Our Games escrita por Magicath


Capítulo 11
Capítulo 11 — Alvura Vermelha


Notas iniciais do capítulo

Oi oi, desculpem o sumiço e tal, mas acontece que: Viagens.

Bem, resolvi postar, porque deixar vocês sema atualização é muita maldade, não é?

Então, o capítulo mais esperado: o começo da arena, o Banho de Sangue.

Curiosos? Bora ler!



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Dez. Onze. Doze. Treze.

Faltam poucos minutos para o Aerodeslizador partir. Olho para Hector ao meu lado, impassível e controlado. Ele me acompanha no percurso do nosso andar até o telhado, dentro do elevador.  Apenas eu, ele e a agonia. Só resta me despedir do meu mentor. Então, chegamos ao final de tudo o que construímos durante nossa estadia na Capital. 

Meu mentor ampara-me antes que eu suba as escadas e entrar no transporte.

— Ouça — ele diz, segurando meus ombros. — Seja esperta, garota, pense sempre antes de fazer alguma coisa. Você vai precisar estar um passo à frente de todo mundo, não só dos tributos, mas dos idealizadores também. Seja sagaz, não deixe eles mexerem com sua cabeça. Não faça uma coisa apenas porque parece certo faze-la. Ceder não é fraqueza. Fugir é uma opção, entendeu?

Balanço a cabeça em concordância. É como uma teoria matemática que abre caminho para várias situações hipotéticas. Às vezes uma equação resulta em duas soluções. É nisso que devo focar: existe apenas uma possibilidade? Precisarei me arriscar, mas pensar antes de agir, não só para sobreviver, mas também para me mantar sã.

— Só uma última coisa: o seu único e verdadeiro aliado é você mesma. E talvez Chris, no caso.

Rio fracamente por causa do último comentário.

— Obrigada.

Um tempinho de silencio e um sorriso bastam para que ele tenha a comoção de me abraçar. Retribuo o gesto. Fecho os olhos, pensando nessa sensação que nunca senti, de alguém que se preocupa comigo, de proteção fraternal. Uma proteção que eu perdi anos atrás. Pela primeira vez, não quero sair de perto dele.

— Você é muito parecida com seu irmão, sabia? — ele comenta, me deixando surpresa. — Talvez um pouco mais...

— Chata, fresca, teimosa... — completo sua frase, rindo.

— É, basicamente. Você não aceita as coisas como elas são, eu gosto disso. Por esse motivo você deveria voltar, você merece. Não vou dizer que você tem mais chances, mas... eu acredito em você.

— Obrigada de novo, Hector. Prometo que vou tentar.

— Acho que isso é hora de ir, então. Adeus, Lara. Espero te ver novamente.

— Eu também — digo e então entro na aeronave. 

A plataforma se fecha e subo as escadas para o interior do complexo. Sento em uma cadeira, deixo uma mulher enfiar algo no meu braço e olho o mundo se afastar pela janela. A imagem de Hector e do Centro de Treinamento vão diminuindo, ficando para trás. Então os vidros escurecem, bloqueando a visão. Pacientemente, fecho os olhos e não vejo a hora disso acabar.

*

Contemplo a parede monótona à minha frente e o pequeno elevador que me levará até a arena. Os azulejos são verdes, retangulares e muito bem organizados. O teto branco. As luzes brancas, refletidas no vidro do elevador. Meu contorno translúcido me encara, pedindo socorro.

A gota de suor frio escorre lentamente pelo canto do meu rosto. Ela pinga e atinge o chão, quase produzindo um eco no meio do silencio mortífero.

Os pacificadores abrem a porta metálica e permitem que Stanley entre por ela. Não consigo nem levantar para ir cumprimenta-lo. Ele esfrega os braços como se estivesse com frio, olhando ao redor

— Eu detesto essa sala — ele admite, mais para si mesmo do que para mim.

Não sei se ele fala como um ser da Capital, analisando a cor neutra e triste do local ou se fala como alguém normal que enxerga a ânsia que esse lugar traz. O peso das almas que passaram por aqui antes de morrer.

Não saberei, pois não tenho voz para perguntar.

Ele pega o conjunto de roupa envolto numa sacola de plástico transparente. Meu uniforme da arena. Retirando o saco, ele me entrega uma calça preta de um tecido meio elástico. Parece fina, mas ao vesti-la vejo que é quente e semelhante à borracha.

— Parece uma calça feita para aguentar baixas ou altas temperaturas. Isolante térmica — Stanley comenta ao analisar a peça. — Impermeável. E talvez à prova de fogo...

— Ok, já entendi — digo baixinho, esperando que ele pare. A situação já está bem desesperadora e imaginar para o que serviria aquela roupa só piorava.

Stan assente e me ajuda a vestir o resto do conjunto — uma blusa preta sem mangas de malha fina, uma camisa curta e uma japona branca.  Visto uma por cima da outra respectivamente. As peças não são justas, facilitando a locomoção. São feitas de camadas folgadas para que minha circulação não tranque. Por cima de uma meia de nylon, coloco duas botas de veludo revestida com algo macio dentro. Deve ser algodão, eu suponho. Finalizando, Stanley gruda uma touca com pelos na japona.

