Rediscovering a Dream escrita por Loren


Capítulo 6
Capítulo Cinco




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/662395/chapter/6

Edmundo acordou.

A cabeça doía. Não era uma dor intensa, mas estava ali dentro. Como se estivessem apertando as paredes do crânio contra o cérebro. Sentou-se e olhou ao redor. Era a prisão, calabouço, sem dúvida. Paredes montadas grosseiramente, apesar de que mais parecia uma caverna que abriram e colocaram uma porta gradeada, de tão malfeita e suja que era. Em alguns cantos podia se enxergar pilhas de ossos e excrementos secos. Edmundo aproximou-se da única janela, a qual era somente um buraco gradeado, para poder inspirar o ar puro. O cheiro daquele lugar era desagradável e enjoativo. Sentia náuseas. Olhou mais uma vez para o lugar e deixou os ombros caírem quando percebeu que não havia realmente modo algum de escapar.

Com o canto do olho percebeu o outro se remexer. Caspian também estava desacordado. Lembrava-se que foram atacados por mercadores de escravos e rendidos. A irmã e o pedrimo levados para outro lugar e por motivo desconhecidos. Enquanto ele e Caspian foram jogados ali. Ele havia tentado revidar e recordava-se apenas de tudo escurecer em seguida. Provavelmente, o outro rei fizera o mesmo. Ajoelhou-se ao lado do companheiro e sacudiu seu ombro.

—Caspian? Acorde! Precisamos sair daqui!

O rei resmungou alguma coisa. Tinha as sobrancelhas juntas.

—O quê?- o sacudiu mais um pouco e aproximou o rosto para ouvir melhor.

Talvez este tenha sido o erro dele. Ou apenas grande azar.

Iri...- a voz soou com um gemido.

Edmundo afastou-se, completamente assustado e caiu sentado. Caspian deitou-se de barriga para cima e repetiu o nome. Repetiu mais e mais uma, até que seu próprio corpo se mexeu e podia-se perceber que não era de desconforto. Edmundo estava estático e voltou a si quando viu um sorriso brotar na boca de Caspian. Aquele sorriso podia significar muitas coisas, exceto inocência. Edmundo sentiu o sangue borbulhar de raiva e seu coração o expulsava e recuperava com uma velocidade tão grande que ele sentiu-se sem ar.

Pegou uma pedra e levantou-se. Não conseguia seguir vendo aquilo. Ergueu a mão e jogou contra as grades, causando um enorme barulho e acordando Caspian.

—Céus... O quê... O que aconteceu? Onde...

—Estamos na prisão. Levaram Lúcia e Eustáquio para algumar lugar e não faço a menor ideia de como sair daqui.- respondeu o moreno de costas.

—E Irina?

Edmundo fechou os punhos e endureceu os ombros. Concentrava-se na respiração, para não ser a raiva. Porém, logo considerou a pergunta e o corpo relaxou, tendo ganhado um olhar triste.

—Eu não sei.

 

 

 

—Lúcia? Lúcia! Acorde!- uma voz fina e trêmula a acordou.

Ela abriu os olhos e encontrou o céu escuro, sem lugar e com poucas estrelas corajosas para se aventurarem por ali. Esticou as pernas e costas, afastando o desconforto de ter dormido sentada, na rua e encostada em uma parede com mãos e pernas acorrentadas. Olhou para o primo e murmurou com a voz rouca.

—Onde... O quê... Aconteceu?

—Nos prenderam aqui. Vão nos vender como escravos!- Eustáquio tentava se controlar, mas o tremor na voz denunciava seu medo.

Lúcia juntou as sobrancelhas, observando o primo.

—Eustáquio, você não apagou?

—Não consegui! Quando nos trouxeram para cá, nos bateram para desmaiarmos, mas acordei já faz muito tempo!- a ruiva não duvidava da veracidade daquelas palavras, levando em conta as olheiras do primo.

Lúcia suspirou e tentou se ajeitar.

—Onde estão Caspian e Edmundo?- Eustáquio deu de ombros.

Parecia mais calmo após a prima ter acordado. E de fato estava. Enfrentar um problema com alguém, por mais que não seja de seu agrado, é sempre mais confortável do que sozinho.

—Não faço a menor ideia. Levaram eles para o outro lado.

