Torne seus Momentos Inesquecíveis escrita por Éden


Capítulo 1
Momentos


Notas iniciais do capítulo

Sim, o nome da cidade é Macaraju.



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A vida é cheia deles: Momentos. Sejam felizes, tristes, enigmáticos, misteriosos. Ninguém pode escolher os momentos que deseja viver, eles esteram sempre ali, a espera e prontos para acontecer. As vezes demoram, as vezes chegam rápidos até demais, mas a certeza é única: Eles sempre vem.

Com o rosto colado no vidro do carro, Jonatas viaja, observando a paisagem sendo embaçada pelas gotas de chuva, que começaram a cair brandas e calmas, um gotinha por vez. O motorista dirigia silencioso, não que seja um calado, ele é até falante demais, mas no estado que o rapaz se encontrava dentro do automóvel, ninguém se atrevia a conversar. Tudo que Jonatas queria era se perder nos pensamentos, eram tristes, de fato, mas isso movia sua vida: Coisas tristes, sem sentindo, diria fúteis e falsas.

Falsidade essa que, sustentou durante vinte e cinco anos de sua vida, sempre tentando agradar os pais, namorou com aquela que eles diziam “Certa para você”, mania de pai, dizer o que é certo para o filho, mas se eles não dissessem, quem ia dizer? Ninguém. Jonatas sempre aprendeu que na vida, ninguém vai te dizer o que fazer e o que não fazer, você tem que tomar suas próprias decisões, no momento certo elas serão certas, nos momentos errados, elas continuaram certas, pois vieram de dentro de você e tudo que vem do fundo é intenso, firme, verdadeiro. Ágata não foi uma decisão certa, pois no momento errado, ela foi errada. Sempre foram empurrados um no outro, mas nunca perguntaram o que ele achava disso, segundo o pai, não era necessário. Não tinha idade para escolher. Cresceu e segundo o pai, não tinha maturidade para escolher. Amadureceu e segundo o pai, não tinha capacidade para escolher.

Já reparou que, em todas as nossas escolhas, existem aquelas pessoas que vivem para dizer que elas são erradas? Geralmente, aquele amigo falso, aquela amiga invejosa, mas no caso de Jonatas não. Amadeu é um pai frio, rancoroso e egocêntrico. Só pensa naquilo que favorece sua imagem de “bom político”. Obrigou o filho a namorar com uma garota cheia de problemas e ciumenta, tudo para passar a imagem de “família perfeita”, mas o perfeito é relativo, inexistente, quando se trata na família de Jonatas.

Depois de tomar sua primeira decisão sensata, sem precisar da aprovação ou argumentos do pai e da mãe, Jonatas decidiu viajar e passar alguns dias na fazenda da família, que não ia desde os doze anos. Eram seus dias mais felizes, quando ficava o dia todo fora, jogando bola e comendo fruta do pé, além de que não tinha o pai, apenas sua avó, Cleonice, a governanta Maria e seu filho, três anos mais velho, Conrado, o melhor amigo que Jonatas já teve na vida. Uma amizade verdadeira, sem preconceitos e baseada na felicidade de quando estavam juntos, não em quanto tinha na conta bancária de Amadeu.

— Já tamo quase chegando, patrão. — disse o motorista, quebrando o silêncio que já durava horas. Jonatas permaneceu em silêncio, olhando a paisagem da cidade de Macaraju, do interior mineiro. Pequena, calma e silenciosa. Tudo que o rapaz precisava. — A senhora, sua mãe, disse que chegaria daqui a três dias, ainda tinha coisas para resolver em Belo Horizonte.

— E meu pai? Ele disse algo? — perguntou Jonatas, deixando o silêncio de lado e, desanimado, tentando saber o que se passava em sua casa, que já não via desde o término com Ágata.

— Não. — respondeu.

— Que bom. Espero que ele não venha. — ponderou Jonatas, ficando com uma pontinha de alegria ao saber que o pai já não vinha. Queria ter dias felizes, não dias ouvindo a voz do pai.