— Suponhamos pelo capuz que a arena seja gelada — ele diz, pensativo, ajeitando a minha roupa, — use-a para aquecer as orelhas, mas quando sentir que está suando retire. Suor não é bom em climas frios.

Assinto, anotando seu conselho na minha caixinha de informações mentais.

Stan então sorri e retira do seu bolso a pulseira que Chris me deu ontem. Tive que deixá-la com os pacificadores na entrada para que pudessem checar se havia algo suspeito nela. Sinto um pequeno alivio por tê-la comigo, como se ela fosse uma parte de mim que não pode faltar. Talvez eu tenha me apegado demais e o acessório me lembre muito da minha vida passada no distrito e principalmente do dia em que Chris a achou. O dia em que todo esse desespero começou.

— Tudo bem? — Stan pergunta calmamente, ajeitando o acessório no meu pulso.

Afirmo com a cabeça. Não sei dizer se estou bem ou não. Minha mente está muito agitada e meu corpo também. Eu posso estar morta daqui a alguns minutos quando todos lutarão pela vida e pela gloria.

Uma voz feminina e mecânica anuncia que devemos entrar no círculo dentro do elevador de vidro. A hora do massacre chegou.

Olho para ele, deixando finalmente o desespero tomar conta. Começo a me agitar e a me afastar do elevador. Ele segura minhas mãos, pedindo para eu respirar. Meu peito pesa quando tento inspirar, principalmente porque seguro as lágrimas e o sufoco que sinto na garganta e no peito dificulta o processo.

— Mantenha a postura — orienta ele, erguendo meu queixo e apertando meus ombros. Relaxo um pouco mais. — Identifique seu medo e o controle. O pânico é mortal, o medo é saudável.

Assinto. Surpreende-me ele ser tão esperto e útil nessas horas.

“Dez segundos”, a voz anuncia.

— Lembre-se de quem você é lá em cima e não esqueça que existem pessoas a esperando aqui fora, o.k.?

— O.k.

Com Stanley me conduzindo, subo na plataforma circular e espero até ela se elevar. Fecho os olhos quando a sinto subir, levando-me até a Arena.

Então, sinto-me ao ar livre. Ouço o vento cantar e bater no meu rosto, gelando-o. A luz ultrapassa minhas pálpebras fechadas e o mundo se torna uma imensidão branca. O calor da minha pele entra em choque térmico com a temperatura gelada do lugar. Imediatamente meu corpo se manifesta com tremores.

Crio coragem para abrir meus olhos. Não é nenhuma surpresa. É uma arena de gelo. Um ponto para mim, no Distrito 3 nevava às vezes. Já estou acostumada. Porém isso não é necessariamente um bom sinal.

Vejo muita neve. Há um chifre dourado no meio de uma imensidão branca, um círculo perfeito. A alguns metros avisto árvores salpicadas de branco, coníferas sustentando os poucos flocos de neve que o vento carrega, rodeando o espaço de batalha do Banho de Sangue. É como se estivéssemos em um ringue redondo a céu aberto, uma circunferência perfeita cercada por árvores. Ao olhar para cima, camuflada por uma neblina densa, avisto o contorno de uma montanha; talvez uma cordilheira. 

O tempo de sessenta segundos inicia e o som da contagem vibra a nossa volta. Tenho um minuto para me acalmar e pensar racionalmente no que é mais aceitável fazer.  Sei que não tenho tempo de ficar olhando para a beleza do lugar, então começo a analisar os itens que foram colocados na frente da cornucópia. Bem no centro do chifre estão as armas, mochilas contendo o necessário para a sobrevivência e caixas de madeira cheias de frutas, verduras e comida enlatada. As coisas mais afastadas da boca da cornucópia são bolsas pequenas, algumas sacolas e rolos de cobertor.

Faltando 30 segundos, procuro Chris e o localizo 10 círculos de metal de mim, quase atrás da cornucópia. Por sorte, os carreiristas não estão perto dele. Matt está na mesma posição, do lado oposto. Brenda, a garota do 4, ao seu lado. Saphire, a loira mal-encarada, está bem perto de mim, à minha esquerda. Terei que me afastar dela se não quiser ser morta.

O gongo soa e, antes que eu possa me arrepender de qualquer coisa, estou saltando para fora do meu círculo. Meus pés afundam na neve escorregadia e disparo sem pensar, tentando me equilibrar enquanto disparo. Corro para a direita a fim de despistar a loira que me cerca com os olhos. Felizmente, ela não me segue e se dirige às armas para poder matar suas vítimas.

A neve diminui à medida que me afasto das plataformas. Enquanto corro, pessoas lutam e armas se chocam à minha volta. Tento prestar atenção para que nenhuma faca ou outra arma me acerte. Avisto Chris agarrando uma mochila perto da cornucópia. Ele corre até mim, pedindo desesperado que eu vá para a floresta. Está tão distraído que não vê um tributo correndo atrás dele. Nautilo, o garoto do 4, está prestes a lançar uma faca. Grito para ele se abaixar ou se atirar no chão. Chris olha para trás e se atrapalha. O chão liso contribui para meu aliado tombar no chão. A faca passa por cima dele e perde-se na neve.