Lúcia olhou para o céu. Ainda estava escuro, mas dentro de poucas horas a manhã já começaria. Sempre quando estamos concentrados em algo, o tempo passa mais rápido. Lúcia apertou os dedos repetidas vezes para o sangue cirular, enquanto pensava se tinha algum grampo ou outra ideia para abrir as algemas grossas.

—Me pergunto- o primo a retirou dos pensamentos-, o que aconteceu com a loira.

Lúcia engoliu em seco e arregalou os olhos.

—Oh céus... Irina! É verdade!- murmurou, espantada.- Como pude esquecê-la?

—O que disse?- perguntou Eustáquio aproximando-se, porém Lúcia abanou a cabeça.

—Nada, nada. Quando foi a última vez que a viu?

—Ela subiu em uma das casas. Havíamos visto um vulto e ela foi conferir. Foi quando me prenderam, por pura sorte, claro.- acrescentou, estufando um pouco o peito.

Lúcia revirou os olhos.

—Subiram outros para pegá-la. Ela correu para dentro de uma casa, acredito. Não a vi mais, mas deve ter escapado, se não estaria aqui.

Lúcia olhou para o chão e queria pensar em como escapar, mas a grande boca de seu primo não permitiu.

—Aquele rapaz... O rei, pelo que entendi, deve estar desesperado.

—Caspian?

—Se esse é o nome do cabeludo. Aliás, por que tanto cabelo? Tem um aspecto... sujo.

—Cale a boca, Eustáquio. E Caspian não é sujo! E é claro que deve estar desesperado! As Ilhas Solitárias estão nas mãos dessa corja de escravistas e...

—Não me referia a isso.- murmurou, olhando para o dorminhoco em seu ombro e tentando tirá-lo sem acordá-lo.

—E a que se referia?

—Achei que tinha dito para me calar.

—Ora, diga logo!- exclamou, irritada.

—Me referia à sua esposa.- Lúcia ficou estática.

—Esposa?

—Rainha, amante, alteza, o que preferir chamar.

—Caspian não é casado. E não tem nenhum relacionamento, pelo que entendi.- ele a olhou, um pouco confuso.

—E quanto a loira?

—Irina?- ele assentiu e ela riu.- Não são nada disso. São apenas amigos. Além do mais, Iri e Ed se gostam.

—É mesmo?- perguntou com os olhos esbugalhados.- Bom, se eu fosse o próximo o bastante, aconselharia ao primo a tomar cuidado. Acredito que o cabeludo esteja interessado.

—Ora, mas que bobagem, Eustáquio! De que lugar tirou essa ideia?

—Eu vi. As trocas de olhares são constantes. Principalmente por parte dele.

Lúcia quis rir, mas segurou-se ao ver o semblante sério do primo. Apenas sorriu de forma descrente.

—Desde quando tu repara tanto ao seu redor, sem ser a si mesmo, Eustáquio?

Novamente, com o orgulho ferido, ele ergueu a cabeça antes de falar e endireitou os ombros.

—Pois saiba, querida prima, que sempre reparei, apenas não dou grande importância. Não me importo se o leiteiro bebe um pouco da garrafa antes de entregá-la. Não me importo se meu pai trai minha mãe todas as quinta-feiras. Não me importo com a triste expressão que Edmundo carrega por não ter idade para o alistamento e não me importo com sua tristeza por não ser e ter a vida amorosa de sua irmã, prima Susana.- Lúcia tinha os olhos arregalados e após a última palavra, corou de vergonha.- Se não me afeta, não interessa. O leite continuará a chegar, meu pai pagará meus estudos e não irá demorar muito para a senhorita e seu irmão irem embora. Desculpe se a incomodei. Não sei porque achei que poderíamos ter uma conversa amistosa presos a estas correntes para sermos vendidos como escravos.- dito isso, virou o rosto e empurrou o dorminhoco para o outro. Nem sequer se mexeram.