Enfim, depois de muito rodear pelo interior de Minas Gerais, chegaram a um pequeno município, que se assemelhava mais a uma vilazinha de tão miúda. Canaviais e milharais por todos os lados, o verde compunha grande parte do território Macarujense. Poucas e simples casinhas rodeavam a praça central, nela, a simplória Igreja de São João de Macaraju, onde crianças brincavam na grama mal cortada e nas flores dos jardins. Ao lado da padaria brasão, um pequeno mercadinho de tudo, provavelmente onde toda cidade se abastecia, um banco com três atendentes, ao lado do correiro e, no fim da rua, a Escola João Júlio de Matos, o fundador de Macaraju.

Jonatas ficava feliz. As lembranças iam vindo pouco a pouco, momentos felizes que ele não poderia esquecer, como quando comeu a Torta da Dona Joaninha, a quitandeira que cuida da Padaria Brasão, o doce mais gostoso que já provou, ou quando jogou queimada pela primeira vez, no meio da rua com as outras crianças de Macaraju, que já devem ser pais e mães de família atualmente, e, quando se aproximava da pracinha, atrás da igreja, teve sua lembrança mais intensa e confusa, o dia que seus sentimentos ficaram embaralhados: Se ele se lembra bem, aos doze anos, no seu último dia em Macaraju, recebeu de Conrado um abraço, mas não um qualquer. Um abraço diferente, que o fez sentir algo que nunca sentiu na vida: Um aperto no coração, uma chama ardente no peito e um desejo inexplicável na mente. Aquilo fez Jonatas ficar confuso, perdido, tentou ganhar algo além de um abraço, um beijo, mas Conrado não queria o mesmo e empurrou o rapaz no chão, saindo furioso da praça e voltando para a fazenda, desde então nunca se falaram.

De fato, fora seu momento mais intenso e confuso da vida. Não havia explicação para seus atos, foi como se algo mais forte que ele tomasse conta do corpo e os fizesse, uma coisa que até então ele não conhecia. Conheceu apenas naquele dia: O amor. Ele amou, mas não pode amar, ninguém quer ter um filho “aberração da natureza”, era isso que ele se chamava, se achava. Um homem não podia amar outro homem, ou será que podia?

Vinte minutos após sair da cidade e entrar na Zona Rural de Macaraju, começaram a passar pelos sítios e fazendas de luxo que compunham a “Zona de Luxo Rural”. Apenas pessoas poderosas tinham casas ali, mas não era só “casas”, eram mansões completas, com piscina, pomar, curral e tudo que se tem direito, além da conhecida Mata do Perdido aos fundos. A casa de Jonatas era a mais afastadinha das demais, mas mesmo assim não perdia seu luxo, se bem que, era mais rústica, em um estilo vintage.

Finalmente chegaram. Como disse, a casa tinha um ar vintage, antigo. A pintura fazia remeter a madeira, telhados com telha de barro, árvores e plantas diversas por todos os lados, animais espalhados pelo quintal, flores e borboletas colorindo o ambiente, além de uma pequena lagoa, cheia de patinhos e um exuberante cisne. Aos fundos, um curral de madeira enorme e uma vasta e densa floresta.

— Chegamos, patrão! — disse o motorista, contando o óbvio a Jonatas, que desfez sua carranca de tristeza e sorriu pela primeira vez, observando o exterior da fazenda e tendo nostalgia e saudade do passado. Abriu a porta do carro e saiu, observando cada detalhe da “Fazenda Paixão”, um lugar lindo, que todas as pessoas deviam conhecer. Colocou o capuz para se proteger da fina chuva, e, enquanto observava, começou a ouvir sons de cavalo trotando e, aparentemente, vindo em sua direção.

— Tem alguém vindo… — indagou, caminhando até a entrada da fazenda e abrindo a porteira. O trotar foi ficando cada vez mais alto, a pessoa estava cada vez mais perto. Jonatas não se importava, continuava em frente, até que o barulho parou.

— Quem são ocês e o que tão fazendo aqui? — disse uma voz máscula, de feitio rústica. Os erros de português, típicos das pessoas de interior. Jonatas parou, retirou o capuz e virou-se para a direção do emissor do som. Se surpreendeu ao ver um rapaz, que ele sabia muito bem quem era: Conrado. Crescido, bonito, forte, com cabelos castanhos e olhos azuis, além de uma expressão de quem não estava com paciência. Jonatas sorriu.

