Ágda escrita por Maresia


Capítulo 14
Na margem do lago




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Várias semanas decorreram desde a chegada de Ângela ao santuário na Grécia, a jovem estava muito feliz, livre e apaixonada, todavia sofria com a ausência de recordações passadas que lhe indicassem quem na realidade era, onde se abrigava o seu verdadeiro lar, quem era a sua família, contudo as respostas tardavam a alcançá-la, a sua memória continuava gelada imersa em dúvidas, sobressaltos, escuridão e desconhecido. A vida naquele lugar sagrado seguia uma rotina muito apertada e rigorosa, incutindo padrões de disciplina e dedicação bastante vincados e intransponíveis o que mantinha a maior parte dos dias a mente e o coração da Cisne ocupados sem lugar para divagações ou distracções inúteis e supérfluas. Bianca e Régulos tornaram-se os seus amigos inseparáveis, ligados pela juventude e pela vontade de vencer aquela dura e inconstante vida. Por vezes, dialogava com Dokho, embora este não fosse muito mais velho tinha uma visão mais nítida, abrangente e clara do mundo e das atrocidades, guerras e perigos, bem como da beleza do amor e da força de vontade e de luta, que coloriam o globo. Apesar de confiar a estas três pessoas a sua frágil vida jamais teria a coragem e a ousadia de confessar a forte e estúpida paixão que colhia por Albafica de Peixes, tinha perfeita consciência de que não era uma situação aprovada pela maioria dos cavaleiros e Ângela não pretendia manchar o seu nome nem o nome do seu mestre, logo guardava em segurança bem trancada num fundo baú do seu jovem coração, longe dos olhares curiosos e mal-intencionados.

Certo dia, a jovem estava de folga dos seus treinos rotineiros e empenhados, aproveitando a manhã solarenga para colher fruta fresca que seria igualmente dividida por todos os cavaleiros e soldados, não esquecendo um cesto bastante recheado para ofertar ao soberano e justo Grande Mestre Sage. Passeava-se tranquila entre o arvoredo frutado e cheiroso recolhendo todos os frutos que lhe eram possíveis alcançar, tendo particular cuidado nas árvores que possuíam ninhos, quando alguém se recortou contra os raios flamejantes da estrela maior, fazendo os seus lindos cabelos de ouro brilhar com uma intensidade estupenda e magnifica, entrando agressivamente pelas janelas de água da jovem ruiva. Com o impacto surpreendente e indetectável, a amazona deixou cair um dos elaborados e coloridos cestos na areia aquecida, espalhando na mãe terra todos os frutos preciosos.

– Quem és tu, um cavaleiro, um inimigo, um soldado ou um aldeão? Eu sou a amazona de Cisne e não hesitarei a te subjugar caso desconfie das tuas intenções. Responde quem és tu? – Interrogou em voz autoritária, mantendo-se a uma distância de segurança. Ângela observava cautelosamente aquela figura imponente e bela, examinando o seu angelical cosmo. O seu coração bateu descompassadamente perante a presença daquele homem magnificente, nunca tinha conhecido ninguém com aquele caracter, talvez fosse um Deus.

– Talvez eu é que devesse desconfiar de ti rapariga. Os males do mundo poluem o coração dos humanos transformando-os em seres indignos e impuros sedentos de sangue e vontade de guerra, desejosos por abraçar a vida de outros. Alguém que me aborda nesse tom arrogante e desrespeitoso não merece saber quem sou, nem conhecer o meu nome. – Proferiu aquele ser divino em voz profunda e impiedosa.

– Mas… - Indagou Ângela surpreendida, não compreendendo as palavras do estranho homem.

– As dúvidas perseguem o meu coração como um vampiro anseia uma gota insignificante e nojenta de sangue. As mascaras e a falsidade retorcem o espírito e a mente do mundo, penetra no teu coração e encontra o teu destino, aceita-o com bravura e dignidade. – Sugeriu enigmaticamente o louro, voltando as costas e partindo a uma velocidade impressionante.

– O meu destino está no meu coração. – Cismou a ruiva, começando a apanhar a fruta beijada pela areia fértil do pomar.

