Os Jogos de Johanna Mason escrita por Tagliari


Capítulo 18
Capítulo 17 ― Erupção


Notas iniciais do capítulo

TAN-TAN-TAN!!!
100 ACOMPANHAMENTO EM OS JOGOS DE JOHANNA MASON?! SÉRIO ISSO, PRODUÇÃO? Cacete!!! Galera, muito obrigado mesmo. Para alguns isso pode ser pouco, mas para mim é tipo encontrar um doador de sangue compatível ao meu (nunca se sabe, né).
Agora sim o circo vai pegar fogo, cambada! (Literalmente hehe). Curiosos para saber como nossa adorável e afável Johanna Mason vai se safar dessa? Então chega de enrolação e boa leitura!

REVISADO EM 23.04.2017



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NÃO É DIFÍCIL SOMAR dois mais dois para saber o que está acontecendo. As cinzas e o tremor só podem significar uma coisa: a Capital se cansou de esperar pelo rumo natural dos Jogos e está apressando os acontecimentos à sua maneira. O vulcão entrará em erupção.

Não há tempo para hesitações. Levanto-me em um pulo e guardo com displicência meus suprimentos e o que sobrou dos mapaches assados dentro da mochila. Jogo-a nas costas, pego os machados e corro o mais rápido que posso para o mais longe possível do Vulcão Sul.

Tendo apenas a débil claridade da lua e das estrelas como aliada, percebo que a floresta se transformou totalmente. Quantidades cada vez maiores de cinzas e fuligem rodopiam do céu, cobrindo o chão com um manto perolado. Enquanto corro, ocasionalmente usando os machados para afastar a vegetação do meu rosto, só consigo pensar que tudo isso é culpa minha. Afinal, não foi o presidente Snow ou até mesmo Blye Lockheart que me mandou ir direto para a parte mais perigosa da arena, perto do vulcão fumegante.

Um segundo tremor desestabiliza meus passos, mais intenso que o último, fazendo-me tropeçar e cair no chão. Por reflexo, ponho as mãos na frente do rosto para amortecer o impacto. Estou ofegante, com medo. Ferrada. Mesmo com o coração ribombando com violência no peito, não me permito um segundo de descanso. Pelo contrário ― levanto-me, recolho minhas armas e volto a correr.

Não faço ideia se o vulcão já entrou e erupção ou se esse é o início da coisa toda, mas não tenho coragem o suficiente para olhar para trás. Pois não sei o que farei se me deparar com um mar de lava arrastando-se em minha direção.

É quando ouço o grito esganiçado de uma coruja cortar o ar noturno. Sei o que isso significa após tantos anos assistindo ao comportamento desses animais, seja na televisão ou no meu distrito. É o instinto de sobrevivência deles falando mais alto. Ouvi dizer que os animais conseguem sentir o perigo antes mesmo do ser humano se dar conta. Eles pressentem a eminência de um desastre e estão fugindo para o mais longe possível do sul da arena.

Então o primeiro borrão cinzento passa zunindo por mim, correndo em minha direção, rumando direto para o perigo. Um coelho. Outros animais o seguem, traçando o mesmo caminho ― mapaches, gazelas, até mesmo uma dupla do que penso ser cães do mato. Não faz sentido. Porque no lugar de afastarem-se da montanha atiçada, eles fazem exatamente o oposto? Sinto que estou deixando algo passar, mas não é como se eu pudesse parar de correr para questionar as decisões de seres irracionais.

Corra, Johanna, corra!, incentivo-me ao pular uma raiz que estende-se acima do solo. Uma crise de tosse me faz parar por uns instantes, sem fôlego. O cheiro... Tenho certeza que o odor de enxofre está mais forte agora. Isso só pode significar uma coisa.

O peito dói e parece que meus pulmões estão queimando com o esforço exigido deles. O abdômen começa a dar pequenas fisgadas, assim como os pés vez ou outra oscilam. Estou pedindo demais do meu corpo, mesmo que seja apenas a sobrevivência. Tento convencer a mim mesma de que seguirei até o cânion a pouco mais de um quilômetro de onde montei acampamento, que lá estarei segura do Vulcão Sul e que poderei descansar. Mas sei que é mentira, que estou perto demais dele. Correr será em vão para fugir da lava, mas é a única coisa que posso me agarrar nesse lugar miserável.

Cerro os dentes, colocando mais força no aperto em meus machados. Durante minha corrida desenfreada pela floresta, chega um momento em que sou obrigada a diminuir os passos, pois encontro-me em um abrupto declive. Mas, mesmo com o cuidado redobrado, acabo pisando em falso na descida e escorrego. A próxima coisa que meu cérebro registra é os solavancos e o duro impacto do corpo contra o chão, rodando várias vezes até o final do declive.

Suspiro algumas vezes, ofegante. Sei que é burrice ficar parada enquanto cada segundo de movimento é crucial para continuar viva, mas não consigo forçar meus músculos a cooperarem. Estou cansada e machucada, mas nada está quebrado. Então porque não me levanto? Eu desisti? Não. Não sou do tipo que dá o braço a torcer.

