Our Games escrita por Magicath


Capítulo 17
Capítulo 17 — Apenas um Jogo


Notas iniciais do capítulo

olá

senti que deveria postar esse capítulo, porque passei quase uma semana sem postar alguma coisa e isso é maldade, sabendo que eu tenho todos os capítulos prontos (menos os dois finais ~tá dificil). ENFIM

Capítulo mais "levinho", levando em consideração os acontecimentos anteriores. Espero que gostem.



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XVII

Apenas um jogo

 

Apoio Chris na árvore mais próxima da forma mais confortável possível. Ele está inerte, ainda desacordado. O colarinho do casaco está todo molhado de saliva e tenho que desabotoá-lo para seca-lo e afrouxar a pressão na garganta de Chris. Ele murmura coisas ininteligíveis enquanto suas mãos abrem e fecham. Pelo que consigo enxergar, o cenho permanece franzido. 

Ele está vivo. Eu não o matei...

Eu não me contenho. Sinto minha respiração pesada, o famoso nó na garganta de quando você segura a angustia que sente dentro de você. Agarro meus próprios cabelos e solto um ruído gutural, um urro de raiva. Qualquer um num raio de 30 metros poderia ser capaz de ouvir, mas não me importo. Nesse momento nada importa. A minha paciência tem vida mais curta que de uma borboleta e eu já não aguento mais suportar tudo isso. Atiro meus punhos contra a casca de uma árvore. A cor rubra do sangue é familiar demais para me incomodar e a adrenalina inibe a dor. Libero toda minha raiva por causa desse jogo estúpido. Isso é só um jogo. Era pra ser. É só uma brincadeira, não? Então estamos brincando de que?

Se era para nós morrermos, porque continuamos vivos? Porque nos mandam antídotos, insistem na nossa sobrevivência, mas também insistem em nos dar motivos para desistir? Qual a razão, afinal?

— Vocês não podem fazer isso! — Eu grito para os espectadores, jogando os braços para cima, sorrindo como louca. — Estão vendo? Não podem me fazer desistir!

Mas eles podem. Eles podem porque este é o joguinho deles. Eles podem brincar conosco a hora que quiserem, do jeito que quiserem. E não importa o quanto de antídoto os patrocinadores mandem, eles podem enviar também qualquer coisa para me matar. Porque eu sou só mais uma pecinha descartável que pode ser jogada fora a qualquer momento. Estou cansada disso.

Estou cansada, farta, de saco cheio. Há horas não durmo direito, há horas não como ou bebo algo, há dias não tenho um minuto de descanso. Tudo o que eu queria era poder sentir que tudo realmente iria ficar bem, poder dormir sem me preocupar com os pesadelos, poder comer alguma coisa nem que seja uma migalha de pão. Até sinto saudades dos dias nos quais só comia mingau e uma sopa como almoço e jantar. Pensar nisso quase me faz babar.

Felizmente, se eu ganhar, terei toda a comida que quiser bem diante dos meus olhos.

Solto uma risada fraca e irônica. É cômico como eu sinto que essa é a única coisa servindo de incentivo para mim no momento.

Chris se move ao meu lado meio sonolento e confuso. Ele grunhe e pressiona a palma da mão na cabeça, ainda se sentindo um pouco tonto. Ele rapidamente senta-se ereto, assustado.

— Ei, calma — eu seguro suas mãos, mas ele se retrai. — Calma Chris! Sou eu.

O brilho da lanterna caída no chão é refletido em nossos rostos. O garoto fora de si se recupera, encarando meu rosto enquanto controla a respiração

— O que… o que aconteceu? —Chris indaga.

— C-Chris… Qual é a última coisa que você se lembra? — pergunto. O nó na garganta dificulta a fala. 

— Eu lembro de estar com falta de ar, parecendo que meu sangue queimava. Lembro de tudo apagar de repente… — Chris coloca as mãos sobre a cabeça enquanto fala. Ele se encolhe, escondendo a cabeça entre os joelhos. — Como… eu juro por Panem, eu achei que tinha morrido.

