A ascensão política de um caveira escrita por Kori Hime


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Tropa de Elite - Tihuana
https://www.youtube.com/watch?v=R7PqvzSwU9s

Muro de concreto
Bom de derrubar
É Tihuana
O pau vai quebrar

Tropa de Elite
Osso duro de roer
Pega um pega geral
Também vai pegar você

Tá de bobeira!

:P



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Sou um homem como qualquer outro. Talvez não igual ao seu pai, tio ou avô. Fui Tenente-Coronel e Secretário de Segurança. Divorciado e com um filho que decidiu rebelar-se contra mim. A vida pessoal é uma bagunça, na verdade, ela mal existe. Me aposentei, mas decidi que não iria passar o resto da minha vida lamentando o que não vivi ou o que poderia ter feito diferente. Foi assim que entrei para a política.

É, nunca diga nunca, não é isso que os mais velhos ensinam?

A campanha, que devo confessar não ter sido fácil, teve uma célere aceitação da população. O apoio de todos foi necessário. Até mesmo daqueles que acreditam na recompensa futura. Esses, camarada, eu devo dizer que vão ter que esperar sentados, como dizia minha avó.

Meu nome, Roberto Nascimento, estampado em painéis pela cidade, trazia em letra garrafal a mudança que o povo tanto pedia. Uma mudança que eu mesmo não tinha poder suficiente para organizar. Mas, meu amigo, sozinho a gente não faz nada nesse mundo.

É por isso que aceitei a ajuda de pessoas que já estavam nesse meio há mais tempo do que eu e tinham certa desenvoltura para lidar com todo o tipo de pessoa. Confesso que não foi fácil, no início, manter aparatosa minha imagem. A cada encontro do partido, suas coligações e até mesmo alguns empresários interessados em colaborar com a campanha, me dava uma vontade de apresenta-los à pistola que mantenho embaixo do meu travesseiro todas as noites.

A conversa distendida me causava falta de ar, as vezes eu precisava afrouxar a gravata e respirar um pouco de ar puro do lado de fora dos restaurantes caros. Engraçado, subir o morro, beijar criança doente, apertar a mão de gente pobre, só mesmo diante das câmeras.

Sempre que eu era pego nessas situações embaraçosas, Diana, minha assistente, trazia um comprimido e copo de água para eu me manter firme no resto dos jantares.

Uma das coisas mais difíceis, além de encarar rostos conhecidos e que não valiam meu tempo, foi lidar com acusações contra minha candidatura. Meu passado, ao qual não tenho vergonha, fora esmiuçado e revirado por todos em propagandas eleitorais. Histórias que eu guardava na minha memória, por motivos óbvios, foram esfregados na cara de todos os cidadãos dessa cidade.

E quando acreditamos que a campanha seria um fiasco, afinal, ninguém quer em seu partido alguém com as mãos manchadas de sangue, mesmo que a mancha tenha sido ordens superiores. O efeito veio o contrário. Nas redes sociais os vídeos e fotos eram compartilhadas cada vez mais. Confesso que na hora achei aquilo o máximo. Entretanto, as consequências eram danosas.

Os pedidos para que eu arrancasse do poder a base de tapas, ou tiros, políticos corruptos eram músicas para meus ouvidos. Apesar de tentadora, essa nunca foi minha intenção quando aceitei me candidatar. Deixei claro minha proposta, um trabalho sério, voltado para segurança e que iria priorizar a qualidade de vida de todos, mas, principalmente, de quem realmente estava no fogo cruzado entre polícia e traficante.

Na verdade, passei noites sem dormir preparando o conteúdo da minha campanha, os textos, discursos, projetos e tudo o que eu queria representar.

Visitei lugares que no passado eu apenas era mais uma caveira causando temor tanto nos bandidos como nas nos inocentes. Aquelas pessoas, pobres, favelados, gente que não tem condições de viver num apartamento no Leblon. Essas pessoas eram e são minha prioridade.

Só que não é bem assim que a banda toca por aqui.

Sugeriram que eu me afiliasse ao partido da natureza, pois meu plano utópico iria efluir pelo esgoto até o mar. Era um paradigma aceitável, porém, na prática não executável. Turista não quer pegar trem e ir até Vigário Geral, Cascadura, Madureira, Irajá ou Pavuna. O povo pode aguardar um pouco mais, enquanto são construídos novos estádios, museus e recantos para a zona sul se vangloriar das belezas naturais do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, a falta de água, saneamento básico, moradia e segurança fica por conta de Associações de moradores, muitos deles nas mãos de quem devia ajudar, mas cobra por isso. É uma vergonha, uma doença que eu próprio queria exterminar com minhas mãos.

Entoar um grito de vitória a muito preso em minha garganta, faria meu dia valer a pena. Aguardar a apuração dos votos, no comitê organizador na Penha, foi uma verdadeira lição de paciência, essa que eu adquiri em noites de treinamento, quando ainda era capitão no Batalhão de Operações Policiais Especiais.

Resiliente à toda aquela pressão, pude avaliar melhor o momento. Meu filho, Rafael, me alegrou com sua presença. As brigas já não eram mais frequentes, mesmo que sua arrogância e teimosia fosse constante. O que eu não posso reclamar muito, pois meu filho saiu uma cópia perfeita de mim. O que eu preferiria mil vezes o contrário. Queria vê-lo seguir outros passos, não os meus. Rosane ainda faz questão de apontar seu dedo, para falar que ele puxou a mim desde petiz.

Ao perscrutar meu passado, meus inimigos políticos não se deram conta de que ali havia trabalho duro e honesto, mesmo que sob pressão psicológica e muitas vezes força bruta. Devo admitir, havia dentro de mim um gosto particular em fazer o que eu fazia. E, por mais que eu queria, minha vida jamais será fechada como um diário particular. Eu fiz o que fiz, e voltaria nessa vida para refazer tudo do mesmo jeito. Talvez eu mudaria algumas coisas, como salvar algumas vidas inocentes. Fui tolhido de escolhas pessoais, mas agora não tem como chorar o leite derramado.

Pedro Almeida, o homem que me ajudou a compor essa campanha, um grande janota, me falou que eu seria a grande revolução da política, depois bastava justapor minhas ideologias aos poucos.

Admito que nos minutos finais da contagem de votos, quando minha vitória era tangível, me bateu um frio na barriga. Todas aquelas vozes ao meu redor servia somente para exacerbar minha ansiedade. A paciência se esgotava. Até que naquela noite de 2014, eu fui eleito Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, com o maior número de votos.

O futuro me aguarda. Quem viver, verá.


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Notas finais do capítulo

Caveira, Capitão!

Essa é a segunda história do desafio. Foi muito fácil, mês que vem preciso dificultar as coisas.Esse Nascimento do texto é um homem mais maduro, lembra que o primeiro filme se passa em 1997 e aqui estamos em 2014.
Espero que gostem, não sei como ficou KKKK.
Sobre o tema do desafio, eu peguei umas coisinhas aqui e ali, para compor o texto. Acho que a crítica social foi feita com sucesso. Os bairros citados existem, para quem não conhece a cidade. (Eu não conheço todos, achei no Google).
Beijos.



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