Fecho os olhos, convencendo a mim mesma que, quando voltar a abri-los, seguirei caminho novamente. Por um segundo, escuto apenas o silêncio da arena e a minha respiração acelerada. Nada mais. Pergunto-me se o espetáculo de fogo já começou, mas acho que não. Ainda não.

Junto todas as minhas forças e abro os olhos. Com grunhidos, consigo levantar. Meu braço dói ― e sei que vai estar muito pior no dia seguinte. Demoro um instante para me localizar, resgatar o controle perdido no desespero da erupção do vulcão. Encaro minhas mãos vazias. Os machados.

Subo o declive e encontro minhas armas na metade do caminho. Recolho-as e, arrumando as alças da mochila nos ombros, volto a correr, minha mente procurando avidamente por um plano que me tire desse maldito lugar com vida. Então o solo terroso é substituído por rochas e as árvores espaçam-se entre si. Diminuo o passo bem na borda do cânion vaporoso de águas termais.

Encaro o que está ao meu redor sem prestar muita atenção. Até que não é um lugar tão ruim para morrer. O céu, mesmo se não for real, é lindo. Acho que se fosse contar todas as estrelas, passaria o resto da minha vida aqui, porque tem muitas. Brilhantes, tão brilhantes. Observo as copas das árvores no outro lado do vale nebuloso, reduzidas apenas a silhuetas negras pela noite. Além delas há o vulcão, furioso, fumegante. E eu estou certa; ele ainda não entrou em erupção, mas tenho certeza que a fumaça que sai da boca está mais densa e tóxica do que antes. É de lá que vem as cinzas que aos poucos vão me cobrindo, pousando em meus cílios. Ah, elas tiveram um longo percurso até aqui. Quantos e quantos quilômetros. Mas... Espere.

Luto contra o cansaço que apoderou-se de mim para clarear meus pensamentos. Demoro longos segundos para lembrar-me em que lugar estou e o que há atrás de mim. Localize-se, Johanna, obrigo minha mente a raciocinar. Onde você está? Quando finalmente percebo o óbvio, tenho vontade de rir, de repente já não tão cansada.

Eu estou no pedaço sul da arena, o mais longe possível do Vulcão Norte. O que vejo não é o Vulcão Sul fumegado ― para onde caminhei por cinco dias ―, mas o Norte. Estou segura. Não é como se ambos os vulcões fossem entrar em erupção simultaneamente, certo?

É quando o Vulcão Norte cospe as primeiras bolas de fogo. O céu, antes azul e preto, ilumina-se com uma coloração doentia de amarelo e laranja, hipnotizante de se observar. A lava rasteja lentamente pela silhueta da montanha enquanto ouço as explosões ensurdecedoras que vibram até onde estou, fazendo as pedrinhas ao meu lado tremerem. É caótico e perfeito, intangível.

Enquanto devoro cada segundo desse magnífico espetáculo, penso como deve estar sendo para as pessoas perto dele. Com certeza um verdadeiro pandemônio se instalou entre os tributos sobreviventes. Aposto que não devem estar achando esse show tão agradável quanto eu. Mais bolas de fogo rompem o azul da noite e solto um contido sorrisinho. Muito obrigada, Capital, penso. Com sorte, todos podem morrer essa noite e sobrar apenas eu. Afinal, a ideia não é tão estúpida assim, porque já funcionou com a vitoriosa louca do Distrito 4.

Uma pergunta insistente não deixa minha mente: por quê? Por que os Idealizadores dos Jogos escolheram o Vulcão Norte para entrar em erupção sendo que era líquido e certo que o alvo era o do sul? Simplesmente não faz sentido. Se bem que, agora que a zona de segurança foi destruída, não há mais tantos esconderijos para os sobreviventes. Sem falar que pode estar acontecendo uma luta sangrenta entre os tributos nesse exato momento. Afinal, aposto que todos eles saíram da toca para escapar. Tenho que admitir: é engenhoso. Aposto meu braço esquerdo que os cidadãos da Capital estão em êxtase. A demora finalmente valeu à pena.

Os minutos se arrastam e decido aconchegar-me para assistir ao espetáculo. Encosto em uma bétula e vou mordiscando um pedaço de mapache enquanto tento mapear um padrão na tonalidade da lava, que parece oscilar constantemente de laranja ao amarelo. Em um dado momento, o cheiro de enxofre fica insuportável e possivelmente tóxico. Por falta de opções, acabo tirando a camiseta do corpo e encharcando-a com água do cantil para usá-la como uma espécie de máscara. Assim, fico nua da cintura para cima. Bom, antes pelada do que morta.

Acabo de roer o último osso e um dos mapaches vira história ― sobrando apenas seu parente e meu escasso suprimento de enlatados. Estou devorando meu parco estoque de cerejas quando a lava finalmente para de jorrar do vulcão. É quando percebo que não ouvi nenhum tiro de canhão e concluo que o barulho das explosões os ocultaram. Descobrirei as baixas somente amanhã à noite, no céu.