De seguida dirigiu-se apressadamente, sempre com as palavras daquele misterioso homem a martelarem pesadamente nos seus ouvidos, até à entrada angelical das doze casas zodiacais para iniciar a habitual distribuição de frutas.

– Aqui tem senhor Aldebaran, trouxe algumas a mais para chegarem para as crianças, espero que sejam suficientes. – Afirmou a amazona feliz, entrando no segundo templo.

– Obrigada minha querida, têm um ótimo aspeto. Servirão para confecionar uma salada de fruta rica em nutrientes. – Agradeceu o enorme e carinhoso Touro, tomando o grande cesto nas suas mãos.

Ângela continuou a sua travessia através dos doze reinos da paz, deixando sem palavras o cestinho em alguns templos que se encontravam vazios como Caranguejo, Leão e Virgem. Finalmente alcançou o sétimo Templo onde Dokho a esperava com um grande sorriso no seu rosto bonito.

– Bom dia Ângela, estava mesmo a pensar quando chegarias, comerei esses frutos ao pequeno-almoço é muito saudável. – Anunciou o cavaleiro de Balança, pegando a sua refeição.

– Sim o mestre Dégel passava todo o treino a insistir para eu ingerir frutos, ele afirmava que aumentava o meu rendimento nos exercícios bem como fortalecia o meu sistema imunitário. – Respondeu Ângela, acompanhando o seu amigo até ao interior silencioso da sua casa.

– O Dégel é um homem muito sábio, a mente dele é um abismo de conhecimento, tu tiveste um grande mestre miúda. – Elogiou o dourado, pousando as suas frutas numa taça de vidro fosco.

– Sim ele sabe de tudo um pouco. – Confirmou a jovem. – Olha Dokho, logo depois do almoço gostarias de dar um passeio junto do lago? – Perguntou.

– Claro que sim! – Assentiu o cavaleiro, começando a comer uma banana muito saborosa. – Estas são ricas em potássio, sabias. – Informou.

– Sim eu sabia. Bem até logo Dokho. – Despediu-se a linda ruiva, precipitando-se té à casa de Escorpião que para sua sorte estava deserta.

Finalmente alcançou as escadarias brancas que conduziam ao Décimo Segundo Templo, o seu coração parou de bater quando os seus lindos olhos de mar almejaram uma figura esbelta e imponente sentado nos degraus superiores, brincando distraidamente com uma linda rosa cor de sangue entre os seus esguios dedos. Subiu com tremor a escada tentado passar despercebida, porém nada escapava aos desconfiados olhos do cavaleiro de Peixes.

– Quem és tu? O que queres da minha casa? Aqui só encontrarás a morte, mais nada. – Avisou arrogantemente o belo dourado, colocando-se de pé.

– Bom dia Albafica! Eu sou Ângela amazona de bronze de Cisne. Venho-te trazer estas frutas, espero que estejam do teu agrado. – Esclareceu a jovem, sentindo as suas entranhas contorcerem-se de desejo e ansiedade. Devagar transpôs os degraus que a separavam do dourado, mas…

– Não te aproximes de mim! – Berrou o atraente cavaleiro, saltando para longe do alcance da jovem confusa e amedrontada.

– Eu só te quero entregar este cesto. – Disse em voz sumida não compreendendo aquela atitude evasiva, desprovida de sentido na opinião da amazona.

– Coloca-as aí no degrau. – Ordenou Albafica sem rodeios nem simpatia.

– Como quiser. – Murmurou Ângela, contendo as lágrimas perante aquela indiferença mórbida e gelada. Abandonando com rapidez e pesar as imediações de Peixes, transportando uma dura e penosa tristeza no seu peito. – Porquê? O que está errado comigo - Pensou ela, perdida naquelas palavras cobertas de sofrimento e desgosto.

Quando a linda cabeleira ruiva da amazona desapareceu no interior gélido da casa de Aquário, Albafica desceu os degraus e segurou com força no cesto, levando para a sua saleta.

