Ágda escrita por Maresia


Capítulo 4
Viagem




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Um mês se passou desde a misteriosa chegada de Ângela à bela e branca Bluegard, e à calma e tranquila vida do jovem Dégel de Aquário. A memória da linda menina permanecia duramente vazia e deserta, refletindo terrivelmente o negro e esquecido espelho do seu passado.

Ângela dividia os seus frios dias de Inverno, caminhando entre pesados livros de estudo, narrados na perfeição pela gelada voz do cavaleiro de ouro, aulas de danças clássicas, partilhadas com a jovem aristocrata, e enormes passeios na companhia dos três amigos.

Numa branca tarde de Domingo, Dégel e Unity desceram como já era costume até à bela aldeia para visitar o mercado. Ali, a diversidade de produtos era imensa, comida, vinhos, tecidos tingidos por belas cores, bijutarias fantásticas, animais e uma pequena banca vendia alguns livros gastos e velhos, manchados pelo passar das primaveras, relíquias escondidas pelo mundo, na sábia opinião de Dégel, que se perdia no meio de títulos incrivelmente sumidos.

– Estes livros são tesouros preciosos, que nas suas belas páginas escondem os mais impressionantes mistérios da humanidade. – Afirmava ele de forma sonhadora, pegando num enorme volume maltratado.

– Sim claro. – Respondeu Unity, não dando muita importância.

– Se quiser comprar aproveite agora, que eu só retornarei para o ano que vem. – Dizia um velho alfarrabista, reparando no fascínio irrepreensível do jovem dourado.

– Este volume narra na perfeição e com todos os pormenores antigas e famosas guerras mitológicas que se abateram sobre a Terra, este livro é uma lenda viva! – Exclamou o Aquário maravilhado com aquela descoberta. – Eu fico com ele. – Confirmou, retirando uma bolsinha branca do bolço das suas calças azuis ganga.

– Boa escolha! Boa escolha, meu rapaz! De facto esse livro é um exemplar muito raro e valioso. – Disse o velhote pegando as moedas rapidamente.

– Obrigado meu amigo. – Agradeceu o cavaleiro, seguindo o seu caminho.

Os dois amigos continuaram a sua viagem através dos maravilhosos produtos expostos por todas as ruas estreitas e empedradas, aquele ambiente dava a Bluegard um aspeto mais quente, mais confortável, mais convidativo. Agora, era a vez de Unity se deter perante uma vasta banquinha de compotas tradicionais e caseiras, rotuladas com uns bonitos e atrativos tecidos.

– Vou comprar algumas! – Disse o jovem louro, lançando um grande sorriso à rapariga que estava a atender.

– Não comeces Unity, lembra-te da menina das lãs a semana passada. – Avisou Dégel.

– Oh! Tinhas que te lembrar disso? Foi um triste incidente. – Desculpou-se Unity, pegando um frasquinho. – Este é de cereja, achas que a Ângela gosta? Ou talvez este de pêra? Não, espera, olha este aqui de quivi. – Unity estava visivelmente empolgado, o seu contagiante entusiasmo captara a atenção da jovem loura que estava a vender as compotas. – Oh meu deus! Olha para este é de coco e canela!

– Unity acalma-te, são apenas compotas! – Pediu o dourado, segurando a mão do seu amigo que se preparava para alcançar um novo frasquinho, desta vez o rótulo dizia abóbora e laranja. – Não os podes levar a todos. – Dizia Dégel, mantendo o jovem guloso fora do alcance dos deliciosos frasquinhos.

– Então levo três. Vá lá Dégel três é bastante pouco, por favor. – Pediu Unity, vendo a cara de reprovação do cavaleiro.

– Certo, mas apenas três nem mais um, ouviste bem. Qualquer dia o teu pai mata-nos. – Lamentou o dourado, lembrando-se dos oito potinhos que o seu amigo levara a semana passada.

Finalmente o cavaleiro conseguiu a muito custo levar Unity para longe da banca da perdição, transportavam num bonito saquinho de seda compotas de coco e canela, mel e limão e de cereja.

