*Lucy

Cada centímetro do meu corpo estava coberto de vergonha. Como eu pude fazer aquilo com Daniel? Acho que eu não havia percebido o quão estava desesperada, e o quanto ainda estava magoada até Dan me afastar de seus lábios e me olhar como se eu fosse um inseto esquisito que havia pousado na sua boca.

Naquela noite eu não dormi tão cedo. Simplesmente fiquei deitada, ouvindo as músicas mais tristes que pude encontrar, encarando o teto e chorando muito. Me lembrando de cada momento, cada segundo ao lado de Victor.

Nós havíamos nos conhecido em uma livraria. Havíamos escolhido o mesmo livro, e nossas mãos se encontraram quando fui pegá-lo. Ele como um cavalheiro me deixou levar o livro e na saída da livraria, acabamos nos esbarrando e eu desastrada como sempre, derramei meu expresso por toda a sua camisa. Eu o levei até meu apartamento para limpar sua camisa cheia de café e nós nos beijamos pela primeira vez.

Parecia uma cena de filme, a partir daquele beijo eu soube que iria ama-lo muito.

E amei. Mesmo durante todas as brigas e manhãs cinzentas. Mesmo durante as noites em que ele não voltava para casa e eu o esperava sentada no sofá. Mesmo durante os dias em que ele continuava mentindo para mim quando eu já sabia de toda a verdade.

Os filmes sempre mostram o término de um relacionamento como algo simples, fácil e divertido. Mas com certeza, não é nada disso. A cada dia que se passa, a ferida em mim se abre cada vez mais.

Eu queria seguir em frente, de verdade. O ato impensado com Dan naquela noite era a prova viva e constrangedora disso. Mas era mais fácil pensar do que realmente fazer. Dan havia me dito que alguma coisa muito boa estava prestes a acontecer comigo. Bem Universo, eu espero que aconteça logo, porque nesse momento eu duvido seriamente que serei capaz de ser feliz algum dia.

As horas passam, e eu acabo pegando no sono. A última coisa que vejo é a camisa velha da banda de rock favorita de Victor no canto do meu quarto.

A luz do sol trespassando as cortinas do quarto me acorda. Quando me levanto, encaro as manchas das lágrimas da noite anterior carimbadas no meu travesseiro. E aquela pequena, suja e triste visão é o que me motiva a levantar da cama furiosamente, agarrar os lençóis, a camiseta de Victor e tudo que ainda resta dele naquele quarto. Determinada, e talvez um pouco alucinada, atiro tudo aquilo pela janela e observo o lençol branco flutuando até a rua, como um fantasma indo embora, finalmente, me deixando livre para recomeçar. Ouço os gritos raivosos da minha vizinha de baixo, uma senhora centenária cujo passatempo favorito é infernizar minha vida, mas até aquilo me faz sorrir.

Coloco meu vestido florido, aquele que Victor sempre dizia que não caia bem em mim, os saltos que ele também não gostava e passo meu melhor batom. Saio do quarto e vejo Dan ainda roncando no sofá. Respiro fundo, agarro minha bolsa e saio de casa com um objetivo em mente.

Hoje eu iria recomeçar, já havia esperado muito tempo e estava cansada de toda aquela tristeza. Reescrever minha vida do zero. Fazer tudo aquilo que sempre me fez feliz. Como caminhar ao longo da praia, montar um arranjo de flores, ir ao cinema acompanhada pela pessoa que sempre esteve ao meu lado quando precisei: eu mesma.

No fim da tarde, já havia visitado praticamente metade dos pontos turísticos da cidade e meus pés estavam me matando. Mas quanto mais eu caminhava, mais sentia meu passado sendo deixado para trás e isso valia a pena à dor nos pés.

Mas quando eu simplesmente não pude mais aguentar, parei em uma pequena loja de sucos naturais e despejei todas as minhas sacolas em uma mesa. Havia comprado muitas coisas naquela manhã, vários souvenires turísticos que eu jamais precisaria, aquele cd da minha cantora favorita que eu ainda não tinha, livros cheios de romances água com açúcar e é claro, meu lindo arranjo de flores. Pedi uma limonada para viagem, agarrei minhas sacolas enormes e cheias e fui embora.

Quando estava quase atravessando a rua, ouvi uma voz chamando ao longe, e de repente, alguém estava com uma mão em meu ombro. Me virei e o vi. Com meu arranjo de flores em uma das mãos e o sorriso mais charmoso de todos nos lábios.

–Você esqueceu isso. –ele me disse, com um carregado sotaque britânico e eu não pude fazer nada além de sorrir para aquele homem.