Lúcia engoliu em seco, por fim. Sentia-se envergonhada pelo primo saber de suas emoções. Estava tão atordoada que nem pensou em perguntar como ele sabia. Tristeza também a invadia, pois a maneira egoísta e rude do primo a machucaram mais do que o previsto, assim como o seu desprezo para consigo e Edmundo. Não imaginava que Eustáquio pudesse ser tão amargo assim. Após algum tempo, Eustáquio cochilou com a cabeça recostada na parede e só então Lúcia voltou a pensar em Irina e no que o primo havia dito, porém não se ateve muito a isso. É claro que debateu por alguns minutos se a hipótese tinha algum senso, mas não conseguia acreditar. Ou ela esteve muito distraída ou o primo enganou-se. Ao final, adormeceu com a recusa da ideia. Não somente porque era Irina, a paixão de seu irmão e boa amiga, mas também porque não conseguia visualizar Caspian apaixonado. A ideia lhe embrulhava o estômago.

 

 

 

Acordou antes de abrir os olhos. Mas a verdade é que nem queria abri-los.

Sentia desconforto nas costas, dormências nas pernas e um calor absurdo. Diferentemente de quando estava no barco, não sentia vento ou brisa ali. Como se o ar estivesse parado, sem circulação. Queria continuar ali, sem se mover, com a esperança de que voltasse a dormir ou que o bafo do local tirasse o ar de seus pulmões de uma vez.

—Sei que está acordada. Abra logo teus olhos, garota.

Era uma voz rouca e impaciente. Irina obedeceu, a contra gosto, porém curiosa para saber onde estava e com quem. Não havia luz no local, a não ser o fogo da lareira. A primeira coisa que enxergou foi a pequena caldeira pendurada sobre o fogo, com a tampa entraberta. Olhou para si e viu com a pouca luz que estava com o peitoral enfaixado. Olhou ao redor e não conseguiu distinguir mais nada. Estava um completo breu.

—Como poderia saber que eu estava acordada?

—O ritmo da sua respiração mudou.- respondeu a voz por trás dela, acompanhada do som de fluidos. Parecia ser uma mulher.- Ou estaria acordando ou estaria morrendo. E eu sei reconhecer futuros cadáveres. Além do mais, isto aqui não é uma pousada. Se fosse morrer, já a teria jogado fora.

—Isto não parece ser coisa alguma...- a loira murmurou e ouviu passos.

—Cale a boca, mal agradecida.

Sentiu a cabeça ser puxada para trás e enfiarem um copo em seus lábios. Quis revidar com o susto, mas logo percebeu que o líquido era água e só então percebera como a garganta estava seca. A soltou e seus passos aproximaram do fogo, o qual recortou-se com uma igura corcunda e gorda. Mexeu na panela com uma colher e serviu duas tigelas. Virou-se e estendeu uma para a loira, que pegou acompanhada de um grunhido. O ombro ardeu com o movimento e por sua espinha desceu uma dor suave.

—Está doendo?

—Não como antes. Foi a senhora que me puxou?

—Sim. Tu estava tonta e sangrando. Não demoraria para ser pega.- respondeu enquanto virava-se para fechar a panela.

Pegou a própria tigela lentamente e murmurando contra as dores do corpo.Em seguida, puxou uma cadeira do escuro e sentou-se, começando a comer. Irina observou a figura à sua frente. Tinha cabelos crespos bagunçados e brancos. Metade de seu rosto estava na penumbra e a outra metade podiam-se ver apenas rugas banharem o rosto. Havia algo em seu olho que ela não conseguia identificar. Estava fechado, porém tinha algo em si que descia até a boca.

—Se não comer agora, a sopa vai esfriar.

Irina piscou, absorta e voltou-se para a comida. Comeram em silêncio, apenas o som das colheres contra as tigelas e bocas por ali. Continuava a se sentir abafada, porém sentiu-se melhor após o alimento. Chegava a ter as pálpebras mais abertas. A velha seviu-se outra vez e continuou a comer em silêncio.

—Obrigada, senhora.- disse por fim. Era o certo, afinal.- Por ter me cuidado e alimentado.

—Tu não tens que me agradecer.

—Ainda assim, sou muito...

—Não, garota. Tu não tens que me agradecer. Agradeça à sua irmã.

—Helena?- indagou, um pouco surpresa, um pouco confusa.

—Ela salvou a minha vida. Esta é maneira de agradecê-la.

—Mas por que eu?

—Foi o que ela pediu.- e por um segundo, Irina sorriu.

Continuava a sentir falta da irmã, mas já não era um peso em si. Não era mais uma dúvida, mas sim uma lembrança. Uma lembrança boa.