— Não se lembra de mim, Conrado? — perguntou Jonatas, levantando os braços e jogando o capuz para trás, deixando seus cabelos dourados a mostra. Conrado sorriu, saltou do cavalo e correu na direção do rapaz, estendeu sua mão a espera de um aperto, Jonatas apertou, então, o peão puxou o rapaz para mais perto e tornou o aperto em um abraço de amigos que não se vinham a séculos.

— Jonata! Como ocê ta rapaz? — disse o peão, soltando Jonatas do abraço e encarando-o olho a olho. — Ficou grandinho, em! Quase que passou! — respondeu, observando a estatura e o físico do amigo.

— Não tão bem como eu queria, mas a vida segue. — respondeu, desanimado, mas mantendo o sorriso.

Um raio cortou o céu, iluminando tudo que tinha ao redor de Jonatas e Conrado. O cavalo se assustou e correu fazenda a dentro, derrubando o peão no chão com o susto que levou.

— Conrado! Machucou? — perguntou Jonatas, com um olhar de preocupação. Ele estendeu a mão e agarrou a do amigo, com tremenda força e puxou para cima. Conrado, com facilidade, se levantou e se recompôs, tentando demonstrar sua “masculinidade”.

— Magina, sou ruim que quebra! — e gargalhou, retirando da bolsa um guarda chuvas enorme, mas não tão grande para duas pessoas separadas. Abriu e entregou para Jonatas, que ficou com receio de aceitar.

— Mas e você? — perguntou, preocupado.

— Eu aguento o tranco. — respondeu o peão, despreocupado e com um simpático sorriso no rosto. Jonatas chacoalhou a cabeça e puxou o amigo para perto de si, para que juntos pudessem ocupar o guarda chuva. Conrado ficou receoso no começo, mas logo deixou a bobagem de lado e aceitou a ajuda do rapaz. Juntos, começaram a subir o pequeno morro que levava a fazenda e esquecendo da existência do coitado do motorista.

— E quando ao seu cavalo? — perguntou Jonatas, preocupando-se mais com o cavalo do que com o motorista.

— O Abel é medroso, mas num foge não. Quarque hora ele aparece no curral, atrás do Meia Lua. — respondeu Conrado, deixando Jonatas com uma verruga de preocupação na testa. Um cavalo macho indo atrás de outro cavalo macho? Que anormalidade.

— Mas… Um macho indo atrás de outro?! — indagou o rapaz da cidade, confuso com as palavras do peão. Até agora estava tudo bem, não havia tido problemas com sentimentos conturbados quando a Conrado, este que, sorriu, com a confusão do amigo.

— Pois é, a natureza disse que eles devem ficar juntos, então eles fica. — respondeu o peão, se aproximado da porta da fazenda e abrindo-a calmamente. Conrado faz um gesto, cedendo a primeira entrada para o amigo, que entra, ainda confuso, com as roupas todas encharcadas, assim domo as do peão, que entra em seguida.

Jonatas olha ao redor, seus momentos mais felizes naquela sala voltam como uma tempestuosa chuva. Não só na sala, mas em toda fazenda, aquele lugar… Era mágico! Era impossível estar ali e sofrer, ainda mais na companhia de… de… de… E então sua mente parou. O que Conrado era para ele? O que sua companhia alterava em seus sentimentos? Ele não sabia e não queria pensar mais no assunto, ainda continuava sendo “anormal”.

— Jonatas? — chamou Conrado, acordando o amigo de seus pensamentos. — Ouviu o que eu disse? — perguntou o peão, sorrindo e percebendo o quão longe Jonatas estava.

— Desculpa, eu…

— Estava voando por aí… Encontrou o que? — cortou Conrado, retirando as botas sujas de barro que trajava, assim como seu chapéu de couro. Jonatas sorriu, amigável.

— O país das maravilhas. — respondeu, com os dentes brancos colorindo seu rosto escurecido pelos maus momentos que andou tendo. Conrado caiu em gargalhadas, como se as palavras do amigo fossem uma grande piada, continuou retirando peças de seu vestuário, dessa vez a camisa, deixando seu peitoral e sua barriga a mostra. Jonatas tentou não olhar, mas seus olhos falavam por si. O corpo de Conrado era escultural, com poucos pelos e muitos gomos na barriga. Se dando finalmente por acordado, Jonatas saiu do “País das Maravilhas”, chacoalhou a cabeça e acordou em sua realidade, virando a cara para não olhar diretamente para o peão.