Alguma força misteriosa me empurra e eu sou jogada para o lado. Minha cabeça bate no chão gelado e sinto um forte estalo em meu nariz. Droga. Talvez tenha quebrado. Arrasto-me pelo chão, tentando levantar. Estou desorientada com o que acaba de ocorrer e cambaleio atrapalhada. Tento sair do campo de morte antes que a pessoa que me empurrou me mate de vez. Meus ouvidos apitam e estou quase sem ar. Gritos e mais gritos ecoam a minha volta. As pessoas são completos borrões, correndo para lá e para cá, jorrando sangue e caindo. 

— Não vai fugir não! — Reconheço a voz. Saphire, a loira maligna, brota na minha frente, com um olhar maldoso. Há sangue escorrendo de suas armas estranhas parecidas com garfos de três pontas. A lâmina do meio é mais alongada que as da lateral, que são meio curvadas nas pontas. A morte eminente é inevitável para mim.

Ela chuta meu corpo antes que eu possa levantar. Caio de novo, dessa vez de costas.  Não vou dar essa chance a ela, ser humilhada no começo dos jogos, deixar ela acabar com tudo antes mesmo de poder tentar, ainda mais depois de tanto sofrimento pelo que passamos. Esperneio, jogando neve para todo lado, e empurro ela com toda a força.

A garota bufa feito uma fera e me acerta bem no rosto com o cabo de sua arma. Nunca levei um soco antes e afirmo não ser algo muito agradável. Minha cabeça lateja de dor.

A menina se prepara para enterrar seus Sai no meu peito. Ao meu lado há um rolo de cobertor grosso. Agarro-o e uso como escudo no último minuto, fazendo a arma penetrar no tecido e não em mim. Ele é suficientemente grosso e a lamina não alcança meu peito. Para a minha surpresa, com a outra arma em mãos ela atinge meu braço, rasgando-o com a ponta mortífera de sua arma. Grito de dor enquanto ela ri triunfante. Com raiva e me agarrando às forças que me restam, cuspo em seu olho esquerdo e a empurro com os joelhos. Ela grita de nojo enquanto se equilibra.

— Vou fazer você se arrepender de ter vivido! — a carreirista rosna para mim.

Largando suas armas, ela agarra meu pescoço e me joga contra o chão gelado novamente. Solto um grito e sinto todo o ar se esvaziar de meus pulmões. Não sendo o bastante, Saphire agarra meu pescoço e golpeia meu rosto várias e várias vezes. Sinto meu olho inchado e o sangue escorrer pelo nariz. A dor é tanta que eu desejo que um de seus Sai se enterrem no meu peito, acabando com aquela tortura.

Felizmente, algo a lança para longe como fez comigo minutos antes. Chris aparece em meu campo de visão limitado por borrões e agarra minha mão direita para me levantar. Ele me puxa em direção a floresta e, deixando as lagrimas rolarem, permito que ele me leve. Minha cabeça lateja, os gritos invadem meus ouvidos e não consigo enxergar direito por onde ando.

Minhas forças estão esgotadas. Desejo parar e me entregar. Contudo, vejo Chris à minha frente, ainda me carregando. Não posso desistir. Há uma floresta ladeira abaixo. Não posso parar agora, precisamos nos abrigar nas profundezas da floresta densa. Só mais um pouquinho...

Ao atravessamos uma descida íngreme, pulando algumas pedras lisas que ficam no caminho, tenho uma sensação de vertigem e me desequilibro. Meu corpo não pode mais aquentar o esforço. Escorrego e caio, levando o coitado do Chris comigo. Neve, folhas e pedrinhas rolam conosco, até que paramos no meio das rochas geladas. Permaneço caída no chão, sem conseguir me levantar. É o fim.

Chris tenta me reanimar, porém não o escuto. Só ouço um zumbido continuo e agudo. As cenas de morte passam pela minha cabeça; todas aquelas crianças caindo no chão mortas, a alvura tingida de vermelho brilhante, o contraste berrante entre essas duas cores. É insano. Fecho os olhos e deixo a escuridão serena me envolver, tentando esquecer tudo que aconteceu.

É só um sonho, Lara. Não pode ser real.


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Notas finais do capítulo

Japona é um casaco de nylon que as vezes deixa você parecendo o Michelin da loja de pneu. Não sei se isso é mais uma expressão só da região Sul, tipo vina (que é salsicha).

Os Sai da Saphire é uma arma q muitos personagens ninjas usam. Sua forma básica é a de uma adaga cega, com duas longas projeções acopladas à empunhadura, mas é claro que a descrição que a Lara fez foi mais básica, porque, é claro, ela não tem como acessar o wikipédia. É aquela arminha que o Rafael das tartarugas ninjas usa.

Então, arena de neve, esperavam por essa? (Nem precisam responder, é obvio que sim hahahsahasdjas)
Não tenho mais o que perguntar especificamente, deixem suas opiniões e expectativas.

Atenciosamente,
Magicath.