Os Jogos de Johanna Mason escrita por Tagliari


Capítulo 3
Capítulo 2 ― Cinco segundos


Notas iniciais do capítulo

Aoooooooo!!!! Espero que estejam prontos para lidar com esse capítulo nessa bela quinta-feira chuvosa (ah, a única coisa melhor que chuva é saber que os planos de muitas famílias foram frustrados por ela).
Apenas lembrando que esse deve ser o capítulo mais falsiane de todo o Nyah! (Risos). Sim, estou brincando. É óbvio que Johanna Mason é sempre sincera e verdadeira. E muito obrigado, amáveis e gentis pessoas com amor e gentileza no coração que comentaram no cap. anterior.
Boa leitura!

REVISADO EM 24.03.2017



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CINCO SEGUNDOS. Esse é o tempo que preciso para assimilar tudo.

Sei que ouvi o meu nome, que fui sorteada para participar dos Jogos Vorazes. Sei que irei para a Capital. Sei que me obrigarão a lutar pela minha sobrevivência. Sei que possivelmente nunca mais verei o Distrito 7 novamente. Sei de todas essas coisas no instante em que Maxell Seekirk termina de pronunciar a última sílaba do meu nome. Afinal, não é muito difícil tirar essas conclusões após dezessete anos vendo outras pessoas passarem pelo mesmo tormento.

Tenho que abrir caminho pela multidão e tomar meu lugar no palco. Entretanto, não me mexo. Sou uma estátua, tão fria quanto as colunas de mármore do Edifício da Justiça. Não penso nas pessoas ao meu redor, que aos poucos somam dois mais dois e vão percebendo que a garota escolhida para morrer está logo ao lado. Não penso em minha família ou amigos. Não sei o que fazer. Essa é a verdade. Estou perdida. Morta.

Tenho vontade de chorar aqui mesmo, com todas as câmeras procurando loucamente pela dona do nome lido; jogar-me ao chão, encolher na posição fetal e tentar desaparecer. Mas uma força invisível me impede de executar esse espetáculo. Tenho que ser forte e corajosa, subir e suportar meu destino ― nunca é bom demonstrar fraqueza. Porém, não o faço.

Lembro-me das edições anteriores. Os tributos carreiristas caçando impiedosamente seus oponentes. Eles agem como animais, procurando vítimas e passando lâminas afiadas em suas gargantas. Dessa vez eu serei uma de suas presas. Sinto que estou deixando algo passar em meio a tudo isso. Mas o quê? Pense, Johanna, pense!, obrigo-me.

É quando uma pequena conversa que tive com Siena tanto tempo atrás ― ou seriam apenas dias? ― me vem à mente.

“Eu provavelmente rosnaria para as câmeras e torceria para que todos tivessem medo de mim”, a garota de cabelo encaracolado disse durante o intervalo na escola. “E você, Jo? O que faria se lessem o seu nome?”

Lembro-me de encolher os ombros antes de responder.

“Eu me jogaria no chão e choraria como uma louca. Ninguém se importa com a menininha estúpida que chora demais.”

Maxell chama por Johanna Mason novamente quando chego a uma conclusão.

Os carreiristas, penso. Sei que o mais sensato é temê-los e evitá-los a qualquer custo. Geralmente há algo em comum nas primeiras vítimas desses tributos. São oponentes que representam perigo ao bando. Eis o que ganharei ao me fazer de forte: virar prioridade na lista de alvos. Então, para que ser corajosa se posso simplesmente fazer com que os carreiristas queiram me ignorar quando o gongo soar? Se eles me deixarem em paz na arena, minhas chances de sobrevivência certamente aumentarão.

Decido que não quero ser lembrada como Johanna Mason, a garota que morreu com dignidade e lutou com afinco, mas sim como aquela que venceu a septuagésima primeira edição dos Jogos Vorazes. E para isso, talvez, demonstrar fraqueza seja uma boa ideia.

Então sei o que fazer.

Permito que a vontade de chorar me domine. As lágrimas vêm junto com os primeiros grunhidos embargados, fazendo com que as pessoas ao meu redor se afastem como se eu pegasse fogo. Sei que a essa altura as câmeras já encontraram o tributo feminino do Distrito 7, que devo estar sendo transmitida ao vivo por cada televisão de Panem, e é por isso que não posso vacilar. Eles têm que acreditar na minha fragilidade. Forço os joelhos a cederem, caindo no chão totalmente desamparada. Lágrimas mornas descem por minhas bochechas enquanto o choro é entrecortado por soluços.

Nem tudo é encenação. Mesmo que todo esse teatro me traga alguma vantagem, sei que as chances ainda não são muito grandes de vencer. Devo estar morta até o final da primeira noite ― com sorte, da segunda. Penso em como meus pais ficarão arrasados quando a Capital mandar meu corpo de volta. E Aggie então? Não estarei aqui para ver o casamento da minha irmã mais velha ou desfrutar da mesma felicidade. Também há Cahlia... ah, a pequena e inocente Cahlia Mason... Ela terá que procurar outra pessoa para defendê-la quando as garotas mais velhas do colégio implicarem com seu cabelo desgrenhado. É a tristeza desses momentos futuramente perdidos que me impulsiona a continuar com tudo, a chorar, chorar e chorar.

Estou quase gritando “Ei, Panem! Olhe para mim! Sou tão frágil e tola. Vamos, vamos, tenha pena de mim, por favor!” quando ouço a voz distante de Maxell dizer:

― Oh, senhorita Mason, não se envergonhe. Venha, venha. O país inteiro quer conhecê-la.

Isso só me faz chorar ainda mais.