Encaro-o pasma, não acreditando. Ele realmente não se lembra do que aconteceu? Do que acabou de acontecer? Talvez não, ele não devia estar consciente quando sofreu essa alteração motora dos seus movimentos. Quando perdeu o controle de si mesmo.

Meus braços fraquejam e mordo o lábio inferior para controlar as emoções. Não posso chorar. Chega de chorar, não posso mostrar que eles estão conseguindo me afetar.

— Lara? — ele me chama, apoiando a sua mão em cima da minha. Não sou capaz de olhar em seus olhos.

— Seu idiota — eu digo, fraquejando. Deixo um soluço escapar. — Como você pôde pensar em suicídio?

Sua mão se afasta de mim e caminha até seu bolso.

— C-como assim...? — ele sussurra. — Por Panem, o que foi que eu fiz?

Não dá, não consigo lhe dar uma resposta. Não consigo traduzir em palavras o que aconteceu minutos atrás, o horror que eu senti e a vontade miserável de tê-lo deixado morrer.

— Lara, o que aconteceu?! — Chris insiste, dessa vez apertando meus ombros com força. — Por que eu estou vivo? E como?

— Isso aconteceu! — exponho o frasco em minha mão, estendendo-o para ele. Quando enfim consegue enxergar o vidrinho, Chris arregala os olhos. — Você tomou a droga do veneno Chris.

— Eu… — ele hesita, desconcertado. Simplesmente não há palavras suficientes para amparar tudo. São inexistentes.

Palavras não são nunca inexistentes, basta achar uma maneira certa de pronuncia-las. Porém, neste caso, não há.

Agarro o tecido da sua camisa, mordendo ainda mais meu epitélio bucal para conter os tremores e mais lágrimas. Eu sinto vontade de joga-lo contra a arvore e gritar com ele, mas lembro de minutos atrás, o desespero, sentindo que a hora tinha chegado e… Minha cabeça encosta em seu ombro enquanto eu soluço. As palavras ficam entaladas na minha garganta. Chris continua estático.

— Você… — Minha voz sai como um miado seco de um gato. Encho meus pulmões antes de prosseguir. — Você teve uma convulsão! — eu grito em plenos pulmões. Que estejam me ouvindo. Eu não ligo. — Caiu do seu bolso quando… eu não… Não consigo.

Afrouxo um pouco o aperto, soltando a sua camisa. Encosto as mãos no seu tórax. Tomo controle da minha respiração, igualando-a a dele, sentindo-a com a palma da minha mão. Subindo e descendo, subindo e descendo, acompanhando o ritmo dos pulmões dele.

— Você se envenenou Chris — eu murmuro, abaixando a voz, agora o encarando. — Eu estava observando você sofrer sem poder fazer nada a respeito…

Ele permanece em silêncio.

— Eu estava vendo você morrer — continuo, ainda com a mão puxando sua camisa. Observo-as. Frígidas e pálidas, refletindo o meu estado atual. — Eu estava lá e… eu quis que acabasse. Eu quase deixei você morrer. Eu queria que você morresse...

Seu peito sobe bruscamente quando faço a confissão. Ele prende a respiração.

—O que você estava pensando? — questiono, finalmente o soltando e deixando meus braços frouxos sobre a neve, sem forças. — Só me diga: por quê?

— Me desculpe… Por favor, eu sinto muito — Chris suplica. Ele observa as mãos fechadas em punho, segurando o pequeno frasco numa delas. — Não sabia o que estava fazendo. Eu perdi a cabeça Lara, eu… não era eu.

Não, não era. Era um ser domado pelo desespero, tentando acabar com todo esse drama.

— Eles mandaram o antidoto. Eu não queria usar… — continuo, sem escutar realmente o que ele diz. — Você poderia estar morto. Eu poderia ter te matado.

— Mas você não fez isso — confronta ele.

A afirmação me pega de surpresa. Não, eu não o matei. Porque…? Eu não sei. Eu não lembro.