– Ela vai adorar esta delícia de cereja, tenho a certeza. – Dizia orgulhoso. – Dégel, já reparaste que os cabelos dela fazem lembrar belas e deliciosas cerejas? – Perguntou Unity com ar sonhador.

– Já referiste isso umas cem vezes desde que ela chegou, e olha que só passou uma semana. – Retorquiu o dourado chateado. – Agora vamos para casa. – Ordenou sem paciência.

– Ainda não. – Discordou o jovem nobre. – Quero passar na banca da Gabriela, para comprar um presentinho para a Ângela, e tu devias comprar algo para a Serafina ela iria ficar louca de alegria. – Sugeriu Unity, dirigindo-se a uma banquinha repleta de brilho e vaidade.

– Boa tarde Gabriela. – Saudou Dégel, avistando a senhora gordinha que os tinha ajudado na noite da tempestade.

– Bom dia Dégel. Bom dia menino Unity! Então como está aquela querida menina? – Perguntou, olhando para Dégel. Unity já remexia apressadamente nos belos produtos expostos.

– Ela está bem, apesar da sua memória ainda não ter voltado. – Respondeu Dégel.

– E aqui está, são perfeitos sem dúvida! – Exclamou Unity, erguendo um par de ganchos em formato de lacinhos, brancos decorados com pequenas estrelas vermelhas. – Acho que ficarão maravilhosos nos cabelos dela. – Disse ele, o jovem louro esticou o dinheiro a Gabriela e olhou para o Aquário. – O que escolheste?

– Bem, acho que não tenho muito jeito para dar presentes a raparigas. – Afirmou o cavaleiro com cara de poucos amigos. – Não sei do que Serafina poderá gostar.

– Tenho algo indicado para a menina Serafina. – Auxiliou a amável senhora, procurando no meio da tralha alguma coisa. – É isto mesmo, meu querido. – Anunciou ela, mostrando uma elegante fita de cabelo cor-de-rosa adornada com pequenas bolinhas douradas.

– É magnífica, acho que Serafina vai gostar. – Afirmou Dégel pegando sem jeito no presente. – Obrigado Gabriela.

– É um bonito presente para se dar a uma namorada. – Disse a senhora, quando os dois rapazes se iam embora.

– Ela não é minha namorada, somos apenas grandes amigos. – Esclareceu o dourado, corando ligeiramente. Unity largou um estrondoso riso de troça.

Ângela e Serafina estavam lindas, desfilando ao sabor de um magnífico Tango, tendo o vasto e nobre salão de dança como atento público. A jovem loura trajava um elegante vestido cor-de-rosa, por sua vez Ângela vestia um bonito vestido lilás, as duas raparigas dançavam embaladas pelas magníficas rodas dos seus vestidos, perdidas na beleza das suas rendas. Por fim, a última nota musical beijou o ar do requintado salão.

– A dança corre tão delicada no teu corpo, como os flocos de neve cobrem a minha querida e amada Bluegard. – Elogiou Serafina, sacudindo a sua linda cabeleira.

– Obrigado Serafina. – Agradeceu Ângela aperfeiçoando a roda do seu vestido.

– Talvez tu fosses bailarina, quem o pode saber. – Sugeriu a jovem do vestido cor-de-rosa.

– Eu não me lembro. – Respondeu a menina tristemente.

– Olha, não penses muito nesse assunto, nós adoramos ter-te aqui, já pertences à nossa família! – Garantiu Serafina docemente. – Acho que Unity e Dégel regressaram, vamos recebê-los. – Disse ouvindo a enorme porta principal bater.

Os dias sucederam-se um atrás do outro, a tão ansiada viagem do cavaleiro espreitava escondida atrás dos belos cortinados que decoravam as janelas da nobre mansão. Finalmente a derradeira noite fez a sua aparição escura e gelada. Todos estavam sentados à elegante mesa de jantar.

– Então Dégel é hoje a tua partida. – Afirmou o senhor Garcia.

– Sim, partirei daqui a algumas horas. – Confirmou o dourado, olhando tristemente para a menina sentada entre Serafina e Unity, nos seus cabelos cor de fogo reluziam os bonitos ganchos oferecidos pelo jovem aristocrata.

