O grito que irrompeu de sua garganta mesclou-se com a trovoada raivosa do lado de fora da torre. Wanda sentara-se antes mesmo de acordar completamente, com lágrimas ácidas molhando o rosto e a mente cheia de perturbações, porque algo pareceu puxar seu peito sem o mínimo de receio, forçando-a naquela posição. Nenhuma dor externa chegaria perto dos demônios que a garota estava enfrentando, chegara a esta conclusão.
A cena que surgia em seu sonho era sempre a mesma, como um "looping" eterno no qual ela era obrigada a viver repetidas vezes. Wanda tinha que assistir seu irmão sendo baleado e caindo sem vida todas as noites, e nunca podia fazer nada. Nem em sonho ela conseguia ser feliz. Mas, talvez, fosse melhor assim, porque a bruxa sempre acordaria no dia seguinte decepcionada, frustrada e um pouco mais no fundo do poço assim que percebesse que Pietro não estava ao seu lado.
Ainda tremendo, Wanda deitou-se novamente, cobrindo-se até a cabeça com os lençóis, forçando-se a dormir. Não estava funcionando. O barulho da água batendo na arquitetura da Torre dos Vingadores era estressante o suficiente para que ela quisesse fazer parar de forma não amigável, e a chuva não era exatamente uma amiga desde que se fez presente no velório de Pietro. Wanda não gostava de nada que a lembrasse daquele dia.
Mesmo de olhos fechados, as lágrimas apenas se intensificaram, provocando soluços baixinhos que tentava ignorar. Ela não queria passar a noite sozinha; descobrira desde muito cedo que sua própria mente era sua maior vilã. Na HYDRA, quando queriam conter seus poderes, apenas forçavam-na a ter lembranças ruins de sua vida – era sempre a morte de seus pais. Isso a desconcentrava, e assim eles a domesticaram.
“Nós temos um ao outro”, seu irmão e ela costumavam dizer isso, e tudo ficava bem, depois, porque era verdade, mas agora Wanda não o tinha mais; ela estava sozinha e isso não mudaria nem quando a chuva passasse, nem quando o dia amanhecesse, nem nunca. Pietro estava morto, e repetir essas palavras doía mais do que podia suportar, como um incêndio dilacerando toda sua alma, nunca tentando ser calmo ou gentil.
“Me chame se precisar de algo”, era o que Clint lhe dizia todos os dias, lembrou-se. Talvez repensasse isso no dia seguinte e achasse uma ideia ruim, mas aquele parecia ser um bom momento para fazer isso. Ela estava precisando dele, afinal.
Movida por este pensamento, e quase agindo em piloto automático, Wanda se soltou das cobertas que a prendiam em sua cama e, em passos lentos e silenciosos, seguiu seu caminho. Era engraçado como tudo parecia ficar mais barulhento durante a madrugada; a maçaneta de seu quarto rugiu de forma mais alta e sua caminhada lembrava o batuque surdo e contínuo em um tambor sem ritmo e impreciso, devido aos tremores que ainda sacudiam seu corpo.
Não melhorou quando chegou ao quarto dele. A porta chiou em um barulho absurdamente alto para ela – ou podia ser apenas impressão – antes que finalmente adentrasse o local. Como era de se esperar, o arqueiro estava dormindo, de costas para a porta, totalmente absorto ao que estava acontecendo ali, sem ter a menor ideia de que Wanda estava ali e do porque dela estar ali.
Antes mesmo de repensar para descobrir se era ou não uma boa ideia, ela deu a volta na cama, ficando frente a frente com ele. Sorrateiramente, Wanda sentou na cama e se deitou, ajustando-se ao lado de Clint. Isso o acordou, obviamente – ela não esperava o contrário –, e seus olhos imediatamente se depararam com os dela. Na superfície de sua mente, a bruxa conseguiu captar um pouco de sua confusão, antes que a compreensão de quem estava ao seu lado o atingisse.