— Que tipo de pessoa eu seria se matasse meu melhor amigo e não sentisse nada com isso? — respondo.

— Lara. Você não fez isso. Eu estou aqui — ele continua a falar, mas eu não escuto. Eu matei meu melhor amigo. Isso não é real.

— Você não era o mesmo. Parecia que você já estava morto eu já tinha te perdido. Parecia mais fácil aceitar a morte naquela hora, mas...

Mais silencio… Minha respiração volta ao normal lentamente. Volto ao meu momento de clareza, com medo de pronunciar a conclusão da frase.

— Achei que estava pronta, mas eu nunca vou estar. Eu nunca vou estar preparada pra te perder, Chris.

Ele agarra meu pulso, impedindo-me de continuar. Ele leva minha mão até o seu peito, onde posso sentir seu coração martelar contra minha palma. Bate forte, mas não parece estar inquieto.

— Está sentindo? — Ele pergunta. Eu assinto. — Pareço morto pra você?

 Limpo uma das lágrimas que deseja escapar. Ainda não sei como reagir, mas a calma parece estar voltando aos poucos.

— Eu estou aqui e estou vivo. Me desculpe por ter feito isso com você, eu me arrependi no momento que tive consciência de que eu iria morrer. Esse não seria o jeito certo, ceder dessa maneira. Eles queriam que eu desistisse e eu acabei não resistindo. Mas eu prometi não desistir, lembra?

Eu assinto, convicta.

— Você e esses discursos motivadores — comento de brincadeira. — É entendi. Obrigada. — Sorrio, agradecida.

Então nos abraçamos. Por enquanto, aquele momento está completamente dissolvido nas águas do passado. O normal se instala novamente. Porém, isso até a mente ruir sob o peso da insanidade. De novo.

— Nós poderíamos nos beijar agora — ele diz, em alto e bom som. Um sorriso zombeteiro escapa pelo canto dos seus lábios iluminados pela lanterna. — Seria bom para a audiência, não acha?

Afasto-me e levanto as sobrancelhas, embasbacada. Chris encolhe os ombros, me encarando com um sorriso zombeteiro.

— Seria bom para a audiência, não acha? — digo, aproximando-me dele devagar, mantendo um mistério.

O sorriso bobo de Chris some de seu rosto assim que percebe o que estou fazendo.

— Ei, você não vai realmente fazer isso né? — Chris indaga. Ele tenta se afastar, porém a árvore atrás dele o impede. — Você sabe que eu não…

Quando me aproximo o suficiente, acumulo um punhado de neve em minha mão e dou uma cotovelada nele. Ele solta o ar, deixando a boca aberta, dando-me a chance de enfiar toda a neve na minha mão lá.

— Só nos seus sonhos, trouxa — eu digo.

*

— Você vai pagar caro por isso — Chris reclama mais uma vez, não esquecendo do ocorrido algum tempo atrás.

Eu reviro os olhos, sorrindo. Porém, ele é breve e logo desaparece.

Mesmo depois de tudo o que aconteceu, ainda penso no inevitável. Ainda me atormenta que a cena de minutos atrás poderia ter ocorrido mais posteriormente, num futuro próximo. Muito próximo.

Quando tudo isso acabar, se eu realmente voltar para lá, não haverá tempo para Chris me fazer pagar pelo o que eu fiz. Porque quando tudo isso acabar, não existirão mais travessuras. Não mais existirá alguém para fazer isso comigo.

Não, pare com isso Lara. Já basta com o drama.

Fecho os olhos e suspiro. Preciso bloquear esse tipo de pensamento.

O fogo crepita com o vento ameaçando apaga-lo. As chamas iluminam o curto espaço no qual nos encontramos, também nos proporcionando um pouco de calor. As mãos quase congeladas agora estão aquecidas pelo fogo.

Nós não voltamos à caverna. Não poderíamos, nossa localização já foi comprometida. Ao invés disso, avançamos até uma pequena clareira atrás de uma proteção rochosa.

