que é a Jéssica Stanley? - Encarou-me com a boca escancarada. Assenti, desgostoso. – Aquela líder de torcida gostosa que você costumava pegar? - Assenti de novo. - Ela não tinha ido estudar em Londres? - Assenti, cansado. - E vocês não estavam “namorando” - Fez aspas com os dedos no ar. – quando ela foi embora? - Assenti de novo. - Hum... Jake?

– Quê? - Perguntei instantemente esperando de modo desesperado uma solução dele para meu problema.

– Por que diabos isso é um problema? - Fez cara de confuso, fazendo com que eu revirasse os olhos. Ótimo, eu tenho o melhor amigo mais inútil do planeta.

– Por que isso é um problema? Por algum acaso a pancada que você levou no acidente te deixou sequelado?

– Por quê? - Rugiu nitidamente ofendido. – Uma garota gostosa está de volta na cidade, desesperada para te encontrar. Sinceramente, não me importaria com isso. - Deu de ombros.

– Deixa a Claire te ouvir falar isso...

Quil revirou os olhos.

– Quero dizer que eu não me importaria se fosse você, mas eu não tenho olhos para outra garota a não ser para minha gatinha. - Completou apaixonadamente.

– Cara, não fala essas coisas de boiola em voz alta. – Sussurrei olhando ao redor para me certificar que não havia ninguém ouvindo. - E bom talvez esse seja exatamente o problema para mim. Não tenho olhos para outra garota. Não mais, pelo menos. Só que como vou falar isso para uma garota que acreditou durante um ano que ainda estávamos juntos?

– Espera ai um momento. - Quil balançou a cabeça atordoado. - Você disse que não tem mais olhos para outra garota? - Assenti. – Você quer dizer que está mesmo gostando da Nessie? - Um sorriso malicioso começou a se formar em seu rosto.

– Eu pensei que você já tinha se dado conta disso. - Falei me sentindo desconfortável.

– Eu já tinha percebido, mas você nunca admitiu em alto e bom som. - Disse. – AAAAAAAAAAAH, JAKE TÁ XONADINHO! - Gritou gargalhando.

– Cala a boca seu animal. - Dei-lhe um soco mais forte do que de costume no seu ombro, fazendo o gargalhar mais ainda.

Para minha felicidade ninguém pareceu ter entendido as palavras histéricas do meu amigo. Não que eu me importasse em dizer que estava gostando de uma garota, mas isso não quer dizer que quero que as pessoas saiam gritando coisas do gênero por ai.

– Certo, podemos nos concentrar no meu problema de agora? - Retomei a palavra, porém Quil me interrompeu, com os olhos acima de minha cabeça, fazendo sinal para que eu me vira-se.

Assim que fitei o local onde meu amigo parecia imensamente hipnotizado, gelei. Lá estava ela, realmente de volta.

– Oi bebê! - Jéssica saudou-me, visivelmente entusiasmada.

POV NESSIE

Ouvia quase desatenta ao tagarelar incessante de Claire sobre sua primeira consulta ao médico, que seria amanhã à tarde após o termino as aulas. Segundo ela Quil queria que a consulta fosse o quanto antes por alguma necessidade urgente. Não prestei muita atenção nisso.

O dia estava passando irritantemente lento, mas isso possivelmente se devia ao fato de eu estar ansiando ver Jake desde que nos despedimos mais cedo. Agradeci mentalmente por Nahuel estar conosco e responder prestativamente aos comentários intermináveis de minha amiga.

– Então, vai voltar com Jake? - Claire sorriu maliciosa para mim.

– Hum, acho que sim. - Tentei parecer indiferente, mas sem sucesso algum.

– Óin amiga! É tão bom ver você apaixonada. - Ela sorriu carinhosamente.

– Qual é, eu não estou apaixonada. - Retruquei sentindo meu rosto esquentar.

Claire e Nahuel trocaram um olhar debochado para depois voltarem a me fitar desacreditados.

– Vocês dois são cabeças duras. Os dois então perdidamente loucos um pelo outro e continuam fazendo charme. - Nahuel comentou recebendo total concordância de Claire.

– Vocês é que estão viajando legal. - Resmunguei. – Jake obviamente não está louco por mim. É só... Atração.