– Partida? – Perguntou Ângela assustada com a inesperada notícia.

– Desculpa, eu não te ter dito nada. Mas não sabia como. – Confidenciou o dourado.

Inúmeras lágrimas saltaram dos bonitos e inspiradores olhos azuis da menina das neves. Ela levantou-se num repente repleto de tristeza e correu até ao seu quarto, onde se enterrou nas fofas almofadas coloridas.

– Devias-lhe ter contado. – Disse Unity apreensivo.

– Eu sei disso mas… – Iniciou Dégel, porém as palavras fugiam-lhe da boca como um gato foge de água fria.

– Não falo somente da viagem, falo ainda do facto de seres um cavaleiro de Ouro ao serviço da deusa Atena. – Repreendeu Unity irritado com a atitude do seu melhor amigo. – Fogo Dégel, detesto saber que neste momento ela está perdida nos escuros caminhos do sofrimento.

– Eu não lhe contei que sou um cavaleiro, porque queria que ela gostasse de mim pelo que eu sou, e não pela armadura que visto ou pelo posto que ocupo. – Disse Dégel em voz gélida como a brisa que devastava as altas vidraças.

– Sem dúvida alguma foi uma nobre decisão a tua meu rapaz, todavia acho que a certa altura acabou de te bater à porta. Acho certamente que lhe deves contar. – Falou sabiamente o regente da mansão.

– Obrigado senhor Garcia, assim o farei. – Disse o dourado, erguendo-se da sua cadeira de palhinhas e caminhando até ao quarto da menina.

Entrou silenciosamente na divisão perfeitamente decorada por Serafina. Dirigiu-se à caminha coberta por uma bela colcha de linha lilás, embalado horrorizado pelo triste choro de Ângela.

– Ângela! – Chamou em voz calma. – Preciso de falar contigo, por favor olha para mim. – Pediu.

– Eu não sei o que me deu, desculpe senhor Dégel. Eu não quero voltar a ficar sozinha. – Confessou, olhando no fundo dos lindos olhos do cavaleiro. – Desculpe.

– Não tem importância, eu compreendo, o erro foi inteiramente meu. – Disse Dégel. – E tu nunca mais vais ficar sozinha, nunca mais te deixo sozinha. – Jurou ele. Num impulso o dourado abraçou a menina num abraço muito apertado. Quantos anos ela teria, pensou enquanto sentia o odor delicado do seu perfume. – Desculpa. – Disse ele rapidamente compreendendo o que tinha feito.

– Não tem importância! – Exclamou Ângela divertida, ainda desfrutando aquele abraço. – O que é que me queria dizer? – Perguntou encerrando o assunto.

– Bem, não existe uma forma fácil de te dizer isto. Eu não sou na realidade quem tu pensas. – Disse de forma definitiva o dourado. A menina olhou-o confusa. – Eu sou um cavaleiro de Ouro, um dos homens que protege a paz no mundo e a Deusa Atena. – Concluiu, mostrando uma caixa que escondia a sagrada armadura de Ouro de Aquário. O espanto brincava com a confusão nos vivaços olhos azuis de Ângela. – Agora já sabes tudo.

– Porque não me contou mais cedo, nada iria mudar. Eu gosto muito de si, Senhor Dégel. – Disse docemente, dando desta vez ela um abraço ao cavaleiro. – Ups, desculpe. – Pediu Ângela envergonhada.

– Nunca ninguém me ofereceu um abraço tão quente e tão puro, os sentimentos desta menina são verdadeiros. – Pensou ele. – Bem, ainda existe mais uma coisa que te gostaria de perguntar. – Continuou. – Talvez seja uma proposta indecente ou até mesmo injusta, talvez eu não tenha o direito de te traçar um destino tão inseguro e violento, porém repleto de honra e dignidade. Gostavas de te tornar uma amazona ao serviço do antigo santuário protegido pela sábia Deusa Atena? Isto é se encontrarmos a tua família poderás voltar para eles se assim o desejares. – Apressou-se ele a dizer.

– Uma amazona ao serviço da paz e da Deusa Atena? – Cismou ela, envolta em pensamentos.

Qual será a decisão de Ângela?


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