A única coisa boa é que a escuridão apresentava índices de que iria ir embora. E, é claro, a comida.

Foi um trabalho árduo forjar uma fogueira. Achar lenha no escuro não era fácil. Tínhamos um isqueiro, mas a chaminha lutou bravamente contra o vento gelado para que pudesse crescer. Felizmente, a fumaça não é tão visível no céu, sendo a única preocupação a luminosidade das chamas. Apenas um tributo próximo conseguiria nos enxergar em meio à escuridão. Eu realmente espero que ninguém esteja nos arredores do nosso acampamento improvisado.

Observo a carne espetada no galho. Ela demora a cozer, lembrando-me do fogão à lenha lá de casa que quase sempre não funcionava. Uma pena que eles não deixam utensílios domésticos na cornucópia. Talvez tenham deixado, mas eu não me arriscaria a descobrir.

Conseguimos capturar um pequeno e gorducho esquilo branco numa de nossas armadilhas. Eu realmente achava que as espeluncas não funcionariam, mas quem diria? Algumas vezes as chances e a sorte estão ao nosso favor.

Eu não sou realmente uma amante de carne, principalmente de um animal pequeno e incomum como esse esquilo, mas a fome era tão grande que conseguiu vencer, nocauteando o enjoo e o nojo. Não é a melhor carne do mundo, obviamente eu senti muita falta de sal ou tempero — sim, é nisso mesmo que estou pensando ao come-la — e muito menos tinha gosto de comida, mas nessa altura do campeonato, até casca de árvore saciaria o monstro de mim.

O hino da Capital nos desperta e a insígnia aparece no céu. O rosto da menina do 12 resplandece no céu. Surpreende-me ela ter sobrevivido todo esse tempo, considerando que seu distrito não é um dos melhores. Isso me faz pensar em nossas chances, em como nós progredimos até aqui. Não posso afirmar que venceremos, mas veja só, estamos aqui, entre os últimos sobreviventes! É claro que mais tarde enfrentaremos inimigos piores que podem significar nossa morte, mas ao lembrar que eu achava que minhas chances eram quase mínimas no começo… Isso me traz forças, esperanças. Ao menos uma pequena chama de esperança dentro de mim.

Aconselho Chris a tirar um cochilo até que esteja recuperado e o céu esteja claro o suficiente para partirmos. Ele insiste em dizer que está bem e me manda dormir, pois eu já fiz mais do que o necessário por ele, o que acaba gerando uma pequena discussão. Por fim, chegamos a um consenso. Apagamos a fogueira e procuramos um canto seguro para nos aconchegar, enrolando-nos no cobertor. Chris senta ao meu lado, cobrindo-se também. Sua companhia me traz segurança.

O silencio e o vento me embalam enquanto observo a suposta luz do sol o escuro. O silencio e o vento me embalam quando fecho os olhos. É estranho como tudo parece sereno demais… Eu diria pacífico, mas desconfio demais desse termo. Algo me incomoda. Alguma sensação estranha e insegura brota dentro de mim. Algo parece se mover por entre as arvores, se esgueirando no escuro, escondendo-se nos cantos sorrateiros, esperando para invadir os sonhos de quem ousasse adormecer.

Havia algo, algo sinistro; o puro medo que adormecia dentro de mim, porém que não se extinguia.

Quando as coisas estão calmas demais, é melhor desconfiar.


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Notas finais do capítulo

Desculpem qualquer erro, eu to postando bem rápido porque preciso sair. Eu particularmente achei que falta algo no capítulo ou algo não está bom o suficiente. Se vocês acharem isso também, digam como eu posso melhorar que eu faço as alterações necessárias.

LEMBRETE: Como fazer uma crítica?
1) Diga o que está errado
2) Não esqueça de dizer POR QUE e COMO MELHORAR.
Não adianta falar "não gostei disso" e não se explicar.

Próximo capítulos as coisas vão começar a caminha para o final da arena. Ele é especial para quem sente saudades do Matt.

Att,
Magicath.