– Atração? Ele me ligou dizendo para ir com o Quil hoje que queria ir pessoalmente te buscar OBVIAMENTE porque sente APENAS uma atração por você. - Desdenhou minha amiga, fazendo com que Nahuel gargalhasse.

– Ele... Ele pediu... Ele pediu para ir... ? - Repeti gaguejando, sentido um calor preencher meu corpo, fazendo com que eu sorriso inesperado brotasse em meu rosto.

Claire concordou com a cabeça olhando para frente. Surpreendi-me em como sua expressão mudou instantemente para perplexidade.

Virei meu olhar na mesma direção curiosa, depois de perceber que Nahuel tinha o mesmo olhar hipnotizado de minha amiga.

Senti minha boca escancarar à medida que a cena fazia sentindo em minha mente. No começo refleti que ela apenas tinha voltado de viajem, e estava inofensivamente conversando com ele. Porém, a cena que se sucedeu fez com que eu desviasse o olhar instantemente, virando-me de costas para os dois.

– Claire, me leva pra casa? - Perguntei controlando a voz embargada pelo choro que ameaçava vir a qualquer momento.

– Nessie, olha lá... - Ela tentou me fazer virar novamente, mas eu a impedi.

Eu não precisava ver Jacob beijando outra garota descaradamente.

– Nahuel? - Supliquei fechando os olhos com força.

– Hum, claro. - Concordou prontamente, puxando-me pelo braço.

Ouvi a voz de Claire me chamar, mas ignorei. Continuei caminhando até o carro de meu amigo e permaneci a viajem inteira em silêncio.

Ótimo. Simplesmente perfeito! Era exatamente isso que eu queria. Seria a próxima tachada como corna naquele colégio. Fora justamente por isso que relutei em expor publicamente o meu suposto envolvimento com Jake. Eu tinha medo dessa estranha relação durasse apenas uma semana – como todas anteriores do rapaz – e eu ser apenas mais uma.

Mas fora extremamente pior. Minha relação com ele não durou nem um dia inteiro, e ele já estava “me traindo”. Como pude ser tão tola de imaginar um segundo se quer que Jake realmente queria alguma coisa séria? Ainda por cima comigo?

É claro que ele estava apenas me perseguindo por ser algo mais parecido que um desafio para ele, uma vez que não suspirei instantemente por sua beleza estonteante, como todas as otárias do colégio. Pude não ter caído em seus encantos de imediato, mas enfim eu cai. E isso, aparentemente, fez com que perdesse totalmente a graça para ele.

– Quer que eu fique com você? - Nahuel proferiu as primeiras palavras desde que concordara em me levar para casa.

Foi só então que reparei que já estava em frente a casa de Charlie.

– Não. Está tudo bem. - Retirei o cinto abrindo a porta. – Obrigada pela carona.

Não esperei resposta, apenas entrei correndo em casa desesperada para ficar sozinha.

– Ness? - Ouvi a voz do meu pai me chamar assim que fechei a porta da frente com força excessiva.

Parei de andar e me virei relutante para ele.

– Agora não, pai. Quero ficar sozinha. - Disse simplesmente seguindo até meu quarto.

Para minha enorme felicidade, ele não me seguiu.

Fui direito para baixo do chuveiro, desesperada por um banho gelado. Desejava que a água que caia pelo meu corpo levasse para baixo do ralo o peso que sentia dentro do peito. Por que diabos fiz isso comigo mesma? Não fora sempre eu que me recusava minuciosamente a NUNCA ficar nesse estado por causa de um homem?

Depois de vestir uma roupa leve, deitei em minha cama e liguei a TV. Minha idéia era distrair-me com qualquer programinha idiota que estivesse passando, porém nem preciso dizer que não obtive o menor sucesso, não é?

Ouvi alguém bater na porta. Provavelmente meu pai querendo encher o saco por eu ter entrado de forma tão espalhafatosa e sem nem dar uma explicação plausível em casa, ou então querer finalmente conversar sobre aquele assunto.

Definitivamente, não estava no humor para nenhum dos dois.

– Estou ocupada estudando. – Gritei para quem fosse à criatura inconveniente. -... Pelada! – Acrescentei para que se fosse de fato meu pai, desistisse de me importunar.

– Esse comentário era para me fazer desistir? – Ouvi a voz rouca da última pessoa que queria ver naquele momento, brincar sarcasticamente do outro lado da porta.