É quando duas mãos fortes seguram meus braços, cessando as lágrimas, e ajudam-me a levantar. Lanço uma rápida olhadela para ver quem são as almas caridosas que resolveram consolar a pobre garota histérica e meu estômago se revira. Pacificadores. Onde estão aquelas pessoas que se dizem ser meus amigos? Siena? Aggie? Aposto que devem estar ocupadas demais suspirando aliviadas por terem sido poupadas por mais um ano. Por um segundo, isso me causa repulsa.

Os Pacificadores meio me guiam, meio me arrastam até o palco. Procuro manter a cabeça abaixada como se estivesse envergonhada pelo escândalo, mas na verdade estou aflita, procurando uma maneira crível de continuar com o espetáculo, mesmo que tudo isso me pareça uma grande bobagem agora. Minha garganta dói e os olhos estão mais secos que o velho poço perto de casa. Não consigo chorar mais.

Os guardas me jogam na frente da escada ― cinco degraus de madeira que levam ao palanque. Ao menos me deixam subir sozinha. Com muita delicadeza, subo um degrau por vez, hesitante. Ergo o olhar quando chego ao topo. Assim como o prefeito e os mentores, Maxell me encara com um ar empático de pena. Aposto que nesse exato momento o acompanhante deve estar se desmanchando em arrependimento por ter lido o meu nome. Depois de anos observando o comportamento dos cidadãos da Capital, sei que é fácil enganá-los. Encantam-se e sofrem por qualquer coisa. Basta saber arquitetar um atraente castelo de cartas. E, depois, assoprá-lo. 

Em silêncio me coloco em um lugar que julgo ser suficientemente afastado do sujeito da Capital, mas não muito perto do homem baixo e roliço que é o prefeito. A memória ainda é fresca de quando ele assistiu de camarote o enforcamento de Alistair, um pobre coitado que foi acusado de roubar legumes podres da lixeira da quitandeira para dar de comer aos quatro filhos. Desde então nutro um ódio particular por Seamus Bishop, que sequer tentou impedir a execução.

Fungo algumas vezes porque meu nariz começa a escorrer após tanta choradeira. Estou muito tentada a assoá-lo na manga do vestido, mas concluo que seria vergonhoso demais, visando que estou sendo filmada ao vivo. As lágrimas deixaram um rastro úmido em minhas bochechas e tenho que lutar contra o impulso de secá-lo. Quero que todos as vejam.

― Agora vamos aos rapazes ― sem se abalar, Maxell dá continuação à colheita.

Vestindo um terno branco, ele caminha com elegância até a bola com o nome dos garotos. A mão esquerda mergulha no mar de papeis e emerge com apenas uma tirinha entre os dedos. Ele volta ao pódio com mais lentidão, deliciando-se com a vaga sensação de esperança estampada nos rostos dos meninos. Com toda certeza ele deve ser pago para fazer esse suspense esmagador.

Torço para que não seja um conhecido. Um completo estranho será muito mais fácil de lidar do que um amigo ou colega. De preferência, que seja alguém realmente fraco para os Jogos Vorazes, um tributo a menos para me preocupar. Realmente ficaria agradecida se fosse o filho idiota de algum mercador. Alguém que não tenha tanta experiência com machados quanto eu.

Fixo os olhos em Maxell quando ele desdobra o papel e dá dois toques no microfone. Antes de dizer o nome, ele lança um olhar geral para os garotos na praça.

― Silas Underwood!

Menos de um minuto depois, as câmeras focalizam o tributo e o acompanham enquanto ele caminha até o palco. Pelos telões, vejo que ele está lutando para ingerir tudo. O rosto quadrado e os ombros largos pelo provável ofício de lenhador dão um ar de maturidade ao garoto, que parece ter seus dezoito anos. Até que ele seria considerado atraente se não fosse pelo nariz adunco e as sobrancelhas que se juntam entre os olhos, formando uma espécie bizarra de monocelha. Silas sobe ao palco e se coloca ao meu lado. Depois de alguns segundos, concluo que deve achar as próprias mãos muito interessantes, pois não desgruda o olhar delas.

Maxell faz uma pequena pausa, esperando algum voluntário improvável se oferecer para ir em nosso lugar. O silêncio na Praça Principal é tão intenso que se poderia ouvir uma agulha caindo. Tento achar Aggie na multidão de garotas de dezoito anos, mas não a encontro. Claro que ela não quer tomar o meu destino para si. Se eu estivesse em seu lugar, possivelmente faria o mesmo. É por isso que não a culpo.

― Senhoras e senhores, eu lhes apresento os tributos do Distrito Sete para a septuagésima primeira edição dos Jogos Vorazes, Johanna Mason e Silas Underwood! ― o acompanhante grita quase em ebulição de tanta euforia.

Agora é o momento em que minha família, amigos, conhecidos e o restante do distrito desatam a bater palmas. Afinal, em teoria esse é um dia de festividades para nós. Os primeiros ecos vêm do fundo, desanimados, mas logo o resto da população se junta com os aplausos. Posso não ver, mas tenho certeza que meus pais não fazem parte da comitiva. Devem estar abalados demais para isso.

Como de praxe, chega a hora em que os tributos têm que se cumprimentarem. Fico de frente para Silas e fica mais do que óbvio que não se trata de um garoto molenga que teve tudo nas mãos desde pequeno. Ele é uns bons quarenta centímetros mais alto do que eu e seu braço tem o a grossura da minha coxa.

Enquanto aperto sua mão férrea e calejada, vejo o quão encrencada eu estou.


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Notas finais do capítulo

E aí, curtiram? Espero que tenham gostado da explicação que elaborei para todo o drama que Mason fez na colheita.
Ah, é sempre bom ressaltar: Johanna Mason é uma flor doce e delicada.
Sintam-se à vontade para comentarem, galera. Sou super receptivo e educado.
Até.