—Diga a ela que já paguei minha dívida.- disse, erguendo-se.

Irina suspirou.

—Está morta.- a velha parou por um momento, mas não demorou a voltar a falar.

—Bem, se lhe faltava apenas isso, agora descansará totalmente.

Pegou a sua tigela e a de Irina, levando-as para o fundo. Irina tentou olhar por sobre o ombro, mas o fogo não era o suficiente para iluminar.

Como consegue viver dessa maneira?

—Uma pena. Sua irmã era uma mulher de valor.

—Concordo.- a velha voltou a se sentar.

—Ela ajudou muito os Narnianos e Arquelândios. Até mesmo alguns Calormanos. Era muito justa, apesar do temperamento instável.- a loira sorriu de canto.

Diferentemente do esperado, Irina não sentia-se mal quando as pessoas vinham lhe falar de sua irmã. Não sentia inveja ou inferioridade. Sentia orgulho e felicidade ao pensar que, mesmo não sendo de sangue, podia chamá-la de irmã. Durante os anos em Nárnia ouviu as histórias de suas aventuras e conheceu criaturas que puderam lhe dar mais detalhes. Ao descobrir tudo isso, sentiu-se aliviada, pois viu que sempre esteve certa. Apesar do sumiço, Helena continuara fazendo o que sempre lhe era do feitio: correr atrás. De quê, a cada momento variava, mas ela sempre ia.

—Espero que não ache que eu vá dizer que tu é especial como tua irmã.

—Não espero.

Dizia a verdade. Não se comparava com a irmã. Não havia como. A verdade é que nem queria tentar seguir seus passos. Não que não conseguisse ser boa em algo. Se entendia com as adagas. Todavia, Helena havia sido escolhida por Aslam. E ela, Irina, estava ali somente por causa de Helena. Não que não confiasse em si. Apenas sabia seu lugar.

—Que bom que sabe, garota. Porque tu não é especial. Não se preocupe, eu também não sou. A verdade é que nem todos nascemos para brilhar. A grande maioria, na realidade, serve como espectador. Alguns conseguem ser os coadjuvantes para os escolhidos.

—Mal da vida, talvez.- disse, com um humor debochado.

—Mas deixa eu te contar uma coisa: somente porque não nascemos para grandes destinos, isso não nos nega a escolha.

—O que quer dizer?

—Podemos não mudar o mundo, viver grandes aventuras, ganhar a glória ou coisa do tipo. Mas nossas ações refletem no nosso dia a dia. É escolha nossa, mesmo que o universo não se importe, se faremos nossa vida valer de algo. Às vezes, podem ser coisas bobas: a família, uma vocação, uma viagem, um amor.

Instintivamente, a mente de Irina voltou-se para Edmundo. Entretanto, tão rápido como apareceu o primeiro, apareceu o segundo. Ela engoliu em seco.

—Às vezes, não ser especial, também é algo bom.

—Por que está me dizendo isso?

—Porque de ti flui um vazio melancólico horrível.- a loira espantou-se, sem saber o porquê.- Te digo isso porque é uma lástima essa- hesitou antes de dizer com repulsa-, coisa que carrega em si. Somente porque o Universo não lhe escolheu para grandezas, isso não te tira a opção de tentar ser feliz. Ou, no mínimo, ser satisfeita com a vida. Tu não é obrigada a isso. A tua escolha continua a ter maior peso que teu destino.

A loira perdeu as palavras por um momento. Antes de pensar sobre, a velha falou mais um pouco.

—Além disso, sei que Helena morreria de desgosto ao vê-la assim.- suspirou.- Ela lhe amava muito.

—Eu sei.- respondeu, sorrindo.

—Então, não deixe que a luta dela para te trazer aqui, seja em vão.

A velha virou o corpo para a lareira e jogou uma lenha para aumentar o fogo. Irina pôde enxergar duas linhas costuras em seu rosto, desde as sobrancelhas até a boca. Era cega.

—Não permita que a tua vida seja em vão.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olá!
Após muito tempo, novamente volto com esta fic. Deve ser a segunda ou terceira vez. Pretendo não me demorar com as postagens, mas, é apenas uma meta. Se encontrarem erros de gramática, agradeço se avisarem.
Espero que tenham gostado.
Beijos e abraços apertados da Loren.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Rediscovering a Dream" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.