— Desculpa ta tirando as roupas assim, é que minhas roupas da molhada e eu preciso dar uma torcida nelas para depois poder andar, se não é capaiz do assoalho estragar! — disse Conrado, envergonhado com a situação. Jonatas continuava lutando contra seus desejos para não olhar para o peão, era difícil, de fato, mas ele não podia ser um anormal, pelo menos não na frente dele.

— Tudo bem, não precisa se preocupar com isso! — respondeu Jonatas, sem desviar o rosto da janela, por onde observava a chuva cair poderosa no chão do campo (E o motorista?). Conrado pegou suas roupas, se aproximou da janela por onde o amigo olhava e se ajoelhou sobre o sofá, apenas de cuecas, estendendo seus braços para fora e torcendo as peças, até toda água sair. Não tinha escapatória, se olhasse para outro lado, Conrado ia desconfiar, permaneceu olhando na janela e tendo a privilegiada visão das costas e do bumbum do peão, um pouco marcado na cueca azul. Nessa hora se lembrou de uma coisa que lera “Azul é a cor mais quente”, realmente. — Então, a cidade mudou alguma coisa nesses anos? — perguntou, querendo se entreter com algo que não fosse a bunda de Conrado.

— A… Pouca coisa! Só a criação do rodeio anual, mermo! — respondeu Conrado, ainda torcendo suas roupas encharcadas. Assim que terminou com a calça, desceu do sofá e começou a vestir-a, olhando Jonatas cara a cara, assim que terminou, começou a vestir a camisa e no fim os acessórios. O rapaz da cidade permanecia em silêncio, tentando limpar sua mente de pensamentos anormais e obscenos. É triste ver que alguém acha que “amar” é algo anormal. — É uma festinha pequena, mas é boa demais!!

— Deixa eu adivinhar, você é o cantor do evento? — perguntou Jonatas, lembrando-se do quão apaixonado por viola e música Conrado era na infância, passava horas ao lado do rádio, cantando e ouvindo as modas de viola das antigas. O peão sorriu, colocou o chapéu e começou a caminhar pela casa, ainda sem falar, Jonatas foi atrás, a espera da resposta.

— É… acerto! — exclamou o rapaz, se aproximando de uma porta e se escorando na parede, com um sorriso malicioso no rosto. — Adivinha o que tem aí? A senhora sua vó pediu que eu cuidasse especialmente para você! — Jonatas sorriu, curioso.

— Não acredito que é o que eu to pensando! — respondeu o rapaz, com um sorriso enorme no rosto. Esquecera finalmente dos problemas, realmente, não era só o ar da fazenda que tornava seus momentos melhores, a companhia de Conrado também ajudava. O peão abriu a porta devagar, revelando o que tinha la dentro: Um enorme quarto infantil, com brinquedos e bugigangas por todos os lados. Desenhos de foguetes e de cavalos, além de carros e corrida e uma beliche no meio. — Sabia! O meu antigo quarto… — disse o rapaz, emocionado, enquanto entrava no quarto e ia na direção da beliche, percebendo que já não tinha tamanho para dormir ali.

— Eu disse para sua avó que você não ia caber aí, mas ela não acreditou! — disse o peão, em tons de gargalhada. Ele entrou e foi na direção do amigo, enrolando seu braço no pescoço deste. — É, não nem jeito, vou ter que estender um colchão la no meu quarto, porque os outros estão todos ocupados com os passatempos da senhora sua vó! — exclamou Conrado, deixando Jonatas um tanto quanto desconfortável. — E então? O que ta achando de seus cinco minutos de estada aqui? Já ta doido para voltar para cidade? — ironizou Conrado, acompanhando Jonatas pelo corredor, na direção da janela em seu final.

Jonatas parou perto da janela, olhou para fora e viu que o céu estava se abrindo. Conrado se aproximou e também observou as nuvens, pouco a pouco se dispersando e deixando o céu azul aparecer. Jonatas sorriu e olhou para Conrado, que fez o mesmo, ficando cara a cara com o amigo. O sol apareceu e começou a iluminar os rostos dos rapazes, deixando um belo e intenso brilho entrando na casa e colorindo o ambiente. Bem ali, com o sol de testemunha, Jonatas esqueceu dos problemas e disse aquilo que sentia realmente:

— Nem em sonho.




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