Aprumo-me, inclinando-me para frente, encarando o que restou da área norte da arena. Está tudo em chamas, crepitando. O fogo parece devorar cada folha e galho das árvores, engolfando-as em uma bola amarela de calor. Sei que não devo me importar com o local, pois não estou lá, mas acontece que a coisa vai piorar em breve. Sei por experiência própria como um incêndio pode destruir tudo em minutos. Lembro-me de uma vez que um homem insatisfeito com o governo acabou ateando fogo no Setor 3, o local dos pinheiros. Em um piscar de olhos, mais da metade do setor foi devorado pelas chamas. Demorou muito tempo para que os Pacificadores conseguissem extinguir o incêndio e logo em seguida o homem foi morto semelhante ao modo que o problema fora causado ― queimado. Talvez demore uns quarenta minutos, no máximo cinquenta, para que o fogo chegue onde estou.

Estou pensando nas possibilidades de escapar do incêndio ― talvez encontrar um modo de dar a volta pela parede de fogo ― quando avisto pequenas luzes piscando no céu. A primeira coisa que concluo é: não são estrelas. Quase tão rápido quanto o golpe de um machado, os aerodeslizadores cobrem todo o céu, dezenas deles. As naves planam sobre o incêndio como um beija-flor paira sobre uma flor chamativa. Por um segundo penso se tratar desses responsáveis para recolher os corpos, mas há muitos.

Então, em total sincronia, as comportas são abertas e uma nuvem perolada desce em direção ao fogo. Água. Centenas e centenas de litros de água são despejadas para aplacar o incêndio. Assim que os aerodeslizadores ficam sem sua carga, desaparecem no ar e outros surgem no lugar, esperando algum comando silencioso para desaguar. Em menos de cinco minutos, resta apenas cinzas, lama e madeira queimada.

Não há mais nada para ver, o espetáculo acabou. Obedientemente, ajeito-me da maneira que posso, encostada à bétula, e tento dormir um sono merecido. Por incrível que pareça, eu consigo.

•••

O dia surge pálido e melancólico. Após abrir os olhos, preciso de alguns instantes para processar o que minha visão periférica capita. A arena mudou. Bom, ao menos até onde a onda de destruição a atingiu. É possível ver o estrago causado pela lava ― as árvores enegrecidas e reduzidas a carvão, a silhueta do Vulcão Norte agora negra e irreconhecível. As cinzas ainda rodopiam no céu, cobrindo qualquer coisa que fique parada por tempo suficiente.

Ainda no meu ponto de observação da noite passada, levanto-me, espreguiço-me e tento me livrar dos flocos cinzentos que me consumiram durante o sono. O ar continua pesado e estranho, portanto não arrisco abrir mão da minha máscara improvisada. Bebo um longo gole de água e jogo o resto do cantil na camiseta a fim de umedecê-la. 

À minha frente encontra-se o vale de piscinas termais. Primeira meta do dia: encher os odres. Desço a escada de pedra e agacho-me na primeira lagoa que encontro. Acontece que não está mais tão cheia como antes, talvez evaporara durante a erupção, e um fino manto de cinzas cobre a superfície. Quando os cantis estão cheios até a boca, coloco as gotas necessárias do purificador azul e torço para que ele seja potente o suficiente para inibir as toxinas liberadas na noite anterior.

Não sei o que fazer agora. Imagino que houve uma baixa considerável no número de tributos após o recente espetáculo, mas não faço ideia de quem caiu e quem continua vivo. Sei que meu próximo passo é dizer adeus ao meu esconderijo e sair para enfrentar qualquer um que aparecer. Está na hora deles finalmente conhecerem Johanna Mason.

Estou pensando em ir agora mesmo em direção ao Vulcão Norte, onde os sobreviventes devem estar ― perdidos, desorientados, à procura de um abrigo ― quando uma ideia me impede. Se quero caçar, tenho que pensar como uma caçadora. Bom, se eu fosse um tributo assustado que viu seu pequeno mundo engolfado em uma grande bola de fogo, para onde iria? Iria para um local seguro, claro. É líquido e certo que a parte norte da arena está fora de cogitação, então sobram os lados leste, oeste e sul. Levando em consideração como o ar está instável aqui, na outra extremidade da arena, imagino que deve estar muito pior perto do vulcão que entrou em erupção. Então imagino que riscaria também da lista as fatias leste e oeste. Sobra apenas um lugar seguro. Onde? Aqui. Os sobreviventes estão vindo para cá, direto para as lâminas de meus machados. Então porque ir à busca deles se eles mesmos podem facilitar minha vida e correr para meus braços?

Ao que tudo indica, o jogo acaba de começar.


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Notas finais do capítulo

Olha, vocês não fazem ideia de como essa erupção do Vulcão Norte vai mudar todo o rumo dos Jogos. Porque, para mim, esse é o capítulo em que Johanna Mason decide abraçar sua persona bad ass. Afinal, já passou da hora dela finalmente usar seus machados para algo útil.
Até quinta então.