– Desculpa é para o teu bem. – Murmurou o cavaleiro, mordiscando um pequeno e doce morango.

Depois do almoço inexistente que a jovem não tomou, Dokho e Ângela deambulavam pelas margens decoradas com bela e fresca vegetação do belo e grande lago azul, onde vários peixinhos saltavam para saborear a brisa agradável, para de seguida voltarem a mergulhar nas profundezas maravilhosas das águas de seda e mistério. A amazona percorria arduamente a sua mente tentando compreender a atitude inexplicável do cavaleiro de peixes, no entanto nenhuma resposta a aliviava.

– O que se passa Ângela? – Perguntou Dokho, reparando na preocupação que desfigurava o belo rosto da amazona de Cisne. – Se quiseres podes falar comigo, sou um bom ouvinte. – Ofereceu-se amavelmente, colocando uma mão no ombro da jovem.

– Eu estou bem, desculpa se te dei uma falsa impressão. – Mentiu Ângela dolorosamente. – O que me dizes de darmos um mergulho? – Sugeriu tentando desviar o assunto.

– A água deve estar fria. – Disse o dourado de Balanço, debruçando-se e acariciando a superfície lisa do lago.

– Eu treinei em Bluegard, lembraste? Esta água deve estar bem quentinha. – Afirmou Ângela sorridente, saltando para o lago transparente, espalhando água pelas suas margens verdejantes, mimadas pelo sol e pelo vento.

– Então vamos lá! – Mentalizou-se o cavaleiro, mergulhando atrás da sua amiga ruiva.

Ângela nadou até às profundezas do seu espírito, do seu coração, da sua mente enevoada, esforçando-se por abafar a voz arrogante do homem que fazia o seu sangue pulsar, o seu coração palpitar, o seu corpo vaguear através do mundo da fantasia e do imaginário onde o impossível se torna em possível. Dokho nadava no seu alcance tentando entrar nos pensamentos que abalavam a adolescência sinuosa e traiçoeira da sua amiga, porém as barreiras do preconceito e da desaprovação barravam-lhe teimosamente a passagem, deixando-o perdido nos subúrbios confusos e translúcidos.

– Ângela vamos até à margem, trouxe bolo de laranja para o lanche. – Chamou Dokho, depois de uma hora viajando no lago azul e silencioso.

– Sim, estou com fome! – Respondeu a amazona, saltando até à margem calma e florida, partindo algumas flores ao aterrar.

Alguém caminhava vagarosamente através dos pequenos arbustos cantantes que protegiam umas das laterias do lago, abafando os seus paços com a areia misteriosa. O sol dançava em sintonia uma perfeita valsa com os seus cabelos de Ouro puro e resplandecente, a brisa adornada com frescura e doces favos de mel brilhava nos seus olhos azuis e encerrados na escuridão luzidia do seu sofredor coração duvidoso. O seu reflexo denunciou-o espelhando-se na superfície de diamante líquido do lago.

– Dokho quem é aquele homem? – Perguntou Ângela, reparando naquela presença divina que cruzava o seu pensamento.

– É muito raro encontra-lo por aqui. – Murmurou o dourado, observando a outra margem do lago.

– Mas quem é? Tu conhece-lo? – Insistiu a jovem, não tendo forças para conter a curiosidade.

– Sim claro, ele é Asmita de Virgem, o homem mais próximo de Deus. – Esclareceu Dokho dramaticamente.

– Ah! Acho que fui indecente para com ele. Eu não queria, juro. Vou pedir-lhe desculpa. – Decidiu Ângela, abraçando o arrependimento sufocante.

– Tu foste indelicada com Asmita, e estás viva para contar a história? És muito sortuda! – Gabou o jovem Balança impressionado. – Tu deves ser muito especial. – Insistiu.

– Ou talvez muito estúpida. – Censurou-se a amazona, levantando-se e caminhando até ao local onde o cavaleiro de virgem se camuflava.

Qual será a atitude de Asmita de Virgem perante o pedido de desculpas de Ângela? Será ela especial ou estúpida? Apenas o cavaleiro mais próximo de Deus o pode revelar.


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